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TRIBUNAL MARÍTIMO

AR/NCF PROCESSO Nº 29.038/14


ACÓRDÃO

L/M “MAGIA DO SOL” e moto aquática “TÔ DE ORIUDE”. Abalroamento pela


popa da moto aquática que caracteriza a manobra da lancha como alcançadora e,
assim, deveria se manter fora do caminho da embarcação que é alcançada. Erro de
navegação do piloto da lancha. Condenação.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.


Tratam os autos do abalroamento entre uma lancha e uma moto aquática, ocorrido
no dia 19 de janeiro de 2014 durante a navegação no Rio Paraíba, em Cabedelo, PB, causando
ferimentos nos passageiros da moto aquática e danos materiais de pouca gravidade nas duas
embarcações.
Envolveram-se no acidente a L/M “MAGIA DO SOL”, com 4,61m de
comprimento, 2,25m de boca e 2,7 AB, construída em fibra de vidro e movida por um motor da
marca Yamaha com 90hp, classificada para o transporte de passageiros em navegação interior,
inscrita na CPPB sob a propriedade de Marks Johns Machado, mas apresentou-se como
proprietário de fato o Sr. Tácio Vinícius Alves Menezes, conduzida no momento do acidente
pelo ARA Thiago Picanço Araujo e a moto aquática “TÔ DE ORIUDE”, com 3,23m de
comprimento, da marca Yamaha com 110hp de potência, classificada para Esporte e Recreio em
área de navegação interior, inscrita na CPPB sob a propriedade de Moacyr Borborema
Arcoverde, conduzida no momento do acidente pelo Motonauta John Mickeul Bahia da Rocha.
Durante o inquérito ouviram os condutores das embarcações, os proprietários de
fato e de direito da lancha, os passageiros da moto aquática e um funcionário da marina para
onde levaram os feridos. De seu depoimento se apurou que as duas embarcações seguiam na
direção da Praia do Jacaré, em Cabedelo, PB, a partir da Prainha, localizada em Lucena, PB,
navegando pela margem direita do Canal do Porto Velho, a cerca de 1 milha náutica da
comunidade de Forte Velho, em Santa Rita, PB, quando a moto aquática teve a popa atingida
pela lancha. O piloto e seus dois passageiros caíram na água, a lancha veio em seu socorro e
levou os feridos até a Marina Jacaré e de lá um deles foi levado por uma ambulância para um
hospital em João Pessoa onde chegou ainda desacordado, mas foi atendido e não teve sequelas
mais graves além de escoriações pelo corpo. As embarcações permaneceram na marina e foram
vistoriadas por uma equipe da Capitania que se encontrava em uma marina vizinha no momento
em que a lancha chegou com os feridos.

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O piloto da moto aquática e os passageiros afirmam que foram atingidos por trás e
não viram a aproximação da lancha, atribuindo ao piloto daquela embarcação a culpa pelo
acidente.
O piloto da lancha disse que a moto aquática teria cruzado sua proa e que a
conduzia pois seu proprietário não seria habilitado e o proprietário de fato, que estava a bordo
como passageiro, disse que a moto aquática navegava à frente da lancha e parou repentinamente,
tendo ambos atribuído o acidente à ação do piloto da moto aquática.
O empregado da marina nada declarou de relevante para desvendar as ações que
resultaram no acidente e o proprietário de direito da lancha afirmou que a vendera ao proprietário
de fato, apresentando cópia do contrato de compra e venda. Disse que a propriedade ainda não
havia sido transferida, pois faltavam ainda duas prestações a receber.
Segundo os peritos da Capitania as embarcações encontravam-se em bom estado
geral, havendo apenas pequenas avarias no bico de proa da lancha e arranhões na bochecha de
bombordo da moto aquática. Apuraram também que no momento do acidente a maré era de
enchente, havia ondas no sentido SE/NE entre 1m e 2m e vento na mesma direção com
intensidade fraca, em torno de 2 nós, céu claro e visibilidade boa. Afirmaram que o condutor da
moto aquática, Sr. Alysson Gonçalves Neiva Monteiro, teve um corte na cabeça na altura da
orelha direita e escoriações no tornozelo esquerdo e sua passageira, Sra. Jéssica Priscila, teria
sido atingida pela cabeça do condutor da moto aquática, sem detalhes da gravidade de seus
ferimentos. A perícia é ilustrada com fotos das embarcações, fotos do local do abalroamento e
um croqui com a posição das embarcações plotadas sobre uma cópia da Carta Náutica do local,
além da tábua de marés, da Carta de Pressão ao Nível do Mar da data do acidente, fotos dos
feridos, um extrato da NORMAM-03/DPC com Recomendações ao Navegante (Anexo 4B) e a
Ficha de Registro da abalroação.
Com base nessas provas o encarregado do inquérito concluiu que o acidente ocorreu
em virtude do descumprimento da Regra 13, letras “a” e “b” (ações durante a ultrapassagem) e
da Regra 16 (ações da embarcação obrigada a manobrar), do RIPEAM, por parte do condutor da
lancha, apontando como possível responsável o ARA Thiago Picanço Araujo, que foi notificado
do resultado do inquérito, mas não apresentou defesa prévia.
Os autos foram remetidos ao Tribunal Marítimo que os encaminhou à PEM, que
ofereceu Representação em face deThiago Picanço Araujo, por entendê-lo responsável pelo
acidente da navegação previsto no art. 14, alínea “a” e pelo fato da navegação previsto no art. 15,
alínea “e”, ambos da Lei nº 2.180/54.
Depois de resumir os principais fatos narrados no inquérito a PEM afirmou que o

