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Direito Administrativo

O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir


da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em
livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais.

Sumário
I. Princípios do Direito Administrativo .................................................................. 3
10. Princípio da continuidade do serviço público. ................................................ 3
11. Princípio da subsidiariedade ........................................................................... 5
12. Princípio da proteção da confiança ................................................................ 7
13. Princípio da autotutela ................................................................................... 9
14. Princípio da indisponibilidade....................................................................... 10
II. Poderes Administrativos ................................................................................. 14
1. Poder discricionário e poder vinculado .......................................................... 14
2. Poder hierárquico ........................................................................................... 16
3. Poder disciplinar ............................................................................................. 16
3.1 Processo Administrativo Disciplinar ......................................................... 19
4. Poder regulamentar ........................................................................................ 20
5. Poder de polícia .............................................................................................. 23
5.1 Atributos do poder de polícia ................................................................... 27
5.1.1 Discricionariedade ............................................................................. 27
5.1.2 Autoexecutoriedade ou executoriedade ........................................... 28
5.1.3 Coercibilidade .................................................................................... 29
5.2 Condições para a validade do poder de polícia ........................................ 30
5.2.1 Competência ...................................................................................... 30
5.2.2 Forma ................................................................................................. 31
5.2.3 Finalidade........................................................................................... 31
5.2.4 Proporcionalidade da sanção ............................................................ 31
5.2.5 Legalidade dos meios empregados ................................................... 32
5.3 Polícia administrativa e polícia judiciária ................................................. 33
5.4 Prescrição para o exercício do poder de polícia ....................................... 35
5.5 Ciclo de polícia .......................................................................................... 39
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5.5.1 Ordem de polícia................................................................................ 39


5.5.2 Consentimento .................................................................................. 40
5.5.3 Fiscalização ........................................................................................ 41
5.5.4 Sanção ................................................................................................ 42
5.6 Delegação do poder de polícia ................................................................. 43

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I. Princípios do Direito Administrativo


Será dada continuidade à parte restante que faltou comentar sobre os princípios
da administração. O professor comentou até o nono princípio, mas foram destacados
catorze princípios. Os princípios compreendem do décimo ao décimo quarto e, em se-
guida, será dado início ao estudo dos poderes administrativos, que é a última matéria
do módulo de Direito Administrativo I.
Serão analisados o poder disciplinar, vinculado, poder hierárquico, poder regu-
lamentar e o poder de polícia, que merece ser analisado com maiores detalhes. Vol-
tando-se os princípios, cumpre abordar o princípio da continuidade do serviço público.

10. Princípio da continuidade do serviço público.


O princípio da continuidade do serviço público é muito citado no Direito admi-
nistrativo, que tem como propósito impedir a interrupção na prestação de serviços pú-
blicos. Ele serve de inspiração para diversos institutos de direito público. Por exemplo,
é muito comum fundamentarem a impenhorabilidade dos bens públicos na continui-
dade do serviço público, bem como a não onerabilidade dos bens públicos, a ideia de
que não podem ser oferecidos em garantia, pois se forem e vierem a ser alienados, isso
poderia comprometer a continuidade do serviço público.
Esse princípio tem como essência o fato de que o serviço público não pode ser
interrompido, porque é de interesse da coletividade. Em razão dele, a exceção de con-
trato não cumprido não pode, como regra, ocorrer para beneficiar o particular que con-
trata com a Administração Pública.
Portanto, esse princípio também inspira a previsão do artigo 78, XV, da Lei nº
8.666/93.

Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993


Art. 78. Constituem motivo para rescisão do contrato:
(...)
XV - o atraso superior a 90 (noventa) dias dos pagamentos devidos pela Adminis-
tração decorrentes de obras, serviços ou fornecimento, ou parcelas destes, já rece-
bidos ou executados, salvo em caso de calamidade pública, grave perturbação da
ordem interna ou guerra, assegurado ao contratado o direito de optar pela suspen-
são do cumprimento de suas obrigações até que seja normalizada a situação;
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Vale lembrar que uma das causas de rescisão do contrato administrativo é o não
pagamento por parte da Administração Pública ao contratado. Esse não pagamento pre-
cisa ser superior a noventa dias. Ou seja, mesmo estando o poder público inadimplente,
isso não autorizará ao particular a se opor a dar cumprimento ao contrato, pois, caso o
faça, isso poderia comprometer o serviço público.
É curioso lembrar que Maria Sylvia Di Pietro limita o alcance do artigo 78, XV,
àqueles contratos que digam respeito à prestação de algum serviço público. Se a inter-
rupção do contrato não comprometer o serviço público, segundo Maria Sylvia Di Pietro,
o particular não precisaria esperar o prazo de noventa dias, pois, para ela, como o fun-
damento do artigo 78, XV, é o princípio da continuidade do serviço público, se a inter-
rupção do contrato administrativo específico não comprometer o serviço público, o par-
ticular poderia, a qualquer tempo de atraso, suspender o contrato.
Todavia, o entendimento predominante é de que essa inoponibilidade de exce-
ção de contrato não cumprido vale para todo e qualquer contrato administrativo, de
modo que o atraso pode chegar a noventa dias sem que o particular possa suspender a
execução do contrato.
Encerrando-se o estudo do princípio da continuidade do serviço público, im-
pende notar que, durante muito tempo, a 1ª e 2ª Turmas do STJ divergiram sobre a
possibilidade do corte de fornecimento de serviços públicos, especialmente, quando fo-
rem essenciais. Isso porque, o CDC, Lei nº 8.078/90, prevê que os serviços essenciais não
podem ser interrompidos, conforme o artigo 22, do Código de Defesa do Consumidor.

Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. (Código de Defesa do Consumidor)


Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissioná-
rias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer
serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações


referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a repa-
rar os danos causados, na forma prevista neste código.

Por outro lado, a Lei nº 8.987/95, que é posterior ao CDC, no seu artigo 6º, pará-
grafo terceiro, prevê:

Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995.


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Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado


ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas
pertinentes e no respectivo contrato.
§ 1º Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade,
eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modi-
cidade das tarifas.
§ 2º A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das
instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço.
§ 3º Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em si-
tuação de emergência ou após prévio aviso, quando:
I - motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; e,
II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.

Portanto, se o débito for presente, não valendo para débito pretérito, e o sujeito
inadimplente for notificado do débito que deve pagar, sob pena de corte, este poderá
ocorrer, ressalvado o interesse da coletividade. Ou seja, não poderá ser cortada a ener-
gia elétrica da UTI de um hospital, por exemplo.
A jurisprudência tem encaminhado no sentido de que o corte é permitido, o que
não é considerado uma descontinuidade. O artigo 6º, da Lei nº 8.078, tem sido aplicado
pelo STJ, visto que, antigamente, a 1ª Turma não aplicava, aplicando o CDC, ao passo
que a 2ª Turma aplicava a Lei nº 8.987. A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, já há
algum tempo, consolidou o entendimento de que o corte se torna possível, desde que
ressalvado o interesse da coletividade. O STJ tem sido muito restritivo, tendo impedido
o corte no fornecimento de serviço público em raríssimos casos, com fundamento no
princípio da continuidade.

11. Princípio da subsidiariedade


Trata-se de princípio que remonta a doutrina social da Igreja Católica, princípio
que prestigia o exercício do poder pela própria comunidade e quando esta não puder
exercer o poder para resolver suas questões, suas demandas, que o poder seja exercido
pela instância estatal mais próxima da coletividade.
O Estado deve permitir que o poder decisório seja transferido, ao máximo, para
os próprios indivíduos ou instituições, tais como as famílias, organizações não governa-
mentais, associações de moradores e congêneres ou, ao menos, permitir a transferência

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do poder decisório para as esferas estatais de poder mais descentralizadas, isto é, que
estejam mais próximas da comunidade.
Recentemente, o Ministro Edson Fachin, proferiu voto sobre a questão relacio-
nada ao amianto, fundamentando no sentido de que a legislação estadual que veda a
comercialização de amianto deveria ser prestigiada, em razão do princípio da subsidia-
riedade. O próprio Estado deveria ter condições de no exercício de sua autonomia ad-
ministrativa avaliar quais produtos podem ou devem ser comercializados no seu âmbito.
Pode-se discordar do voto do eminente Ministro, uma vez que a União já permi-
tiu a comercialização do amianto branco, essa norma deveria prevalecer em detrimento
de uma norma específica sobre a matéria, pois em matéria de competência concorrente,
o Estado deve observar as normas gerais editadas pela União1.Ressalte-se que o princí-
pio da subsidiariedade tem sido mais observado hodiernamente do que no passado pelo
STF.
O ministro Luiz Fux, em caso envolvendo limite de alunos em sala de aula, anali-
sou lei do Estado de Santa Catarina que previu que não poderia haver mais de quarenta
alunos, o que instaurou a discussão, visto que a lei deveria ser de competência da União.
O Supremo Tribunal Federal entendeu que os Estados deveriam ter maior autonomia
para cuidar da sua própria educação.
É notório que o Judiciário, principalmente o STF e o STJ, tendem a prestigiar as
competências da União. Hoje, há movimento contrário a isso, no sentido de prestigiar o
próprio Município e Estado para que se atente à essência do princípio da subsidiaridade.
Ou seja, as esferas estatais mais distantes da comunidade só podem agir quando aquela
mais próxima não tiver condições para resolver o problema, o que tem relação direta
com a autonomia dos indivíduos.

1Nota do Monitor:
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
(...)
§ 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas ge-
rais.
§ 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar
dos Estados.
§ 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena,
para atender a suas peculiaridades.
§ 4º A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe
for contrário.
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12. Princípio da proteção da confiança


Ao se falar sobre esse princípio, cabe limitar o estudo, ressaltando que o profes-
sor Valter Shuenquener dissertou a sua tese de doutorado sobre o assunto, com livro
publicado sobre esse tema. Afirma-se que esse princípio solucionaria muitos problemas
no Brasil, caso fosse adotado com mais frequência do que tem sido. A tese foi defendida
em 2008. Hoje, em 2017, muita coisa mudou, o Supremo Tribunal Federal já tem ado-
tado o princípio com maior frequência.
Com relação a esse princípio, vale lembrar que ele não está previsto expressa-
mente na Constituição e que, para a maioria dos autores e também de acordo com a
jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão e do Supremo Tribunal Federal, o prin-
cípio da proteção da confiança é derivado da segurança jurídica e do Estado de Direito,
o que os alemães denominam de cadeia de derivação (Herleitungskette), que leva ao
princípio da proteção da confiança. Em um Estado de Direito, existe a segurança jurídica
e a dimensão subjetiva da segurança jurídica, que é o princípio da proteção da confiança.
A segurança jurídica irradia valores que são contrários e a favor das expectativas legíti-
mas de um indivíduo.
 Pergunta-se: o particular recebe uma gratificação ilegal por seis meses, recebendo
R$1.000,00 a cada mês. A gratificação é ilegal, não há dúvidas, de modo que não a
receberá mais no futuro. Contudo, ele precisa devolver aquela gratificação?
Um ato ilegal precisa ser retirado do ordenamento jurídico, pois a sua manuten-
ção gera insegurança jurídica. A preservação de atos ilegais no ordenamento jurídico
gera, do ponto de vista objetivo, insegurança jurídica. Agora, do ponto de vista do cida-
dão, que é o destinatário e beneficiário do ato ilegal, a sua retirada gera insegurança.
De um lado, do ponto de vista do ordenamento, a manutenção do ato gera inse-
gurança, enquanto que, do outro lado, do ponto de vista do cidadão, a manutenção do
ato gera segurança jurídica. É interessante que a segurança jurídica irradia valores que
estão em permanente estado de tensão, de um lado a preservação do ordenamento
jurídico de maneira previsível estimula a retirada de um ato ilegal e, do ponto de vista
do indivíduo, ele almeja que o ato ilegal permaneça, tendo em vista que tinha expecta-
tiva de que o ato era válido.
Logo, o princípio da proteção da confiança materializa a tutela do cidadão no
sentido de protegê-lo em relação às suas expectativas legítimas. Os atos estatais e
mesmo comportamentos estatais podem dar origem a expectativas que são legítimas e
que devem ser tuteladas. O direito positivo brasileiro e a dogmática do direito ainda

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trabalha, infelizmente, com o binômio direito adquirido e expectativa de direito, remon-


tando à Gabba e Paul Roubier, de modo que a pessoa tem tudo, ou não tem nada.
Exemplo: no caso da aposentadoria, o Brasil está passando por, provavelmente,
mais uma reforma da previdência. Suponha-se que a idade mínima para aposentadoria
do servidor homem passe de sessenta para sessenta e cinco anos.
O princípio da proteção da confiança permite uma proteção do cidadão que está
em vias de se aposentar contra uma mudança que frustra essa expectativa. Consigne-se
que o fato de estar em vias de se aposentar dependerá do caso concreto, da fundamen-
tação, através de raciocínio lógico para se chegar ao resultado, ou seja, motivação da
decisão.
Exemplo: considerando que falta um ano para o servidor se aposentar, não se
pode defender que o indivíduo não possui direito adquirido, alegando que a idade mí-
nima para se aposentar pode ser alterada para cem anos.
Além do direito adquirido, o ordenamento jurídico deve proteger aqueles direi-
tos que foram acumulados ao longo do tempo. Diante de relação jurídica de trato su-
cessivo e que dura, por exemplo, o regime previdenciário, que tende a durar décadas,
não se pode frustrar a expectativa do indivíduo sob alegação que só terá o direito a se
aposentar se tiver direito adquirido incorporado ao seu patrimônio.
Um país de ordenamento jurídico sério respeita as expectativas dos seus cida-
dãos, pois a relação de confiança entre o cidadão e o Estado é o pressuposto mínimo
para o convívio social. Não há uma civilização ou um Estado de Direito sem a relação de
confiança entre o cidadão e o Estado. Se o Estado for o primeiro a descumprir as expec-
tativas que originou na consciência do cidadão, a primeira coisa que este irá fazer é pro-
curar outras fontes de expectativas. O cidadão corta sua relação com o Estado e procura
outros meios. Por exemplo, o indivíduo que não acredita na segurança pública contrata
a segurança privada.
Isso deve ser evitado. Para incentivar uma relação firme e perene do Estado com
o cidadão, o primeiro não pode descumprir as promessas que fez e, se tiver que mudar
o rumo das coisas, como a mudança da idade mínima para aposentadoria, não significa
dizer que a idade anterior estava errada, mas que as pessoas ficam mais velhas e a regra
deve sofrer alteração, pois não se pode engessar o Estado e o governante, o princípio
da proteção da confiança não engessa, ele apenas tutela aqueles que estão em situação
diferente dos demais, deve ser feita gradação. Não se pode colocar a pessoa que só falta
um mês para se aposentar na mesma situação que aquela que acabou de entrar no re-
gime previdenciário, sob o argumento que ambas possuem mera expectativa de direito.
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As duas pessoas no exemplo traçado possuem mera expectativa de direito, con-


tudo, uma delas passou mais tempo que a outra e essa diferenciação é visualizada pelo
princípio da proteção da confiança, derivado do Estado de Direito e tem como propósito
tutelar as expectativas legítimas dos administrados criadas por atos estatais.
A doutrina sustenta que é um princípio de mão única, ou seja, protege o cidadão
na sua relação com o Estado, não protege o Estado em relação ao cidadão, pois o Estado
exerce o poder de modo que pode criar regras para proteger suas expectativas, ao passo
que o cidadão fica sujeito à vontade do Estado e deve ter um mínimo de proteção que
é inerente a um Estado de Direito.
Outrossim, saliente-se que o princípio da proteção da confiança tem sido ado-
tado pelo STF e, principalmente, pelos Ministros Gilmar Mendes e Luiz Fux.

