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SISTEMAS CLASSIFICATÓRIOS
DE PARENTESCO*

A. L. KROEBER

Tradução de MIRIAM LEMLE

A DISTINÇÃO entre sistemas de parentesco classifica-


tórios e descritivos tem sido largamente aceita, e já deu entrada
nos manuais e na literatura geral. O que geralmente se acredita
é que os sistemas de certas nações ou línguas agrupam relações
de parentesco distintas, dando-lhes um só nome, e são, pois,
classificatórios. De outros sistemas de consangüinidade diz-se
que indicam diferenças de parentesco secundárias por meio de
epítetos descritivos acrescentados aos seus têrmos primários,
sendo portanto descritivos.
Não pode haver maior falácia do que êsse ponto de vista
comum. Um momento de reflexão é bastante para mostrar
Todo língua
que qualquer
agrupa vários
língua agrupa, sob uma só designação, muitos
graus de
graus e tipos distintos de parentesco. Nossa palavra “irmão”
parentesco inclui tanto o
irmão mais velho quanto o mais nôvo, e 0 irmão
de um homem ou de uma mulher. Abarca ou classifica, pois,
quatro parentescos. A palavra inglêsa “cousin” denota tanto
primos como primas; primos de parte de mãe ou de pai; pri-
mos descendentes do irmão dos pais ou da irmã dos pais:
primos mais velhos ou mais novos do que a própria pessoa
ou cujos pais são mais velhos ou mais novos do que ela mesma;
e primos de homens ou de mulheres. Trinta e dois parentescos
diferentes são, pois denotados por essa palavra inglêsa. Se o
têrmo não fôr limitado estritamente ao significado de primo
q-›-nn-.ip-n---4-p-n--ún

* Este artigo foi publicado sob o título “Classificatory Systems of Relationship”


em Journal of Royal Anthropological Institute, 39, -pp. 77-84, 1909.

I5

uyuuflnçflf rvwwpifliupreørmwv- _ _ _
* não parentesco mas os princípios (ou categorias) subjacentes.
em primeiro grau, o número de idéias distintas que é capaz do homem, e sim para os princípios ou categorias de parentesco
de expressar é um múltiplo de muitas vêzes trinta e dois. Já que lhes são subjacentes. Oito dessas categorias são dis-
que, portanto, não são só os povos primitivos que classificam cerníveis.
ou deixam de distinguir relações, justifica-se a suspeita de que
a distinção corrente entre as duas classes ou sistemas de indicar 1. A diferença entre pessoas da mesma geração e pessoas
parentesco é subjetiva e tem origem na atitude de investiga- de geração diferente. As distinções entre pai e avô, entre tio
dores que, ao se aproximarem de línguas estrangeiras, ficaram e primo, e entre uma pessoa e seu pai, envolvem o reconhe-
impressionados com o fato de elas deixarem de discriminar cimento dessa categoria. s
certos parentescos entre os quais as línguas da Europa civi-
lizada estabelecem distinções; no entusiasmo de formularem 2. A diferença entre parentesco linear e colateral. Quando
Nossas línguas teorias gerais a partir de tais fatos, esqueceram-se de notar que há distinção entre o pai e to irmão do pai, essa categoria é
tb têm agrupamentos suas próprias línguas estão cheias de agrupamentos ou classi- operativa. Quando um só têrmo é empregado para irmão e
e classificações ficações de todo análogos, tornados tão familiares e naturais primo, ela não é operativa.
pelo hábito que já nem mais nos apercebemos dêles.
3. Diferença de idade numa mesmo geração. A distinção
O número total de diferentes parentescos que se podem freqüente entre irmão mais velho e irmão mais nôvo e um
distinguir é muito elevado, e alcança no mínimo várias centenas. caso. Em inglês, ela não é operativa. (N. do T.: Tampouco
Lingua alguma possui têrmos diferentes para todos êles, e nem em português.)
mesmo para qualquer proporção considerável dêles. Num
certo sentido é óbvio que uma língua seja tanto mais classi- 4. O sexo do parente. Esta distinção é realizada consis-
Quanto menor o n° ficatória quanto menor seja o número dos seus têrmos de pa- tentemente em inglês, a única exceção sendo para a palavra
de termos, mais
rentesco. Sendo constante o número de parentescos teôrica- estrangeira “cousin” (prinio/priina --- N. do T.), que torna
classificatório
mente possíveis, é preciso que haja maior número de idéias a distinção óbvia. Há muitos povos, porém, que não fazem a
agrupadas em cada têrmo na medida em que o número de distinção por sexo de muitas relações de parentesco. Avô e
têrmos fôr menor. De acôrdo com o sentido consensual do avó, cunhado e cunhada, sogro e sogra, e mesmo parentescos
que constitua a consangüinidade classificatória, o inglês, com próximos como filho e filha, são expressos por palavras únicas.
os seus vinte têrmos de parentesco, deve ser tido como mais, 5. O sexo da pessoa que ƒala. Não-representada em inglês
e não menos, classificatório do que as línguas de todos os povos e na maioria das línguas européias, esta categoria é reconhe-
primitivos que tenham vinte e cinco, trinta ou mais têrmos. cidamente relevante em muitas outras línguas. Pai, mãe, irmão,
“ É claro que, se quisermos dar algum sentido à expressão irmã e parentescos mais distantes podem receber umadesig-
consanguinidade classificatória”, devemos procurá-lo de uma nação por parte de um homem e outra por parte da irmã dêle.
maneira mais discriminatória. O simples fato de que outro
agrupar + não o torna povo agrupa vários parentescos que nossa língua mantém sepa- 6. O sexo da pessoa através da qual o parentesco tem lugar.
classificatório rados não torna o seu sistema classificatório. Se é que há uma O inglês (assim como o português -- N. do T.) não expressa
diferença geral e fundamental entre os sistemas de parentesco esta categoria. Conseqüentemente, é freqüente têrmos a neces-
dos povos civilizados e os dos não-civilizados, a base dessa sidade de explicar se um tio é irmão da mãe ou do pai, e se
diferença deve ser diferença deve ser procurada em algo mais exato do que as uma avó é materna ou paterna.
buscada alhures expressões imediatistas de pontos de vista subjetivos que têm nu I

