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Governo do Distrito Federal

Secretaria de Estado de Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres,


da Igualdade Racial e Direitos Humanos
Conselho Distrital de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos

EXCELENTÍSSIMA SENHORA PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA DOUTORA


RAQUEL ELIAS FERREIRA DODGE

O CONSELHO DISTRITAL DE PROMOÇÃO E DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS – CDPDDH,


órgão paritário, que goza de plena e absoluta independência funcional e tem por finalidade atuar
na proteção, promoção e garantia dos direitos humanos, bem como na fiscalização das políticas
dos Direitos Humanos no Distrito Federal, nos termos da Lei nº 3.797, de 06 de fevereiro de 2006 1
e com fulcro na alínea “a” do inciso XXXIV do artigo 5º, da Constituição Federal 2, a ALIANÇA
NACIONAL LGBTI, pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, com sede na Av. Marechal
Floriano Peixoto, 366, Conjunto 43, Curitiba-PR, neste ato representado pelo Coordenador
Regional, Dr. Ricardo Andrade Dallasta, advogado, inscrito na OAB/DF sob o nº 34.715, e a
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE FAMÍLIAS HOMOTRANSAFETIVAS - ABRAFH, pessoa jurídica de
direito privado, sem fins lucrativos, inscrita no CNPJ sob o nº 23.420.475/0001-32, com sede na
Rua Clóvis Beviláqua, 173, Sala 102, Tijuca, Rio de Janeiro - RJ, CEP 20.520-160, neste ato
representado pelo Diretor Executivo, Sr. Emerson da Silveira Gonçalves, vem respeitosamente à
presença de Vossa Excelência, oferecer REPRESENTAÇÃO pelas razões a seguir esposadas:

A) DOS FATOS

O Projeto de Lei nº 173, de 2015 foi vetado integralmente pelo Governador do Distrito
Federal, por intermédio da Mensagem nº 200/2015/GAG, de 8 de setembro de 2015 (cópia anexa)

1 Art. 1º O Conselho Distrital de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, instituído pela Lei nº 1.175 de 29 de julho de
1996, passa a chamar-se Conselho Distrital de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos - CDPDDH.
Art. 2º Ao Conselho a que se refere o artigo anterior compete: [...] II - receber e encaminhar às autoridades competentes
petições, representações, denúncias ou queixas de qualquer pessoa ou entidade que lhe sejam dirigidas por desrespeito
aos direitos individuais e coletivos assegurados na Constituição Federal, na Lei Orgânica do Distrito Federal e demais
tratados de que o Brasil seja signatário;
2 XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;

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Ocorre que o referido veto fora derrubado em sessão da Câmara Legislativa


do Distrito Federal, realizada em 12 de junho de 2018.
Dessa forma, referida lei entrará em vigor no âmbito do Distrito Federal em breve.
Ocorre que referida lei malfere a Constituição Federal, afronta a autoridade de decisão do
Supremo Tribunal Federal e, ainda, a recente decisão da Corte Interamericana de Direitos
Humanos, de observância obrigatória pelo Brasil, razão pela qual merece ser imediatamente
expurgada do ordenamento jurídico nacional.

B) A INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL

Preambularmente, a referida lei trata sobre entidade familiar, regulada pelo Código Civil em
seus artigos 1.511 e seguintes, sendo, portanto, tema de Direito Civil, matéria de competência
legislativa privativa da União, nos termos do art. 22, I, da Constituição Federal 3.
Há, por conseguinte, evidente invasão de competência de outro ente da federação, razão,
por si só, para fulminar a lei por completo. Porém há mais!

