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DELEUZE, Gilles - A LÓGICA DO SENTIDO

GRUPO TRANSVERSAL

Da décima segunda série a décima sétima série –


RENATA E VALÉRIA

Renata - ... com certeza nós lemos isso de uma forma bastante distinta
também, não só porque somos duas pessoas diferentes, mas porque,
como estávamos comentando na hora do almoço, me parece bastante
diferente o jeito que uma pessoa que estudou filosofia lê isso e uma
pessoa que não estudou filosofia lê isso. Na verdade eu fico me
perguntando como uma pessoa que não estudou filosofia lê isso... não,
porque parece tão cheio de referências o texto... então tem duas coisas:
ou eu sei a história da filosofia e fico fazendo, tentando fazer, esse
diálogo interno que ele fica tentando fazer ou você se isenta dessas
referências todas e lê a coisa, daí até fosse uma leitura na
superficialidade e no bom sentido, no sentido que ele coloca do que ficar
tentando as relações profundas da coisa... por mais que tentemos
entender exatamente como o autor quis dizer, não vamos entender,
então é uma aventura meio em vão né? Então, nesse sentido, eu não
trouxe nada para explicar essas referências que ele faz no texto, por
exemplo, o que o Kant falou, o que ele está dizendo que o Kant falou,
enfim,então, no máximo, eu trouxe o Jaguadarte do Carroll, porque dele
eu não podia deixar de ter que é sobre isso que está se montando esse
jogo aqui, mas eu trouxe também só no caso de alguém querer ver e a
Valéria trouxe Silvia e Bruno como ilustração, pois está tudo em inglês...
(traduções diferentes acerca do jaguadarte). Bom, eu estudo assim vou
grifando algumas coisas no livro e nesse caderno fiz algumas anotações
gerais, então aproveitando o ensejo de estar com a palavra para dizer
que desde que fomos estudar o Deleuze no ano passado, eu tinha
algumas idéias, não sei se vocês se lembram, que era totalmente contra
essa idéia da lógica formal, dos três princípios, etc, desde aquele
seminário que o Américo deu. Daí eu tive umas idéias e comecei a
escrever um texto que não acabei de me dedicar a ele que pareceu que
eu tinha umas idéias geniais, mas que na verdade, elas estão todas
aqui... exatamente nesses capítulos, Deleuze conseguiu me copiar com
uns sessenta anos de antecedência, então o Artaud não acusava o
Carrol de estar copiando ele quase cem anos antes – a mesma coisa...
(risadas). Mas, na verdade, o que acontece suscita algumas idéias ao
longe que ele ainda não chegou na idéia aqui, mas ele suscitou em mim,
embora essa obra seja anterior as obras que vínhamos lendo, que é
sobre a questão da síntese disjuntiva que está muito bem explicada
aqui, mas que eu prefiro chamar de disjunção inclusiva, então, como eu
estava apenas fazendo uma apresentação das metodologias... a Valéria,
por sua vez, trouxe uma série de textos, contos e tal, nos quais ela foi
pensando e se lembrando, conforme ela fazia as leituras, não
explicitamente, algumas vezes sim, mas não só do que ele cita aqui,
mas de outras coisas...
Valéria – e não para exemplificar... porque enquanto eu lia, me
lembrava de outras coisas, vai te remetendo a outras linguagens e de
algumas coisas que eu consegui ir atrás, eu fui e fui fazendo a leitura
desse jeito, não numa perspectiva de dar conta de tudo e de entender,
porque existiram coisas que eu passei batido... mas no sentido de
procurar fazer essas interlocuções com outras coisas que me chamaram
atenção, mas não para exemplificar, mas para dialogar...
Renata – então, essa questão do Paradoxo que está nessa série, o que
estou percebendo é que o que ele fala nesse capítulo é um
desdobramento do que ele fala na primeira página da primeira série,
aquela que o Zé trouxe... “o paradoxo não é a contradição, é onde
nasce a contradição, a gênese da contradição e é o que vai destruir o
bom senso e o senso comum”. Ele vai destruir o bom senso porque esse
é um sentido único e vai destruir o senso comum porque este é a
designação de uma identidade fixa. Então o paradoxo é a afirmação dos
dois sentidos ao mesmo tempo e em duas direções ao mesmo tempo.
Aí, se você toma um sentido, como sendo o chamado “bom sentido”,
você escolheu um como bom e tomar aquele, só que o paradoxo não é
você abandonar esse bom senso e pegar o lado oposto dele, o outro, de
qualquer maneira se você fizesse isso, estaria optando por um, entre os
dois e, portanto, fazendo a mesma coisa; então o paradoxo é você
correr para os dois lados ao mesmo tempo, assumir os dois sentidos ao
mesmo tempo e isso destrói essa idéia de sentido único do bom senso e
também isso seria a instauração de uma identidade infinita que é
contrária, ou melhor, que destrói a idéia de uma identidade fixa e que é
o que o senso comum faz.
