Boletim Operário 486
Caxias do Sul, 24 de março de 2018.
A Época
Rio de Janeiro
03 de setembro de 1912.
Página 6
Edição 35
Coluna Operária
Os deportados
Senhores que dominam, imperam sobre
tudo escravizam o povo e matam
consciências; que procuram manter o
império – iniquidade; que torcem e
aniquilam os gestos de revoltosos, dos que
anunciam liberdade; que engradam,
deportam e decepam aqueles que, heroicos,
vão singrando pelo mar das ambições, o
ramo do futuro; que a pata de cavalo e a
metralha estrangulam a razão, amparam a
mentira – violentando o trabalho, salvando o
capital; Senhores que não sentem a dor da
multidão, que há muito se revolta, que há
muito vem lutando, por um pouco de justiça,
um pouco de conforto.
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Reparai bem: a vossa tirania, em vez de
amortecer os ânimos, exalta as forças,
aviventa! Inútil tirania – a rebeldia aumenta!
Não pensem que a Sibéria, o Acre, o rude
exílio, tornam pesadelo a nós que assim
lutamos, enfrentando as barreiras da injúria e
da calunia, desprezando o martírio da prisão,
sorrindo a morte pela vitória do ideal e como
Ferrer em Montjuïc, ao cair pelas balas de
inconscientes soldados ao mando de verdugos
– vivando a Escola Moderna.
Não nos atemoriza este cortejo imenso que
forma o sustentáculo da podre sociedade!
Apenas nos revolta a rubra tirania –
acorrentando a justiça, tolhendo a liberdade e
deixando ecoar de norte a sul a vil inquisição
sobre o covarde pretexto de “garantir a
estabilidade da família brasileira barbaramente
ameaçada por perigosos indivíduos”.
Irrisão! Onde estão os perigosos indivíduos
senão no vosso seio, roubando, assassinando e
escravizando tudo, para serem senhores do
luxo, da vaidade, vivendo do supérfluo que
falta aos que trabalham a estes que deportam
por serem estrangeiros!
Porque são estrangeiros? Porque não tem
palácios, ouro e brilhantes, como muitos que aí
vivem do seu trabalho e não exploram
ninguém?!
Vejamos como é torpe a lei que nos governa e
o há de ser enquanto existir vejamos como é
vil, traiçoeira, a déspota justiça da nossa
autoridade; vejamos enfim como é ambiciosa a
insaciável burguesia estrangeira ou brasileira.
Porque foram deportados quatro operários?
Porque conscientes que eram colocaram-se ao
lado, orientando e guiando, aos caros
companheiros que, em Santos, lutavam por um
pouco mais de bem estar. Simplesmente por
isso serem inteligentes e não por serem
estrangeiros que é o pretexto.
Não confundam senhores autoritários energia,
altivez e rebeldia com desordem, com roubo e
o caftismo.
Workers’ Bulletin
A desordem, o roubo e o caftismo existe sim,
mas vós o praticais.
O próprio Jornal do Comércio ocupando-se da
greve de Santos disse ser ela patrocinada por
indivíduos anarquistas. Pois seja. Nunca,
porém por desordeiros, ladrões ou caftens.
Em nosso seio o que não presta, o que é inútil,
não viceja, não enraíza, marcha para o lado
oposto.
Se estes Companheiros eram tudo isto que
parte da imprensa disse e sendo eles como os
outros deportados todos de São Paulo, porque
então fizeram esta distinção entre eles
enviando para esta capital quatro e aqui
embarcaram a força como bravata da policia
carioca e os outros da paulista?
É simples a explicação, quatro eram homens,
que pensavam livremente e por isso urgia que
se fizesse constar serem todos da mesma
camada evitando assim qualquer opinião a
esse respeito, desfavorável ao ato heroico da
policia.
Mas enganam-se a opinião daqueles que
pensam com critério e não estão sujeitos a
peias de espécie alguma, não se confunde nem
se torce com tanta facilidade.
Seria mais digno que ficasse bem confirmado,
mas noticias que rolam por certos jornais,
talvez até informados que foram expulsos do
território nacional vinte e três indivíduos,
sendo dezenove por serem desordeiros,
ladrões e caftens e quatro na qualidade de
perigosos anarquistas estrangeiros.
Mas prossigais na vossa obra que nós
prosseguiremos na nossa – vós formais o
conceito das ambições, iniquidades,
opressões, inquisição moderna; e nós no
conceito da luta há muito iniciada iremos
adubando e tonificando com as nossas
energias a pureza do nosso ideal – a pequena
arvores que plantamos ao lado daquela já
velha e carunchosa, que vai morrendo aos
poucos, ao sopro e as rajadas do vento
revolucionário.
E os deportados irão levar os germens à
semente deste grande ideal além, onde ele
ainda for ignorado.