Você está na página 1de 8

EXCELENTÍSSIMO DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Habeas corpus com pedido liminar


Impetrante: Defensoria Pública do Estado de São Paulo
Paciente: ALEX DE CASTRO
Autoridade coatora: Juízo de Direito da Primeira Vara do Júri da Capital - São Paulo
Autos nº 0003095-57.2015.8.26.0052

A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por


intermédio de CRISTINA EMY YOKAICHIYA, Defensora Pública de São Paulo,
com sede para intimação na Avenida Abraão Ribeiro, nº 313, Rua 01, 2º andar, sala 2-
020, Capital/SP, vêm, respeitosamente, à presença de Vossas Excelências, com
fundamento no artigo 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal e nos arts. 647 a 667,
do Código de Processo Penal, impetrar o presente

HABEAS CORPUS
Com pedido de ordem liminar

em favor de ALEX DE CASTRO, RG nº 33.756.948-4, Brasileiro, filho de Carlos


Roberto de Castro e Rosana de Castro, nascido em 03 de agosto de 1979, que sofre
constrangimento ilegal por ato do Juízo da 1ª Vara do Júri da Capital, em conformidade
com as razões de fato e de direito a seguir expostas.

1 LOPES JR., Aury; Direito processual penal / Aury Lopes Jr. – 10. Ed. – São Paulo; Saraiva; 2013; pg.
109
I- DOS FATOS

Consta dos autos que, supostamente, no dia 18 de abril de 2015, por volta
das 16h45min, na Avenida Trumain, nº 58, Vila Formosa, Comarca de São Paulo,
Capital, Alex de Castro, juntamente com Erika Daiane Chaves, previamente ajustados e
unidos pelos mesmos propósitos, agindo com vontade de matar, desferiram golpes de
faca contra Antonio Marcos de Oliveira, não se consumindo o delito em razão da fuga
da vítima, bem como a presença de terceiros no local.

A denúncia foi recebida pela magistrada no dia 28 de setembro de 2016.


Na mesma oportunidade foi decretada a prisão preventiva do acusado e determinada a
sua citação.

No dia 30 de setembro de 2016 foi expedido mandado de prisão em nome


de Alex.

No dia 30 de janeiro de 2017 foi expedida Carta Precatória com o fim de


citar o acusado a apresentar Resposta à acusação, sendo o mesmo cumprido no dia 06 de
fevereiro de 2017. Nesta ocasião, o réu respondeu que, em face de não possuir
advogado constituído requeria a “imediata designação de um defensor público”.

Ao contrário da solicitação feita pelo acusado e a necessária celeridade


processual, os autos somente foram encaminhados para a Defensoria Pública para
apresentação de Resposta à Acusação no dia 07 de dezembro de 2017.

Considerando que o paciente se encontra preso preventivamente há


aproximadamente um ano quando a Defensoria Pública recebeu vista dos autos para
apresentação de resposta à acusação, foi requerido nesta peça o relaxamento da prisão
cautelar pelo evidente excesso de prazo para o encerramento da primeira fase do
procedimento do Júri.

1 LOPES JR., Aury; Direito processual penal / Aury Lopes Jr. – 10. Ed. – São Paulo; Saraiva; 2013; pg.
109
Todavia, o pedido foi indeferido pela magistrada de primeira instância
com fundamentação inidônea, não restando outro meio se não a impetração deste habeas
corpus para resguardar o direito de ir e vir do paciente.

É a síntese do necessário.

II– DO RELAXAMENTO DA PRISÃO CAUTELAR PELO EVIDENTE


EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA

O paciente se encontra preso preventivamente há aproximadamente 1 ano


e 1 mês à ordem da justiça. O Estado, desta forma, teria e tem a obrigação de envidar
todos os esforços no sentido de formar a culpa no prazo regular, o que não ocorre no
presente caso.

No dia 28 de setembro de 2016 foi determinada a citação de Alex,


entretanto, somente no dia 30 de janeiro de 2017, mais de 4 meses após a determinação
da magistrada, foi expedida Carta Precatória com o fim de citar o acusado a apresentar
Resposta à Acusação.

Ao ser cumprido o mandado no dia 06 de fevereiro de 2017, o réu


requereu a imediata designação de um defensor público, porém, os autos somente foram
encaminhados para a Defensoria Pública para apresentação da Resposta à Acusação no
dia 07 de dezembro de 2017, ou seja, 10 meses depois de cumprido o mandado de
citação, e mais de 1 ano e 2 meses após a determinação da magistrada para que
houvesse a citação.