Valéria – e nessa parte do paradoxo, ele vai trabalhar bastante com a
idéia de contrário, então ele traz a idéia de que o contrário do bom
senso não é o outro sentido que seria o chamado “mau sentido”, então
não é que não existe o contrário, mas ele não faz essa oposição, pois o
contrário está presente na própria coisa que está acontecendo, são os
dois sentidos ao mesmo tempo.
Zé – é como ele fala sobre o não-senso, ele coloca que o não-senso, não
é a falta de sentido...
Renata – bom, o paradoxo tem por característica ir, de fato, “nos dois
sentidos ao mesmo tempo e tornar impossível uma identificação, é um
devir-louco, é perder o nome próprio” então, é a destruição do bom
senso e do senso comum, portanto, é oposto à Doxa, que é justamente
formada pelo bom senso e senso comum. “Esta ordem do tempo, do
passado ou futuro é, pois, instaurada com relação ao presente, isto é,
uma relação a uma fase determinada do tempo escolhida do sistema
individual considerado”. A identidade fixa é justamente essa coisa de
inventar um eu fixo e sujeitar todo resto a isto. Isso é mais
desenvolvido depois quando ele vai falar do Moi e do Je...
Valéria – daí, nesse momento que ele está trabalhando a questão do
paradoxo, ele vai trazer a idéia do Aion e dizer da diferença entre o aion
e o cronos e dizer que além de ser, é próprio do paradoxo, ter o dois
sentidos ao mesmo tempo, é um passado e um futuro infinitamente
subdividido e alongado; então o tempo não é o aion que está presente
no paradoxo.
Renata – cronos é o tempo da nossa vidinha normal, entendida com
bom senso no senso comum, essa diferença me lembrou que tem a ver
com tomar os dois sentidos ao mesmo tempo e tem a ver com
identidade infinita que não é uma identidade fixa, então que não é
substantivo, nem adjetivo, mas é verbo no infinitivo, então existem
vários filmes que eu me lembrei – O feitiço do tempo – o cara acorda
sempre no mesmo dia, mas esse dia nunca é o mesmo dia, é o mesmo
dia cronologicamente, no calendário, mas o que acontece naquele dia é
sempre diferente, que tem a ver com um outro que é O efeito borboleta
que para mim é idêntico e tem a ver com a minha geração que é De
volta para o futuro. A idéia é a mesma porque você volta para algum
momento da sua história passada, age de uma maneira diferente,
modifica a história quando você volta para o futuro de onde você saiu
inicialmente, não é mais o mesmo ponto porque você modificou antes...
o que pira é que você se pergunta sobre o que aconteceu com a minha
história antes, eu vi, ela estava lá, então o cara nunca volta para o
mesmo ponto porque não é cronos.
Silvio – você relacionou esses filmes com o quê?
Renata – com a diferença entre aion e cronos... “cronos é o presente
que só existe que faz do passado e do futuro, suas duas dimensões
dirigidas tais que...”(página 80)
Silvio- sim, é que eu acho que todos esses filmes se relacionam com o
registro do cronos...
Renata – mas acho que eles te fazem pensar no aion (definição na
mesma página)
Silvio – então, mas se você pega o feitiço do tempo, é um eterno
presente, é sempre o agora, o mesmo dia, é o mesmo dia que nunca é o
mesmo, mas é o mesmo; qual é o drama do filme? Que o cara não
consegue sair daquele dia, ou seja, o sujeito quer ir em direção ao
futuro, ele quer transformar aquele dia em passado, mas não consegue
sair do presente e é aí a grande imagem de cronos, é a presentificação
absoluta, você sempre fica no presente e por mais que se queira sair,
você não sai.
Renata – e daí essa agonia que você percebe e mesmo que esse seja o
absoluto cronos, ele me faz, por isso mesmo, pensar no aion, que é o
que faz o efeito borboleta, você está aqui, aí você volta dez anos e
modifica a história, embora o de volta para o futuro seja uma coisa
linear, mas no efeito borboleta não, é mais complicado porque ele
sempre volta para um lugar que não é o seu de origem e salta para
outros lugares, então já não existe mais a idéia de origem e dentro
desse tempo, ele já não distingue o que é passado, futuro e presente...
Então dentro desse tempo, a busca dele é pelo ponto em que ele vai
solucionar as questões e nesse sentido, é que se perde essa noção
prévia do que é passado, presente e futuro e perde-se o eu... quebra a
consciência sartriana...
Valéria – tem um trecho do Borges que tem a ver com isso...
Silvio- mas o eu permanece lá... bem, porque ele vai dizer que aion e
cronos não se opõem, mas se complementam, ou melhor, se opõe e se
complementam, são duas visões/percepções distintas de tempo. Se
opõem por serem completamente diferentes, mas o mesmo tempo que
se opõem, se complementam porque, se voltarmos aos Estóicos, temos
o cronos como o tempo dos corpos e o aion como tempo dos
acontecimentos e acho que o cinema por mais que tente ficar para além
do tempo dos corpos, ele fica no tempo dos corpos... por exemplo no de
volta para o futuro é sempre uma viagem do presente pelo passado e
futuro...
Zé - ... Deleuze trabalha as teses de Bergson sobre o movimento em
relação a imagem, e trabalha essa questão do pensamento e imagem,
conseqüentemente o cinema... e assim, o cinema permite esse contato
porque você tem através da imagem do filme, uma captura para romper
com o imediato...
