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A perceção da profundidade

A perceção da profundidade é a capacidade de percecionar os objetos


tridimensionalmente ( em 3 dimensões), avaliando a sua distância. Representa um
importante desafio à nossa capacidade percetiva. Porque? Porque as imagens que
recebemos dos objetos físicos são bidimensonais, e a realidade física é tridimensional.
Por outras palavras, a imagem que de um mundo tridimensional se projeta na retina é
bidimensional.
Como sabemos que os objetos no espaço têm profundidade e como temos a
noção de distância se as imagens projetadas na retina são planas e bidimensionais? A
resposta está em dois tipos de informação que usamos para a perceção da
profundidade: os indicadores binoculares (dois olhos) e os indicadores monoculares
(um olho).

• Os indicadores binoculares
Os indicadores binoculares são indicadores de profundidade qe dependem do
funcionamento simultâneo dos dois olhos.
Ao contrário das gazelas e das zebras, que têm os olhos em cada um dos lados da
sua cara, nós e outros animais, como os leões e os tigres, temos os olhos colocados na
zona frontal. Possuímos visão binocular, este tipo de visão permite o uso de dois
indicadores de profundidade: a convergência e a disparidade retinal.

A convergência é o indicador que se refere ao facto de os olhos se retraírem


(parecem mover-se para dentro) quando um objeto se aproxima e de se expandirem
(parecem mover-se para fora) ou divergirem quando m objeto se afasta. Segure num
lápis e lentamente aproxime-o do seu nariz. À medida que vai movendo o lápis na
direção do nariz, os olhos como qe se retraem para seguir o movimento do objeto.
A disparidade retinal é um indicador para a perceção da profundidade de
acordo com o qual quanto mais próximo está o objeto de quem o perceciona tanto mais
diferente é a sua imagem na retina.
A quantidade de disparidade retinal de que temos experiência varia em função
da distância a que vemos um objeto. O cérebro usa essa quantidade para calcular a que
distância o objeto està, e assim percecionamos a profundidade dos objetos no mundo.
Fala-se de disparidade porqe as imagens que cada um dos olhos vê são ligeiramente
diferentes. O cérebro organiza as duas informações recebidas nas retinas, formando
uma só imagem que dá a impressão de profundidade e distância.

• Os indicadores monoculares
Os indicadores monoculares são indicadores de profundidade que se baseiam
no funcionamento independente de cada olho.
As pessoas que só veem de uma vista não possuem indicadores binoculares para
a perceção da profundidade, mas, apesas disso, ocorre nelas este processo percetivo.
Porquê? Porque há indicadores monoculares de profundidade, ou seja, indicadores que
podem ser recebidos por ma só vista.
Muitas pessoas apreenderam o que são estes indicadores quando em crianças
começaram a desenhar e a pintar. Sem o saber, estavam a aprender sobre o problema
da perceção. Quem pinta defronta-se com o problema de representar m mndo
tridimensional numa tela ou numa folha que é bidimensional. Uma folha e uma tela não
têm profundidade. Por isso, todos os elementos de um quadro estão à mesma distância
da nossa vista. Como temos então a perceção de profundidade em quadros e
fotografias? Através de um indicador monocular denominado tamanho relativo dos
objetos, ou seja, através da perceção de que os objetos mais afastados criam ma
imagem retinal menos do que os objetos mais próximos.

A perspetiva linear designa o facto de que quanto mais longe está um objeto
menos espaço ocupa o nosso campo visual. Com a distância, as linhas paralelasde
autoestradas, vias férreas e rios convergem em termos percetivos, atingindo
eventualmente um ponto em que o paralelismo se desvanece. Quanto mais as linhas
convergem maior é a distância percecionada.
Como a maioria dos objetos não é transparente, os que estão mais próximos de
nós bloqueiam parcial ou totalmente a visão de objetos mais distantes. O indicador
denominado interposição dá-nos uma forma de julgar distâncias relativas.

As leis da perceção: o contributo da teoria da Gestalt

Como percecionamos as formas dos objetos do mundo?