C) A INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL

A referida lei afronta, ainda, decisão do Pretório Excelso sobre o tema. Em 2011, o STF
deliberou:
1. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF). PERDA
PARCIAL DE OBJETO. RECEBIMENTO, NA PARTE REMANESCENTE, COMO AÇÃO DIRETA
DE INCONSTITUCIONALIDADE. UNIÃO HOMOAFETIVA E SEU RECONHECIMENTO COMO
INSTITUTO JURÍDICO. CONVERGÊNCIA DE OBJETOS ENTRE AÇÕES DE NATUREZA
ABSTRATA. JULGAMENTO CONJUNTO. Encampação dos fundamentos da ADPF nº 132-RJ pela
ADI nº 4.277-DF, com a finalidade de conferir “interpretação conforme à Constituição” ao art. 1.723
do Código Civil. Atendimento das condições da ação. 2. PROIBIÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO DAS

3 Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:


I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

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PESSOAS EM RAZÃO DO SEXO, SEJA NO PLANO DA DICOTOMIA


HOMEM/MULHER (GÊNERO), SEJA NO PLANO DA ORIENTAÇÃO
SEXUAL DE CADA QUAL DELES. A PROIBIÇÃO DO PRECONCEITO COMO CAPÍTULO DO
CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL. HOMENAGEM AO PLURALISMO COMO VALOR
SÓCIO-POLÍTICO-CULTURAL. LIBERDADE PARA DISPOR DA PRÓPRIA SEXUALIDADE,
INSERIDA NA CATEGORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO INDIVÍDUO, EXPRESSÃO
QUE É DA AUTONOMIA DE VONTADE. DIREITO À INTIMIDADE E À VIDA PRIVADA.
CLÁUSULA PÉTREA. O sexo das pessoas, salvo disposição constitucional expressa ou implícita
em sentido contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica. Proibição de preconceito,
à luz do inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, por colidir frontalmente com o objetivo
constitucional de “promover o bem de todos”. Silêncio normativo da Carta Magna a respeito do
concreto uso do sexo dos indivíduos como saque da kelseniana “norma geral negativa”, segundo a
qual “o que não estiver juridicamente proibido, ou obrigado, está juridicamente permitido”.
Reconhecimento do direito à preferência sexual como direta emanação do princípio da “dignidade
da pessoa humana”: direito a auto-estima no mais elevado ponto da consciência do indivíduo.
Direito à busca da felicidade. Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do
direito à liberdade sexual. O concreto uso da sexualidade faz parte da autonomia da vontade das
pessoas naturais. Empírico uso da sexualidade nos planos da intimidade e da privacidade
constitucionalmente tuteladas. Autonomia da vontade. Cláusula pétrea. 3. TRATAMENTO
CONSTITUCIONAL DA INSTITUIÇÃO DA FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DE QUE A
CONSTITUIÇÃO FEDERAL NÃO EMPRESTA AO SUBSTANTIVO “FAMÍLIA” NENHUM
SIGNIFICADO ORTODOXO OU DA PRÓPRIA TÉCNICA JURÍDICA. A FAMÍLIA COMO
CATEGORIA SÓCIO-CULTURAL E PRINCÍPIO ESPIRITUAL. DIREITO SUBJETIVO DE
CONSTITUIR FAMÍLIA. INTERPRETAÇÃO NÃO-REDUCIONISTA. O caput do art. 226 confere à
família, base da sociedade, especial proteção do Estado. Ênfase constitucional à instituição da
família. Família em seu coloquial ou proverbial significado de núcleo doméstico, pouco importando
se formal ou informalmente constituída, ou se integrada por casais heteroafetivos ou por pares
homoafetivos. A Constituição de 1988, ao utilizar-se da expressão “família”, não limita sua
formação a casais heteroafetivos nem a formalidade cartorária, celebração civil ou liturgia
religiosa. Família como instituição privada que, voluntariamente constituída entre pessoas adultas,
mantém com o Estado e a sociedade civil uma necessária relação tricotômica. Núcleo familiar que
é o principal lócus institucional de concreção dos direitos fundamentais que a própria Constituição
designa por “intimidade e vida privada” (inciso X do art. 5º). Isonomia entre casais
heteroafetivos e pares homoafetivos que somente ganha plenitude de sentido se
desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família. Família
como figura central ou continente, de que tudo o mais é conteúdo. Imperiosidade da interpretação
não-reducionista do conceito de família como instituição que também se forma por vias distintas do