Silvio – mas isso é na sua relação com o cinema...
Zé – mas quando ele trabalha a questão da montagem, enfim, da
estrutura, do enquadramento, que é nessa montagem que se tem essa
idéia...
Silvio – o problema é que ficamos aqui também nesse movimento de
quebrar a linearidade, e o cinema, quanto mais se quebra essa
linearidade, mais maluco fica o filme... se bem que temos mais uma
questão da dissolução da identidade do que de tempo...
Valéria – mas eu estava pensando aqui, quando começamos essa
discussão, na imagem que tivemos na semana passada do relógio. O
cinema não sei se é isso também, nós é que não conseguimos olhar
para o relógio porque já sabemos o que ele vai dizer e com o cinema é
assim também... em geral, no senso comum, nós já vamos esperando
uma história linear que dá a comercialidade do filme... em geral não se
vai ao cinema não buscando isso...
Zé – sim, mas existem alguns filmes que tentam romper com essa
lógica através da montagem, enfim...
Renata – no meu modo de entender o que o Deleuze estava querendo
fazer, faz e fez é propor uma outra visão de mundo, por isso propõe
uma outra ação no mundo, então eu volto a insistir que o que ele está
fazendo aqui é política, então aqui me parece que ele está anunciando
uma coisa que ele fez depois no Mil platôs, ele fala do mundo, como o
mundo é e depois começa a falar do mundo numa outra perspectiva, por
isso que é tão difícil ler a filosofia do Deleuze porque ele escreve, ou
tenta escrever na superfície, sem sujeitos e predicados, sem identidades
fixas, sem órgãos, etc, mas a nossa cabeça funciona daquela maneira, a
partir daquela lógica aristotélica...
Silvio- daí a pergunta é: porquê?
Valéria: mas é a mesma pergunta, por que a gente olha para o relógio
esperando ver as horas daquele jeito e porque vamos para o cinema
esperando ser contada uma história?
Renata – porque tudo isso foi sendo construído assim...
Rita - o Jung tem um livro hoje, comentando com uma amiga sobre o
aion e aí ela comentou que o Jung tem um livro sobre o aion e na
semana passada quando você questionou como a psicologia daria conta
disso, eu pensei que talvez o Jung pudesse dar com essa questão do
inconsciente puro e tudo mais, talvez a gente não consiga viver isso,
talvez os loucos, as crianças, os poetas vivam esse inconsciente
enquanto nós estamos presos a tudo isso...
Silvio- daí o potencial revolucionário do esquizo, daí que eles vão
escrever O anti-édipo chamando atenção para esse potencial do
esquizo... se há alguma coisa que pode romper com o capitalismo é
exatamente o esquizo.
Renata – exatamente, o que é uma outra lógica.
Rafael – eu ainda não tive a oportunidade de ler O anti-édipo, mas estou
começando a ler e estou fazendo um curso em São Paulo agora e
estamos trabalhando esse livro. E a questão do Jung, eu não sei e ele
apela meio que para questão da religiosidade, meio místico, ele até
prega umas identidades fixas assim... não sei...
Silvio - achei interessante a Rita chamar atenção para o Jung, porque
me parece ser a idéia do aion como o tempo do inconsciente, das
simbologias, daquela lógica que rompe com essa coisa do racional...
Renata – ... propondo uma outra lógica, de alguma forma, tentando
praticar uma coisa esquizofrênica dentro da racionalidade, do aceitável,
dentro de uma filosofia, embora seja uma filosofia totalmente maldita e
esquisitona e tal, é uma lógica da complicação e ele fala isso, é uma
coisa muito mais ligada ao “vamos fazer” do que “vamos falar sobre o
que seria e tentar entender” e isso que eu acho legal...
Valéria – será que é uma outra lógica ou será que não é uma lógica e
ele não propõe uma outra lógica, ele pratica, ele faz.
Silvio – ele afirma que não há uma única lógica que há outras lógicas e
que por exemplo você pode praticar essa lógica do paradoxo...
