Foi sentada numa sala estática, aparelho televisor
desligado e visão correndo por retratos na parede, que comecei a me perguntar. O que é arte para mim? O que significa? Por que a anseio? De onde vem? Para onde vai? Meus olhos, se desviando entre foto e foto, pararam numa almofada no sofá. Era uma almofada marrom clara contornada por uma franja de barbante em cima do sofá também de cor neutra. Dou-me conta que essa franja dá a ilusão de mover-se. E começo a perceber também o movimento das cortinas, quase imperceptível, na frente às janelas semi-cerradas. É o gesto. O gesto é a intenção do corpo que impulsiona a criação do movimento. Segurar um pincel, um lápis ou sentir debaixo dos dedos as teclas de um piano. É o gesto! O movimento é forma com que o gesto expressa em cada artista, os ventos de Van Gogh, as mulatas de Cavalcanti, as poesias de Drummond, o nosso samba, Villa Lobos, etc. O gesto é o impulso criador, e pode ser tanto concreto quanto imaginário. O gesto concreto é o já descrito, que se transforma numa obra artística. Por exemplo, o gesto de tocar um instrumento impulsiona a criação de um movimento sonoro que se expressa em modo de imagem melódica. Aí imagem melódica seria nossa obra de arte. Em uma pintura, o gesto de segurar o pincel impulsiona o movimento de cores que se expressam em imagem. Em poesia, o gesto de segurar o lápis impulsiona o movimento de palavras que também expressam uma imagem. É claro que todas expressam, por meio de relações mais complexas, pensamentos, sentimentos ou idéias. E é nessa relação complexa que eu me vi enquanto observava a almofada no sofá. Relação onde atua o gesto imaginário, o gesto imaginário impulsiona o pensamento a criar o movimento, que se dá em forma de imagem ilusória. Essa imagem é o fluxo do próprio pensamento/sentimento/idéia expresso pelo gesto. Por isso, a franja da almofada começa a mexe-se de maneira ilusória empurrada pelo gesto que impulsiona o movimento e, portanto o fluxo do meu pensamento/sentimento/idéia. Podemos observar como exemplo da capacidade do gesto imaginário as miragens no deserto e as viagens lisérgicas. O gesto imaginário é a necessidade da criatividade, criar atividade para expressar-se no campo físico, transportando o pensamento/sentimento/idéia do campo da idéia, por isso qualquer processo artístico se inicia nele. O pensamento/sentimento/idéia é impulsionado pelo movimento criado pelo gesto imaginário(imagem ilusória) e se transforma em gesto concreto quando transposto para o campo físico criando a atividade artística. Atividade artística é o movimento criado pelo gesto concreto, que expressa imagens reais, mas que buscam retornar a imagem ilusória. Por exemplo, no teatro os atores usam do gesto concreto cru para criar o movimento que transforma a imagem ilusória em cena ou no próprio corpo encarnando a imagem ilusória. Não sendo necessário figurino ou cenário para termos o entendimento e vivenciarmos essa imagem. A imagem vivenciada estimula nosso gesto imaginário a criar uma terceira imagem, a imagem imaginativa. Essa imagem é criada pelo mesmo processo que a imagem ilusória, porém não se desenvolve em atividade artística, é sim fruto da atividade artística compartilhada. Só o conjunto do teatro, musica, artes plásticas e poesia é o casamento artístico capaz de trazer completamente uma imagem ilusória para o campo físico. Então a atividade artística é o movimento de retorno à imagem ilusória, tentando por meio do gesto concreto trazê-la ao campo físico a fim de expressá-la e torná-la acessível a todos.