É evidente que a demora desarrazoada na conclusão da instrução,


resultante de fatores externos à atividade defensiva (desídia do órgão policial e do poder
judiciário), não pode prejudicar o paciente, perpetuando-se indefinidamente a sua
segregação cautelar.

1 LOPES JR., Aury; Direito processual penal / Aury Lopes Jr. – 10. Ed. – São Paulo; Saraiva; 2013; pg.
109
Ademais, se o prazo não é cumprido por falhas da Administração
Pública, cabe ao Magistrado, como aplicador da lei, velar por sua aplicação de forma
justa, relaxando a prisão quando esta se tornar ilegal, não fazendo com que o réu arque
com tais problemáticas, em respeito, também, ao princípio da presunção da inocência.

Nada justifica a falta de andamento processual. Afinal, determinada a


citação, a serventia demorou 4 meses apenas para expedir o mandado(ao contrário do
mandado de prisão, expedido em 4 dias), e uma vez ultimada a citação, mais 10 meses
se passaram antes que fosse aberta vista à defesa para apresentar a resposta acusação.

Ora, a prisão preventiva, como verdadeira restrição ao princípio da


presunção de inocência, positivado pelo inciso LVII do artigo 5º da Constituição
Federal, é medida excepcional e, portanto, transitória. Permitir que sua duração se
prolongue em demasia é sujeitar o réu a verdadeiro punição sem que tenha sido julgado,
atribuindo, inaceitavelmente, caráter definitivo ao seu encarceramento cautelar.

A manutenção da condição de preso provisório durante período


indeterminado, sem acesso à progressão de regime, por si só, já será um enorme
gravame ao paciente caso venha a ser julgado culpado. Tornar-se-á absurdo ainda maior
se for reconhecida a inocência do paciente, causando um prejuízo incomensurável e
irreparável na trajetória de sua vida - contrário a qualquer das disposições decorrentes
do respeito à dignidade da pessoa humana, diretriz fundamental da ordem constitucional
pátria, positivada pelo inciso III do artigo 1º da Constituição Federal.

O artigo 412 do Código de Processo Penal é taxativo ao estabelecer o


prazo de 90 (noventa) dias para encerramento da instrução da primeira fase do
procedimento do júri. Apesar de haver pequena flexibilidade em relação ao referido
prazo, não é razoável admitir-se tamanho excesso.

1 LOPES JR., Aury; Direito processual penal / Aury Lopes Jr. – 10. Ed. – São Paulo; Saraiva; 2013; pg.
109
O artigo 648, inciso II, do Código de Processo Penal determina que a
coação será considerada ilegal quando alguém estiver preso por mais tempo do que
determina a Lei:

“Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal:


(...)
II - quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei”;

É patente o constrangimento ilegal infligido ao paciente, visto que não há


notícia de data para que a fase sumária do procedimento do Júri seja encerrada.

O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, adotado pelo Brasil


em 24 de janeiro de 1992, em seu artigo 9º, item 3 (1ª parte), estabelece:

“Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal


deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada
por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de
ser posta em liberdade.” (grifo nosso).

O mesmo princípio também é assegurado pela Convenção Americana


sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), ratificada pelo Brasil em 25
de setembro de 1992, a qual, em seu artigo 7º, item 5, dispõe:

“Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à
presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e
tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem
prejuízo de que prossiga o processo”. (g.n.)

Assim, o Pacto de São José da Costa Rica, tratado internacional


recepcionado pelo ordenamento jurídico brasileiro por força do Decreto de Lei nº 678
de 06 de novembro de 1992, deixa claro que o réu tem direito a ser posto em liberdade
caso não seja julgado em prazo razoável.
1 LOPES JR., Aury; Direito processual penal / Aury Lopes Jr. – 10. Ed. – São Paulo; Saraiva; 2013; pg.
109
E esse também é o entendimento recente do Supremo Tribunal Federal:

“HABEAS CORPUS”. PRISÃO CAUTELAR QUE SE


PROLONGA POR MAIS DE 04 (QUATRO) ANOS.
PACIENTE QUE, EMBORA PRONUNCIADA, SEQUER FOI
SUBMETIDA, ATÉ O PRESENTE MOMENTO, A
JULGAMENTO PERANTE O TRIBUNAL DO JÚRI.
INADMISSIBILIDADE. EXCESSO DE PRAZO
CARACTERIZADO. SITUAÇÃO QUE NÃO PODE SER
TOLERADA NEM ADMITIDA. DIREITO PÚBLICO
SUBJETIVO DE QUALQUER RÉU, MESMO TRATANDO-
SE DE DELITO HEDIONDO, A JULGAMENTO PENAL
SEM DILAÇÕES INDEVIDAS NEM DEMORA EXCESSIVA
OU IRRAZOÁVEL. DURAÇÃO ABUSIVA DA PRISÃO
CAUTELAR QUE TRADUZ SITUAÇÃO ANÔMALA APTA
A COMPROMETER A EFETIVIDADE DO PROCESSO E A
FRUSTRAR O DIREITO DO ACUSADO À PROTEÇÃO
JUDICIAL DIGNA E CÉLERE. PRECEDENTES (RTJ
187/933-934, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 85.237/DF,
Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.). MAGISTÉRIO DA
DOUTRINA (OdoneSanguiné, José Rogério Cruz e Tucci, Luiz
Flávio Gomes e Rogério Lauria Tucci). OCORRÊNCIA, NA
ESPÉCIE, DE LESÃO EVIDENTE AO “STATUS
LIBERTATIS” DA PACIENTE EM RAZÃO DE OFENSA À
CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS
(ARTIGO 7º, n. 5) E À CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
(ART. 5º, INCISO LXXVIII). “HABEAS CORPUS”
DEFERIDO.

– Nada pode justificar a permanência de uma pessoa na prisão,


sem culpa formada, quando configurado excesso irrazoável no
1 LOPES JR., Aury; Direito processual penal / Aury Lopes Jr. – 10. Ed. – São Paulo; Saraiva; 2013; pg.
109
tempo de sua segregação cautelar (RTJ 137/287 – RTJ 157/633
– RTJ 180/262- -264 – RTJ 187/933-934), considerada a
excepcionalidade de que se reveste, em nosso sistema jurídico, a
prisão meramente processual do indiciado ou do réu, mesmo que
se trate de crime hediondo ou de delito a este equiparado.

– O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao


aparelho judiciário – não derivando, portanto, de qualquer fato
procrastinatório causalmente atribuível ao réu –, traduz situação
anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além
de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão,
frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito
à resolução do litígio sem dilações indevidas (CF, art. 5º,
LXXVIII) e com todas as garantias reconhecidas pelo
ordenamento constitucional, inclusive a de não sofrer o arbítrio
da coerção estatal representado pela privação cautelar da
liberdade por tempo irrazoável ou superior àquele estabelecido
em lei.

– A duração prolongada, abusiva e irrazoável da prisão cautelar


de alguém ofende, de modo frontal, o postulado da dignidade da
pessoa humana, que representa – considerada a centralidade
desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) – significativo vetor
interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira
todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País e que
traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se
assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática
consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo.
Constituição Federal (Art. 5º, incisos LIV e LXXVIII). EC
45/2004. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art.
7º, ns. 5 e 6). Doutrina. Jurisprudência. (HC 139.664/GO, Min.
Rel. Celso de Mello, julgado em 22/05/2017). (g.n.)

1 LOPES JR., Aury; Direito processual penal / Aury Lopes Jr. – 10. Ed. – São Paulo; Saraiva; 2013; pg.
109
II- DO PEDIDO

Ante o exposto, diante da violação ao princípio da duração razoável do


processo e ao constrangimento ilegal sofrido pelo paciente requer-se a concessão de
medida liminar para que o paciente seja posto imediatamente em liberdade.
Os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora encontram-se
presentes diante da patente violação ao princípio da duração razoável do processo, uma
vez que, enquanto não concedida a ordem, permanece o cerceamento indevido à
liberdade do paciente, que, se já tivesse sido condenado, muito provavelmente já
poderia, neste momento, contar com lapso para a progressão de regime.

São Paulo, 05 de fevereiro de 2018

Cristina Emy Yokaichiya


Defensora Pública do Estado de São Paulo

Felipe Lucena Saraiva


Estagiário da Defensoria Pública

1 LOPES JR., Aury; Direito processual penal / Aury Lopes Jr. – 10. Ed. – São Paulo; Saraiva; 2013; pg.
109

Você também pode gostar