13. Princípio da autotutela


Muitos autores citam este instituto como se fosse um princípio. A administração
tem o dever de corrigir os vícios de seus atos e de retirar do ordenamento os atos ino-
portunos. Isso independe da anuência do Poder Judiciário, o que é importante frisar,
haja vista que, embora no Brasil isso seja óbvio, em outros países não é evidente, pois
noutros Estados há necessidade de o Judiciário autorizar a anulação de ato administra-
tivo.
Aqui, no Brasil, a própria administração pode, de ofício ou em razão de provoca-
ção, de requerimento, declarar a nulidade de atos administrativos. Evidentemente, para
assim fazer, deverá observar o contraditório e a ampla defesa, até porque a anulação é
um ato que resulta de procedimento dialógico, em que há a tese, antítese e a síntese,
que é exatamente a conclusão pela anulação. Para chegar à síntese, não basta a tese de
que o ato é inválido, é preciso saber a posição do particular que será atingido com a
anulação para chegar à conclusão.
Alerta-se que as Súmulas nº 346 e 473 do STF são frequentemente citadas, posto
que amparam o poder de autotutela, que consubstancia o poder da administração de
rever, sob a ótica da legalidade e do mérito administrativo, os atos que ela própria edita.
Súmula 346 do STF
A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.
Súmula 473 do STF
A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os
tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de

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conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em


todos os casos, a apreciação judicial.

O que hoje encontra-se ultrapassado na Súmula 473 é a menção de que da nuli-


dade não se originam direitos. O próprio Supremo Tribunal Federal reconhece nos seus
julgados que alguns atos inválidos podem produzir efeitos, com base no princípio da
proteção da confiança. Por exemplo, a Lei nº 9.784/99 prevê no seu artigo 54, a possibi-
lidade de manutenção de um ato inválido.
Lei nº 9.784 , de 29 de janeiro de 1999.
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decor-
ram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data
em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á
da percepção do primeiro pagamento.
§ 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade ad-
ministrativa que importe impugnação à validade do ato.

Portanto, existem situações em que o ato, a despeito de ser inválido, irá produzir
efeitos jurídicos, ainda que sejam efeitos não desejados pelo ordenamento jurídico, mas
são efeitos jurídicos.
Ademais, é digno de nota que autotutela não se confunde com tutela adminis-
trativa. Tutela administrativa é o controle que a Administração direta exerce sobre as
entidades da Administração Indireta. Enquanto que na autotutela há um controle hie-
rárquico, no âmbito da mesma pessoa jurídica, tutela é expressão que se refere ao con-
trole exercido por uma pessoa em relação aos atos de outra pessoa, o que a administra-
ção direta faz quando controla entidade da administração indireta.

14. Princípio da indisponibilidade


Por fim, o princípio da indisponibilidade rege que o administrador público não
tem poderes para dispor dos bens e direitos do Estado. A gestão do patrimônio público
não abrange atos de disposição. A prática de atos de disposição depende de autorização
legal. Por isso, a alienação de bens públicos depende, como regra, de autorização legis-
lativa.
Não obstante, o artigo 17, da Lei nº 8.666/93, prevê que a alienação de bens
imóveis depende de autorização legislativa, mas não faz a mesma referência no que
tange à alienação de bens móveis.

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Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de


interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá
às seguintes normas:
I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da adminis-
tração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as en-
tidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade
de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos:
a) dação em pagamento;
b) doação, permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da administra-
ção pública, de qualquer esfera de governo, ressalvado o disposto nas alíneas f, h e
i; (Redação dada pela Lei nº 11.952, de 2009)
c) permuta, por outro imóvel que atenda aos requisitos constantes do inciso X do
art. 24 desta Lei;
d) investidura;
e) venda a outro órgão ou entidade da administração pública, de qualquer esfera
de governo; (Incluída pela Lei nº 8.883, de 1994)
f) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, lo-
cação ou permissão de uso de bens imóveis residenciais construídos, destinados ou
efetivamente utilizados no âmbito de programas habitacionais ou de regularização
fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administra-
ção pública; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)
g) procedimentos de legitimação de posse de que trata o art. 29 da Lei no 6.383, de
7 de dezembro de 1976, mediante iniciativa e deliberação dos órgãos da Adminis-
tração Pública em cuja competência legal inclua-se tal atribuição; (Incluído pela Lei
nº 11.196, de 2005)
h) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, lo-
cação ou permissão de uso de bens imóveis de uso comercial de âmbito local com
área de até 250 m² (duzentos e cinqüenta metros quadrados) e inseridos no âmbito
de programas de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por ór-
gãos ou entidades da administração pública; (Incluído pela Lei nº 11.481, de
2007)
i) alienação e concessão de direito real de uso, gratuita ou onerosa, de terras públi-
cas rurais da União e do Incra, onde incidam ocupações até o limite de quinze mó-
dulos fiscais e não superiores a 1.500ha (mil e quinhentos hectares), para fins de
regularização fundiária, atendidos os requisitos legais; e (Redação dada pela
Medida Provisória nº 759, de 2016)
II - quando móveis, dependerá de avaliação prévia e de licitação, dispensada esta
nos seguintes casos:

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a) doação, permitida exclusivamente para fins e uso de interesse social, após avali-
ação de sua oportunidade e conveniência sócio-econômica, relativamente à escolha
de outra forma de alienação;
b) permuta, permitida exclusivamente entre órgãos ou entidades da Administração
Pública;
c) venda de ações, que poderão ser negociadas em bolsa, observada a legislação
específica;
d) venda de títulos, na forma da legislação pertinente;
e) venda de bens produzidos ou comercializados por órgãos ou entidades da Admi-
nistração Pública, em virtude de suas finalidades;
f) venda de materiais e equipamentos para outros órgãos ou entidades da Adminis-
tração Pública, sem utilização previsível por quem deles dispõe.
§ 1º Os imóveis doados com base na alínea "b" do inciso I deste artigo, cessadas as
razões que justificaram a sua doação, reverterão ao patrimônio da pessoa jurídica
doadora, vedada a sua alienação pelo beneficiário.
§ 2º-A Administração também poderá conceder título de propriedade ou de direito
real de uso de imóveis, dispensada licitação, quando o uso destinar-se: (Redação
dada pela Lei nº 11.196, de 2005)
I - a outro órgão ou entidade da Administração Pública, qualquer que seja a locali-
zação do imóvel; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)
II - a pessoa natural que, nos termos da lei, de regulamento ou de ato normativo do
órgão competente, haja implementado os requisitos mínimos de cultura, ocupação
mansa e pacífica e exploração direta sobre área rural limitada a quinze módulos
fiscais, desde que não exceda a 1.500ha (mil e quinhentos hectares); (Redação
dada pela Medida Provisória nº 759, de 2016)
§ 2º-A. As hipóteses do inciso II do § 2o ficam dispensadas de autorização legislativa,
porém submetem-se aos seguintes condicionamentos: (Redação dada pela Lei nº
11.952, de 2009)
I - aplicação exclusivamente às áreas em que a detenção por particular seja com-
provadamente anterior a 1o de dezembro de 2004; (Incluído pela Lei nº 11.196,
de 2005)
II - submissão aos demais requisitos e impedimentos do regime legal e administra-
tivo da destinação e da regularização fundiária de terras públicas; (Incluído pela
Lei nº 11.196, de 2005)
III - vedação de concessões para hipóteses de exploração não-contempladas na lei
agrária, nas leis de destinação de terras públicas, ou nas normas legais ou adminis-
trativas de zoneamento ecológico-econômico; e (Incluído pela Lei nº 11.196,
de 2005)

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IV - previsão de rescisão automática da concessão, dispensada notificação, em caso


de declaração de utilidade, ou necessidade pública ou interesse social. (Incluído
pela Lei nº 11.196, de 2005)
§ 2º-B. A hipótese do inciso II do § 2o deste artigo: (Incluído pela Lei nº 11.196,
de 2005)
I - só se aplica a imóvel situado em zona rural, não sujeito a vedação, impedimento
ou inconveniente a sua exploração mediante atividades agropecuárias; (Incluído
pela Lei nº 11.196, de 2005)
II – fica limitada a áreas de até quinze módulos fiscais, desde que não exceda mil e
quinhentos hectares, vedada a dispensa de licitação para áreas superiores a esse
limite; (Redação dada pela Lei nº 11.763, de 2008)
III - pode ser cumulada com o quantitativo de área decorrente da figura prevista na
alínea g do inciso I do caput deste artigo, até o limite previsto no inciso II deste
parágrafo. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)
IV – (VETADO) (Incluído pela Lei nº 11.763, de 2008)
§ 3º Entende-se por investidura, para os fins desta lei: (Redação dada pela Lei nº
9.648, de 1998)
I - a alienação aos proprietários de imóveis lindeiros de área remanescente ou re-
sultante de obra pública, área esta que se tornar inaproveitável isoladamente, por
preço nunca inferior ao da avaliação e desde que esse não ultrapasse a 50% (cin-
qüenta por cento) do valor constante da alínea "a" do inciso II do art. 23 desta lei;
(Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)
II - a alienação, aos legítimos possuidores diretos ou, na falta destes, ao Poder Pú-
blico, de imóveis para fins residenciais construídos em núcleos urbanos anexos a
usinas hidrelétricas, desde que considerados dispensáveis na fase de operação des-
sas unidades e não integrem a categoria de bens reversíveis ao final da concessão.
(Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)
§ 4º A doação com encargo será licitada e de seu instrumento constarão, obrigato-
riamente os encargos, o prazo de seu cumprimento e cláusula de reversão, sob pena
de nulidade do ato, sendo dispensada a licitação no caso de interesse público devi-
damente justificado; (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)
§ 5º Na hipótese do parágrafo anterior, caso o donatário necessite oferecer o imóvel
em garantia de financiamento, a cláusula de reversão e demais obrigações serão
garantidas por hipoteca em segundo grau em favor do doador. (Incluído pela
Lei nº 8.883, de 1994)
§ 6º Para a venda de bens móveis avaliados, isolada ou globalmente, em quantia
não superior ao limite previsto no art. 23, inciso II, alínea "b" desta Lei, a Adminis-
tração poderá permitir o leilão. (Incluído pela Lei nº 8.883, de 1994)
§ 7º (VETADO). (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

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Isso gera forte polêmica. Defende-se que, em ambos os casos, a autorização le-
gislativa seria necessária. José dos Santos Carvalho Filho entende que a autorização le-
gislativa poderia ser genérica na alienação de bens móveis e deveria ser específica na
alienação de bens imóveis.
Conclui-se que o legislador deve consentir com a alienação de bens públicos em
razão do princípio da indisponibilidade. Cabe destacar que, ao longo dos anos, esse prin-
cípio foi lembrado de forma conservadora para impedir que a administração pública pu-
desse fazer acordos, transação, conciliação e submeter-se à arbitragem.
Hoje em dia, uma visão mais moderna do direito administrativo postula que a
indisponibilidade não impede que a administração se submeta à arbitragem, nem
mesmo à mediação. A legislação atual de arbitragem e mediação permite que a admi-
nistração se submeta a estes mecanismos de resolução de disputas. Pode ser que a so-
lução alcançada através de processo de mediação ou arbitragem seja melhor do ponto
de vista do interesse público do que uma solução obtida judicialmente. A solução poderá
ser tecnicamente melhor ou mais rápida, a depender do caso concreto. Não se pode, de
antemão, impedir a adoção de mecanismos alternativos de resolução de disputas com
fundamento no princípio da indisponibilidade.
A indisponibilidade se presta para recordar que o administrador possui limites,
foi escolhido para administrar, não para abdicar do interesse público, do patrimônio pú-
blico sem autorização legislativa. Mediação e arbitragem na administração não repre-
sentam, necessariamente, uma abdicação do interesse público, pelo contrário, o inte-
resse público pode ser concretizado de maneira melhor do que seria se a demanda fosse
solucionada no âmbito judicial.

II. Poderes Administrativos


De modo geral, os poderes administrativos são, na verdade, funções ou deveres
que o administrador possui, voltados para satisfação do interesse público. Nessa linha,
cada poder específico representa uma função que o administrador possui voltada para
missão própria. O poder regulamentar não se confunde com poder de polícia, com po-
der discricionário, com poder vinculado, tampouco com poder hierárquico.
1. Poder discricionário e poder vinculado
O poder do administrador pode ser exercido de forma vinculada ou de forma
discricionária. Poder vinculado é aquele exercido de acordo com os parâmetros estabe-
lecidos, definidos em lei, sem que haja espaço para o administrador fazer qualquer tipo
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de avaliação de conveniência e oportunidade. Dá-se quando o administrador não tem


espaço para conformar o texto legal de acordo com sua conveniência e oportunidade.
Por exemplo, a lei estabelece que o Rio de Janeiro deverá ser fiscalizado todos os dias
às 10:00 da manhã. O poder público estadual deverá fiscalizar, trata-se de exemplo de
poder de polícia a ser exercido de forma vinculada.
O poder discricionário, por sua vez, é o poder do administrador exercido de
forma discricionária, mediante edição de atos discricionários. Isso ocorre quando o ad-
ministrador possui um poder para fazer avaliação de conveniência e oportunidade.
É importante destacar que o ordenamento jurídico brasileiro está repleto de con-
ceitos jurídicos indeterminados ou cláusulas gerais, como ordem pública, segurança na-
cional, mulher honesta. Todos esses são exemplos de preceitos que precisam ser inter-
pretados pelo administrador para saber como aquela regra será aplicada no caso con-
creto.
Quando se está diante de conceito jurídico indeterminado, não há espaço para
avaliação de conveniência e oportunidade. Havendo zona de certeza positiva ou zona
de certeza negativa, fazendo-se alusão a Karl Engisch, ou seja, sabendo que determinada
situação não se encaixa no conceito (zona de certeza negativa), ou tem certeza de que
ela se encaixa no conceito (zona de certeza positiva), não há que se falar em discricio-
nariedade. No máximo, pode-se admitir como discricionário na zona de certeza indeter-
minável em que há certo espaço para avaliação de acordo com o caso concreto para
inferir se aquela situação se encaixa ou não no conceito jurídico indeterminado.
Em verdade, na discricionariedade, o administrador opta por um dos caminhos a
seguir, com base em conveniência e oportunidade. Quando se está diante de conceito
jurídico indeterminado, o poder do administrador é exercido não de forma discricioná-
ria, mas exigindo a interpretação daquele preceito geral, daquela cláusula geral diante
do caso concreto.
Atualmente, revela-se ultrapassado continuar investindo na divisão de ato dis-
cricionário e ato vinculado, pois, em realidade, o que se tem são atos administrativos
com dosagens de liberdade para o administrador. Definir quando um ato é discricionário
ou vinculado não é tão simples quanto nos livros, que apresentam o ato jurídico vincu-
lado sem qualquer espaço de avaliação.
Exemplo: licença ambiental. Para o deferimento da licença ambiental, o admi-
nistrador irá avaliar o Estudo de Impacto Ambiental (EIA). No EIA, o requerente irá apre-

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sentar estudo demonstrando que aquele seu projeto não irá trazer malefícios irreversí-
veis para a sociedade. Percebe-se que há grande subjetividade na avaliação do adminis-
trador, pois a aprovação de EIA ou RIMA não é de simples solução.
Dessa forma, pode haver situação em que a edição de licença, ato vinculado, de-
penda de avaliação tanto quanto discricionária. Logo, resta difícil insistir na divisão entre
poder discricionário e poder vinculado. Não obstante, constitui divisão contida nos ma-
nuais, como na obra de Hely Lopes Meirelles, consistindo em divisão clássica dos pode-
res administrativos.