A constância percetiva e a perceção em profundidade são importantes
componentes do processo percetivo. Mas como percecionamos a forma cilíndrica de
uma lata de Coca-Cola ou a forma retangular de uma caixa de chocolates belgas?
A resposta mais influente pertenceu a um grupo de psicólogos alemães – Max
Wertheimer, Wolfgang e Kurt Koffka -, que formaram a escola Gestaltista antes da
Segunda Guerra Mundial.
O termo Gestalt significa «forma», «padrão» ou «configuração». Segundo os
defensores desta perspetiva, organizamos naturalmente a nossa perceção de acordo
com certos padrões. O princípio fundamental do Gestaltismo enuncia-se do
seguinte modo: o todo é igual à simples soma das suas partes.
Por exemplo, quando vemos um filme, o movimento que observamos não pode ser
encontrado no próprio fiome, na película a partir da qual é projetado. Se olharmos
para a película, vemos «quadros» separados e estáticos semelhantes a fotografias.
Quando vemos o filme, esses «quadros» são o que vemos, mas vemos vários por
segundo. Ou seja, quando vemos o filme, percecionamos esse estímulo como um todo. A
mente agrupa os vários elementos que constituem o referido objeto num todo
coerente, e por isso vemos um rosto.
Uma das maiores contribições da teoria da Gestalt foi a formulação do
conjunto de leis segundo as quais tentaram explicar como a mente automaticamente
interpreta os estímulos sensoriais para produzir a perceção de uma forma organizada.
Ao princípio de qe o todo é mais do que a soma das suas partes acrescentavam várias
leis fundamentais. As leis da figura-fundo e as leis do agrupamento percetivo.

A lei da figura-fundo

Esta lei diz o seguinte: a primeira coisa que fazemos quando percecionamos
é separar o que é figura do que é fundo. É a chamada lei da figura-fundo. Por
outras palavras, percecionamos uma figura que se destaca sobre um fundo que fica em
segundo plano.
Isto quer dizer qe centramos a nossa atenção em alguns objetos do nosso
campo visual, excluindo outros. Não vemos figura e o fundo ao mesmo tempo.
Percecionamos ora uma ora outra, como se fosse um flip-flop.

• As leis do agrupamento percetivo


Além da lei geral da figura-fundo, os gestaltistas elaboraram uma série de
leis configurativas que definem a forma de agrupar os estímulos percetivos e que
explicam o facto de, em cada caso, todos nós termos perceção da mesma figura. Essas
leis específicas sáo as da proximidade, semelhança, continuidade, fechamento e
simetria.
(b)Semelhança (c)Continuidade (d)Fechamento (e)Simetria
(a)Proximidade Xo x
x ox
x ox