Renata – ele vai fazendo e é daí que você percebe que existe outras
lógicas e tem uma parte muito bacana aqui desse documento que eu
peguei na Internet – passo por email para vocês – sobre a síntese
disjuntiva, “a síntese disjuntiva ou disjunção inclusa – ou como eu
prefiro a disjunção inclusiva – é o operador principal da filosofia de
Deleuze, o conceito assinado entre todos, pouco importa que seja um
monstro aos olhos dos chamados lógicos: Deleuze que definia de bom
grado seu trabalho como a elaboração de uma lógica criticava a
disciplina institucionalizada sob esse nome por reduzir exageradamente
o campo do pensamento ao limitá-lo ao exercício pueril da recognição e
por assim justificar o bom senso satisfeito e obtuso aos olhos do qual
tudo o que da experiência abala os dois princípios de contradição do
terceiro excluído é puro nada e vão, todo empreendimento de aí
discernir o que quer que seja...” continuando... “o pensador é antes de
tudo o clínico, decifrador sensível e paciente dos regimes de signos
produzidos pela existência e segundo os quais ela se produz...” ou seja,
o que me parece é assim, que esse é uma cara que resolveu falar do
mundo de uma outra maneira de perceber, sem órgãos porque ele
derruba o senso comum, o bom senso... esquartejamento do sujeito e
peço licença para ler um pouco daquilo que eu escrevi... então
retomando aquilo que acabamos de falar, é só uma repetição e alguma
outra coisa... “o possível, a realidade é o não-paradoxo – tudo que
entendemos por realidade e possível é o não paradoxo – o senso
comum afirmando identidades fixas e o bom senso como sentido único,
o reino do ou – o que seria a disjunção exclusiva – a escolha de um
sentido em detrimento do outro ou vice-versa, tanto faz, pois afirmar o
sentido contrário é também afirmação de um sentido. O paradoxo, por
sua vez, é a afirmação do dois sentidos ao mesmo tempo, isso destrói o
bom senso e é, pois a identidade infinita, o devir louco, o furtar-se ao
presente, não há identidades fixas é a perda do nome próprio,
esquartejamento do sujeito, do mundo e de deus – página 3 e 81 – que
destrói o senso comum, designação de identidades fixas, eu, mundo,
deus, azul, mesa, etc. A filosofia de Deleuze é a filosofia do paradoxo,
ele escreve assim e assim quer falar das coisas e dos acontecimentos,
mas para falar usam a linguagem e o pensamento e esses só
conseguem designar o possível, sujeitos e predicados, substantivos e
adjetivos que prendem as coisas no mundo, onde o particular é o eu e o
geral é deus. As identidades são fixas, há uma determinada sintaxe,
suas regras, sedentárias, o reino do ou, a identificação da diversidade à
forma do mesmo, por isso é tão difícil lê-lo... a linguagem e o
pensamento reduzem o todo ao “mundo” ou seja, tudo o que existe e o
que se pode perceber, sem pensarmos o que é estilo e o que é
perceber, enfim todas as possibilidades e diversidades, como ele fala,
inclusive põe no plural... as diversidades são transformadas em mundo
que é um todo significativo e fechado, agente fala sobre ele, pensa nele,
tem o sujeito, o predicado, a sintaxe, as regras que são sedentárias, né?
O paradoxo delata o pouco alcance de nossos instrumentos de
designação e representação, criação do mundo, do que há, fazemos
uma historinha com começo, meio e fim, com moral de sujeitos seguros
de si, de bens e maus.” Escrevi isso conforme estava lendo esse capítulo
sobre o paradoxo.
Valéria – aí para fecharmos essa série do paradoxo, fiquei pensando
numa coisa que me chamou bastante atenção que é que nessa série do
paradoxo ele vai se remeter muito a questão dos sentidos, daí eu fiz
aqui não como oposição, mas ele coloca dois aspectos do sentido, uma
hora falando de uma jeito e outra falando de outro jeito, de um lado a
série significante e de outro a série significada, de um lado as
proposições e de outro o estado de coisas, ele não faz assim, mas eu é
que para entender fiz assim... o lugar sem ocupante, o ocupante sem
lugar... então, eu fiquei tentando entender e na página 84 ele vai dizer
“o sentido em si mesmo é o objeto de paradoxos fundamentais que
retomam as figuras do não senso...” e daí esses dois aspectos dos
sentidos, que na verdade não são dois, são inúmeros e cada hora ele é
uma coisa, uma outra coisa. Ele é dois sentidos mas...
Renata – por isso que o paradoxo tem poder genético, né? Porque ele
gera outros estados de coisas...
Valéria – e daí ele vai dizer na página 83 que esses dois aspectos do
sentido é que permitem denominar um significante e outro significado e
que eu acho que era uma coisa que nós não tínhamos falado...
Renata – daí na página 82 ele faz a referência literal à Alice com o
chapeleiro e a lebre, os dois sentidos ao mesmo tempo, o paradoxo, o
devir louco e o chapeleiro e a lebre e aí em contraposição a isso Humpty
Dumpty que é a simplicidade real, o doador dos sentidos, tanto que na
história é ele quem vai traduzir o Jaguardarte para ela, porque ele chega
lá e diz que ouviu um poema mas não entendeu nada, aí ele fala manda
e ela vai falando e ele vai traduzindo, são as palavras-valise, do que
foram formadas e tal, portanto, ele é o doador de sentido... é muito fofo
porque ele parece um ovo, ela diz lindo cinto e ele fica super ofendido
porque na verdade é uma gravata porque você não consegue identificar
onde é o pescoço e onde é a cintura... mas como ela é esperta, já logo
diz: ah não desculpa a gravata e é muito legal essa parte... enfim, o
Humpty Dumpty , nas singularidades, nada começa ou acaba, tudo vai
no sentido do futuro e do passado ao mesmo tempo. Não é de
surpreender que o paradoxo seja a potência do inconsciente, ele se
passa sempre entre-dois das consciências, contra o bom senso ou às
costas do senso comum... mas o paradoxo como paixão descobre que
não podemos separar duas direções, que não podemos instaurar um
senso único, nem um senso único para o sério do pensamento, para o
trabalho, nem um senso invertido para as recreações dos jogos
menores
Silvio – então já que estamos na contra-mão, na página 77 “Não
diremos também que os paradoxos dão uma falsa imagem do
pensamento, inverossímil e inutilmente complicada. Seria preciso ser
muito “simples” para acreditar que o pensamento é um ato simples,
claro para si mesmo, que não põe em jogo todas as potências do
inconsciente e do não-senso no inconsciente. Os paradoxos só são
recreações quando os consideramos como iniciativas do pensamento;
não quando os consideramos como “a paixão do pensamento”,
descobrindo o que não pode ser senão pensado, o que não pode ser
senão falado, que é também o inefável e o impensável, Vazio mental,
Aion”. Acho que ele começa justamente colocando a força do paradoxo
como mobilizador do pensamento, a importância do paradoxo é
justamente o fato dele ser o disparador do pensamento; no senso
comum nós não somos estimulados ao pensamento porque as coisas se
passam exatamente como você espera que se passe e o paradoxo é
justamente aquilo que, se formos pensar no Clássico da filosofia, o que
te espanta, o espanto, e daí diante disso o questionamento de como é
que fica, daí você é obrigado a pensar para conseguir equacionar essas
coisas...