2. Poder hierárquico
É o poder administrativo que tem como função ordenar, coordenar, organizar a
administração pública. A hierarquia é inerente à administração pública. No âmbito da
administração, existe uma relação hierárquica entre os agentes públicos e até mesmo
entre os órgãos da administração pública, alguns estão subordinados a outros.
O poder hierárquico permite, por exemplo, a delegação de competência, permite
a avocação de competência. Na avocação, a autoridade superior chama para si uma
competência que é do seu subordinado. Lado outro, na delegação, normalmente, há
transferência de competência para um subordinado.
Vale ressaltar que nem sempre a delegação é feita ao subordinado. Portanto,
nem sempre está relacionada ao poder hierárquico. Normalmente, a delegação possui
íntima relação com o poder hierárquico, mas nem sempre.
Logo, o poder hierárquico é inerente à administração. No entanto, alguns auto-
res, como José dos Santos Carvalho Filho, por exemplo, sustentam que não há poder
hierárquico, na verdade hierarquia é um dos atributos da administração, está presente
nesta, de forma que não seria um poder.
Contudo, ainda predomina a compreensão de que poder hierárquico é aquele
que, existindo na administração, permite a prática de todos os institutos ora menciona-
dos. Ademais, destaque-se que, normalmente, o poder hierárquico caminha junto com
o poder disciplinar, mas nem sempre.

3. Poder disciplinar
É o poder que autoriza o administrador a punir, aplicar sanções aos agentes pú-
blicos e demais pessoas que estão subordinadas ao regime jurídico da administração.
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Trata-se de um vínculo de supremacia especial, do Estado em relação aos desti-


natários do poder disciplinar. Por vínculo de supremacia especial, entende-se que ape-
nas aqueles que estiverem submetidos ao regime jurídico da administração é que po-
dem ser atingidos pelo poder disciplinar.
Exemplo: um servidor pode sofrer uma pena de suspensão, de demissão. Diver-
samente, um turista norueguês que transita pelo Brasil não pode ser demitido, sofrer
pena de advertência, suspensão, visto que não tem o vínculo especial, não há relação
de supremacia especial, de modo que a administração não está em um patamar superior
porque possui fundamento em vínculo específico que é o estatuto jurídico do servidor,
que legitima o exercício do poder disciplinar.
Em alguns casos, a lei de regência do servidor público estabelece qual sanção
deve ser aplicada ao servidor, de modo que não há margem para uma avaliação discri-
cionária. Previsto na lei de regência que determinada conduta gera demissão, há vincu-
lação, se o servidor praticar aquela conduta, deverá ser demitido. No entanto, na maio-
ria dos casos, existe o que a doutrina denomina de princípio da adequação punitiva. Na
maior parte das vezes, diante da gravidade da conduta, o administrador irá avaliar qual
a sanção que melhor se encaixa naquela conduta, se será advertência, suspensão por
dez ou quinze dias. O professor afirma que sustenta que há uma certa discricionariedade
nesse ponto, conforme entende Hely Lopes Meirelles.
Saliente-se que, no Conselho Nacional do Ministério Público levam-se horas de
debate sobre qual a sanção apropriada, visto que, por vezes, todos os membros do
CNMP concordam que o promotor deve ser punido, contudo, um membro vota pela
pena de demissão, outro pela pena de suspensão, outro pela pena de advertência. Vale
ressaltar que, no caso de demissão, o CNMP apenas propõe a pena de demissão, que
será aplicada pelo Judiciário em ação judicial. Encaminha-se pela propositura da pena
de demissão pelo Judiciário. Existe esse espaço de avaliação.
Contudo, nunca é demais destacar que também é defensável que não há espaço
de avaliação, pois o administrador deve aplicar a proporcionalidade, aplicando a pena
que seja proporcional, sem fazer avaliação de conveniência e oportunidade. De ambas
formas, entendendo-se que não há discricionariedade e que o administrador deve apli-
car a pena proporcional, ou postulando que há discricionariedade, entendendo que o
administrador pode avaliar qual sanção irá aplicar, em verdade, há espaço para escolha,
especialmente porque as condutas não são descritas de forma fechada como no Direito
Penal.

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Exemplo: matar alguém. No direito administrativo, na esfera de punição discipli-


nar encontram-se previsões de comportamentos abstratos, como conduta escandalosa,
falta de decoro, conduta incompatível com as funções do cargo. Isso exige uma análise
minuciosa do que ocorreu para se chegar à sanção adequada.
Nesse ponto, o professor destaca que a abstração da lei obriga o administrador
a fundamentar de maneira mais robusta o reconhecimento da prática da conduta e qual
sanção deve ser aplicada. Caso contrário, isso violaria o direito de defesa, consubstanci-
ando cerceamento de defesa, visto que como as condutas são abertas, se não houver
identificação do elemento subjetivo de forma clara, definição cristalina do que ocorreu
e a avaliação da pena a ser adotada na dosimetria, haverá cerceamento de defesa.
A aplicação da sanção disciplinar depende de processo administrativo. Destaque-
se que os meios sumários de acusação, a verdade sabida e o termo de declaração não
foram recepcionados pela Constituição Brasileira, posto que comprometem o direito à
ampla defesa. O agente tem o direito de se defender previamente ao exercício do poder
disciplinar. Conforme afirmado anteriormente, normalmente, quem aplica a sanção ao
servidor é a autoridade superior, por isso, geralmente, o poder disciplinar caminha jun-
tamente com o poder hierárquico, mas nem sempre. Assim, pode ser que determinado
ente da federação tenha órgão com competência par aplicar sanções aos servidores sem
que haja relação de subordinação hierárquica.
Oportuno assinalar que a jurisprudência não admite a dupla punição pelo mesmo
fato, o bis in idem é proibido. Ainda, detalhe a ser realçado é que, se o servidor público
ainda não foi punido, mas a pena já foi reconhecida em processo administrativo, a pena
pode ser anulada e substituída por nova sanção, sem que isso ofenda a proibição de
dupla punição pelo mesmo fato.
Leia-se a Súmula nº 19 do Supremo Tribunal Federal.
Súmula 19 do STF
É inadmissível segunda punição de servidor público, baseada no mesmo processo
em que se fundou a primeira.

Exemplo: pena de suspensão por trinta dias. Houve reconhecimento de que o


servidor deve ser punido com essa pena, mas ela ainda não foi aplicada. Nada impede
que essa pena seja anulada e substituída por outra.
O que o STJ não permite é que se a pena, ainda que ilegal, já foi efetivada, apli-
cada ao servidor, ele não pode ser punido pela segunda vez. A súmula deriva do STF,
mas essa temática vem sendo decidida com maior frequência pelo STJ, reconhecendo
que, se a pena ilegal já foi aplicada, não pode ser substituída. No entanto, há exceção a
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esse entendimento, consistente nas hipóteses do CNMP e do CNJ. A Constituição Brasi-


leira prevê que o CNMP e o CNJ podem rever punições aplicadas a menos de um ano
nos tribunais locais e nos MPs locais2.
Verificada a desproporcionalidade da punição a membro do Ministério Público,
pode-se afirmar que o indivíduo foi protegido por corporativismo, de modo que o CNMP
pode rever a punição por meio de processo de revisão disciplinar (RD). Em revisão disci-
plinar, o CNMP pode, mesmo que a pena tenha sido aplicada, avaliando aqueles mesmos
fatos, aplicar outra pena mais gravosa. Isso é pouco comentado na doutrina, mas é um
exemplo previsto constitucionalmente de dupla punição com base no mesmo fato.

3.1 Processo Administrativo Disciplinar


O processo administrativo disciplinar contempla cinco fases, quais sejam: instau-
ração, instrução, defesa, relatório e julgamento. A fase de instrução destina-se à coleta
de provas. A defesa deve vir após a instrução e, por vezes, na fase de defesa é desco-
berto novo documento, o que enseja abertura de nova fase de instrução, depois da qual,
deve ser assegurada nova fase de defesa. Isso é possível em razão do princípio do infor-
malismo, que é um dos princípios que rege o processo administrativo, em especial o
processo administrativo disciplinar. Em razão desse princípio, é possível repetir as fases,
não sendo tão formal quanto um processo judicial.
Tem-se a fase do julgamento, em que a autoridade competente irá exercer seu
poder disciplinar de aplicar a sanção correta. E a fase do relatório, sendo comum a le-
gislação exigir a elaboração de relatório propondo aplicação de uma pena, contudo, o

2Nota do Monitor:
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze) membros com mandato de 2 (dois)
anos, admitida 1 (uma) recondução, sendo: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 61, de
2009)
(...)
V - rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais
julgados há menos de um ano; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

Art. 130-A. O Conselho Nacional do Ministério Público compõe-se de quatorze membros nomeados pelo
Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, para um
mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: (Incluído pela Emenda Constitucional nº
45, de 2004)
(...)
IV rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de membros do Ministério Público
da União ou dos Estados julgados há menos de um ano;

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administrador não precisa seguir aquela pena proposta. Todavia, se o administrador di-
vergir da pena proposta, a divergência deverá ser motivada. A Lei nº 8.112/90 detalha
todo o procedimento disciplinar, a punição, o descrédito, as condutas e etc. O artigo 170
dispõe:
Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990
Art. 170. Extinta a punibilidade pela prescrição, a autoridade julgadora determi-
nará o registro do fato nos assentamentos individuais do servidor.

Tal dispositivo merece destaque, visto que o sujeito não foi punido, houve pres-
crição, de modo que registrar isso nos assentamentos só serviria para manchar os as-
sentamentos funcionais do servidor. Segundo o STF, o artigo 170 da Lei nº 8.112/90 é
inconstitucional, pois se ocorreu a prescrição, não deve ser registrado que o servidor
não foi punido. Só será registrada nos assentamentos a punição, mas se não houve pu-
nição, não importa o fundamento da extinção da punibilidade, pois a colocação disso
nos assentamentos gerará dúvida no sentido de que só não houve punição em razão da
prescrição, o que pode não ser verdade, visto que pode ser que o sujeito não tenha
cometido a conduta, respondia a um processo e acabou prescrevendo a sanção.

4. Poder regulamentar
É a função de competência do Chefe do Poder Executivo de detalhar previsões
legais genéricas. É através do poder regulamentar que o Presidente da República, que o
governador e que o prefeito esmiúçam, detalham, por meio de decretos, o que o legis-
lador não detalhou.
Para a maioria dos autores, citando-se Hely Lopes Meirelles, o poder regulamen-
tar é de competência privativa do Chefe do Poder Executivo, isso por força do artigo 84,
IV, da Constituição, que assim dispõe:
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
(...)
IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e re-
gulamentos para sua fiel execução;

O entendimento predominante é no sentido de que esse poder é do Chefe do


Poder Executivo, não podendo inovar no ordenamento jurídico.

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Registre-se, todavia, que alguns autores, como, por exemplo, José dos Santos
Carvalho Filho, sustentam que não é só o Chefe do Poder Executivo que detém compe-
tência para exercer o poder regulamentar. Carvalho Filho aborda os atos de regulamen-
tação de primeiro grau e de segundo grau. Por exemplo, tem-se um decreto, ato que
regulamenta a lei, mas pode haver outro ato, como uma portaria, uma ordem de serviço,
uma instrução normativa, que regulamente ainda mais aquele decreto, o que também
seria um ato de regulamentação, poder regulamentar exercido por outras autoridades
que não o Chefe do Poder Executivo.
Em reforço à tese de que o poder regulamentar não é privativo do Chefe do Po-
der Executivo, cita-se o artigo 87 da Constituição, que cuida das competências dos Mi-
nistros de Estado e assim dispõe:
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Art. 87. Os Ministros de Estado serão escolhidos dentre brasileiros maiores de vinte
e um anos e no exercício dos direitos políticos.
Parágrafo único. Compete ao Ministro de Estado, além de outras atribuições esta-
belecidas nesta Constituição e na lei:
I - exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da admi-
nistração federal na área de sua competência e referendar os atos e decretos assi-
nados pelo Presidente da República;
II - expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos;
III - apresentar ao Presidente da República relatório anual de sua gestão no Minis-
tério;
IV - praticar os atos pertinentes às atribuições que lhe forem outorgadas ou delega-
das pelo Presidente da República.

O texto constitucional prevê que o Ministro de Estado assina em conjunto com


o Presidente os decretos. Logo, não se pode defender que o poder regulamentar é pri-
vativo do Chefe do Executivo, já que a própria Constituição reconhece que o Ministro de
Estado também assina o decreto na matéria de sua competência.
Por isso, tende-se a aceitar a ideia de que o poder regulamentar não é privativo
do Chefe do Poder Executivo. Não obstante, frise-se que, em provas para concursos pú-
blicos, revela-se mais prudente afirmar que o poder regulamentar é de competência
privativa do Chefe do Poder Executivo.
Existem regulamentos de execução, que são aqueles voltados para dar cumpri-
mento às leis, que não inovam no ordenamento jurídico, não criam nova obrigação não
prevista em lei. Bem como, há os regulamentos autônomos ou independentes, que são
aqueles evitados nas hipóteses de lacunas legislativas, que tratam de matérias ainda não

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tratadas por lei, portanto, são regulamentos que inovam no ordenamento jurídico. De
um modo geral, a doutrina não aceita os regulamentos autônomos, ressalvadas situa-
ções excepcionais que a própria Constituição prevê.
Exemplo: Maria Sylvia Di Pietro atenta para exceção muito citada de regula-
mento autônomo prevista na Constituição Federal, que é a hipótese do artigo 84, VI,
alínea a:
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
(...)
IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e re-
gulamentos para sua fiel execução;

VI - dispor, mediante decreto, sobre: (Redação dada pela Emenda Constituci-


onal nº 32, de 2001)
a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar au-
mento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; (Incluída pela
Emenda Constitucional nº 32, de 2001)

Portanto, um decreto poderia organizar a administração federal e cuidar do fun-


cionamento da administração federal. Seria exemplo excepcional de decreto que inova
o ordenamento jurídico, mas, como regra, os decretos e regulamentos devem ser de
execução e devem, em razão do princípio da legalidade, dar mero cumprimento ao texto
legal, sem inovar o ordenamento jurídico.
O Chefe do Poder Executivo edita decretos, logo o decreto é exemplo de ato que
materializa o poder regulamentar. Atos normativos, dotados de generalidade, posto
que, ao regulamentar determinada matéria, esta é disciplinada de forma genérica. As-
sim, não cabe mandado de segurança contra lei em tese, tampouco contra ato norma-
tivo, porque não há lesão concreta a determinado direito. Portanto, a Súmula nº 266 do
STF também conduz à conclusão de que não cabe mandado de segurança contra ato
normativo que seja fruto do poder regulamentar.
Súmula 266 do STF
Não cabe mandado de segurança contra lei em tese.