7. A distinçao entre parentes consangüzneos e conexoós


no I

sido usuais. através do casamento. Apesar de ser esta distinção comumente


H Parece-nos evidente que a nossa atenção deve voltar-se expressa na maioria das línguas, há lapsos ocasionais; como
nao para as centenas ou milhares de parentescos ligeiramente quando no linguajar do inglês familiar se chama o sogro de
diversos que sao ou podem ser expressos pelas várias línguas pai. Não estritamente dentro do domínio do parentesco, mas

16 17

_ _ |-m_@:¡.z..
agalogo a falha ocasional na expressão desta categoria, é a
cada uma dessas quatro categorias. Tôdas as línguas indígenas
3» 011930 ff@ÇlU¢flÍ€, fillíre povos primitivos, da diferença entre expressam de seis a oito categorias. Quase tôdas reconhecem
parentes reais e parentes ficticios de clãs ou tribos.
sete. Mas em tôdas as línguas indígenas a maior parte das ca-
* categ. e tegorias que ocorrem são expressas apenas em uma parte dos
8. A condição de vida da pessoa através da qual 0 paren-
termos têrmos de parentesco da língua. Há mesmo línguas, como
¡@~*`¢`0 fem lugar. O parentesco pode ser determinado por nas-
cimento ou por casamento; a pessoa servindo de elo pode estar Pawnee e Mohave, em que nem uma só das sete ou oito cate-
viva _ou morta, casada ou solteira. Muitos indígenas norte- gorias encontra expressão em todos os têrmos. Enquanto em
americanos evitam termos tais como “sogro” e “sogra” após a inglês o grau de reconhecimento atribuído às categorias repre-
morte ou separação da espôsa. Alguns chegam a ter tê;-mgg sentadas pode ser indicado pela percentagem de 100 em todos
restritos a tais parentescos truncados. É natural que a relação os casos exceto um, no qual é 95, em Pawnee as percentagens
de um tio com to sobrinho órfão tenda a ser algo diferente da correspondentes variam heterogêneamente de 5 a 95. Tôdas
sua relaçao com o mesmo menino no tempo em que seu pro- as outras línguas indígenas, comparadas ao inglês, aproximam-
tetor natural, o pai, estava vivo. Daí ser comum encontra- se da condição do Pawnee e do Mohave.
rem-se termos distintos para parentes do grupo dos ti-05 ¢ tias É evidente que essa é uma diferença real e fundamental.
apos a morte dos pais. O inglês é simples, consistente, e realiza em tôda a linha as
distinções que faz. Os sistemas de parentesco indígenas come-
A tabela anexa mostra a representação das oito categorias, çam todos de uma base mais elaborada, mas efetuam o seu
e o^ grau em que encontram expressao, respectivamente em esquema de maneira menos completa. Isso é inevitável, pelo
ingles e em muitas das linguas indígenas da América do Norte. fato de ser o número total de têrmos de parentesco empre-
gados nelas aproximadamente o mesmo que no inglês. A adição
de apenas uma categoria àquelas empregadas em inglês normal-
,
1
l
r
Ind'os
No,.¡e_Ani,e¡.¡canos
z
l
_ _ _
Índios da Califórnia mente duplica o número de têrmos necessários para dar expres-
são plena ao sistema, e a presença de três categorias a mais mul-
tiplica o total possível por oito. Sendo que o número de têrmos
Inglêses
que ocorrem em qualquer das línguas indígenas consideradas
S54':I
éiwnzil não é muito superior ao dô-bro dos inglêses, ea às vêzes nem
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O
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1. :_'* ;'_ zz r ¿:___ _ __-_ _. Í i __ ____il


