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2- É preciso confirmar que houve estupro para que a mulher possa praticar o
abortamento?
11- Uma adolescente de 13 anos, que engravida e não aceita a gravidez, pode
pleitear a realização do aborto num serviço de referência, mesmo que não tenha
sido forçada pelo namorado?
12- Quando uma vítima de violência, de menor idade, é abusada, está grávida,
quer abortar e não tem apoio da mãe ou do pai, como o profissional de saúde
deverá proceder para atender sua demanda?
13- É possível atender e garantir o sigilo a uma adolescente que não quer
comunicar aos pais ou responsáveis que foi agredida sexualmente, estando ou
não gestante?
NOTA: Devo observar, ainda, que o princípio da proteção ao menor deve orientar
também a interpretação dos demais dispositivos legais que disciplinam a
revelação ou não do segredo médico. A) ECA, artigo 13: Comunicação ao
Conselho Tutelar. De acordo com o artigo 13 do ECA, os casos de suspeita ou
confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente devem ser
comunicados ao Conselho Tutelar. Inicialmente, portanto, é preciso saber se o
termo maus-tratos, utilizado no referido dispositivo legal, abrange ou não a
violência sexual. Acredito que não. Com efeito, o Estatuto da Criança e do
Adolescente, quando se refere a maus-tratos, é omisso quanto à definição desse
termo. Portanto, o único conceito cabível deve ser aquele que corresponde à
tipificação de maus-tratos no Código Penal. Segundo o artigo 136 do Código
Penal, maus-tratos é um crime com a seguinte tipificação jurídica: “expor a perigo
a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de
educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou
cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado,
quer abusando de meios de correção ou disciplina”. Como se vê, o conceito
penal de maus-tratos é bastante restrito e as condutas que o caracterizam estão
vinculadas aos termos definidos pelo tipo penal acima invocado. No sistema
jurídico, dizemos que se trata de um tipo de conduta vinculada, ou seja, de um
tipo que somente se caracteriza mediante a prática das ações nele especificadas.
Assim, induvidosamente, o crime de maus-tratos somente fica caracterizado
quando ocorre a exposição a perigo da vítima ou da saúde do menor, nas
seguintes situações: (a) privação de alimentação ou de cuidados indispensáveis;
(b) sujeição a trabalhos excessivo ou inadequado; e (c) abuso de meios de
correção ou disciplina. Em conseqüência, não se pode falar em “maus-tratos”
quando ocorre violência sexual contra menor e, obviamente, não há falar em
exigência de comunicação ao Conselho Tutelar nessa hipótese. Aliás, ao
comentar a obrigatoriedade de comunicação ao Conselho Tutelar nos casos de
“maus-tratos”, os Promotores de Justiça Jurandir Norberto Marçura, Munir Cury
e Paulo Afonso Garrido de Paula, que integram o Centro de Apoio Operacional
das Curadorias da Infância e da Juventude de São Paulo, asseveram que o
conceito de “maus-tratos” no ECA está vinculado ao conceito de “maus-tratos” do
artigo 136 do Código de Penal29. Como se vê, não há obrigatoriedade de
comunicação ao Conselho Tutelar quando o serviço de saúde toma conhecimento
da ocorrência de violência sexual contra criança ou adolescente. Acredito, pois,
que a comunicação ao Conselho Tutelar, nos casos de violência sexual contra
menor, constitui, induvidosamente, um DEVER ÉTICO dos profissionais do
sistema de saúde, mas não constitui um dever jurídico. Logo, a omissão dessa
comunicação não caracteriza violação ao disposto no artigo 13 do ECA.
Entretanto, vale a pena lembrar que nenhuma comunicação ao Conselho Tutelar
há de ser feita quando essa comunicação puder acarretar qualquer dano físico ou
psíquico ao menor. É que essa comunicação ao Conselho Tutelar visa à proteção
do menor. Logo, obviamente, se houver necessidade de mantença do segredo
para garantir a integridade do menor, nenhuma comunicação ao Conselho Tutelar
deve ser exigida. Lembro, todavia, que a não comunicação ao Conselho tutelar,
quando exigida, da mesma forma como a não comunicação aos pais, é uma
situação excepcional, que deve ser fruto de uma decisão fundamentada do
serviço de assistência ao menor. E essa decisão deve ser registrada no prontuário
do menor com a devida fundamentação e com os pareceres exarados pelos
psicólogos, assistentes sociais e médicos. Entanto, na primeira oportunidade,
quando a possibilidade de dano estiver debelada, o Conselho Tutelar deve ser
comunicado, mas apenas nos casos em que há exigência legal, o que afasta a
comunicação nos casos de violência sexual contra menor. Devo deixar
consignado, também, que a Lei não fixa prazo para tal comunicação ao Conselho
Tutelar. Assim, embora seja recomendada a comunicação imediata, nos casos em
que a lei exige, para que o Conselho Tutelar possa adotar as medidas protetivas
cabíveis e garantir a sua eficácia, nada impede que essa comunicação seja
protelada e feita oportunamente, ou seja, quando não houver nenhum risco de
dano para o menor. É verdade que de acordo com a opinião de alguns juristas, o
conceito de “maus-tratos” do ECA também abrange a violência sexual30. Assim,
caso prevalecesse esse entendimento, a comunicação ao Conselho Tutelar, nos
casos de violência sexual contra o menor, seira obrigatória. Todavia, ainda que
essa comunicação seja considerada obrigatória, não há falar na sua exigência
quando houver risco para a saúde integral do menor. E, conforme acima já
afirmei, ainda que obrigatória, essa comunicação, que visa exclusivamente à
proteção do menor, poderá ser protelada para o oportuno momento, ou seja,
poderá ser feita apenas e tão-somente quando estiver garantido que não haverá
qualquer risco para o menor. Finalmente, devo lembrar, ainda, que, se a violência
sexual for praticada com o abuso do poder familiar, pelos pais, pelos tutores,
pelos padastros ou pelos curadores, o fato deve ser comunicado obrigatoriamente
à Autoridade Policial ou ao Juiz ou mesmo ao Ministério Público, pois, se não
houver tal comunicação, ficará caracterizado o delito tipificado no artigo 66 da Lei
das Contravenções Penais, conforme será esclarecido no item “C” abaixo. B)
ECA, ARTIGO 245. INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA POR FALTA DE
COMUNICAÇÃO. Lembre-se também do disposto no artigo 245 do ECA, que
dispõe ser infração administrativa “deixar o médico, professor ou responsável por
estabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamental, pré-escola ou
creche, de comunicar às autoridades competentes os casos de que tenham
conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança
ou adolescente”. Todavia, como acima afirmei, a violência sexual não está
abrangida pela expressão “maus-tratos”. Assim, não ficará caracterizada a
infração administrativa se o médico deixar de comunicar à autoridade competente
a ocorrência de uma violência sexual contra menor, da qual tomou conhecimento
no exercício de sua atividade profissional. Entretanto, há respeitáveis juristas que
sustentam que a violência sexual está incluída na expressão “maus-tratos”.