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5. Poder de polícia
Consigne-se que o poder administrativo mais importante para fins de concurso
público é, sem dúvidas, o poder de polícia. Trata-se do poder que gera maiores contro-
vérsias na doutrina e na jurisprudência, também é muito comum perguntarem sobre o
poder de polícia em prova, devendo-se comentar os atributos do poder de polícia, a
diferença entre polícia administrativa e judiciária, delegação, etc.
A expressão poder de polícia é tradução da expressão inglesa police power e, nos
Estados Unidos, ela designa toda e qualquer intervenção estatal que delimita a liberdade
e o exercício da propriedade. Poder de polícia como tradução da expressão police power
significa toda e qualquer intervenção estatal, acrescente-se, inclusive aquelas deflagra-
das pelo poder legislativo, que se destinam a delimitar a liberdade e a propriedade.
O poder de polícia não restringe, não diminui o espaço de propriedade do indiví-
duo, ao contrário, ele delimita e apresenta o alcance das liberdades individuais. Pode
parecer preocupação preciosista, mas não o é, visto que essa lógica gera resultados prá-
ticos, na medida em que, como o poder de polícia apenas esclarece o alcance das liber-
dades individuais e do direito de propriedade, não há diminuição patrimonial e não há,
portanto, qualquer pretensão do indivíduo de receber indenização em razão do regular
exercício do poder de polícia.
Registre-se que poder de polícia é usualmente dividido em poder de polícia em
sentido amplo e poder de polícia em sentido estrito. Poder de polícia em sentido amplo
ou police power, ou poder de polícia, designa toda e qualquer intervenção estatal que
delimita a liberdade e a propriedade, conforme afirmado em na definição inicial dada
pelo professor.
Contudo, há também o poder de polícia em sentido estrito, expressão que pode
ser substituída pela expressão polícia administrativa, caracterizando intervenção por
parte da administração pública, atividade da administração pública que delimita a liber-
dade e a propriedade. Observe-se que no poder de polícia em sentido amplo ou poder
de polícia, tem-se toda e qualquer intervenção estatal que desempenha esse papel e
sempre com fundamento de validade em instrumento introdutor de norma jurídica de
caráter primário, como uma lei, por exemplo.
O poder de polícia deve ter algum fundamento em lei, não pode haver delimita-
ção da liberdade sem qualquer fundamento em lei, pois isso violaria o princípio da lega-
lidade insculpido no artigo 5º, II.
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

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Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garan-
tindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Cons-
tituição;
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude
de lei;

Já a expressão polícia administrativa ou poder de polícia em sentido estrito fica


adstrita àquela atividade realizada pelo administrador e sempre com fundamento em
lei, norma primária, que respalde a delimitação feita pelo administrador. No estudo dos
poderes administrativos, em especial poder de polícia, essa análise não pode virar as
costas para a importância do poder legislativo, pois será a lei que vai fundamentar a
edição de atos de polícia, ou mesmo a materialização do poder de polícia.
O artigo 78 do CTN, Lei 5.172, traz uma definição de poder de polícia muito co-
nhecida, visto que é comum indagações sobre o que seria o poder de polícia, devendo-
se comparar com a definição do artigo 78.
Assinale-se que o dispositivo não se preocupa muito com a técnica, tendo em
vista que aborda a limitação da liberdade, o que vai contra o discurso ora feito, que é
entendimento doutrinário no sentido de que o poder de polícia não limita, não restringe
a liberdade, apenas esclarece o que é a liberdade, pois ninguém pode defender uma
liberdade irrestrita, o exercício do direito de propriedade sem qualquer limitação, isso é
inviável para a sobrevivência de uma sociedade em um Estado Democrático de Direito.
Não há como defender um exercício irrestrito das liberdades.
Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966.(Código Tributário Nacional)
Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limi-
tando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou
abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higi-
ene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de
atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público,
à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou
coletivos. (Redação dada pelo Ato Complementar nº 31, de 1966)
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando de-
sempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância
do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária,
sem abuso ou desvio de poder.

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O dispositivo permite inferir que a discricionariedade, que é inerente ao exercício


do poder de polícia, não pode ser tão ampla a ponto de se caracterizar como abusiva ou
como hipótese de desvio de poder.
O Código Tributário Nacional se preocupou com a definição do poder de polícia
por uma simples razão, o exercício do poder de polícia é retribuído em favor do Estado
por meio de taxa. A taxa é a retribuição devida pelo particular em razão do regular exer-
cício do poder de polícia, conforme artigo 145, II, da Constituição.
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os
seguintes tributos:
I - impostos;
II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou
potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou
postos a sua disposição;

Ressalte-se que poder de polícia não se confunde com serviço público. Serviço
público se materializa através de atividade material que assegura comodidades aos usu-
ários daquele serviço público.
Por exemplo: serviço de telecomunicações. O usuário do serviço possui uma sé-
rie de comodidades em razão da prestação desse serviço público pelo Estado ou por
quem aja em seu nome.
Já no caso do exercício do poder de polícia, tem-se um comando dirigido pela
administração pública ao particular que obriga o particular a fazer ou deixar de fazer.
Normalmente, o poder de polícia se materializa através de uma obrigação de não fazer,
obrigando o particular a não realizar algum tipo de providência.
Por exemplo: não pode ultrapassar o sinal vermelho. A lei estipula essa regra, o
administrador delimita as situações.
Diferentemente da servidão administrativa, é comum os administrativistas
chamarem atenção para o fato de que, no exercício do poder de polícia, normalmente,
o particular está sujeito ao non facere (não fazer), podendo estar também sujeito a uma
obrigação de fazer, ao passo que, na servidão administrativa há uma obrigação de tole-
rar ou de suportar um gravame em determinado imóvel. São obrigações que não se con-
fundem, aquela resultante do exercício do poder de polícia e aquela que decorre da
constituição de uma servidão administrativa.
A servidão é direito real, que obriga o proprietário do imóvel a suportar um gra-
vame. No poder de polícia, a situação é diversa, havendo obrigação de não fazer ou de
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fazer como regra, que nem sempre irá atingir imóveis. São institutos com propósitos
distintos.
Ainda, poder de polícia também não se confunde com poder disciplinar, pois este
último está ancorado por uma supremacia especial, a manifestação estatal atinge pes-
soas que estão sujeitas ao regime disciplinar do Estado.
Por exemplo: um servidor público pode ser punido com uma advertência ou sus-
pensão. Isso é poder disciplinar.
No caso do poder de polícia, a situação é diversa, porque não há vínculo de su-
premacia especial, não há liame jurídico específico que ampare a atuação estatal em
relação àquela pessoa destinatária do poder de polícia, o vínculo é de supremacia geral.
O Estado exerce a função de poder de polícia administrativa em relação a todos aqueles
que se situam em seu território, pouco importando se são servidores públicos sou não.
Não há supremacia especial e sim geral em relação ao destinatário do poder de polícia.
Também do artigo 78 extrai-se a ideia de que todos os entes da federação têm
competência para o exercício do poder de polícia. Cada ente da federação terá compe-
tência em relação às matérias que sejam de sua competência. Quando a competência
for comum, visto que a Constituição Brasileira é permeada pelo federalismo de coope-
ração, incentivando a distribuição da competência ou mesmo o exercício conjunto de
determinadas atribuições.
Por exemplo: matérias de meio ambiente, saúde e educação, em que, nitida-
mente, cada ente terá um papel e, muitas vezes, esses papéis se sobrepõem a um en-
trelaçamento das competências, mas cada um desempenhando papel próprio, especí-
fico.
Quando isso ocorrer, cada ente da federação irá exercer o poder de polícia em
relação às suas matérias. Por vezes, o STF declara a inconstitucionalidade de ato de de-
terminado ente da federação que interfere na competência de outro ente da federação.
Logo, não é raro esse tipo de situação ter de ser apreciada pelo Supremo Tribunal
Federal, um ato estatal que interfere na competência para o exercício do poder de polí-
cia de outro ente da federação.
Por exemplo: no caso do Município de Paulínia, esse ente federado editou uma
lei proibindo a queima da cana-de-açúcar. Paulínia é Município do Estado de São Paulo
em que essa atividade econômica é muito forte e o Município resolveu impedir a queima
da cana para seu corte. Contudo, na legislação nacional há uma regra permissiva da
queima da cana para o corte, de modo que a queima será eliminada gradualmente.
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O Supremo Tribunal Federal teve que se manifestar sobre quem teria competên-
cia desse poder de polícia, se o Município de Paulínia ou a União, na medida em que,
tanto o Município quanto a União têm competência para legislar sobre o meio ambiente.
Nesse cotejo, considerando os valores subjacentes, o Supremo privilegiou a lei
nacional, por entender que a lei nacional havia solucionado a questão, ponderado todos
os valores em jogo, como a livre iniciativa, valorização do trabalho e proteção do meio
ambiente, prestigiando solução mais proporcional.
Será analisada a relevância da proporcionalidade no exercício do poder de polí-
cia, o que também é relevante na distribuição de competências para o exercício do po-
der de polícia. Há casos de competência privativa, em que caberá à União, aos Estados
ou Municípios, mas, na maioria dos casos, essa competência é comum ou mesmo con-
corrente, de modo que o caso concreto permitirá identificar quem deve atuar de forma
preponderante no exercício do poder de polícia.

5.1 Atributos do poder de polícia


Todos que escrevem sobre o poder de polícia chamam atenção para o fato de
que o poder de polícia possui atributos, características. As características precisam ser
conhecidas.
A maioria dos autores abordam três atributos: discricionariedade, autoexecuto-
riedade, também chamado por alguns de executoriedade, e, por fim, o terceiro e último
atributo, da coercibilidade.
5.1.1 Discricionariedade
Em regra, o poder de polícia será exercido de forma discricionária. Via de regra,
o administrador público irá avaliar a melhor forma para delimitar a liberdade do admi-
nistrado. Avalia como irá fiscalizar, como irá consentir, observando-se uma discriciona-
riedade, como regra, no exercício do poder de polícia.
Por exemplo: Fiscalizar: incumbe ao poder público avaliar a conveniência e opor-
tunidade de se fazer uma fiscalização diária, mensal ou semanal. Há algum tempo, no
Rio de Janeiro, está em voga a blitz da Lei Seca. Em alguns Estados, isso não é tão obser-
vado, mas no Rio de Janeiro essas blitz são feitas até mesmo durante o horário de al-
moço.

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Isso reduz drasticamente o número de acidentes, contudo, existe uma avaliação


de conveniência e oportunidade. Se o Estado ou o administrador quiser diminuir a fisca-
lização, pode fazê-lo, pois é política que segue uma lógica e estratégia do administrador.
Logo, há discricionariedade no exercício do poder de polícia, entretanto, nem
sempre o poder de polícia é exercido de forma discricionária. A discricionariedade não
estará sempre presente em toda manifestação do poder de polícia. Prova disso é que
existem atos de consentimento de polícia que são editados de forma vinculada, sem que
haja, portanto, qualquer espaço para a conformação por parte do administrador.
Exemplo: licença é tradicionalmente considerada ato vinculado. Trata-se de ato
negocial destinado a consentir com a prática de uma atividade. Uma atividade econô-
mica pode, em razão de sua relevância para a coletividade, depender de um consenti-
mento estatal. No caso da licença, o consentimento será deferido após uma aferição
para avaliar se o requerente preencheu os requisitos para o deferimento da licença. En-
tão, nem sempre o poder de polícia será exercido de forma discricionária.
A discricionariedade é um atributo, uma característica do poder de polícia, que,
em regra, será dessa forma, mas nem sempre.

5.1.2 Autoexecutoriedade ou executoriedade


Em algumas situações, a administração pública poderá, manu militari, indepen-
dentemente da anuência do Poder Judiciário ou de qualquer outro poder, dar concre-
tude aos atos administrativos que ela própria edita.
A administração pública pode, em razão da autoexecutoriedade, dar essa con-
cretude. Pode fazer a interdição de um estabelecimento, por exemplo, ou a destruição
de mercadorias estragadas. Isso faz parte da autoexecutoriedade, inerente ao poder de
polícia, que, nem sempre dependerá da anuência do Poder Judiciário.
Importante frisar, mais uma vez, que a autoexecutoriedade é uma característica
que está presente no poder de polícia, mas que nem sempre estará presente. Há casos
em que o poder de polícia é exercido sem esta autoexecutoriedade.
Por exemplo: uma multa aplicada a um particular. A multa é espécie de sanção.
Ultrapassado o sinal vermelho, o particular irá receber uma multa. Se o particular não
pagar a multa, deverá se tornar réu em execução fiscal, o Estado não pode cobrar a
multa do particular à força. Deve ser ajuizada execução fiscal visando a cobrança judicial.
Portanto, nem sempre o poder de polícia será exercido de forma autoexecutória.

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Na doutrina, prevalece o entendimento que a autoexecutoriedade estará pre-


sente em duas hipóteses. Em primeiro lugar, quando a lei a autorizar, podendo a lei
prever que determinado ato é dotado de autoexecutoriedade, ou, em segunda hipótese,
quando, a despeito da ausência de previsão legal, a situação for emergencial, for urgente
e justificar a autoexecutoriedade.
Logo, pode aparecer em prova que a autoexecutoriedade do poder de polícia
não depende de previsão legal, pois pode haver situação emergencial, não prevista em
lei, como a interdição de um estabelecimento, que não precisa estar prevista em lei, a
administração possui a competência para preservar o interesse da coletividade.
É preciso ressaltar que a autoexecutorieade não é panaceia, não é remédio para
solucionar todos os males, trata-se de providência que deve ser adotada cum grano sa-
lis, com muita cautela, em situações excepcionais, por mais que seja uma característica.

5.1.3 Coercibilidade
Interessante notar que, quando da abordagem dos atos administrativos, cita-se
como um dos atributos o da imperatividade. Contudo, ao analisar o poder de polícia,
prefere-se o uso da expressão coercibilidade.
Coercibilidade nada mais é do que a aptidão que o ato de poder de polícia possui
de produzir efeitos, independentemente da anuência do seu destinatário. O Estado,
através da sua administração, não precisa da concordância do particular para que o ato
do poder de polícia produza seus efeitos. Isso decorre da coercibilidade, a administração
pode impor unilateralmente a sua vontade, não pergunta ao particular se concorda com
o que ela está fazendo, ela simplesmente cria aquela obrigação.
Por exemplo: agora, casas da Rua X deverão ser pintadas de branco. Uma exi-
gência que pode parecer desarrazoada, mas, por exemplo, na Grécia existem cidades
que são assim, devendo todas as cassa ser pintadas de branco.
Nesse caso, o espaço de liberdade que o particular possui não o autoriza escolher
a cor da casa em que mora. Existem lugares em que o poder de polícia pode chegar tão
longe a ponto de impedir que o particular pinte a sua casa de determinada cor. Isso não
é perguntado ao particular.
Hodiernamente, há tendência de se estabelecer um diálogo prévio à edição de
um ato estatal. Melhor que ocorra dessa forma, visto que, quando há diálogo a comuni-
dade participa do processo de decisão, esta tende a ser mais facilmente aceita do que
aquela imposta unilateralmente pela administração.
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Contudo, vale frisar que a administração não precisa perguntar ao particular se


ele concorda com o ato administrativo, isso decorre da coercibilidade.
Mais uma vez, observe-se que nem todo ato administrativo possui essa caracte-
rística. Existem exemplos de atos não dotados de coercibilidade.
Exemplo: na licença, ato negocial, a administração licencia quem requer. A ad-
ministração não se dirige ao particular para licenciá-lo a explorar um bar na rua X sem
que o indivíduo tenha requerido qualquer coisa.
São exemplos de atos que representam consentimento de polícia que depen-
dem, para sua edição, de requerimento do particular, sendo a vontade do particular
imprescindível para que o ato seja editado, já que uma licença não pode ser editada de
ofício.
Portanto, a coercibilidade é um atributo do poder de polícia, mas que, assim
como os demais, não está presente em todas as manifestações do poder de polícia.