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casamento civil. Avanço da Constituição Federal de 1988 no plano dos


costumes. Caminhada na direção do pluralismo como categoria sócio-
político-cultural. Competência do Supremo Tribunal Federal para manter, interpretativamente, o
Texto Magno na posse do seu fundamental atributo da coerência, o que passa pela eliminação de
preconceito quanto à orientação sexual das pessoas. 4. UNIÃO ESTÁVEL. NORMAÇÃO
CONSTITUCIONAL REFERIDA A HOMEM E MULHER, MAS APENAS PARA ESPECIAL
PROTEÇÃO DESTA ÚLTIMA. FOCADO PROPÓSITO CONSTITUCIONAL DE ESTABELECER
RELAÇÕES JURÍDICAS HORIZONTAIS OU SEM HIERARQUIA ENTRE AS DUAS TIPOLOGIAS
DO GÊNERO HUMANO. IDENTIDADE CONSTITUCIONAL DOS CONCEITOS DE “ENTIDADE
FAMILIAR” E “FAMÍLIA”. A referência constitucional à dualidade básica homem/mulher, no §3º do
seu art. 226, deve-se ao centrado intuito de não se perder a menor oportunidade para favorecer
relações jurídicas horizontais ou sem hierarquia no âmbito das sociedades domésticas. Reforço
normativo a um mais eficiente combate à renitência patriarcal dos costumes brasileiros.
Impossibilidade de uso da letra da Constituição para ressuscitar o art. 175 da Carta de 1967/1969.
Não há como fazer rolar a cabeça do art. 226 no patíbulo do seu parágrafo terceiro. Dispositivo
que, ao utilizar da terminologia “entidade familiar”, não pretendeu diferenciá-la da “família”.
Inexistência de hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as duas formas de constituição
de um novo e autonomizado núcleo doméstico. Emprego do fraseado “entidade familiar” como
sinônimo perfeito de família. A Constituição não interdita a formação de família por pessoas do
mesmo sexo. Consagração do juízo de que não se proíbe nada a ninguém senão em face de um
direito ou de proteção de um legítimo interesse de outrem, ou de toda a sociedade, o que não se
dá na hipótese sub judice. Inexistência do direito dos indivíduos heteroafetivos à sua não-
equiparação jurídica com os indivíduos homoafetivos. Aplicabilidade do §2º do art. 5º da
Constituição Federal, a evidenciar que outros direitos e garantias, não expressamente listados na
Constituição, emergem “do regime e dos princípios por ela adotados”, verbis: “Os direitos e
garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios
por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja
parte”. 5. DIVERGÊNCIAS LATERAIS QUANTO À FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO. Anotação
de que os Ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cezar Peluso convergiram no
particular entendimento da impossibilidade de ortodoxo enquadramento da união homoafetiva nas
espécies de família constitucionalmente estabelecidas. Sem embargo, reconheceram a união entre
parceiros do mesmo sexo como uma nova forma de entidade familiar. Matéria aberta à
conformação legislativa, sem prejuízo do reconhecimento da imediata auto-aplicabilidade da
Constituição. 6. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL EM CONFORMIDADE
COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL (TÉCNICA DA “INTERPRETAÇÃO CONFORME”).
RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA COMO FAMÍLIA. PROCEDÊNCIA DAS AÇÕES.
Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. 1.723

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do Código Civil, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a


utilização da técnica de “interpretação conforme à Constituição”. Isso para
excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união
contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é
de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável
heteroafetiva.
(ADPF 132, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 05/05/2011, DJe-198
DIVULG 13-10-2011 PUBLIC 14-10-2011 EMENT VOL-02607-01 PP-00001) Destacamos.

