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luizpdsbarbosa@yahoo.com.br
Resumo
Este trabalho tem como objeto o sufixo –ē formador de verbos com valor de estado em
Latim. A proposta aqui é mostrar a assunção de uma perspectiva teórica moderna dentro
das tendências funcionalistas para estudo de um fenômeno da Antiguidade Clássica – a
Gramática de Construções. Assim, este artigo se inicia com uma breve descrição do que
seriam esses verbos estativos e de como eles estão situados na conjugação latina. Em
seguida, ele mostra como analisar as construções com esses verbos segundo a
perspectiva construcional de Traugott & Trousdale (2013). Em sua conclusão, são
apontadas algumas possíveis direções para futuros estudos.
Abstract
This paper has as object the suffix –ē, composer of verbs with state value in Latin. The
purpose here is to show the assumption of a modern theoretical perspective for the study
of a Classical Antiquity phenomenon – the Construction Grammar. Thus, the article
initiates with a brief description of what such verbs would be and how they are inserted
in latin conjugation. Next, it shows how to analyze the constructions containing these
verbs according to the constructional perspective of Traugott & Trousdale (2013). In its
conclusion, a few possible directions for following studies are appointed.
1- Introdução
1ª conjugação, formada pela vogal temática –ā, como amo, –as, –āre, –āui, –ātum
2ª conjugação, formada pela vogal temática –ē, como habeo, –es, –ēre, –ui, –itum
3ª conjugação, formada pela vogal temática –ĕ, como facio, –is, –ĕre, feci, factum
4ª conjugação, formada pela vogal temática –ī, como seruio, –is, –īre, –īui, –ītum
(amar, ter, fazer e servir, respectivamente)
não só foram perdendo seu uso estativo intransitivo original, como também passaram
por processos bastante peculiares de mudança.
Tardiamente, no Latim Vulgar, muitos verbos formados pelo sufixo –ē, por
alterações fonéticas, acabam por se confundirem com verbos de outros paradigmas (em
geral –ĕre e īre). No entanto, a composição do sufixo estativo com o sufixo incoativo –
sc apresenta certa produtividade, como os pares floreo/floresco; doleo/dolesco (estar
florido/florescer; estar doendo/começar a doer) (cf. VÄÄNÄNEN, 1967, p. 144-5).
É oportuno observar alguns exemplos de uso dos verbos estativos nos textos
arcaicos latinos:
(1)
- ...madeo metu. (Mostellaria, v. 395)
-... estou molhado de medo
(2)
- Post se derisum dolet (Mostellaria, v.10)
- Ele sofre após ter sido zombado
(3)
- At te Iuppiter /Dique omnes perdant! <Fufae!> Oboluisti alium (Mostellaria, v.39)
- Mas que Júpiter e todos os deuses te destruam! <Ugh!> Fedeste a alho!
Outra diferença marcante é o fato de o verbo estar no aspecto perfeito, o que confere
maior transitividade à oração, no entanto, essa mudança aspectual não inclui o sufixo –ē
na formação do perfeito.
(4)
- nam muliones mulos clitellarios
habent, at ego habeo homines clitellarios. (Mostellaria, v. 781)
- Pois os arrieiros têm machos de carga,
mas eu tenho homens de carga
(5)
- Satis iam dictum habeo. (Persa, v. 214)
- Já tenho dito o suficiente
3- A abordagem construcional
Microconstrução [ē]
Construto ē
Mesoconstrução [√V+ē]
Construto mad+ē
Macroconstrução [S+Vē]
Construto <ego> madeo
Mesoconstrução [√V+ē]
Construto hab+ē
*Macroconstrução *[S+Vē+O]
*Construto *ego habeo homines clitellarios.
O exemplo 4’, que foi classificado aqui como menos prototípico, principalmente
por ter um objeto, mostra uma construção diferente daquela mais prototípica expressa
em 1. Essa outra construção [S+Vē+O] seria um ponto de partida oportuno para um
estudo diacrônico, já que mostra que, no texto latino arcaico, o verbo habeo já encontra
usos afastados do protótipo de verbo estativo. Já que essa mudança prodiziu uma nova
construção, tratar-se-á de uma construcionalização. No entanto, ainda não houve tempo
suficiente para um estudo diacrônico sobre os verbos estativos.
Um possível estudo diacrônico poderia estabelecer uma reflexão sobre a
produtividade da macroconstrução prototípica [S+Vē] e também para a mesoconstrução
[√V+ē], ou, ainda, mostrar até que época é possível encontrar produtividade nas
construções com verbos estativos, se isso for possível.
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5- Considerações Finais
Este trabalho produziu mais dúvidas do que respostas. Isso se deve não apenas à
incipiência da abordagem construcional que aqui é utilizada, mas também à incipiência
dos próprios estudos lingüísticos modernos sobre Língua Latina. De certo modo, o
surgimento dessas dúvidas é positivo, pois mostra os caminhos possíveis para estudos
vindouros.
Alguns possíveis caminhos para próximos estudos podem incluir: a) a possível
construcionalização que incluiu os verbos habeo e teneo; b) a produtividade dos verbos
estativos; c) a gramaticalização não apenas do ē, mas dos outros sufixos formadores de
verbos em Latim, em direção às vogais temáticas das línguas neolatinas.
Voltando ao presente objeto, o estabelecimento de uma rede, que vai desde o
sufixo como microconstrução até a oração como macroconstrução mostra como as
propriedades formais s erelacionam, de maneira interdependente.
Enfim, este trabalho mostrou como aspectos da morfologia latina podem ser
trabalhados sob a ótica da Gramática de Construções. Espera-se que mais latinistas
venham a se debruçar sobre teorias lingüísticas modernas e também que mais lingüistas
possam ter conhecimento das línguas clássicas.
6- Referências