5.2 Condições para a validade do poder de polícia


Quando Hely Lopes Meirelles escreveu sobre o poder de polícia, apresentou al-
gumas condições para a validade desse instrumento. Essas condições costumam ser co-
bradas em provas. São cinco, das quais, as três primeiras citadas por Hely Lopes Meirel-
les são os mesmos elementos que normalmente são abordadas pelos demais autores.
Competência, forma e finalidade e as outras condições para a validade do poder
de polícia são a proporcionalidade da sanção e legalidade dos meios empregados. Ou
seja, são elementos que devem ser observados de maneira regular, sob pena de o exer-
cício do poder de polícia ocorrer de maneira ilegal.

5.2.1 Competência
É preciso que o poder de polícia seja exercido por uma autoridade que recebeu
competência para tanto. Ainda que se defenda que, como regra, o poder de polícia é
discricionário, se a autoridade competente não editou o ato, foi editado por autoridade
incompetente, o ato é ilegal.
O mesmo deve ser dito em relação à forma.

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5.2.2 Forma
Se o ordenamento jurídico prescreveu a observância de uma determinada forma
para a validade do poder de polícia, não pode o administrador optar por outra forma,
ainda que mais simplificada. Fica atrelado à forma exigida pelo ordenamento e, se hou-
ver algum vício, poderá haver correção, sanatória do vício de forma. Isso é possível, mas
precisa ser observado.

5.2.3 Finalidade
Toda manifestação do poder de polícia se dá por meio de atos administrativos,
ainda que fundados em leis e esses atos devem satisfazer o interesse da coletividade. A
finalidade se preocupa com o interesse público.
A administração não pode editar um ato, no exercício do poder de polícia, que
tenha como finalidade satisfazer um interesse privado, o interesse de algum particular
específico. A administração deve satisfazer o interesse da coletividade.
Por exemplo: uma blitz da Lei Seca deve ser realizada com objetivo de evitar que
as pessoas dirijam embriagadas. Esse é propósito legítimo, deve se preocupar com o
interesse público, não com o interesse de alguém da administração para prejudicar uma
pessoa.
Logo, a finalidade é condição que se relaciona com a preocupação com o inte-
resse público.

5.2.4 Proporcionalidade da sanção


As sanções a serem aplicadas aos infratores devem ser proporcionais com a gra-
vidade das condutas praticadas.
A pessoa que ultrapassou um sinal vermelho não pode receber sanção incompa-
tível com a gravidade desse evento lesivo. Não poderia perder a carteira de habilitação
por dez anos em razão de ter ultrapassado um sinal vermelho.
Esse é um dos argumentos utilizados para questionar a Lei Seca, alega-se que a
multa para quem dirige em estado de embriaguez é muito alta e que isso violaria a pro-
porcionalidade da sanção. Todavia, não haveria qualquer desproporcionalidade com re-
lação à multa, haja vista que dirigir embriagado já resultou na perda de muitas vidas.

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Pode-se ir além. Hely Lopes Meirelles abordou a proporcionalidade da sanção


como condição para a validade do exercício do poder de polícia, mas pode-se afirmar
que a validade do poder de polícia também depende da proporcionalidade na sua atua-
ção. A delimitação da liberdade não pode ser mais severa que o objetivo que se busca
alcançar com ela. Não se pode ter uma limitação tão forte para algo que não traga tantos
benefícios.
Exemplo: o primeiro precedente em que o Supremo Tribunal Federal reconhe-
ceu a inconstitucionalidade de uma lei com fundamento na proporcionalidade. A pri-
meira vez que o STF citou o princípio da proporcionalidade foi para declarar uma lei
inconstitucional que se deu em caso de lei que obrigava a pesagem do botijão de gás
na frente do consumidor.
O Supremo Tribunal Federal entendeu que aquela exigência ofendia a proporci-
onalidade, na medida em que, no Brasil, o botijão de gás é vendido no caminhão. O
sujeito que está no caminhão vai entregando os botijões nas casas. Não se poderia obri-
gar o motorista do caminhão a transportar uma balança junto com os botijões, pois,
dessa forma, a balança perderia a precisão, não há tecnologia que resista à trepidação
de um caminhão. Logo, não seria possível medir aquela mercadoria. Esta exigência foi
declarada inconstitucional por ofensa à proporcionalidade. Além da proporcionalidade
da sanção, tem sido objeto de preocupação por parte do Judiciário aferir a proporciona-
lidade no exercício do poder de polícia.
Por exemplo: o STJ já reconheceu que o rodízio de veículos na cidade de São
Paulo, proibindo o uso de veículo automotor em determinado dia da semana, se mate-
rializa por meio do poder de polícia exercido de maneira proporcional.
Tem sido uma preocupação do judiciário aferir também, não só a proporcionali-
dade da sanção, como também a do próprio exercício do poder de polícia.
5.2.5 Legalidade dos meios empregados
Evidentemente, o administrador não pode fazer uso de algo que não esteja pre-
visto em lei. Por melhor que seja a intenção, não pode delimitar a liberdade, criando
embaraço ou restrição que não tenha fundamento em lei ou mesmo em ato administra-
tivo.
Para que o poder de polícia seja válido, é preciso que haja uma preocupação com
a legalidade dos meios empregados.

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5.3 Polícia administrativa e polícia judiciária


Todos que escrevem e comentam sobre o tema poder de polícia separam pági-
nas ou parágrafos para diferenciar a polícia administrativa da polícia judiciária.
Polícia administrativa é o que estamos visualizado, uma função da administração
pública destinada a delimitar a liberdade ou mesmo o modo como o direito de proprie-
dade é exercido.
Por outro lado, polícia judiciária atua como longa manus do Poder Judiciário.
Atua com o propósito de dar cumprimento às decisões do Poder Judiciário, o que tem
gerado algumas confusões.
Em caso no Conselho Nacional do Ministério Público, houve processo, que já foi
julgado, por isso não há problema em comentar o precedente, no qual o Ministério
Público Militar havia requerido ao exército a tomada de algumas providências, o que
ensejou discussão se o MPM teria essa competência para exigir do exército que atuasse
no exercício da função de polícia administrativa, ou se o MP Militar só poderia exercer
controle do exército no que diz respeito à função de polícia judiciária, pois o exército
desempenha função de polícia judiciária em relação à Justiça Militar.
No âmbito federal, essa função é realizada pela polícia federal, longa manus do
Poder Judiciário Federal, órgão de segurança pública que dá cumprimento às decisões
judiciais. No âmbito militar, este papel é do exército.
Ressalte-se que poder de polícia é dotado de autoexecutoriedade.
Por exemplo: o exército brasileiro fiscaliza vidros blindados, determinadas armas
de uso privativo pelas forças armadas e, no exercício da função de poder de polícia ad-
ministrativa, o exército pode apreender esses bens, essas armas e equipamentos, até
mesmo para realizar testes de verificação.
De outra via, o MP Militar atua na seara penal, requerendo diligências ao Judici-
ário Militar. É inconstitucional apreender uma mercadoria ou bem de uma pessoa para
fins penais sem que haja decisão judicial.
Procurador da República não poderia determinar que a polícia federal faça a
apreensão de uma arma, de um computador, de um carro, sem que isso passe pelo crivo
do Judiciário Federal.
Em um Estado Democrático de Direito, a atuação da polícia judiciária decorre de
autorização judicial, até mesmo o nome assim indica. A polícia judiciária é longa manus
do Poder Judiciário e, normalmente, no cumprimento de decisões de natureza penal.

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No entanto, cumpre abordar as diferenças entre polícia administrativa e polícia


judiciária. Em primeiro lugar, a polícia administrativa recai sobre bens, direitos e sobre
atividades, delimitando a liberdade. Já a polícia judiciária, realiza atividade que atinge
diretamente as pessoas, porque a polícia judiciária irá viabilizar a privação da liberdade.
Outra diferença é que a polícia administrativa consiste em função da administra-
ção pública que se difunde por quase toda a administração, não se concentra em um
órgão específico do Estado. De um modo geral, quase toda a administração pública pode
exercer a função de polícia administrativa. Por ora, não se adentrará na polêmica acerca
do exercício do poder de polícia pelas pessoas jurídicas de direito privado componentes
da administração pública indireta.
Diversamente, a polícia judiciária realiza função concentrada em determinados
órgãos públicos, órgãos de segurança pública que amparam o Poder Judiciário no cum-
primento de decisões de natureza penal, a polícia federal, no âmbito federal, polícia civil
no âmbito estadual, pois cumprem as decisões da Justiça Federal e Estadual, respectiva-
mente, em seara criminal.
Mais relevante é observar que, o fato de esses órgãos de segurança pública, a
polícia federal e a polícia civil exercerem a função de polícia judiciária, não os impede
de também exercer a função de polícia administrativa.
Por exemplo: de fato, a polícia federal cumpre os mandados de prisão, função
de polícia judiciária. Contudo, não se deve olvidar que quem emite passaporte no Brasil
é a polícia federal, que também realiza o controle de empresas privadas de vigilância.
Essas duas últimas são funções de polícia administrativa. Em síntese, o fato de um órgão
realizar a função de polícia judiciária não o impede de também realizar uma função de
polícia administrativa, até porque, a função de polícia administrativa está presente na
administração pública como um todo.
Uma terceira e última diferença comparando-se polícia administrativa e polícia
judiciária é que, em regra, a polícia administrativa é função exercida com caráter pre-
ventivo, ela se materializa antes da prática do ilícito. A administração irá tomar todas as
providências para evitar que o ilícito se concretize. Por sua vez, a polícia judiciária é
exercida, normalmente, com caráter repressivo, isto é, após o ilícito penal ter sido pra-
ticado.
Não é correto afirmar que a polícia administrativa seria sempre realizada com
caráter preventivo. Nada impede que a polícia administrativa seja exercida após a prá-
tica do ilícito administrativo e nada obsta que a polícia judiciária seja exercida com ca-
ráter preventivo, para evitar futuro ilícito penal.
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Uma coisa é o normal que acontece usualmente, outra coisa é a situação oposta,
então é bom lembrar que em regra a polícia administrativa tem caráter um caráter pre-
ventivo e a polícia judiciária um caráter repressivo, mas nada impede que o inverso tam-
bém ocorra.
Portanto, são estas as principais diferenças na comparação entre polícia admi-
nistrativa e polícia judiciária.

5.4 Prescrição para o exercício do poder de polícia


Oportuno registrar que há uma lei muito citada para concurso público na área
federal, que regula o prazo prescricional para o exercício do poder de polícia. Trata-se
da Lei 9.873, de 1.999. Cabe a leitura, principalmente, dos seus artigos mais importantes
para fins de concurso público, que são os artigos 1º, 1º-A e 5º. Nada obstante, não se
deve desprezar a leitura da lei toda, visto que já foram cobrados outros dispositivos
deste diploma legal.
Observe-se que há um prazo para constituição do crédito não tributário resul-
tante do exercício do poder de polícia administrativa, bem como um prazo previsto no
artigo 1º-A da Lei 9.873 para execução fiscal desse crédito não tributário. Rememore-se
que a Lei de Execução Fiscal, Lei nº 6.830, permite a inscrição em dívida ativa dos crédi-
tos tributários e créditos não tributários. A multa fruto do poder de polícia é crédito não
tributário.
Lei nº 9.873, de 23 de novembro de 1999.
Art. 1º Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal,
direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à
legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração
permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.

Destaque-se que o termo a quo, o termo inicial para o prazo prescricional é o da


data da prática do ato ou, no caso de infração permanente, do dia em que a infração
tiver cessado. Trata-se de regra diversa daquela normalmente aplicável em matéria de
punição disciplinar.
Por exemplo: a Lei 8.112 prevê que a aplicação da pena de demissão prescreverá
no prazo de cinco anos a contar da ciência do ato.
Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990
Art. 142. A ação disciplinar prescreverá:

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I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de apo-


sentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;
II - em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;
III - em 180 (cento e oitenta) dias, quanto à advertência.
§ 1º O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou co-
nhecido.
§ 2º Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações discipli-
nares capituladas também como crime.
§ 3º A abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar interrompe
a prescrição, até a decisão final proferida por autoridade competente.
§ 4º Interrompido o curso da prescrição, o prazo começará a correr a partir do dia
em que cessar a interrupção.

Diferentemente, em matéria de poder de polícia, o prazo é contado da data do


ato infracional.
Lei nº 9.873, de 23 de novembro de 1999.
Art. 1º Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal,
direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à
legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração
permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.
§ 1º Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três
anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício
ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da
responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.

Portanto, se a administração federal deixar o processo administrativo paralisado


por mais de três anos, aquela sanção não mais poderá ser aplicada, os autos deverão
ser arquivados em virtude de requerimento, ou mesmo por deliberação de ofício por
parte da administração, independentemente de qualquer requerimento.
§ 2º Quando o fato objeto da ação punitiva da Administração também constituir
crime, a prescrição reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal.

Ressalte-se que este tipo de previsão também existe em matéria de punição dis-
ciplinar. O artigo 142 da Lei 8.112 também prevê que, se o ilícito administrativo também
configurar crime, a prescrição será regida pela regra do direito penal.
Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990
Art. 142. A ação disciplinar prescreverá:
I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de apo-
sentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;
II - em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;

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III - em 180 (cento e oitenta) dias, quanto à advertência.


§ 1º O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhe-
cido.
§ 2º Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações discipli-
nares capituladas também como crime.