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representado infringiu as normas e procedimentos estabelecidos para uma navegação segura,
pois o trecho do canal onde navegavam era largo, havendo espaço considerável para que
ultrapassasse a moto aquática sem oferecer riscos, mas que, desatento à navegação, acabou por
provocar o acidente. Pediu, assim, sua condenação nas penas da Lei e ao pagamento das custas
processuais, em razão de sua conduta negligente e imperita na condução da lancha.
Ressalta a PEM no fim da inicial que a lancha estava com sua a apólice de seguro
DPEM vencida por ocasião do acidente, pedindo que a representante local da Autoridade
Marítima seja oficiada para tomar as providências devidas no sentido de penalizar o proprietário
da embarcação por essa falha administrativa que não guarda relação com o acidente em si.
A representação foi recebida na Sessão Ordinária do dia 28 de abril de 2015, o
representado foi citado pelos Correios e apresentou contestação por meio de advogado próprio
devidamente constituído, que em sua defesa afirmou que os fatos narrados na inicial como sendo
a dinâmica do acidente estão errados. Na verdade a lancha conduzida por ele seguia a 25 nós de
velocidade quando a moto aquática o teria ultrapassado por boreste e em seguida diminuiu
bruscamente a velocidade em proximidade perigosa da lancha, provocando o abalroamento.
Ressaltou que o acidente não resultou em danos graves, que a lancha prontamente socorreu os
acidentados, que as regras do RIPEAM teriam sido cumpridas por ele e que o acidente decorreu
de culpa do condutor da moto aquática. Afirmou que não agiu com negligência, pois essa se
caracteriza por uma clara omissão na observância de um dever de cuidado obrigatório por parte
do sujeito causador do dano, o que não teria ocorrido no caso e afirmou que tampouco agiu com
imperícia, e que a definição do termo seria a inaptidão técnica no exercício de arte, ofício ou
profissão e que essa se configuraria quando um agente causa danos a outrem por falta de
conhecimentos técnicos que deveria em virtude de sua qualificação profissional, o que não se
pode dizer do contestante, pois ele seria habilitado legalmente. Pede para ser exculpado ou, caso
não seja esse o entendimento da Corte Marítima, que a ele seja aplicada pena mínima de
advertência, face à sua primariedade, da pequena gravidade do acidente e pelo pronto
atendimento dado às vítimas.
Aberta a instrução nenhuma prova foi produzida e em alegações finais a PEM se
manifestou reportando-se à inicial.
É o relatório.
Decide-se:
A PEM acusou o representado de ter infringido as normas e procedimentos
estabelecidos para uma navegação segura, uma vez que deu causa ao acidente apesar de o trecho
do canal onde navegavam ser largo havendo, desse modo, espaço considerável para que