Renata – nesse livro aqui encontramos dois paradoxos na página 251 –
o que a tartaruga disse a Aquiles e um paradoxo lógico, um cara
contando a conversa entre dois “tios”...
Valéria – trouxe também esse livro considerado de literatura infanto-
juvenil e chama “clara manhã de quinta à noite” e daí fiquei pensando
se o que está colocado aqui é um paradoxo nesse sentido ou será que é
um livro que brinca com os contrários? Daí eu fiquei pensando se não
seria essa segunda parte mesmo... e a ilustração é muita linda... vou
contar... “Numa clara manhã de quinta-feira à noite, acordei e sonhei
que tinha morrido; meu galo vermelho põe um ovo e me chama
cocorocó e me tira da cama; vesti a roupa para meu enterro, uma festa
bem simples com muito luxo; os convidados contentes choram o tempo
inteiro até os mais pobres cheios do dinheiro; quando a banda tocou
gelatina de osso, todos nós sentamos para dançar, aí apareceu uma
batata Argentina sem roupa com calça de gabardina; que bom ver você
novamente – falei - e a primeira vista me apaixonei, vamos comer que
morro de sede – ele disse – e de uma só bocada comi o infeliz; veja o
que fez comigo – gritou o crocodilo – comeu o estranho, meu melhor
amigo; eu não fiz isso – sorri arrependida – e não vou fazer de novo é o
que lhe digo; como tenho pressa, demoro a contar, a batata Argentina
pudemos salvar, aí o crocodilo fez o nosso casamento e ficamos
solteiros no mesmo momento; eu sabia, sabia, eu tinha certeza, por
isso gritei muito surpresa: aí vem um bebê sem nenhum cabelo com um
topete na testa como um novelo; eu sou mentirosa, mas a estória é
verdade e o fim acontece antes da metade; se você acreditou nessa
mentira verdadeira recomece do fim toda brincadeira”. Esse livro era de
quando eu dava aula para as criancinhas... e quando elas iam ficando
mais velhos, eles exigiam uma coisa mais séria, concreta, lógica, mas
no geral, eles curtem bastante... Então, eu fiquei pensando e fui ler a
estória de novo e pensei acho que esse não é o paradoxo que o Deleuze
propõe, acho que a estória trabalha mais com a coisa dos contrários
mesmo, mas tem momentos que eu acho que não são, por exemplo
quando ela fala que come a batata e que era o cara que ela tinha se
apaixonado, aí o crocodilo que pede para salvar e por isso que eu acho
que tem horas que não cabe muito e fica legal, né?
Silvio – uma outra coisa interessante é esse movimento de contar a
estória de traz para frente, você começa na morte e termina no
nascimento, agora é interessante essa coisa de ver no sentido contrário
e continua sendo um sentido...