Tradicionalmente, o STJ tem exigido que este envio do tema da prescrição para
a regra do direito penal só ocorra caso a conduta penal esteja sendo apurada em ação
penal, ou seja, caso haja desdobramento do ilícito penal na esfera penal. Pois a conduta
pode configurar crime em sede abstrata, mas sem apuração e mesmo ação penal, a re-
gência da prescrição continuar a se dar pela regra da Lei 8.112.
Defende-se isso também em matéria de poder de polícia, que esta regência só
se faça quando a matéria estiver sendo apurada no âmbito penal, entretanto, o STF pos-
sui decisões recentes, relatadas pela Ministra Carmen Lúcia, em que se sustenta que a
regência do prazo prescricional pela regra do direito penal depende apenas de a conduta
ser tipificada como crime.
Sinaliza-se, desde já, que há, hoje em dia, orientação no Supremo Tribunal Fede-
ral capitaneada pela Ministra Carmen Lúcia em suas decisões relatadas na Segunda
Turma, antes de ocupar a presidência daquele tribunal, em que se defende a regência
pelo direito penal desde que a conduta seja tipificada como crime no âmbito penal. Ou
seja, não precisa haver apuração da conduta.
Logo, pode ser que o STJ compatibilize seu entendimento já consagrado com o
entendimento do Supremo Tribunal Federal. Vive-se momento em que pode haver mu-
dança deflagrada pela nova postura do STF. Ressalte-se que não há decisão do plenário
do STF nesse sentido, havendo apenas decisões da Segunda Turma relatadas pela Mi-
nistra Carmen Lúcia.
Pode ser que as coisas caminhem nesse sentido, em lugar de a regência da pres-
crição se dar pela regra penal só quando a conduta estiver sendo apurada no âmbito
penal, passar a ser regida pelo direito penal caso a conduta seja criminosa. Tal digressão
pode parecer despicienda de relevância, contudo é muito importante no dia-a-dia fo-
rense, pois o prazo prescricional do direito penal, normalmente, é maior do que aquele
previsto no artigo 1º, de 5 anos, podendo representar mudança deveras contundente
com a abordagem da prescrição e com a remessa do tema para o direito penal.
Embora o envio da matéria para o campo do direito penal seja mais comum em
tema de poder disciplinar, mas se o Supremo Tribunal Federal insistir na tese de que

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basta a conduta ser crime para que a prescrição seja regida pelo direito penal, essa ló-
gica também deve ser aplicada ao poder de polícia, conforme previsto na Lei 9.873.
De outro giro, o artigo 1º-A cuida do prazo prescricional para o ajuizamento da
execução fiscal. Constituído o crédito, a administração pública possui um prazo para
ajuizar a execução fiscal.
Lei nº 9.873, de 23 de novembro de 1999.
Art. 1º-A. Constituído definitivamente o crédito não tributário, após o término re-
gular do processo administrativo, prescreve em 5 (cinco) anos a ação de execução
da administração pública federal relativa a crédito decorrente da aplicação de
multa por infração à legislação em vigor. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

A administração tem também cinco anos a contar da conclusão, do término do


processo administrativo, à semelhança do que ocorre no direito tributário, para ajuizar
execução fiscal.
Por sua vez, o artigo 5º, que também costuma incidir em provas para concursos
públicos.
Art. 5º O disposto nesta Lei não se aplica às infrações de natureza funcional e aos
processos e procedimentos de natureza tributária.

Em relação aos processos e procedimentos de natureza tributária já há regra-


mento próprio sobre essa matéria, visto que o CTN já regula isso. A lógica é a mesma,
porém não deve ser aplicada uma lei que regula o prazo prescricional para o exercício
de poder de polícia em matéria tributária, se já existe regra própria para essa disciplina.
Em matéria de infração de natureza funcional, não haveria sentido aplicar regra
de prescrição atinente ao poder de polícia, tendo em vista que poder disciplinar não se
confunde com poder de polícia, essa lei não trata de prescrição do poder disciplinar. A
prescrição do poder disciplinar é matéria que está prevista nas leis de regência dos ser-
vidores. A Lei 8.112 prevê prazo prescricional, assim como as leis dos servidores estadu-
ais, municipais. A lei dos servidores tratam desse tema.
Infere-se que a Lei 9.783 é diploma legal de importante consulta.
Cumpre tratar acerca do tema mais importante no que toca ao poder de polícia,
que consiste em falar primeiro no ciclo de polícia, para depois abordar a delegação do
poder de polícia, tema recorrente em concurso público.

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5.5 Ciclo de polícia


Ao se falar em ciclo de polícia, significa o estudo das fases em que o poder de
polícia irá se desenvolver. Em verdade, não há poder de polícia como coisa única, singu-
lar, tem-se diversas fases. As etapas ou fases componentes do ciclo de polícia são iden-
tificadas como quatro etapas ou fases.
1º) Ordem de polícia;
Quem disserta de maneira proficiente sobre o assunto é Diogo de Figueiredo
Moreira Neto que faz uma tabela com as etapas.
2º) Consentimento de polícia;
3º) Fiscalização; e
4º) Sanção de polícia.
São quatro etapas no ciclo de polícia, muito citadas e depois relevantes para ana-
lisar a delegação do poder de polícia.

5.5.1 Ordem de polícia


Nada mais é do que a previsão contida no ordenamento jurídico que delimita em
caráter abstrato a liberdade e o exercício do direito de propriedade. É a previsão nor-
mativa, normalmente fundada em lei, que obriga o particular a fazer ou a deixar de fazer
alguma coisa.
Normalmente, essa previsão normativa impede o particular de realiza alguma
medida. Por isso, na doutrina é comum dividirem a ordem de polícia em ordem. Por
exemplo: quando na condução de veículo automotor, não é permitido ultrapassar o si-
nal vermelho. Não pode dirigir acima de oitenta quilômetros por hora, não pode dirigir
sem o documento.
Como, normalmente, essa obrigação tem caráter negativo, é comum dividirem a
ordem de polícia em negativa absoluta e considerarem também uma negativa relativa.
Na ordem de polícia negativa absoluta, a proibição imposta pela administração
não pode ser superada por um consentimento estatal. Aquela proibição tem caráter ab-
soluto.
Por exemplo: um particular pretende vender cocaína num estabelecimento co-
mercial, ou possui uma farmácia onde pretende vender maconha. Isso não é autorizado
no Brasil.
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Essa negativa, essa proibição fruto do poder de polícia, é insuperável por um


consentimento estatal. Trata-se, portanto, de negativa absoluta.
Por outro lado, a ordem de polícia negativa relativa é aquela proibição que pode
ser superada por meio de consentimento estatal. O particular que pretende explorar a
venda de medicamentos por meio de uma farmácia precisa obter os consentimentos
estatais para fazer essa comercialização. Consiste em proibição que pode ser afastada.
É muito comum a ordem de polícia negativa ser relativa.
Por exemplo: a proibição de ultrapassar um sinal vermelho não vale para uma
ambulância que transporta pessoa em estado gravíssimo. Veja-se que é uma proibição
que comporta um consentimento excepcional, pontual, uma negativa que pode ser re-
lativizada.

5.5.2 Consentimento
Em termos de consentimento, há a necessidade de o Estado anuir com a prática
de alguma atividade. Algumas atividades são de interesse da coletividade e o seu exer-
cício pode depender do consentimento estatal. Consiste em tema que está na ordem do
dia.
Pergunta: em que caso o Estado pode exigir seu consentimento para a prática de
uma atividade?
Um cantor que pretenda se apresentar em um bar, em uma casa de espetáculos,
não precisa estar inscrito em um conselho, em alguma ordem, obter algum consenti-
mento estatal. O Supremo Tribunal Federal entendeu nesse sentido, pois o tema teve
de ser apreciado pelo STF. O Supremo entendeu que não é constitucional exigir de um
músico que se filie à Ordem dos Músicos do Brasil para se apresentar, pois essa apre-
sentação é fruto de uma manifestação da liberdade de expressão, diz respeito ao de-
senvolvimento do indivíduo, de forma que não é razoável exigir o consentimento do
Estado para esse tipo de atividade.
Hoje em dia esse tema está em voga, visto que a questão do Uber, por exemplo,
questiona se o Estado deve consentir com o transporte de passageiros em carro, se isso
seria uma atividade econômica ou um serviço público. Caso seja atividade econômica,
se ela depende do consentimento, ou em razão da previsão constitucional da livre inici-
ativa, o particular pode desempenhá-la nos termos da lei, se a lei não existe, ele pode
fazer e o diploma legal terá, ainda que superveniente, estabelecer os limites e as exigên-
cias para o desempenho dessa atividade.
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Logo, há muita discussão em relação ao alcance do consentimento. Um Estado


que não seja muito liberal, não muito favorável à livre iniciativa, irá tender a ser mais
burocrático e exigir consentimentos, contudo a tendência atual é diminuir a exigência
desses consentimentos. Até porque, a tecnologia tem criado mecanismos de controle e
fiscalização muito mais eficientes do que aqueles que o Estado dispõe.
Não haveria utilidade em insistir no exercício da fiscalização através do poder de
polícia do Estado se a própria sociedade possui condições de, através dos recursos tec-
nológicos, realizar avaliações, restrições, sugestões a respeito de atividade econômica
que está sendo desempenhada.
Tradicionalmente, o consentimento se dá de duas formas, ou é discricionário, ou
será vinculado. Será discricionário quando o administrador puder avaliar a conveniência
e oportunidade para consentir com a prática de uma atividade. Isso se dá, por exemplo,
através de uma autorização, ou mesmo a permissão, que são institutos que permitem
que o administrador exerça valoração de conveniência e oportunidade, consentimento
discricionário.
Ao passo que, no consentimento vinculado tem-se por principal exemplo a li-
cença. Uma licença para construir é ato vinculado fruto do poder de polícia estatal, o
Estado deve consentir com o exercício daquela atividade e consente de forma vinculada.
Vale frisar que o alvará não é vinculado nem discricionário, pois o alvará nada
mais é do que o documento que veicula uma autorização ou uma licença. Por isso o
correto é se referir ao alvará de autorização ou alvará de licença, visto que o alvará é
aquele documento que irá veicular uma autorização ou licença. A licença ou autorização
que são atos vinculados ou discricionários, não o alvará, que não é ato, mas documento
que dá suporte físico ao ato de autorização ou de licença.

5.5.3 Fiscalização
O significado de fiscalizar é de conhecimento geral, fiscalizar é aferir a compati-
bilidade da conduta do administrado com a ordem de polícia. Este é o objetivo nuclear
da fiscalização.
A fiscalização se dá com caráter preventivo ou repressivo. Ocorrerá antes da vi-
olação à ordem de polícia, em que a administração verifica antes de alguma irregulari-
dade ocorrer se tudo corre bem. Ou então, a fiscalização se dá com caráter repressivo,
isto é, após a prática do ilícito ter se consumado.

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5.5.4 Sanção
Por fim, a sanção de polícia nada mais é do que a etapa do ciclo de polícia em
que o poder público irá aplicar a sanção pelo descumprimento da ordem de polícia, ou
aplicará uma medida de natureza cautelar para evitar a perpetuação da ofensa à ordem
de polícia.
Nunca é demais lembrar que, conforme a classificação defendida por Diogo de
Figueiredo Moreira Neto, a sanção de polícia se divide em pena e constrangimento de
polícia.
A pena de polícia nada mais é do que a punição pelo descumprimento da ordem
de polícia. É a multa, por exemplo, o sujeito que ultrapassou sinal vermelho deverá pa-
gar uma multa.
Já o constrangimento, por sua vez, é medida de natureza cautelar que deve ser
aplicada para evitar a perpetuação da ofensa à ordem de polícia.
Por exemplo: a blitz da Lei Seca. Uma pessoa que está dirigindo seu veículo é
abordada por policiais que fazem parte dessa operação da Lei Seca e não quer soprar o
bafômetro e sofrerá aplicação da pena de multa, pena de polícia. Contudo, essa pessoa
não pode continuar a dirigir o veículo. O veículo só será apreendido, de acordo com o
Código de Trânsito Brasileiro, caso não haja quem substitua o condutor. Se o carona
tiver soprado o bafômetro, poderá assumir o volante, conduzir o veículo3.
Observa-se que a apreensão do veículo não é punição dirigida ao infrator, ao
revés, ela é apenas uma medida de natureza cautelar que tem como propósito evitar
que aquela situação se perpetue. Se não se sabe se o motorista está embriagado ou não,
pois não fez o teste do bafômetro, não pode ele continuar a dirigir.

3Nota do Monitor
Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997. (Código de Trânsito Brasileiro)
Art. 165. Dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência:
(Redação dada pela Lei nº 11.705, de 2008)
Infração - gravíssima; (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 2008)
Penalidade - multa (dez vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses. (Redação dada pela Lei nº
12.760, de 2012)
Medida administrativa - recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo, observado o disposto no
§ 4o do art. 270 da Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997 - do Código de Trânsito Brasileiro. (Redação dada
pela Lei nº 12.760, de 2012)

Art. 270. O veículo poderá ser retido nos casos expressos neste Código.
(...)
§ 4º Não se apresentando condutor habilitado no local da infração, o veículo será removido a depósito, aplicando-
se neste caso o disposto no art. 271. (Redação dada pela Lei nº 13.281, de 2016) (Vigência):

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Consigne-se que foram utilizadas as expressões cunhadas por Diogo de Figuei-


redo, entretanto, não é raro o uso da expressão sanção de polícia para designar a pena
de polícia.
Por exemplo: a multa é uma sanção de polícia, questão meramente de nomen-
clatura.
José dos Santos Carvalho Filho utiliza sanção de polícia para designar a punição
à multa. E usa a expressão medida de polícia para designar o que fora denominado de
constrangimento de polícia.
Independentemente do nome adotado, o mais relevante é visualizar que uma
coisa é a punição pela ofensa à ordem de polícia, como é a multa. Diversa é a medida de
natureza cautelar, que possui propósito de evitar que aquela infração se perpetue.

5.6 Delegação do poder de polícia


Poder de polícia se divide em poder de polícia originário e delegado. É originário
quando exercido no âmbito da administração pública direta, como uma Secretaria Esta-
dual, Governadoria do Estado. O exercício do poder de polícia pela administração direta
é exemplo de poder de polícia originário.
Será poder de polícia delegado quando a administração direta delegar o exercício
do poder de polícia a alguém que não integra a sua estrutura. Em primeiro lugar, deve-
se analisar se um particular pode ser delegatário do poder de polícia. Este é um tema
que não possui fácil análise, consiste em tema deveras complexo, haja vista que na dou-
trina existem posições das mais variadas.
Existe posição, por exemplo, no sentido de que não haveria problema de o par-
ticular exercer poder de polícia, o mais importante seria que aquele ato editado pelo
particular tivesse todas as características de um ato administrativo, que pudesse ser im-
pugnado, por exemplo, por mandado de segurança.
Todavia, tal dinâmica pode ser rechaçada, pois um dos atributos do poder de
polícia é a autoexecutoriedade e também a coercibilidade. O particular não pode impor
a outro particular a sua vontade. O Estado pode fazer isso. Só pode, o particular, impor
sua vontade ao outro se houver um contrato previamente firmado.
No final da década de 1990, o professor Diogo de Figueiredo Moreira Neto es-
creveu um livro denominado Mutações do Direito Administrativo, contendo vários arti-