Ahapaho
_
Dakota ,
Slrolromish ` Chinook ` >-Í 1
Pomo ilvashoE
` Yokuts O rsizaàal ` Mohave
mesmo chega a ser superior, é evidente que pelo menos algumas
äèilrgêšgs de termos äši z 20* 31 23 ` 24 27 28 24. 28 ,34 35 de suas categorias devam receber expressão apenas parcial.
Consarig. ou afins 921 i 20 31 23 i 24 21 ` 27 24 i 22 i 30 ` 26 Resumindo: no que concerne à expressao de categorias
pu

Linear ou colat - *21


~ i 19
10 26 24
25 24 27
21 * 28
28 , 24
18 i 28
26 i 32
34 34
28
Sexo do -parente .20O l 186 D-i
I-I|I_l'|-nl
I-lb-ih-dp-¡

16 20 . 20 I7 j . 22 possíveis, 0 inglês é menos completo do que qualquer uma das


Sexo do par. ligação 1 1 13 14 10 14 21
Sexo de quem fala t~HJl×.H.n = 1ã i 12 2 12 l 10 * 14 línguas indígenas; mas, considerando a realização da expressão
Idade em geração i ` 1 das categorias que reconhece, o inglês é mais completo. Poten-
Cond. de vida do p.§ COC) l 9 ›-1 8
Quito-1 O-JmO\OC>|-zh Dix)-F~l\>-JU'|-.\›-\D O NO NHWUJO |-› ie-Ii
Guam O-FU-1 O O-Ii DN im
cialmente, o esquema inglês é mais simples e pobre; mas dentro
1. E
stao
_
omitidos
. .
todos os termos
^
tais
I
como bisavo,
u .A
tio-avô
z
e primo
,
em segundo
do seu ponto de vista próprio é mais completo e mais consis-
EIHU. Bflrfllmente pouco usados na fala quotidiana e que existem principalmente tente. Como o inglês pode, evidentemente, ser tomado como
como uma reserva disponível para os casos em ue a discrim` " "
se faz necessária. q maçao cspeclfica representante das línguas européias, é a êsse aspecto que se
_.
G
Os_ têrmos que denotam parentes afins sofrem uma mudança vocálica para O
deve atribuir a verdadeira diferença entre os sistemas a que se
lfldlcfll' que 0 parente de ligação já é falecido. tem dado 0 nome de classificatórios e os chamados de des-
critivos.
_Ve1`1f1°a"Se que 0 ÍUEÍÊS dá expressão a apenas quatro ca- *diferença: Os assim chamados sistemas descritivos expressam um nú-
Í°801'l21S.
«co ~ J:
C0m exceção,
À
porém,
. A
da única palavra estrangeira
_
descritivos
mero reduzido de categorias de parentesco de forma completa;
usm , cada termo em ingles envolve o reconhecimento de 'classifi.'
os errôneamente denominados sistemas classificatóri-os expressam