Renata – sim, mas continua sendo um sentido e não os dois ao mesmo
tempo, porque isso só acontece quando se quebra essas regras do
terceiro excluído e da não-contradição, aí sim, aí é sonho... pode ser e
não ser ao mesmo tempo... eu vou ler esse pedaço que explica bem
isso... “Desde os primórdios, a filosofia acredita que a razão opera
segundo determinados princípios, seus próprios que concordam com a
realidade, sendo por isso que podemos conhecê-la, vamos explicitar
esses princípios básicos de toda lógica, pois acreditamos ser útil para a
formação da idéia que nos propomos. O princípio da identidade é aquele
que deve ser enunciado assim a é a ou o que é, é. Inicialmente pode
nos parecer um tanto óbvio e talvez assim seja se usarmos esse
princípio sem nos darmos conta dessa nossa fé, algo só pode ser
conhecido e pensado se mantiver a sua identidade, esse princípio é o
que faz com que definamos uma coisa e possamos reconhecê-la
enquanto tal. O segundo princípio é o da não–contradição, cujo
enunciado é a é a e é impossível que ao mesmo tempo e na mesma
relação seja o não-a, sendo assim, por exemplo é impossível que meu
cachorro seja meu e não ao mesmo tempo, ele pode não ser meu
cachorro antes ou depois, mas não ao mesmo tempo. Afirmar e negar
uma coisa ao mesmo tempo e na mesma relação gera uma mútua
negação e, portanto, uma mútua destruição, sua inexistência, coisas
contraditórias são portanto, segundo esse princípio, impensáveis,
impossíveis. O princípio do terceiro excluído é enunciado da seguinte
maneira: a é x, é minúsculo porque é predicado, ou a é y, não há uma
terceira possibilidade, assim acreditamos que sempre só há duas
possibilidades ou isto, ou aquilo – ou x ou y – ou esta é minha mãe ou
não é minha mãe; obriga-se que se escolha uma delas e só uma como
verdadeira. Sendo que aqui existe o sujeito e o predicado não as duas
coisas ao mesmo tempo. Ainda temos o princípio da razão suficiente que
considera que tudo que existe e acontece tem uma razão, uma causa ou
um motivo, assim a partir desse princípio podemos afirmar que existem
razões internas entre as coisas, seu enunciado pode ser dado a
necessariamente se dará b ou dado b necessariamente houve a, isso
não significa que a razão não possa admitir o acaso, mas mesmo para
esse terá que encontrar uma razão e será restrita a um acidente e não-
universal, não podendo ser generalizada. A disjunção inclusiva seria
figurada pelo e, enquanto que a disjunção exclusiva seria figurada pelo
ou. Essa lógica que eu apresentei é a tradicional, a do Deleuze é da do
e, ao mesmo tempo. O e nesse sentido, ao mesmo tempo. Porque toda
disjunção é exclusiva, assim a disjunção inclusiva já é um paradoxo,
como que você disjuntando vai estar incluindo, por isso é quase
redundante falar disjunção exclusiva, mas ele fala justamente de
disjunção inclusiva...
Fernando – não sei se o aion, o paradoxo, etc, são imagens, então em
certa medida, eu acho que uma lógica exclui a outra, a lógica tradicional
como se fosse uma imaginação, eu penso nisso porque o Espinosa
quando ele vai falara de tempo, ele diz que é um conceito que a
imaginação criou para conseguir esconder alguns problemas, mas o que
existe é a eternidade, e pelo deslocamento da eternidade você cria
alguns conceitos para explicar algumas coisas, mas é a imaginação, ela
é equivocada porque ela te faz esquecer essa idéia de eternidade. E eu
fico pensando se o que o Deleuze está procurando tratar ali não é dizer
a quantidade de possibilidades e como há uma restrição...
Renata – mas é isso que ele fala, essa restrição a existência do tempo
ou a lingüiça são segmentos de reta que pode estar incluído nessa outra
coisa que você está dizendo ou quer seja a eternidade ou isso que você
fala que o Deleuze chama atenção sobre a restrição, então é uma coisa
maior, a diversidade e também, você acha que não está contido?
Fernando – acho que não, pode ser um deslocamento do aion, uma
racionalização... é mais importante ler a lógica do sentido pela
percepção e não pela razão e eu acho que é isso... então, o Américo até
estava me dizendo que ele foi entender o acontecimento quando ele viu
uma ave, seu vôo enfim, é um rompimento com a lógica tradicional...
Valéria – nesse sentido, eu até me apego a uma frase do Deleuze
quando ele diz que nós devíamos ler uma obra como ouvimos um disco,
que eu acho fantástico porque tem coisa que se consegue perceber e
tem outras que não e é percebido de outra maneira, enfim, tem coisas
que entendemos, que esquecemos, etc.
Silvio – mas eu não quero escapar pela percepção não, eu quero
racionalizar um pouco sim, porque pegando essa coisa do Américo, o
que ele fez foi uma sacanagem, “ah não estou entendendo nada, olhei o
pássaro no céu e entendi o acontecimento...” então quando eu parei de
racionalizar na linguagem, mas fui na percepção sensível e entendi
tudo??? Não sei se é bem assim...
Fernando – eu vejo o seguinte... se você pensar a partir da percepção, a
possibilidade de você compreender pela percepção é mais, talvez seja
mais viável do que pela razão, mas eu só sugeri isso porque muitas
vezes deixando a razão você rompe com a lógica tradicional...
Renata – mas tem como de fato deixar a razão??
Fernando – acho que não, mas acredito que a razão e o afeto estão um
no outro, uma coisa está na outra, não sei... mas talvez a percepção
possibilite romper com as categorias da lógica formal, num determinado
momento a percepção pode romper com a lógica formal.