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gos. Um dos seus artigos, escrito em 1998, dizia respeito à transferência de funções pú-
blicos a entidades privadas, a particulares. Ao longo do texto, Diogo de Figueiredo de-
fendeu que as etapas de consentimento e de fiscalização seriam etapas que poderiam
ser delegadas a particulares. Pois tais etapas diriam respeito a atos de gestão, não se-
riam atos de império.
O particular não pode criar uma obrigação que delimite a liberdade do particular
ou o direito de propriedade, isso só poderia ser feito pelo Estado e com fundamento em
lei, bem como não poderia impor as sanções a outros particulares. Mas os particulares
poderiam avaliar as regras do ordenamento e consentir com a prática de atividades,
bem como fiscalizar.
Ressalte-se que, até os dias de hoje, é comum citarem essa posição esposada por
Diogo de Figueiredo em provas de concursos, postulando que o particular pode exercer
poder de polícia em relação às etapas de consentimento e fiscalização, pois são etapas
que se materializam através de atos de gestão e não atos de império. Em uma prova é
comum concordar com essa afirmação.
Ao final de seu artigo, o professor Diogo de Figueiredo citou um exemplo do que
objetivava ilustrar, de particular que poderia consentir e fiscalizar em matéria de poder
de polícia. Citou os conselhos de fiscalização profissional.
O artigo datava de 1998 e, em 1.998 foi publicada a Lei 9.649, de 98, que, no seu
artigo 58, previu que os conselhos de fiscalização profissional eram particulares e, como
tal, exerceriam poder de polícia, pois exercem poder de polícia nas suas áreas específi-
cas e isso reforçou a tese do professor Diogo de Figueiredo.
Lei nº 9.649, de 27 de maio de 1998.
Art. 58. Os serviços de fiscalização de profissões regulamentadas serão exercidos
em caráter privado, por delegação do poder público, mediante autorização legisla-
tiva. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 1º A organização, a estrutura e o funcionamento dos conselhos de fiscalização de
profissões regulamentadas serão disciplinados mediante decisão do plenário do
conselho federal da respectiva profissão, garantindo-se que na composição deste
estejam representados todos seus conselhos regionais. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 2º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, dotados de perso-
nalidade jurídica de direito privado, não manterão com os órgãos da Administração
Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico. (Vide ADIN nº 1.717-6)

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§ 3º Os empregados dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas


são regidos pela legislação trabalhista, sendo vedada qualquer forma de transposi-
ção, transferência ou deslocamento para o quadro da Administração Pública direta
ou indireta.
§ 4º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são autorizados a
fixar, cobrar e executar as contribuições anuais devidas por pessoas físicas e jurídi-
cas, bem como preços de serviços e multas, que constituirão receitas próprias, con-
siderando-se título executivo extrajudicial a certidão relativa aos créditos decorren-
tes. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 5º O controle das atividades financeiras e administrativas dos conselhos de fisca-
lização de profissões regulamentadas será realizado pelos seus órgãos internos, de-
vendo os conselhos regionais prestar contas, anualmente, ao conselho federal da
respectiva profissão, e estes aos conselhos regionais. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 6º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, por constituírem
serviço público, gozam de imunidade tributária total em relação aos seus bens, ren-
das e serviços. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 7º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas promoverão, até 30
de junho de 1998, a adaptação de seus estatutos e regimentos ao estabelecido
neste artigo. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 8º Compete à Justiça Federal a apreciação das controvérsias que envolvam os
conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, quando no exercício dos
serviços a eles delegados, conforme disposto no caput. (Vide ADIN nº 1.717-6)
§ 9º O disposto neste artigo não se aplica à entidade de que trata a Lei no 8.906, de
4 de julho de 1994.

Entretanto, após o artigo, o Supremo Tribunal Federal julgou a ADI 1717, decla-
rando a inconstitucionalidade dos parágrafos do artigo 58, da Lei 9.649 e afirmando que
os conselhos de fiscalização profissional não seriam particulares, em razão de exercerem
poder de polícia.
EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE IN-
CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649,
DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES RE-
GULAMENTADAS. 1. Está prejudicada a Ação, no ponto em que impugna o pará-
grafo 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1988, em face do texto originário do
art. 39 da C.F. de 1988. É que esse texto originário foi inteiramente modificado pelo
novo art. 39 da Constituição, com a redação que lhe foi dada pela E.C. nº 19, de
04.06.1988. E, segundo a jurisprudência da Corte, o controle concentrado de cons-
titucionalidade, mediante a Ação Direta, é feito em face do texto constitucional em
vigor e não do que vigorava anteriormente. 2. Quanto ao restante alegado na ini-
cial, nos aditamentos e nas informações, a Ação não está prejudicada e por isso o

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requerimento de medida cautelar é examinado. 3. No que concerne à alegada falta


dos requisitos da relevância e da urgência da Medida Provisória (que deu origem à
Lei em questão), exigidos no art. 62 da Constituição, o Supremo Tribunal Federal
somente a tem por caracterizada quando neste objetivamente evidenciada. E não
quando dependa de uma avaliação subjetiva, estritamente política, mediante crité-
rios de oportunidade e conveniência, esta confiada aos Poderes Executivo e Legisla-
tivo, que têm melhores condições que o Judiciário para uma conclusão a respeito.
4. Quanto ao mais, porém, as considerações da inicial e do aditamento de fls.
123/125 levam ao reconhecimento da plausibilidade jurídica da Ação, satisfeito, as-
sim, o primeiro requisito para a concessão da medida cautelar ("fumus boni iuris").
Com efeito, não parece possível, a um primeiro exame, em face do ordenamento
constitucional, mediante a interpretação conjugada dos artigos 5o, XIII, 22, XVI,
21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da C.F., a delegação, a uma entidade
privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tribu-
tar e de punir, no que tange ao exercício de atividades profissionais. 5. Precedente:
M.S. nº 22.643. 6. Também está presente o requisito do "periculum in mora", pois
a ruptura do sistema atual e a implantação do novo, trazido pela Lei impugnada,
pode acarretar graves transtornos à Administração Pública e ao próprio exercício
das profissões regulamentadas, em face do ordenamento constitucional em vigor.
7. Ação prejudicada, quanto ao parágrafo 3o do art. 58 da Lei nº 9.649, de
27.05.1998. 8. Medida Cautelar deferida, por maioria de votos, para suspensão da
eficácia do "caput" e demais parágrafos do mesmo artigo, até o julgamento final
da Ação.

Portanto, a ADI 1717 é citada como decisão do Supremo Tribunal Federal que
rejeita a tese de que particular pode exercer poder de polícia. O STF entendeu que os
conselhos de fiscalização profissional não eram particulares, pois exercem poder de po-
lícia e particular não pode exercer poder de polícia. Essa é a tese defendida, por exem-
plo, por Celso Antônio Bandeira de Mello.
Celso Antônio sustenta que, como regra, um particular não poderia exercer po-
der de polícia. O autor apresenta algumas exceções.
Por exemplo: o capitão de um navio seria um particular que, segundo Celso An-
tônio, poderia exercer poder de polícia em relação à tripulação do navio. Tal situação
configura-se tão excepcional que só confirma a regra de que os particulares não pode-
riam exercer poder de polícia.
Essa é a posição do Supremo Tribunal Federal acerca do tema, sem prejuízo da
tese de que consentimento e fiscalização podem ser exercidos pelo particular. Contudo,

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por vezes, em provas deve-se considerar a posição do Supremo Tribunal Federal em re-
lação a esse tema e, de acordo com a ADI 1717, os conselhos de fiscalização profissional
não são particulares, mas entidades autárquicas e exercem poder de polícia como au-
tarquia, o que não enseja problemas. A delegação pode ser feita a uma pessoa de direito
público, como uma autarquia, ainda que uma autarquia corporativa ou corporativista,
como o Supremo Tribunal Federal ocasionalmente cita.
Portanto, é mais defensável em provas que o particular não pode exercer o po-
der de polícia. Mas, se o particular não pode, cumpre indagar a quem pode ser feita essa
delegação. A delegação só pode ser feita no âmbito da administração pública indireta.
Na administração pública indireta, uma pessoa jurídica de direito público poderia exer-
cer poder de polícia, como o IBAMA, o Instituto Chico Mendes, CVM, as Agências Regu-
ladoras, que são autarquias, ainda que de regime especial.
A descentralização da atividade a uma entidade autárquica pode transferir o po-
der de polícia.
Pergunta: e quanto às empresas públicas e as sociedades de economia mista,
elas podem exercer poder de polícia?
No Estado do Rio de Janeiro houve uma análise deste tema fortemente no caso
da Guarda Municipal do Rio de Janeiro. A Guarda Municipal do Rio de Janeiro surgiu em
meados da década de 1990, sendo uma das guardas municipais pioneiras no Brasil, sur-
giu como uma empresa pública municipal. Havia numa empresa pública do Rio de Ja-
neiro, a COMLURB, um grupamento de guardas, pois o Prefeito da época, César Maia,
resolveu criar uma nova empresa pública com esse grupamento de guardas, chamada
Empresa Municipal Vigilância S.A., formada por guardas municipais, que começaram a
fiscalizar o trânsito e a aplicar multas.
Diante dessa situação inesperada, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro come-
çou a ser provocado, surgindo decisões no sentido de que guarda municipal é empresa
pública, que não pode exercer poder de polícia, de forma que a multa é ilegal. Não pode
exercer poder de polícia, porque o regime da pessoa jurídica é privado, seus agentes
públicos são empregados públicos, não possuem estabilidade.
Assim caminharam as coisas e, posteriormente, o Órgão Especial do Tribunal de
Justiça do Rio de Janeiro começou a validar as multas da Guarda Municipal e, com rela-
ção à questão do regime jurídico dos agentes públicos que trabalhavam na Guarda Mu-
nicipal, não há qualquer problema, hoje em dia, de o poder de polícia ser exercido por
quem é empregado público.

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No passado, enfrentou-se resistência, contudo, não é mais o caso, visto que, ao


refletir sobre o tema, em grande parte dos Municípios brasileiros, quem atua como au-
toridade máxima de trânsito, aplicando multas e lavrando autos de infração é o Secre-
tário Municipal de Transporte, que, normalmente, ocupa apenas cargo em comissão.
Dizer que quem não tem estabilidade está impedido de exercer poder de polícia impe-
diria, portanto, que os Secretários Municipais lavrassem autos de infrações.
Talvez o ideal seria que o poder de polícia fosse exercido por quem possui esta-
bilidade, o que permite maior imparcialidade, mas não é a realidade. Não se pode de-
fender ponto de vista que se dissocie completamente da realidade. O Secretário Muni-
cipal pode multar, o que é exercício do poder de polícia, pode ele não ser servidor pú-
blico, apenas ocupar cargo em comissão, logo não há qualquer mal em autorizar um
empregado público a exercer poder de polícia, embora, segundo o Supremo Tribunal
Federal, o empregado público seja concursado mas sem estabilidade, sua despedida
precisa ser motivada, diferente da do ocupante do cargo em comissão, que sequer pos-
sui direito para saber as razões de sua exoneração.
Não haveria razão para não se aceitar o exercício do poder de polícia por ser
empregado público. De outro giro, na ADI 2310, o STF declarou a inconstitucionalidade
do artigo 1º, da Lei 9.986, que permitia que as Agências Reguladoras contratassem em-
pregados públicos para o desempenho de suas funções, o Supremo dizia que não podia,
porque as agências exercem função típica de Estado.
Lei nº 9.986, de 18 de julho de 2000.
Art. 1º As Agências Reguladoras terão suas relações de trabalho regidas pela Con-
solidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio
de 1943, e legislação trabalhista correlata, em regime de emprego público. (Vide
ADIN 2310) (Vide Medida Provisória nº 155, de 2003) (Revogado pela Lei nº 10.871,
de 2004)
DECISÃO: - Vistos. O PARTIDO DOS TRABALHADORES, com fundamento nos arts.
102, I, a, e 103, VIII, da Constituição Federal, propõe ação direta de inconstituciona-
lidade, com pedido de suspensão cautelar, dos arts. 1º; 2º e parágrafo único; 12,
caput e § 1º; 13 e parágrafo único; 15; 24, caput e inciso I; 27; 30 e 33, todos da Lei
9.986, de 18 de julho de 2000, que "dispõe sobre a gestão de recursos humanos das
Agências Reguladoras e dá outras providências" (fls. 33-34). Requisitaram-se infor-
mações (fl. 37), que foram prestadas pelo Presidente do Congresso Nacional e pelo
Presidente da República (fls. 43-48 e 50-75, respectivamente). O eminente Ministro
Marco Aurélio, então relator, deferiu a liminar e suspendeu, ad referendum do Ple-
nário, a eficácia dos arts. 1º; 2º e parágrafo único; 12 e § 1º; 13 e parágrafo único;
15; 24 e inciso I; 27 e 30, todos da Lei 9.986/2000 (fls. 124-139). Em 11.11.2001, o

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Plenário desta Corte sobrestou o referendo da liminar até a conclusão do exame da


ADI 2.135/DF. O ilustre Advogado-Geral da União, Dr. Álvaro Augusto Ribeiro Costa,
manifestou-se pela prejudicialidade da presente ação (fls. 161-162). À fl. 181, o re-
querente informa que, diante da revogação expressa dos dispositivos da Lei
9.986/2000 pela Lei 10.871/2004, não tem mais interesse na continuidade do pre-
sente feito. Em 16.11.2004, os presentes autos foram a mim distribuídos com fun-
damento no art. 38, I, do RI/STF. O eminente Procurador-Geral da República, Prof.
Claudio Fonteles, opinou pela prejudicialidade da presente ação direta de inconsti-
tucionalidade, em razão da perda de seu objeto (fls. 198-208). Autos conclusos em
06.12.2004. Decido. Destaco do parecer do Procurador-Geral da República, Prof.
Claudio Fonteles: "(...) 8. Verifica-se que o art. 37 da Lei nº 10.871, de 20 de maio
de 2004, que 'dispõe sobre a criação de carreiras e organização de cargos efetivos
das autarquias especiais denominadas Agências Reguladoras, e dá outras providên-
cias', revogou expressamente, os art. 1º, 12 e 13, o parágrafo único do art. 14, os
arts. 15, 20, 21, 24, 27, 30, 33 e 34 da Lei nº 9.986, de 18 de julho de 2000, in verbis:
'Art. 37. Ficam revogados o art. 13 da Medida Provisória nº 2.228-1, de 6 de setem-
bro de 2001, os arts. 1º, 12 e 13, o parágrafo único do art. 14, os arts. 15, 20, 21,
24, 27, 30, 33 e 34 da Lei nº 9.986, de 18 de julho de 2000, o § 2º do art. 34 da Lei
nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996, o parágrafo único do art. 76 da Lei nº 9.478,
de 6 de agosto de 1997, o art. 36 da Lei nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999, o art.
28 da Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000, e o art. 69, o art. 70, incisos I e II e § 2º,
os arts. 71, 76 e 93, o caput e §§ 1º e 2º do art. 94, o art. 121 e as Tabelas I e III do
Anexo II da Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001' (Ênfases acrescidas). 9. Demais
disso, dispõe a Lei nº 10.871, de 20 de maio de 2004, em seu art. 6º, que 'o regime
jurídico dos cargos e carreiras referidas no art. 1º desta Lei é o instituído na Lei nº
8.112, de 11 de dezembro de 1990, observadas as disposições desta Lei'. 10. Assim,
cumpre esclarecer que, embora não tenha sido expressamente revogado o art. 2º
da Lei nº 9.986/2000, a norma nele inserta, que cria os empregos públicos das Agên-
cias Reguladoras foi tacitamente revogada pelo art. 1º da Lei nº 10.871/2004, que,
diversamente, cria carreiras e cargos efetivos para as Agências Reguladoras. 11.
Portanto, como os dispositivos originalmente impugnados não mais existem no
mundo jurídico, tem-se a perda de objeto do presente pedido de declaração de in-
constitucionalidade, pois a ação direta visa à 'declaração de inconstitucionalidade
de lei ou ato normativo em tese, logo o interesse de agir só existe se a lei estiver em
vigor' (ADIMC nº 709-PR, Rel. Min. PAULO BROSSARD, DJ de 24/6/94). 12. Nesse
sentido, pacífica é a jurisprudência desse Colendo Supremo Tribunal Federal como
se colhe dos arestos abaixo transcritos: 'o interesse de agir, em ação direta de in-
constitucionalidade, só existe enquanto estiver em vigor a norma jurídica impug-
nada, ficando, pois, a ação prejudicada na hipótese de perda de seu objeto por ter
sido revogada essa norma' (ADIMC nº 2001/DF, Rel. Min. MOREIRA ALVES, DJ

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03.09.99, pág. 25). 'Tendo em vista a orientação desta Corte que, ao julgar a Ação
Direta de Inconstitucionalidade n. 708, decidiu que a revogação do ato normativo
ocorrida posteriormente ao ajuizamento da ação direta, mas anteriormente ao seu
julgamento, a torna prejudicada, independentemente da verificação dos efeitos
concretos que o ato haja produzido, pois ele têm relevância no plano das relações
jurídicas individuais, não, porém, no controle abstrato das normas' (Ação direta não
conhecida, por estar prejudicada pela perda de seu objeto - ADI nº 1280/TO, Rel.
Min. MOREIRA ALVES, DJ 19.12.96, pág. 51765). 13. Ante o exposto, manifesta-se o
Ministério Público Federal pela prejudicialidade da presente ação direta, em razão
de perda de seu objeto. (...)" (Fls. 206-208). Ademais, na ADI 709, Relator o Ministro
Paulo Brossard, o Supremo Tribunal Federal assentou que, "revogada a lei argüida
de inconstitucionalidade, é de se reconhecer, sempre, a perda de objeto de ação
direta, revelando-se indiferente, para esse efeito, a constatação, ainda casuística,
de efeitos residuais concretos gerados pelo ato normativo impugnado." Nas ADI's
221/DF, 539/DF e 737/DF, inter plures, o Supremo Tribunal reiterou o entendi-
mento. Assim decidi, também, na ADI 971/GO e, recentemente, nas ADI's 2.625/PE,
2.858/RJ, 2.889/MG, 2.933/ES, 3.076/CE e 3.078/CE. Do exposto, sem objeto a pre-
sente ação, julgo-a prejudicada (art. 21, IX, do RI/STF). Publique-se. Brasília, 07 de
dezembro de 2004. Ministro CARLOS VELLOSO - Relator (DJ 15/12/2004 ).