18 19
mas expressa o sexo de quem fala. Os dois têrmos recí-
'img Êum°f°_ maior ÕÊ categprias com menos regularidade. Visto procos, portanto, envolvem, cada um, uma categoria
so esse prisi.na,, o sistema ingles e o menos classificatório; visto
*depende da que o outro não expressa. Se as mesmas categorias esti-
pelo prisma indigena, é o mais classificatório, pelo fato de que
perspectiva vessem representadas nos dois têrmos, o correspon-
Íniiênqâdaretpâqps qeäqxa de relconhecer certas distinções freqüente- dente de filha do irmão seria irmã do pai, e a recipro-
sob a qual é
visto cidade exata scria impossível. Quando, pois, os têrmos
e compparativa , nenhi(igiriiSê`:ldi1g}las,°VlStO
e mais nemnuma perspecilya
menos gfeial
classificatorio. encontrados forem irmã do pai e filhos do irmão de
_ _ Em suma, o conceito prevalecente do sistema classificatório uma mulher, fica evidenciado que a tendência para o
* classif. cai inteiramente por terra, quando cuidadosamente analisado. E,
cai por terra estabelecimento de têrmos precisamente reciprocos foi
na medida que houver alguma diferença fundamental no método mais forte do que a preferência pelo uso ou abandono
de denotar o parentesco entre as línguas dos povos europeus consistente de certas categorias; em outras palavras, é
e dos menos civilizados, ela só pode ser determinada na base a fôrça da tendência à reciprocidade que determina a
** diferença das categorias descritas, e só por meio delas pode ser clara- medida em que certas categorias aparecem expressas.
só na base mente expressa.
das categorias
descritas
As categorias servem também para indicar as características
Ha casos em que se observa uma tendência sensível centrais de sistemas da mesma natureza geral. É óbvio, por
para a expressao reciproca, a qual pode influenciar O exemplo, que a diferença mais importante entre o Dakota e o
grau em que as categorias recebem expressão. Os têrmos Arapaho é a forte tendência do primeiro para reconhecer o sexo
reciprocos sao aqueles em que tôdas as pessoas incluí- de quem fala. O Chinook chama a atenção pelo fato de dar
das no parentesco expresso por um dado têrmo empre- mais ênfase ao sexo do falante e do parente intermediário da
gam um nome para chamar tôdas as pessoas que relação do que ao sexo do próprio parente designado -- sem
expressao
empregam esse termo com relação a elas. Na forma dúvida devido ao fato de que o sexo dêste pode ser indicado
reciproca
mais extrema de reciprocidade, os dois grupos de pa. por meios puramente gramaticais. Diferenças gerais como
rentes referem-se uns aos outros com o mesmo têrmo as que naturalmente ocorrem entre as línguas de diferentes re-
Os avós paternos chamam os filhos dos filhos meninos
› 3
giões podem também ser expressas em têrmos dessas categorias.
?Utm¢f111'la_S, P610 mesmo nome pelo qual as crianças, Todos os sistemas da Califórnia, por exemplo, dão muito mais
an o meninos como meninas, chamam os avós. No ênfase ao sexo do parente intermediário do que qualquer das
entgnto, a reciprocidade da relação fica igualmente clara, línguas da Planície examinadas. Os sistemas. das planícies são
em ora menos marcadamente expressa, quando cada notáveis pelo pouco desenvolvimento que dão à distinção entre
grupo usa um termo diferente em relação ao outro. parentesco linear e colateral, a qual só encontra expressão em
N°§Sa5 Pifllf-1Vf_äS pai re filho, ou irmã ea irmão, não são dois terços dos casos em Dakota, metade dos casos em Arapaho,
repciprocas, pois o termo filho e empregado também pela um quarto em Pawnee. Em sete línguas da Califórnia, as propor-
fflafš C Irmão e^ empregado tanto pelo irmão como pela ções correspondentes vão de três quartas partes à expressão com-
irma. Em ingles, o unico têrmo recíproco é “cousin” pleta. O método pode ser aplicado com sucesso mesmo no caso
A tendência à expressão recíproca é desenvolvida em de áreas geográficas menores e contíguas. Das sete línguas da
muitas linguas indigenas. E particularmente forte na Califórnia, Luiseño e Mohave são faladas na região meridional.
California. Em algumas línguas essa tendência trouxe Seus sistemas apresentam uma unidade, quando confrontados com
Ct0p1_0d conseqüpncia que diferentes categorias estão en- os das cincos línguas da Califórnia central e setentrional. Ambas
voƒri as nos ,termos aplicados a um par de parentescos as línguas do sul têm uma quantidade maior de têrmos; ambas