Não obstante a clareza da decisão do Pretório Excelso, a Câmara Legislativa do Distrito


Federal insiste em afrontar a decisão de nossa Suprema Corte ao promulgar a famigerada lei, que
estabelece de maneira discriminatória em seu art. 2º: “Entende-se por entidade familiar: I – o
núcleo social formado a partir da união entre um homem e uma mulher, por meio de casamento
ou união estável;” Destacamos.
Como se vê, a referida lei, assentada em flagrante discriminação, vedada pela Constituição
Federal em seu art. 3º, inciso IV, volta a estabelecer tratamento discriminatório dos arranjos
familiares homoafetivos.
Inconformada com a interpretação dada à Constituição pelo Supremo Tribunal Federal, seu
natural guardião, a Câmara Legislativa do Distrito Federal promove novamente a afronta ao Texto
Maior, razão pela qual deve ser restabelecida a decisão proferida pelo Pretório Excelso.

D) A AFRONTA À DECISÃO DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS

Convém ainda registrar que a referida lei, desatenta às obrigações e vínculos internacionais
do Brasil, coloca o país no patamar de descumpridor, ao menos no âmbito do Distrito Federal, de
seus compromissos internacionais.
Neste contexto, a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos-CIDH, que na
Opinião Consultiva OC-24/7, de 24 de novembro de 2017, solicitada pela República de Costa Rica 4,

4 Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/opiniones/seriea_24_esp.pdf>. Acesso em 12 Jun. 2018.

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expressamente asseverou a orientação sexual, a identidade de gênero e a


expressão de gênero, como categorias protegidas pelo artigo 1.1 da Convenção Americana e, por
isso, está proscrita pela Convenção qualquer norma, ato ou prática discriminatória baseada na
orientação sexual ou na identidade de gênero das pessoas (item 68).
O Brasil reconhece como obrigatória a competência da Corte Interamericana de Direitos
Humanos em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação da Convenção Americana de
Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica)5
Dessa forma, o entendimento firmado pela CIDH acerca do arts. 11.2 6 e 247 em relação ao
art. 1º8, todos da Convenção, é de observância obrigatória pelo Estado brasileiro e, segundo
entendimento do Supremo Tribunal Federal 9, referidos artigos possuem status de dispositivo
supralegal, prevalecendo sobre as leis ordinárias brasileiras.
Portanto, vê-se que o direito humano à liberdade de orientação afetivo-sexual, de
identidade de gênero e, mais recentemente, de expressão de gênero, ocupa significativamente a
mais recente agenda internacional dos direitos humanos.

5 O Decreto 4.463, de 8 de novembro de 2002, reconhece como obrigatória a competência da Corte Interamericana de
Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), consoante é possível extrair de seu art. 1º: É reconhecida como
obrigatória, de pleno direito e por prazo indeterminado, a competência da Corte Interamericana de Direitos Humanos
em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São
José), de 22 de novembro de 1969, de acordo com art. 62 da citada Convenção, sob reserva de reciprocidade e para
fatos posteriores a 10 de dezembro de 1998.
6 Artigo 11.2. Proteção da honra e da dignidade. [...] Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em
sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ataques ilegais à sua honra e
reputação.
7 Artigo 24. Igualdade diante da lei. Todas as pessoas são iguais diante da lei. Em consequência, têm direito, sem
discriminação, à igual proteção da lei.
8 Artigo 1º. Obrigação de respeitar os direitos. 1. Os Estados Partes nesta Convenção se comprometem a respeitar os
direitos e liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que está sujeita à sua
jurisdição, sem discriminação alguma por motivos de raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer
outra forma, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição social. Para os
efeitos desta Convenção, pessoa é todo ser humano.
9 O Supremo Tribunal Federal, no HC 88.240, Relatora Ministra Ellen Gracie, DJe de 23/10/2008, deliberou sobre o
caráter especial do Pacto Internacional dos Direitos Civis Políticos (art. 11) e da Convenção Americana sobre Direitos
Humanos - Pacto de San José da Costa Rica (art. 7°, 7), ratificados, sem reserva, pelo Brasil, no ano de 1992. Assentou
que a esses diplomas internacionais sobre direitos humanos é reservado o lugar específico no ordenamento jurídico,
estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados
internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil, torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele
conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação.