Contudo, ainda que prevaleça esse entendimento, a não comunicação de tal fato
à autoridade competente não poderá constituir infração administrativa se a
revelação puder, de qualquer forma, acarretar danos para o menor. É que há de
prevalecer o princípio da proteção do menor. Todavia, seja como for, por cautela a
decisão de não comunicar o fato às autoridades competentes deve ser fruto de
uma decisão fundamentada do serviço de saúde e deve ficar registrada no
prontuário do menor, quando da constatação da possibilidade da ocorrência de
dano. C) LEI DAS CONTRAVENÇÕES PENAIS – ARTIGO 66: OMISSÃO DE
COMUNICAÇÃO DE CRIME. O artigo 66 da Lei das Contravenções Penais, que
dispõe sobre a omissão de comunicação de crime, também merece referência.
Segundo esse dispositivo, constitui contravenção penal, deixar de comunicar à
autoridade competente a ocorrência de crime de que teve conhecimento no
exercício de função pública ou no exercício da medicina ou de outra profissão
sanitária, mas apenas e tão-somente quando o crime for de ação penal pública
incondicionada. Assim, quando o crime for de ação penal privada ou de ação
penal pública condicionada a representação, não há falar em contravenção nos
casos de omissão de comunicação. E o estupro, bem como o atentado violento ao
pudor, é um crime de ação penal privada em regra e, excepcionalmente, de ação
penal pública condicionada a representação31. Portanto, não há falar na
tipificação da referida contravenção penal quando o profissional deixa de
comunicar à autoridade competente a ocorrência de um estupro, ou de qualquer
outro crime contra a liberdade sexual, se o crime for de ação penal privada ou de
ação penal pública condicionada a representação. E a ação penal somente será
pública incondicionada quando o crime for cometido com abuso de pátrio poder
(poder familiar), ou com abuso da qualidade de padrasto, tutor ou curador (Código
Penal, artigo 225, parágrafo 1º, inciso II). Portanto, nesse caso, há
obrigatoriedade da comunicação do fato à autoridade competente e a omissão
dessa comunicação tipifica o artigo 66 da Lei das Contravenções Penais. Assim,
em tal caso, a ocorrência da violência sexual deve ser comunicada à Autoridade
Policial, ou mesmo ao Juiz ou ao Ministério Público, e não há falar em “segredo”.
Em conseqüência, quando o autor da violência sexual for um dos pais, padrasto,
tutor ou Curador do menor, também não há falar na aplicação do 103 do Código
de Ética Médica. Assim, se o agressor for um dos pais, o outro poderá ser
comunicado, ainda que desrespeitada a vontade do menor. E, além disso, a
autoridade competente deve ser comunicada. Mas, também não se olvide que, se
houver risco de dano para o menor em razão dessa comunicação, não haverá
justa causa para caracterização da contravenção penal em menção, pois há de
prevalecer sempre a principiologia da proteção do menor. Mas, lembre-se, sempre
e sempre, de que a não comunicação é uma decisão excepcional, que deve estar
bem fundamentada e registrada no prontuário. D) CÓDIGO PENAL, ARTIGO 154:
CRIME DE REVELAÇÃO DE SEGREDO MÉDICO. Por derradeiro, lembro do
disposto no artigo 154 do Código Penal, que também merece análise. De acordo
com esse dispositivo penal, constitui crime “revelar alguém, sem justa causa,
segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e
cuja revelação possa produzir dano a outro”. Portanto, somente ficará
caracterizado o crime de violação de segredo profissional se essa revelação
puder acarretar dano a outrem e se a revelação for feita sem justa causa. Ora, se
a revelação for feita exatamente para preservar o menor da ocorrência de danos,
estará afastada a caracterização do referido crime. Mais uma vez, devo afirmar:
por cautela, a decisão de não comunicar o fato, por ser excepcional, deve estar
fundamentadamente registrada no prontuário do menor e, oportunamente, quando
não houver risco de dano, deve ser feita a comunicação.
14- O que fazer diante de uma situação em que o responsável pelo menor recusa-
se a notificar ao Conselho Tutelar a ocorrência de crime sexual contra esse
menor?
15- Qual a diferença entre notificação e denúncia? Em que situação se aplica uma
e outra? Nos serviços de saúde quem é o responsável por essas providências?