Leis

✔ Proximidade: Quando percecionamos um aglomerado de objetos (estímulos


percetivos), tendemos a ver os objetos que estão próximos uns dos outros como
formando um grupo ou unidade. a) Não vemos 4 círculos, mas grupos de círculos.
✔ Semelhança: Os objetos semelhantes ou em posição semelhante são, por
tendência, agrupados juntos ou vistos como ma unidade. Assim, em b) vemos
alternadamente filas de Xs e Os.
✔ Continuidade: É tendência da nossa perceção ver formas suaves ou contínas em
vez de formas descontínuas. A figura c) mostra linhas cruzadas que percecionamos
como uma linha reta intersetando uma linha curva em vez de ângulos disjuntos.
✔ Fechamento: Figuras incompletas tendem a ser vistas como completas. A figura
d) mostra-nos segmentos, linhas desligadas, que fechamos mentalmente de modo a ver
um trângulo e um círculo.
✔ Simetria ou Simplicidade: Tendemos a organizar os estímulos percetivos ou
objetos da forma mais simples possível. A figura e) mostra-nos um diamante e um
círculo divididos em partes simétricas.
Perceção e cultura
Dê atenção ao desenho apresentado ao lado. Representa uma cena interior
ou exterior? Que pistas nos podem ajudar a responder à questão? Se for como eu ou,
melhor dizendo, se pertencer à cultura que pertenço, diré que se trata de uma cena
que se desenrola dentro de casa.
Como justifica essa perceção? Assumindo que a figura retangular atrás da
mulher qe está sentada ao lado esquerdo é uma janela revelando vegetação lá fora.
Além disso, a fiura em forma de Y que se destaca do lado direito parece indicar que
há um teto. Parece pacífica esta perceção, mas indivíduos de culturas de África
Oriental descreveram que se tratava de uma cena familiar na qual a mulher referida
transporta um pacote volumoso à cabeça, uma situação frequente no dia a dia da
região. Tratava-se para essas pessoas de uma cena exterior, afirmando alguns que o
objeto que para nós indicaria um teto representava ma árvore o ma proteção contra o
Sol. Este exemplo mostra como uma cultura inflencia o que vemos e o modo como
interpretamos o que vemos.
Outro exemplo de influência cultural na perceção foi dado pelo
antropólogo Colin Turnbull. Os pigmeus qe vivem nas densas florestas do Congo
raramente veem objetos a longas distâncias. Turnbull observou que, quando os pigmeus
dessas áreas viajavam para as savanas africanas e viam búfalos no horizonte,
pensavam que os animais eram pequenos insetos e não volumosos búfalos. A falta de
experiência dos pigmeus com objetos distantes explica a sua incapacidade de
percecionar a permanência do tamnaho dos objetos.
Uma ilusão percetiva, denominada ilusão de Ponzo, parece ambém ser um
exemplo de como a experiência e cultura moldam a nossa perceção. Nesta ilusão, que
se baseia na perspetiva linear, linhas convergentes conduzem à perceção de qe a barra
superior é maior porque aparece mais longe. Na verdade, as barras são do mesmo
tamanho. Pessoas que vivem em ambientes nos quais linhas convergem à disntância -
tais como vias férreas e autoestradas – são mais suscetíveis a esta ilusão do qe as que
vivem em meios onde há pocas linhas convergentes. Por exemplo, os zulus da África do
Sul são pouco suscetíveis de serem ludibriados por esta ilusão percetiva. Porquê?
Porque vivem em espaços abertos com muitas curvas. As suas cabanas são redondas.
As suas portas e os campos agrícolas são também curvos e não retangulares.
Síntese:

1. A perceção é o processo mediante o qual a informação sensorial – as sensações


– é ativamente e interpretada pelo cérebro.
2. A sensação é a receção de informações sensoriais. A perceção é a
interpretação, organização e descodificação dos dados sensíveis. A sensação é
recetiva. A perceção é um processo mental ativo, embora dependa da sensação –
admitindo que a perceção extrassensorial é um mito.
3. As componentes fundamentais do processo percetivo são a constância
percetiva e a perceção da profundidade.
4. A constância percetiva é a tendênca para percecionar pessoas e objetos de
diferentes ângulos,distâncias e condições de iluminação como mantendo o mesmo
tamanho, a mesma luz e a mesma cor.
5. A perceção da profundidade é uma capacidade possibilitada pela existência de
dois tipos de indicadores: os indicadores binoculares – inidicadores de profundidade
que se baseiam no trabalho conjunto dos dois olhos – e os indicadores monoculares –
indicadores de profundidade que se baseiam no funcionamento independente de cada
olho.
7. Segundo a escola de Gestalt, o todo não é a simples agregação das partes.
Quando olhamos para os objetos, damos primeiro atenção à forma organizada e não
aos elemnetos individuais.
8. Os psicólogos da Gestalt acreditavam que nascemos com a capacidade de
organiar o nosso mundo percetivo de forma previsível. Esta convicção não é partilhada
pelos psicólogos que hoje em dia estudam o fenómeno percetivo porque o fator
cultural condiciona significativamente a perceção. Assim, as pessoas que vivem em
ambientes onde predominam linhas retas, ângulos retos e retângulos – nas quais os
edifícios são habitualmente retangulares e as esquinas das ras são retas – são mais
suscetíveis a ilusões percetivas envolvendo esse tipo de objetos do que pessoas que
vivem em meios em que predominam objetos arredondados e curvos. Deve notar-se
contudo que estudos mostram que a capacidade de percecionar a profundidade é, em
boa parte, inata.

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