Zé – mas veja só, às vezes a percepção, depende de que percepção, foi
nesse sentido que eu estava dizendo, falando do M.P porque ele
trabalha a noção de profundidade num outro sentido porque o que está
à margem da percepção e ele usa a palavra “borda” é o não-percebível,
então o que está à margem provoca o estranhamento e daí aquilo que
você vai investigar o que é isso que está à margem, na profundidade,
mas que tem uma superfície e você está sentindo e vai provocando um
estranhamento na sua percepção e é aí que você vai buscar, mergulhar,
quer dizer, de certo modo você vai viver também a sua inteligência, mas
daí depende do seu conceito de inteligência, ela é racionalidade? Nesse
caso, ela está trabalhando a partir do sentido, agora é diferente a
percepção em si mesma, de repente ela pode simplesmente reproduzir o
senso comum... então daí a importância de você mergulhar na obra a
partir de uma certa intensidade e de algumas questões provocarem
certo estranhamento, provocar o seu sentido que você vai capturar ou
não o sentido, mas de qualquer maneira eu acredito, acho interessante
essa coisa que o Deleuze coloca sobre a música, acho que isso é para
tudo na nossa vida e ele fala na primeira parte do livro que o sentido,
ele é o primeiro, ele é anterior... por isso é que existem muitas pessoas
que lêem e dizem que não entendem nada, mas dizem que é porque ela
não entendeu o sentido da coisa, então se você não tiver acesso ao
sentido complica, então por isso ao ler interpretar é você ter acesso ao
sentido, se você não tiver acesso ao sentido você vai pegar o quê? O
significado do termo, ou sei lá, então acho que a percepção, a razão,
tudo passa pelo sentido.
Valéria – a Gláucia fez uma pergunta aqui – e anterior ao sentido, o que
é?
Gláucia – porque o que eu quero saber é assim, se você tem contato
com a coisa, mas não vê o sentido, o que é anterior ao que chamamos
de sentido? É o estranhamento?
Zé – pode ser, será que isso não é justamente o paradoxo? porque se
você lê algo e não entendeu, você continua a mesma pessoa, agora se
você lê um texto, e...
Valéria – será, Zé?
Gláucia – uma obra de arte, por exemplo, as leituras que se faz...
Renata – então, mas com uma obra de arte é diferente, porque aqui por
exemplo, você entende as palavras é português, você pode não
entender, mas leu, você não pegou o sentido...
Zé – e é justamente essa noção do paradoxo, o que estávamos falando
em relação ao cinema, tem uma imagem que provoca estranhamento
em relação ao sentido, você tem uma imagem, você reconhece cada
objeto como real, mas a relação dele na imagem ou de uma palavra
com outra você não pega, então é isso que te faz se perguntar, o que é
isso? Qual o sentido disso? O que isso quer dizer? Então se você lê algo
por exemplo um texto de jornal e pegou sua informação, não houve
nenhuma mudança na sua forma de ser, então dependendo do tipo de
texto ele trabalha no nível do senso comum e reproduz uma carta
identidade que você conhece, agora já um texto poético, um texto
filosófico, dependendo de cada um desses textos, ele está justamente
tentando nos colocar em contato com os paradoxos e talvez no sentido
que nós poderíamos dizer, num sentido de uma meta-filosofia ou uma
ontologia, então quer dizer uma filosofia que é capaz de dizer a gênese
do sentido, então a lógica do sentido, pode ser a gênese do sentido, ou
seja, é como nasce o sentido.
Gláucia – então o que você estava falando anteriormente é de um
pseudo-sentido, é isso?
Zé – não porque ele não usa essa noção de falso, mas você inclusive
pode ter os absurdos, os equívocos, os erros e isso faz parte dessa
noção de sentido lá no primeiro capítulo e relacionado ao verdadeiro e
falso porque você pode fazer uma interpretação errada, mas aquilo tem
sentido para você, então isso nos leva até a questão do erro, quer dizer
não existe erro?não existe interpretação errada, equivocada, ou sem
sentido, ou absurda? Então temos o senso comum, o bom senso, pode
ter o absurdo, ou você pode ter uma obra poética que seja geradora de
sentido, produtora de sentido e é por exemplo, na medida em que você
lê um poema e se afeta e existem pessoas que não conseguem ler
poesia... agora isso depende do seu momento, da intensidade, enfim,
outras coisas que talvez vamos ver mais para frente...
Valéria – Silvio, naquele trecho que você leu lá na página 77, aí eu
fiquei pensando aqui, quando ele fala da “paixão do pensamento
descobrindo o que não pode ser senão pensado, o que pode ser senão
falado que é também o inefável, o impensável, Vazio mental, Aion”, aí
eu fiquei pensando no campo de imanência, o tempo do campo de
imanência, seria o tempo do aion?
Silvio – lá no “o que é a filosofia?” quando ele fala que não é uma
sucessão de planos cronológicos, mas múltiplos planos existentes no
aion...
Valéria - então quando ele fala que tem um campo de imanência, tem
um lugar, inclusive para os pensamentos não pensados, não que eles
estejam lá prontos, mas eles podem estar e ninguém pensou ou pode
não ser pensado nunca, mas não significa que ele não exista...
Renata – então vamos mudar de série?