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Especificamente sobre o tema versado na malfadada lei, a Corte


Interamericana de Direitos Humanos é clara:

220. Estabelecer um tratamento diferente entre os casais heterossexuais e aqueles do mesmo


sexo na forma que podem fundar uma família – seja por união matrimonial de fato ou um
matrimônio civil – não logra superar um teste estrito de igualdade (supra párr. 81), pois, a juízo do
Tribunal, não existe uma finalidade que seja convencionalmente aceitável para que esta distinção
seja considerada necessária ou proporcional.
221. A Corte adverte que para se negar o direito de acessar a instituição do casamento,
tipicamente se utiliza como argumento que sua finalidade é a procriação e que esses tipos de
união não cumprirão com tal fim. Neste sentido, a Corte estima que essa afirmação é incompatível
com o propósito do art. 17 da Convenção, a saber, a proteção da família como realidade social.
Assim mesmo, a Corte considera que a procriação não é uma característica que defina as relações
conjugais, pois afirmar o contrário seria degradante para os casais – casados ou não – que por
qualquer motivo carecem da capacidade de gerar ou do interesse em procriar.
222. Por outro lado, o significado da palavra “matrimônio”, assim como de “família” tem variado
conforme o passar dos tempos (supra párr. 177). Se a etimologia é sempre ilustrativa, ninguém
pretende uma imposição semântica da etimologia, pois do contrário se deveria igualmente excluir
da linguagem outra numerosa quantidade de vocábulos, cuja semântica se aparta de sua
etimologia.
223. Ainda, a evolução do matrimônio dá conta de que sua atual configuração responde à
existência de complexas interações entre aspectos de caráter cultural, religioso, sociológico,
econômico, ideológico e linguístico. Neste sentido, a Corte observa que em certas ocasiões, a
oposição ao matrimônio de pessoas do mesmo sexo está baseada em convicções religiosas ou
filosóficas. O Tribunal reconhece o importante rol que colocam ditas convicções na vida e na
dignidade das pessoas que a professam; não obstante, estas não podem ser utilizadas como
parâmetro de convencionalidade, pois a Corte estaria impedida de utilizá-los como um guia
interpretativo para determinar os direitos de seres humanos. Em tal sentido, o Tribunal é da opinião
que tais convicções não podem condicionar o que a Convenção estabelece a respeito da
discriminação baseada na orientação sexual. E assim como nas sociedades democráticas deve
existir coexistência mutuamente pacífica entre o secular e o religioso; por isso o papel dos Estados
e dessa Corte é reconhecer a esfera na qual cada um desses habita, e em nenhum caso forçar um
sobre a esfera do outro”.

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E) CONCLUSÃO

Portanto, é possível concluir que a referida lei, sob várias perspectivas, por insistir em tentar
subalternizar as relações familiares homoafetivas, por descumprir o princípio maior de nossa
República, que é a preservação da dignidade da pessoa humana, o que inclui todas as pessoas, por
afrontar a Constituição Federal, ignorar os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil e
pretender substituir-se ao Supremo Tribunal Federal na interpretação da Lei Maior, apresenta
vícios insanáveis, que a tornam incompatível com o ordenamento pátrio.

F) O PEDIDO

Diante do exposto, solicita-se a Vossa Excelência o recebimento da presente


REPRESENTAÇÃO, e a adoção das medidas que entender pertinentes, de forma a expurgar de
nosso ordenamento jurídico a referida lei, aprovada pela Câmara Legislativa do Distrito Federal.

Nestes Termos,
Pede Deferimento.

Brasília-DF, 14 de junho de 2018

MICHEL PLATINI
Presidente do CDPDDH

RICARDO ANDRADE DALLASTA


Coordenador Regional da Aliança Nacional - LGBTI

EMERSON DA SILVEIRA GONÇALVES


Diretor Executivo da ABRAFH

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