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ultrapassasse a moto aquática sem oferecer riscos, mas que, desatento à navegação, acabou por
abalroá-la.
Em sua defesa afirmou que o acidente teria ocorrido de modo diverso e que
navegava a uma velocidade de 25 nós quando foi ultrapassado pela moto aquática que, em
seguida, teria parado à sua frente, impedindo-o de manobrar com eficiência para evitar o choque.
A tese da defesa não encontra respaldo nas provas dos autos e, assim, deve ser
rejeitada.
As três pessoas que estavam a bordo da moto aquática afirmaram que trafegavam
em baixa velocidade quando foram atingidas por trás pela lancha. O relato do acidente feito pelo
próprio proprietário de fato da lancha que estava a bordo como passageiro confirma que o
choque se deu pela popa da moto aquática, afirmando, entretanto, que essa seguia à frente da
lancha e teria diminuído repentinamente a velocidade, o que não é suficiente para desfazer a
culpa do representado.
Quem tem uma embarcação à sua frente deve se manter fora do caminho dessa, uma
vez que não é uma ação inesperada que aquela diminua sua velocidade ou mude seu curso. É
dever do condutor da embarcação que alcança manter sua embarcação fora do caminho da
embarcação que será alcançada, considerando-se duas embarcações nessa condição quando uma
se aproxima da outra vinda de uma direção de mais de 22,5º por ré do través da embarcação que
vai à frente. A ultrapassagem deve ser feita com antecedência, à maior distância possível,
inclusive para evitar a inteiração entre as embarcações, a manobra deve ser clara e deve ser
sinalizada por meio da buzina, de maneira que quem segue a frente não tenha dúvidas sobre a
intenção de quem vem ultrapassando. São regras contidas no RIPEAM que não foram
observadas pelo representado.
Dessa forma, o acidente da navegação constante do art. 14, “a”, da Lei 2.180/54,
ficou bem caracterizado nos autos pelo abalroamento entre uma lancha e uma moto aquática, que
foi atingida pela popa. Como consequência do acidente anotou-se danos materiais de pequena
monta e em ferimentos de natureza leve em dois dos três ocupantes da moto aquática. A causa
determinante do acidente foi a aproximação indevida da lancha em relação à moto aquática em
uma situação que caracteriza uma ultrapassagem.
Deve-se, assim, julgar procedente a representação para responsabilizar o
representado pelo acidente da navegação em razão da falta de perícia demonstrada na manobra.
Na aplicação da pena deve-se levar em consideração que ele prestou imediato socorro às vítimas
e com sua ação conseguiu minimizar os danos causados pelo acidente.
Assim,

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ACORDAM os Juízes do Tribunal Marítimo, por unanimidade: a) quanto à natureza
e extensão do acidente da navegação: abalroamento entre lancha e moto aquática, com danos
materiais de pequena monta e ferimentos de natureza leve nos passageiros da moto aquática; b)
quanto à causa determinante: erro na manobra de ultrapassagem da moto aquática; e c) decisão:
julgar o acidente da navegação constante do art. 14, alínea “a”, como decorrente da imperícia do
representado Thiago Picanço Araujo, aplicando-lhe a pena de repreensão e multa no valor de R$
500,00 (quinhentos reais) e ao pagamento das custas processuais, com fulcro no 121, inciso I e
VII, c/c art. 124, inciso I e 139, IV, “a”, todos artigos da Lei nº 2.180/54.
Publique-se. Comunique-se. Registre-se.
Rio de Janeiro, RJ, em 21 de novembro de 2017.

NELSON CAVALCANTE E SILVA FILHO


Juiz Relator

Cumpra-se o Acórdão, após o Trânsito em julgado.


Rio de Janeiro, RJ, em 20 de fevereiro de 2018.

MARCOS NUNES DE MIRANDA


Vice-Almirante (RM1)
Juiz-Presidente
PEDRO COSTA MENEZES JUNIOR
Primeiro-Tenente (T)
Diretor da Divisão Judiciária
AUTENTICADO DIGITALMENTE

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COMANDO DA MARINHA
c=BR, st=RJ, l=RIO DE JANEIRO, o=ICP-Brasil, ou=Pessoa Juridica A3, ou=ARSERPRO, ou=Autoridade Certificadora SERPROACF, cn=COMANDO DA
MARINHA
2018.03.14 10:47:35 -03'00'

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