Valéria – eu separei um trecho aqui dessa novela, o Milton trabalha com
o laboratório OLHO, ele trabalha com imagens, nunca fiz disciplina com
ele e não tenho muita interlocução, mas eu gosto bastante dessa novela
e aí só para vocês se contextualizarem, conta aqui que ele encontra uns
manuscritos de um mercador de Veneza de 1800 e tanto e daí o
mercador está contando de uma cidade que ele vai trocar mercadoria e
ele vai numa época do ano em que a cidade funciona de um jeito
completamente outro, de um jeito meio louco e tal, onde os sentidos
acabam se misturando ou são entendidos de um outro jeito e é bem
legal porque eu queria ter separado mais partes dessa novela e acabei
separando só duas... “Como se todos os significados trazidos por ruídos
ou falas tivessem sido arrebatados para uma região obscura. Os
habitantes passam a se movimentar numa busca incessante de novos
sons para falar coisas já conhecidas, repentinamente indizíveis. Nos dias
anteriores a este, tempos de aparente normalidade espalhados pela
aldeia, encontram-se pessoas cuja função parece ser reveladores de
significado...”
“... a pequena história sentimental de Marqueti revela a sua consciência
de que, apesar de vir da sereníssima e bela Veneza era aqui em ? um
ser incompleto, dono de um falar pobre e de milhares de palavras que
nunca alcançavam o sentido das coisas, sua beleza está na busca
impossível de trazer para as palavras, as cores, cheiros e sons dessa
aldeia insólita e tornar-se digno de enamorar...”
aí tem a história de amor, tem o desfecho e lá no final ele vai falar...
“novamente estamos impossibilitados de saber a duração do tempo
desses acontecimentos. Conta-nos não ter experimentado nenhum
problema de entendimento e comunicação e que também não se lembra
se conversaram, se trocavam gestos ou se tudo isso era dispensável
nesse lugar, sabe que não era mais visto como um estranho e
acompanhou todos, enquanto agiram no tempo. O tom dessas ações era
aquele da preparação de um ritual de construção de um momento
importante por acontecer e esse foi ocupado por operações que
aconteceram em diversas salas do estranho tempo”.
Renata – só para desfecho... o Nietzsche... “mas como nos encontrar a
nós mesmos? Como o homem pode se conhecer, trata-se de algo
obscuro e velado e se a lebre tem sete peles, o homem pode bem se
despojar setenta vezes das sete pele, mas nem assim poderia dizer-
ah!, pois sim, eis o que você é verdadeiramente! não há mais o
invólucro!” que é a questão da profundidade, que existe um eu
profundo, mas isso terá que ficar para o próximo encontro.
Renata – (um à parte) ...podemos a partir daí, que ele está falando do
Humpty Dumpty, da simplicidade real, que o paradoxo é a potência do
consciente e tal... “podemos propor um quadro do desenvolvimento da
linguagem em superfície e da doação do sentido na fronteira das
proposições e das coisas. Tal quadro representa a organização dita
secundária, própria à linguagem. Ele é animado pelo elemento
paradoxal ou ponto aleatório ao qual demos duplos-nomes diversos.E
dá na mesma apresentar este elemento como percorrendo as duas
séries na superfície ou como traçando entre as duas a linha reta do
Aion. Ele é não-senso e define as duas figuras verbais do não-senso.
Mas, justamente porque o não senso-se acha em uma relação interior
original com o sentido, ele é também o que provê de sentido os termos
de cada série: As posições relativas desses termos, uns com relação aos
outros depende de uma posição “absoluta” com relação a ele. O sentido
é sempre um efeito produzido nas séries pela instancia que as percorre.
Eis porque o sentido, tal como é recolhido sobre o Aion, tem ele próprio
duas faces que correspondem às faces dessimétricas do elemento
paradoxal: uma, voltada para série determinada como significante; a
outra, voltada para a série terminada como significada. O sentido
insiste em uma das séries (proposições): ele é o exprimível das
proposições, mas não se confunde com as proposições que o exprimem.
O sentido advém à outra série (estados de coisas): ele é o atributo dos
estados de coisas, mas não se confunde com os estados de coisas com
os quais ele se atribui, com as coisas e qualidades que o efetuam. O
que permite, pois, determinar tal série como significante e tal outra
como significada, são precisamente os dois aspectos do sentido,
insistência e extra-ser e os dois aspectos do não senso ou do elemento
paradoxal do qual eles derivam, casa vazia e objeto supranumerário -
lugar sem ocupante em uma série de ocupante sem lugar na outra e é
por isso que o sentido em si mesmo é objeto de paradoxos
fundamentais que retomam as figuras do não-senso, mas a adoção de
sentido não se faz sem que sejam também determinadas condições de
significação as quais os termos das séries, uma vez providos de
sentidos, serão ulteriormente submetidos em uma organização terciária
que os refere às leis das indicações e das manifestações possíveis (bom
senso e senso comum). Este quadro de desdobramento total na
superfície é necessariamente afetado em cada um desses pontos por
uma extrema e persistente fragilidade.” Nada é mais frágil que a
superfície...
Silvio – mas veja, eu acho que é uma pegadinha legal aqui quando ele
fala da fragilidade, aí ele começa a outra série dizendo que nada é mais
frágil que a superfície e dá-nos a ilusão de que você tem ler a página 85
depois da 84, mas eu acho que você pode começar a ler a 85 e depois a
84... acho que não impede a compreensão(...)

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