mu uos. Odtermo irma do pai indica o sexo do parente, dão mais fôrça à expressão das categorias de sexo do parente
mas nao o .o falante. O reciproco exato de irmã do pai
e filho ou filha do irmão de uma mulher Este têrmo intermediário e de idade dentro da mesma geração; e marcam
1 .-..- . . ' 9
porem, nao indica o sexo do parente a que se refere,
menos do que as demais a categoria de sexo do parente. Um
21
20
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caso ainda: o Chinook e o Skokomish, ambos da costa do Pací- o casamento entre primos era ou fôra a regra entre os Sioux,
fico Norte, ass-emelham-se no fato de indicarem a condição de situação esta inteiramente contrária aos princípios básicos de
1
parente intermediário e de deixarem de fazer, devido à exis- quase tôda sociedade indígena.
tência na língua de gênero gramatical de sexo, a distinção dos
** razão - fusao A razão do uso de têrmos idênticos ou semelhantes para
I sexos dos próprios parentes, em vários dos têrmos de parentesco.
Há, porém, uma diferença profunda entre as duas línguas, no - semelhançaparentescos distintos está na semelhança entre ^oS_ parenteSC0S-
fato de que o Skor/comish ignora tanto quanto o inglês o sexo de
entre os O primo de uma mulher e seu cunhado sao identicos no sexo,
parentesco. em pertencerem ambos ao sexo oposto ao da peSSoa que fille,
quem fala e dos parentes intermediários, ao passo que o Chinook - categorias em serem de sua mesma geração, e em serem colaterais; de
_ """-¬-~m-. nr«z¬-
geralmente expressa ambas as categorias. Em suma, as cate- de identidademodo que são quatro as categorias nas quais apresentam^ iden-
*
gorias constituem um meio de compararem-se sistemas de têrmos
de parentesco na base das linhas-mestras das suas estruturas, tidade Diante do número relativamente pequeno de te1'm0S,
e de se expressarem as semelhanças e diferenças entre êles inde- se comparado ao de parentesc-osâ possíveis, e natural dquetí:
pendentemente de seus têrmos individuais ou detalhes menores. mesma palavra ou raiz seja por vezes empregada Para 3110 a
dois parentescos tendo tantas coisas em comum quanto eSSeS
O motivo que levou a tão ampla aceitação de uma idéia dois. _
vaga e insatisfatória sôbre o sistema de parentesco classifica-
tório deve ser procurado não em qualquer interêsse pelas * A ninguém ocorreria supor que _o modo costumeiro eum
designações de parentesco em si mesmas, mas no fato de terem uso do termo inglês coloquial de_ referir-se ao proprio cuäihado comq irmã;
* problema: os têrmos de parentesco sido vistos, costumeiramente, como sem tem qualquer implicaçao quanto a forma .e dcasamendo, psa
tiraram dos termos material a partir do qual se pudessem tirar inferências con- implicação pela lógica to uso do termo so poderia_ser 111 lCflÇa0d a C 1
de parentesco qto à forma mento sororal. Pode-se facilmente imaginar qàie nunài _ eS:[Êr1\/(Z)š
cludentes quanto à organização de sociedade e condições de de casamentovimento futuro do ingles o mais complicado estes ois
inferencias sobre casamento. Se se tivesse percebido com maior clareza que os rm
org.social e (N do T' brother-in-law, brother) venha a desaparecer do
têrmos de parentesco decorrem primeiramente de fatôres lin-
casamento.
güísticos, e são apenas indireta e ocasionalmente afetados por uso diário, tendo seu lugar tomado pelo mais curto deleS,_ 5613
que isso signifique qualquer mudança de condiçoes sociais o
termos de paretesco circunstâncias sociais, ter-se-ia compreendido há mais tempo matrimoniais.
decorrem de fatores que a diferença entre sistemas descritivos e classificatórios é
linguísticos subjetiva e superficial. Nada é mais precário do que o método * causas As causas determinantes da formação, escolha e seme-
A
linguisticas lhanças de termos .
de_parentesco ~ antes de tudo lingu
sao ' "ísticas.
ç O
usual de deduzir-se a existência recente de instituições sociais (termos par.) Os que desejam considerar a terminologla dg Pafaâteäšdãoäs
ou maritais partindo de designações de parentesco. Mesmo - não sociol. devida a causas sociologleas e como indica ora^ ep tÇ de
quando o estado social é perfeitamente condizente com as ex- sociais ficam concomitantes obrigados a provar esse pon o
i
ii
pressões de parentesco, não é prudente concluir-se, sem outras vista. _ i d d