O que restou decidido na ADI 2310 dificulta o entendimento de que empregado


público possa exercer o poder de polícia.
No caso da Guarda Municipal do Rio de Janeiro, após inúmeras discussões, a
Guarda Municipal foi transformada em autarquia no Rio de Janeiro. De certa forma, en-
cerrou-se a controvérsia sobre se a Guarda Municipal poderia multar através dos seus
empregados, tendo em vista que deixou de ser empresa pública e passou a ser autarquia
e, portanto, passou a ter servidores nos seus quadros. No entanto, surgiu outro pro-
blema, questionando se a Guarda Municipal pode exercer poder de polícia.
Questiona-se: mesmo como autarquia, a Guarda Municipal pode fiscalizar o
trânsito?
O artigo 144, da Constituição enumera nos seus cinco incisos quais são os órgãos
de segurança pública no Brasil, não cita a Guarda Municipal.
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos,
é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e
do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;

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III - polícia ferroviária federal;


IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.

A Guarda Municipal está prevista no parágrafo oitavo do mesmo artigo 144, mas
o dispositivo não a considera órgão de segurança pública.
§ 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de
seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.

Na literalidade do dispositivo, não há qualquer referência expressa ao poder de


polícia de trânsito. Este tema chegou ao Supremo Tribunal Federal em sede de reper-
cussão geral, foi julgado no RE 658570.
Ementa
DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PODER DE POLÍCIA. IMPO-
SIÇÃO DE MULTA DE TRÂNSITO. GUARDA MUNICIPAL. CONSTITUCIONALIDADE. 1.
Poder de polícia não se confunde com segurança pública. O exercício do primeiro
não é prerrogativa exclusiva das entidades policiais, a quem a Constituição outor-
gou, com exclusividade, no art. 144, apenas as funções de promoção da segurança
pública. 2. A fiscalização do trânsito, com aplicação das sanções administrativas le-
galmente previstas, embora possa se dar ostensivamente, constitui mero exercício
de poder de polícia, não havendo, portanto, óbice ao seu exercício por entidades
não policiais. 3. O Código de Trânsito Brasileiro, observando os parâmetros consti-
tucionais, estabeleceu a competência comum dos entes da federação para o exer-
cício da fiscalização de trânsito. 4. Dentro de sua esfera de atuação, delimitada pelo
CTB, os Municípios podem determinar que o poder de polícia que lhe compete seja
exercido pela guarda municipal. 5. O art. 144, §8º, da CF, não impede que a guarda
municipal exerça funções adicionais à de proteção dos bens, serviços e instalações
do Município. Até mesmo instituições policiais podem cumular funções típicas de
segurança pública com exercício de poder de polícia. Entendimento que não foi al-
terado pelo advento da EC nº 82/2014. 6. Desprovimento do recurso extraordinário
e fixação, em repercussão geral, da seguinte tese: é constitucional a atribuição às
guardas municipais do exercício de poder de polícia de trânsito, inclusive para im-
posição de sanções administrativas legalmente previstas.

O STF entendeu que o poder de polícia de trânsito não precisa ser exercido por
um órgão de segurança pública. Não há em dispositivo constitucional algum a exigência
de que o trânsito seja fiscalizado por órgão de segurança pública. Além disso, não é difícil
concluir, segundo o STF, que o poder de polícia de trânsito está inserido nas preocupa-
ções do parágrafo oitavo do artigo 144, especialmente quando se refere à proteção dos
bens, serviços e instalações do Município.

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Por exemplo: um carro resolve estacionar numa calçada do Município. O guarda


municipal que irá autuar esse estacionamento irregular está protegendo os bens e ser-
viços municipais, tendo em vista que aquela calçada pertence ao Município, pendendo
dificultar a limpeza da calçada.
Não é difícil enquadrar a competência da Guarda Municipal, na linha do que pre-
visto no artigo 144, parágrafo oitavo, quando pretende fiscalizar o trânsito. Foi essa a
conclusão do Supremo Tribunal Federal que, no RE 658570, que entendeu que Guarda
Municipal pode exercer o poder de polícia de trânsito, pode aplicar sanções, multas.
Observe-se que a preocupação do Supremo Tribunal Federal não foi analisar se
a Guarda Municipal era autarquia ou empresa pública, mas assinalar que ela pode exer-
cer poder de polícia de trânsito.
Contudo, a questão central que precisa ser analisada se refere à empresa pública
e sociedade de economia mista, pessoas de direito privado da administração indireta,
se essas podem exercer poder de polícia.
Partindo-se da premissa de que empregados públicos não podem exercer poder
de polícia, então não podem, pois são empregados públicos. Entretanto, não parece que
esta seja a melhor resposta, visto que Secretário Municipal também não tem estabili-
dade e exerce poder de polícia.
Nessa toada, cumpre observar que o Supremo Tribunal Federal tem dividido as
empresas públicas e sociedades de economia mista em dois grandes grupos. De um lado,
aquelas que exploram atividade econômica em regime de concorrência, como, por
exemplo, o Banco do Brasil, que é sociedade de economia mista, a Caixa Econômica
Federal, empresa pública, a Petrobrás, sociedade de economia mista, todas essas enti-
dades concorrem com particulares. Em outro grupo, o STF insere as que exploram ativi-
dade econômica em regime de monopólio e as que prestam serviço público em regime
não concorrencial.
Por exemplo: empresa pública que realize distribuição de gás canalizado é caso
de monopólio natural, pois não há concorrência nesse serviço. No caso do serviço postal,
a ECT é empresa que constitui serviço público em regime de monopólio da União, sendo
o privilégio atribuído à ECT.
Olhando-se para esses dois grupos, é fácil concluir que não é razoável defender
que empresa pública ou sociedade de economia mista que explore atividade em regime
de concorrência exerça poder de polícia. Se a empresa concorre com outros particulares,
não pode exercer poder de polícia.

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Basta imaginar, por exemplo, o Banco do Brasil exercendo poder de polícia em


matéria de instituições financeiras, obviamente irá criar regras que irão favorecer seu
funcionamento.
Não há decisão do Supremo Tribunal Federal sobre esse tema específico, dis-
pondo que quem explora atividade em regime de concorrência não pode exercer poder
de polícia. Entretanto, é algo totalmente coerente com o que o STF tem decidido no que
tange ao regime dessas entidades.
Quando o Supremo Tribunal Federal observa o grupo que atua em regime de
monopólio ou presta serviço público em regime não concorrencial, o STF tem permitido
que algumas prerrogativas da fazenda pública incidam em relação a esse grupo.
Por exemplo: regime de precatórios, imunidade tributária. A ECT possui imuni-
dade tributária, paga suas dívidas pelo regime de precatório, que é típico de uma autar-
quia, por exemplo.
Indaga-se: que mal haveria se uma entidade dessa natureza pudesse exercer po-
der de polícia? Que a ECT exercesse poder de polícia em relação ao serviço postal, ou
então que uma distribuidora de gás canalizado exercesse poder de polícia em matéria
de sua competência, visto que não concorre com ninguém.
O tema exercício do poder de polícia por empresa pública ou sociedade de eco-
nomia mista terá de ser enfrentado em sede de repercussão geral pelo Supremo Tribu-
nal Federal em processo inserido pelo Ministro Luiz Fux, pelo ARE 662186, depois con-
vertido em RE, visto que o STF tem convertido os agravos em REs, quando inseridos na
repercussão geral, de nº 840230 e, mais recentemente, em 2016, o RE 840230 foi subs-
tituído pelo RE 633782, talvez porque este novo RE trate do tema de forma mais abran-
gente. Caberá ao STF decidir se a BHTrans, entidade integrante da administração indi-
reta de direito privado do Município de Belo Horizonte, pode ou não exercer poder de
polícia.
A BHTrans tem fiscalizado o trânsito em Belo Horizonte e as suas multas são
questionadas. De acordo com o que defendido anteriormente, não há qualquer pro-
blema, uma vez que a estatal não concorre com outras entidades de direito privado,
possui regime que pode ser o mais próximo possível do regime público. Por mais que
seja entidade de direito privado, ao integrar o grupo de entidades que atuam em regime
não concorrencial, pode ter algumas prerrogativas da fazenda pública.
O ideal seria que a BHTrans fosse uma autarquia, porém não o é. Chegar-se à
conclusão de que as multas devem ser anuladas geraria caos. Em situação como essas,

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provavelmente, o Supremo Tribunal Federal irá legitimar o exercício do poder de polícia


por essas entidades. Porém, constitui tema que ainda não foi analisado pelo STF ou pelo
seu Plenário e será apreciado no RE 633782.
Não se pode impedir que uma empresa pública ou sociedade de economia mista
exerça poder de polícia pelo fato de serem empesa pública ou sociedade de economia
mista. O que impede é o fato de, eventualmente, concorrer com outros particulares.
Olhando-se para o artigo 173, da Constituição, tem-se a regra de que, se explora ativi-
dade econômica em regime de concorrência, não pode ter regime diferente daquele
dispensado aos demais particulares.
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de
atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos impera-
tivos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos
em lei.
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de eco-
nomia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção
ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (Re-
dação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade; (In-
cluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto
aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; (Incluído
pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os
princípios da administração pública; (Incluído pela Emenda Constitucional nº
19, de 1998)
IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com
a participação de acionistas minoritários; (Incluído pela Emenda Constitucional
nº 19, de 1998)
V - os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administra-
dores. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
§ 2º As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar
de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.
§ 3º A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a socie-
dade.
§ 4º A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos merca-
dos, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.
§ 5º A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa ju-
rídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis
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com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e
contra a economia popular.

Mesmo assim, o regime dessas estatais não é totalmente igual ao dos particula-
res, visto que empresas públicas e sociedades de economia mista devem observar con-
curso público, licitações. Inclusive, há a Lei das Estatais, Lei 13.303, já questionada no
Supremo Tribunal Federal na ADI 5624, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, distribu-
ída antes do recesso, no final do ano de 2016. A lei das estatais prevê procedimento
licitatório para todas as estatais, pouco importando se explora atividade econômica em
regime de concorrência ou se atua em regime de monopólio ou não concorrencial.
Portanto, algumas regras atingem todas as estatais.
Em relação ao exercício do poder de polícia, cita-se o caso do IRB Brasil RE, soci-
edade de economia mista que atua na atividade econômica, hoje em regime de concor-
rência, do resseguro. Antigamente, o resseguro era de monopólio da União e o privilégio
era do IRB, sociedade de economia mista. Porém, só quem entendia sobre resseguro era
quem trabalhava no IRB, portanto, quem regulava o setor, quem exercia poder de polí-
cia nesta matéria era o próprio IRB, através de seus funcionários, o que nunca foi ques-
tionado.
Hoje em dia, o resseguro é exercido pela livre iniciativa, consubstanciando ativi-
dade econômica em regime de concorrência, é indefensável que o IRB exerça poder de
polícia. A mesma entidade no passado pôde exercer e exerceu poder de polícia e, hoje,
não pode mais fazê-lo.
Interessante destacar que a Guarda Municipal surgiu de um departamento da
COMLURB, que é empresa de limpeza do Rio de Janeiro, empresa pública. Quando a
Guarda Municipal começou a multar, questionou-se que empresa pública não poderia
multar e exercer poder de polícia, todavia, a COMLURB sempre multou. A COMLURB
multa a pessoa que coloca o lixo no lugar errado e não é matéria de destaque jurídico.
As multas da COMLURB são cobradas e executadas sem maiores problemas.
O problema estaria na presença de atividade econômica em regime de concor-
rência, pois se o particular não pode fazê-lo, a empresa pública e a sociedade de econo-
mia mista também não poderiam.
Imperioso ressaltar que a Lei das PPPs, Lei 11.079, prevê, no seu artigo 4º, a in-
delegabilidade ao parceiro privado do exercício do poder de polícia.
Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004.

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Art. 4º Na contratação de parceria público-privada serão observadas as seguintes


diretrizes:
I – eficiência no cumprimento das missões de Estado e no emprego dos recursos da
sociedade;
II – respeito aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços e dos entes pri-
vados incumbidos da sua execução;
III – indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder
de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado;
IV – responsabilidade fiscal na celebração e execução das parcerias;
V – transparência dos procedimentos e das decisões;
VI – repartição objetiva de riscos entre as partes;
VII – sustentabilidade financeira e vantagens socioeconômicas dos projetos de par-
ceria.

Isso tranquilizou os parlamentares no momento da aprovação da Lei 11.079, pois


reforça a visão do Supremo Tribunal Federal na ADI 1717 de que o particular, no caso o
parceiro privado, não pode exercer poder de polícia.
Contudo, o raciocínio ora traçado não se refere ao particular, mas à empresa
pública e sociedade de economia mista, que fazem parte da estrutura do Estado e que,
por vezes, tem seu regime equiparado ao regime da fazenda pública.
Portanto, ainda há muito a ser debatido em relação à delegação do poder de
polícia, não é tema fechado e poderá ensejar remansosa questão em prova discursiva,
devendo-se acompanhar o desfecho do RE 633782, o que não irá demorar para ser apre-
ciado pelo Supremo Tribunal Federal, valendo frisar que se trata de matéria que, quando
for decidida, certamente será cobrada em prova de concurso público.

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