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Resumo
A partir do questionamento “Professora, de que cor eu sou?” feito por jovens afrodescendentes
participantes dos projetos sociais do CIEE Rio - Centro de Integração Empresa-Escola, e
partindo do pressuposto que a cor da pele é um dos elementos constitutivos da identidade
pessoal, buscamos neste artigo entender como se dá a (re)construção da identidade negra na
perspectiva de intelectuais negras e negros. A hipótese é que, por terem passado por esse mesmo
processo, essas/es autoras/es apresentem argumentos consistentes sobre o tema, embasados
tanto teórica quanto empiricamente. Os textos selecionados foram, em sua maioria,
apresentados e discutidos na disciplina Tópicos especiais em raça e classe na perspectiva de
intelectuais negras e negros do Mestrado em relações étnico-raciais do CEFET RJ. A pesquisa
se deu pelos conceitos de identidade, identidade negra e identidade negra coletiva constantes
nesses textos e o resultado mostrou-se bastante satisfatório no sentido de compreender a dúvida
dos jovens em relação à sua auto definição de cor da pele e respaldar estratégias pedagógicas
que contribuam para a elevação de sua autoestima e orgulho por suas raízes africanas.
Abstract
Based on the questioning "Mrs. Mello, what color am I?" asked by young Afro-descendants
participants in the social projects of CIEE Rio - Centro de Integração Empresa-Escola (Center
for Company-School Integration), and assuming that skin color is one of the constituent
elements of personal identity, we seek in this article to understand how the re-construction of
the black identity occurs in the perspective of black intellectuals. The hypothesis is that, because
they have gone through this same process, these authors present consistent arguments on the
subject, based both in theory and empirically. The selected texts were mostly presented and
discussed in the subject Special topics in race and class in the perspective of black intellectuals
at the Masters in Ethnic-Racial Relations of CEFET RJ. The research was based on the concepts
of identity, black identity and collective black identity contained in these texts and the result was
quite satisfactory in the sense of understanding the doubts of the young people in relation to
their self-definition of skin color and to support pedagogic strategies that may contribute to the
elevation of their self-esteem and pride in their African roots.
populares. Este projeto de pesquisa surgiu quando percebemos que sempre que esses
identidade negra significa que esta identidade passa, em seu processo de construção,
pela cor da pele” (2012, p. 12), esta pesquisa visa entender como ocorreu (e ainda
negras e negros.
foi subdividido em: Conceitos gerais, Identidade negra e Identidade negra coletiva. O
questionamento original dos jovens, de entender sua dúvida com relação à auto
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Site oficial disponível em http://www.ciee.org.br/portal/institucional/index.asp. Acesso em 02/12/2017.
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teórico na busca por alternativas pedagógicas em consonância com a Lei 10639/03, que
atendidos.
Hall no artigo com o mesmo título (2000), Kabengele Munanga, no artigo citado no
item 1 acima, argumenta que todos nós necessitamos de identidade, motivo pelo qual ao
nascer recebemos um nome que nos diferencia de todos os outros seres humanos. Esse
sobrenomes das famílias do pai e da mãe, compondo assim nossa identidade pessoal e
existência, é transposto também para o coletivo, ou seja, para “nações, países, povos,
desses conceitos que operam ‘sob rasura’, [...] uma ideia que não pode ser pensada da
forma antiga, mas sem a qual certas questões-chave não podem ser sequer pensadas”
(2000, p. 104).
disponível para consultas, esclarecimentos e atualizações, é reforçada não por ser “um
por Munanga, em seu livro Negritude usos e sentidos (2012), no qual menciona, entre
mais importante, na medida em que constitui o cimento cultural que une os elementos
conjunto de sua coletividade” (2012, p. 12). Segundo ele, esse elo com o passado
origem comum, ou de características que são partilhadas com outros grupos ou pessoas,
ou ainda a partir de um mesmo ideal”. (2000, p. 106). Esse é o alicerce para o vínculo
“identidade” envolve tal complexidade, que sua definição ainda representa um enorme
desafio para a ciência social contemporânea. Em seu livro A identidade cultural da pós-
acordo com Hall, justamente por conta dessas interconexões, o sujeito assume diferentes
Essa afirmação coincide com o artigo de Munanga, que também menciona uma
que reúne a todas e todos, estamos atravessados/as por outras identidades de classe,
sexo, religião, etnias, gênero, idade, raça, etc., cuja expressão depende do contexto
simplesmente um homem entre outros homens, [...] de ter chegado puro em um mundo
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negro pode ser assustador? Aimé Césaire, no livro Discurso sobre a Negritude,
forma tão eloquente quanto seus pares, Achille Mbembe, em Crítica da razão negra,
através de uma metáfora: a metamorfose que obedece a uma “tripla lógica de ossificar,
fabricação das moedas é feita na Europa (BAUCOM, 2005, apud 2014, p. 78). E ele
tanto sofrimento: “Desde que era impossível livrar-me de um complexo inato, decidi me
afirmar como Negro. Uma vez que o outro hesitava em me reconhecer, só havia uma
Sua postura coincide com o discurso de Césaire: a única maneira de aqueles que
recuperação de seu passado negro. Isso lhes traria de volta sua identidade negada, seu
“negro”, bem como por saber da importante contribuição de seus ancestrais africanos
doutores negros que viajavam à Meca para discutir o alcorão. “Tudo isto exumado,
pertencia a uma raça que há dois mil anos já trabalhava o ouro e a prata” (2008, p. 119).
autores negros, (com tanta dor e sofrimento, mas também com perspectivas de
transformações positivas) projetam sua expansão para um nível mais abrangente, mais
intelectuais negros, nos faz retornar ao prefácio do livro O discurso sobre a negritude,
em que Carlos Moore exalta a genialidade de Césaire por ter percebido que, como havia
de si mesmo, mas esse “si” seria, na verdade, “grupal”, pois abrangeria toda a população
pela existência do conceito de raça como uma construção social concreta, havia a
Outra autora que propõe novas teorias para as questões coletivas do negro é bell
(2013). Para ela, “[...] Muitas questões que continuamos confrontando como negros –
que destroem nosso bem-estar físico e psicológico [...]” (2013, p. 93) demandam um
rompendo com a visão depreciativa do negro, para que se possam oferecer subsídios
Essa (re)ação surge como resultado dos esforços de todos os que lutaram e lutam
para que a história do negro seja reescrita de maneira justa e autêntica . Por isso, bell
hooks se diz agradecida “às muitas mulheres e homens que ousam criar teoria a partir
do lugar de dor e da luta, que expõem corajosamente suas feridas para nos oferecer sua
experiência como mestra e guia, como meio para mapear novas jornadas teóricas. O
sobre o tema Identidade, com o intuito de buscar elementos para embasar uma prática
coletiva, dos jovens afrodescendentes participantes dos programas sociais do CIEE Rio.
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Na hipótese de omissão do ensino oficial.
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Organizações sem fins lucrativos.
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Moore, Hooks e Mbembe foram unânimes em afirmar (e provar) o quanto o Negro foi
Esses autores também nos mostram caminhos para o resgate de nossa verdadeira
e honrosa história, o que poderá contribuir para elevar a autoestima desses jovens e
oxalá dirimir sua dúvida literalmente cruel para que, ao invés de perguntarem confusos:
“Professora, de que cor eu sou?”, passem a afirmar de cabeça erguida “Sou Negra/o
6) Referências Bibliográficas
HALL, Stuart. Quem precisa de Identidade. In: SILVA, Tomas Tadeu da (org.).
Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis: Vozes, 2000.
hooks, bell. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. São Paulo:
WMF Martins Fontes, 2013.