i evidências corroboradoras, que essas expressões refletem ou


resultam diretamente daquele estado.
Na língua Dakota, segundo Riggs, há um só têrmo para
avô e sogro. Segundo o modo de raciocínio às vêzes empre-
ex: irmão do Mesmo os casos em que o irmao dO Pal 5 Chama 0 6
pai chamado pai não são necessariamente devidos ou ligados ao costume do
de pai nao levirato; nem se pode inferir a existência de casamento de grupo
indica
do fato freqüente de se usar o mesmo termo para irma da mãe
levirato antes.
gado, poder-›se-ia deduzir que os dois parentescos haviam em e mãe. Uma mulher e sua irma se assemelham mais do que
alguma época sido idênticos. Levada até às suas últimas impli- uma mulher e seu irmão, mas a diferença é conceptual, ou seja
cações, a conclusão absurda seria a de que era costumeiro lingüística, ao mesmo tempo que sociológica. É verdade que
entre os Sioux casar-se com a própria mãe. a irmã da mulher pode tomar-lhe o lugar em inumeras funçoes
e relações em que o irmão nao pode; ainda assim, o fato e que
Nessa mesma língua, as palavras para primo da mulher e
uma mulher e sua irmã, sendo do_mesmo sexo, compartilham
para cunhado da mulher têm o mesmo radical, diferindo apenas uma categoria de parentesco a mais do que ela e Sell Emef),
num sufixo. Raciocinando dêsse modo diríamos nesse caso que sendo portanto de um parentesco mais semelhante, e mais fa-
um parentesco
mais semelhante
22 23

l
ll- I

l i

ciliiicnte denotadas pelo mesmo têrmo. Os casos em que a ex- 3) A diferença fundamental entre os sistemas de têrmos
-psicológicos pressão de parentesco não poderia ser determinada por fatôres de parentesco europeus e o dos indígenas americanos esta no
sociológicos, e sim puramente psicológicos, são tão numerosos, número menor de categorias de parentesco expressas pelos pri-
como vimos nos exemplos acima, que parece justo preferir meiros, e à expressão mais completa que lhes dao.
atribui-los a causas psicológicas, ou ao menos admiti-las como
igualmente prováveis, mesmo quando ambas as explicações 4) Os têrmos de parentesco refletem a Psicologia, não
forem igualmente admissíveis e faltarem outras evidências que a Sociologia. São determinados, antes de mais nada, pela
dêem fundamento a uma das alternativas. língua e só com muita prudência podem ser utilizados como
3

fontes de inferências sociológicas.


Numa perspectiva ampla, é inerentemente pouco prová-
vel, em qualquer caso particular, que o uso de têrmos idênticos
para parentescos semelhantes se possa ligar a costumes tão
1- expres. linguistica específicos quanto o levirato ou o casamento de grupos. É
2- cond. sociais
muito mais prudente considerarem-se tanto as formas de ex-
....decorrentes...
pressão lingüística quanto as condições sociais como decor-
rentes do fato sempre igual a si mesmo de que algumas rela-
** relações que se ções se parecem mais entre si do que com outras. Este simples
assemelham fato ocasionaria, por um lado, certas instituições sociais e, por
outro, certas identificações psicológicas expressas na língua.
Ligar por um nexo causal as instituições e os têrmos raramente
deixaria de ser demasiado afoito. A Antropologia dos anos
recentes teve como uma característica pouco feliz a de ter insis-
tentemente procurado causas específicas para eventos especí-
ficos, entre os quais as conexões só podem ser estabelecidas
através de evidências selecionadas subjetivamente. Com o
aumento de conhecimentos e com a libertação de preconceitos,
vem-se tornando cada vez mais evidente que explicações causais
de fenômenos antropológicos isolados raramente podem ser en-
contradas em outros fenômentos isolados e que sé difícil até
mesmo especificar -como causas imediatas de fenômenos par-
ticulares as tendências mais gerais que ocasionam as formas
de cultura.
Chegamos assim às seguintes conclusões:

s 1) A distinção geralmente aceita entre sistemas de paren-


tesco descritivos e sistemas classificatórios carece de uma base
de sustentação.
2) Os sistemas de têrmos de parentesco podem ser com-
parados de forma adequada através de um exame de categorias
de parentesco que envolvem e do grau em que estas categorias
recebem expressão.

24

._ ..._ _í___.

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