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da justiça distributiva: determina que se proceda com equanimidade sempre que se


trate de recnhecer normativamente bens, encargos, riscos e oportunidades;
o portunidades;
-p. do mínimo de existência: exige que se garanta a cada pessoa a atribuição dos bens e
serviços necessários para que verdadeiramente
verdadeiramente possa existir como pessoa;
- p. da progressiva
progr essiva eliminação das diferenças: determina que se tente melhorar sempre e
tanto quanto possível, através de uma criteriosa repartição da riqueza;
- p. da justiça comutativa: impõe que o respeito pelos pré-existentes equilíbrios
patrimoniais sempre que se proceda a uma troca de bens;
- p. da segurança jurídica: postula a transparência da situação jurídica.

Estes princípios constituem valores fundamentais.

3) É constituído pelo plano da dimensão axiológico-normativa última do direito. É a auto-


recíproca compreensão do Homem com ser ético-praticamente dignificado que os
mencionados princípios fundamentais irredutivelmente traduzem.
A categoria pessoa é diferente da categoria indivíduo. À pessoa reconhece-se, na
intersubjectividade comunitária e mesmo de uma perspectiva bio-eticamente centrada, uma
dignidade de todo independente da pertença a um determinado sexo, raça. Por isso, a pessoa
é sujeito indisponível e não objecto manipulável. A pessoalidade pressupõe o reconhecimento
de uma autonomia ética comunitariamente integrada e normativo-juridicamente relevante,
enquanto que a individualidade identifica uma pura unidade discreta conformadora.
Cada um de nós só emerge como pessoa se como tal for reconhecido no diálogo da
reciprocamente responsabilizante dignificação ética em que é com os outros. Enquanto o
indivíduo era pensado contra a comunidade, a pessoa tem na comunidade uma sua dimensão
constitutiva.
O nível de ser que antigimos devemo-lo, em grande parte, à comunidade em que somos,
porque depende significativamente do património humano-cultural que herdámos e que
depois vamos reconstituindo dialecticamente. A pessoa real é constituída pela dialéctica de
um eu singular e de um eu social.
Mas a comunidade em que se enreda com cada um de nós  – valor esse que se projecta no
princípio da responsabilidade dos sujeitos-pessoas, uns perante os outros e perante o todo o
comunitário, quer através do dever de solidariedade, quer do dever de corresponsabilidade. A
solidariedade mostra não se esgostar a relação de cada um com os outros numa mera
 justaposição de egoísmos, e antes implicar um respeito sincero para com eles.
eles. A
corresponsabilidade indicia a projecção, em cada um de nós, dos valores tutelados pela ordem
comunitária e que não devem ser violados nem preteridos sem fundamento bastante. E o
Direito é sempre a transacção possível entre o que usufruímos em autonomia e em
participação e o que devemos em solidariedade e em corresponsabilidade.
corresponsabilidade.

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- p. da justiça distributiva: determina que se proceda com equanimidade sempre que se
trate de recnhecer normativamente bens, encargos, riscos e oportunidades;
o portunidades;
-p. do mínimo de existência: exige que se garanta a cada pessoa a atribuição dos bens e
serviços necessários para que verdadeiramente
verdadeiramente possa existir como pessoa;
- p. da progressiva
progr essiva eliminação das diferenças: determina que se tente melhorar sempre e
tanto quanto possível, através de uma criteriosa repartição da riqueza;
- p. da justiça comutativa: impõe que o respeito pelos pré-existentes equilíbrios
patrimoniais sempre que se proceda a uma troca de bens;
- p. da segurança jurídica: postula a transparência da situação jurídica.

Estes princípios constituem valores fundamentais.

3) É constituído pelo plano da dimensão axiológico-normativa última do direito. É a auto-


recíproca compreensão do Homem com ser ético-praticamente dignificado que os
mencionados princípios fundamentais irredutivelmente traduzem.
A categoria pessoa é diferente da categoria indivíduo. À pessoa reconhece-se, na
intersubjectividade comunitária e mesmo de uma perspectiva bio-eticamente centrada, uma
dignidade de todo independente da pertença a um determinado sexo, raça. Por isso, a pessoa
é sujeito indisponível e não objecto manipulável. A pessoalidade pressupõe o reconhecimento
de uma autonomia ética comunitariamente integrada e normativo-juridicamente relevante,
enquanto que a individualidade identifica uma pura unidade discreta conformadora.
Cada um de nós só emerge como pessoa se como tal for reconhecido no diálogo da
reciprocamente responsabilizante dignificação ética em que é com os outros. Enquanto o
indivíduo era pensado contra a comunidade, a pessoa tem na comunidade uma sua dimensão
constitutiva.
O nível de ser que antigimos devemo-lo, em grande parte, à comunidade em que somos,
porque depende significativamente do património humano-cultural que herdámos e que
depois vamos reconstituindo dialecticamente. A pessoa real é constituída pela dialéctica de
um eu singular e de um eu social.
Mas a comunidade em que se enreda com cada um de nós  – valor esse que se projecta no
princípio da responsabilidade dos sujeitos-pessoas, uns perante os outros e perante o todo o
comunitário, quer através do dever de solidariedade, quer do dever de corresponsabilidade. A
solidariedade mostra não se esgostar a relação de cada um com os outros numa mera
 justaposição de egoísmos, e antes implicar um respeito sincero para com eles.
eles. A
corresponsabilidade indicia a projecção, em cada um de nós, dos valores tutelados pela ordem
comunitária e que não devem ser violados nem preteridos sem fundamento bastante. E o
Direito é sempre a transacção possível entre o que usufruímos em autonomia e em
participação e o que devemos em solidariedade e em corresponsabilidade.
corresponsabilidade.

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14.ª Lição: O modo-de-ser do Direito

 Modalidades de existência: a normatividade jurídica manifesta-se como uma realidade


ou objetividade social, o que nos leva a perguntar: qual a verdadeira modalidade de existência
do Direito?
O modo de ser do direito é a vigência, categoria com um enorme interesse prático
(manifestado no aumento das fontes de direito) e teorético (enquanto síntese do modo de ser
do direito). A vigência do Direito é uma vigência paralela à Cultura. A cultura não é uma pedra
 – nasce, evolui e morre. Por isso, a cultura hoje vigente não é igual à, por exemplo, medieval.
Podemos considerá-la vigente quando for efectiva dimensão da existência comunitária. E é
assim porque comunicamos através de certos sentidos, densificadores da constituenda cultura
que partilhamos e que nos permitem compreender
com preender a nós, aos outros e ao mundo
m undo onde
existimos. O mesmo se pode dizer mutatis mutandis para o direito. A vigência normativo-
 jurídica afirma-se num determinado
determinado âmbito social e num determinado momento
momento temporal. O
direito é um dever-ser e a vigência é precisamente este modo de existência de um dever-ser.
O direito é simultaneamente uma específica normatividade (numa validade) e uma
instância reguladora dos problemas mais relevantes suscitados pelo nosso encontro mundanal
 – daí que os princípios normativos
no rmativos apresentem uma dimensão societária.
A vigência é, portanto, a subsistência histórico-social de uma normatividade. É aquele
fenómeno ou modo de ser do normativo que se verifica quando uma validade e um regulativo
normativos são assumidos vinculativamente e informam praticamente a vida histórica de uma
determinada comunidade. Deve-se-lhe apresentar, portanto, uma face ideal (a validade) e
outra empírica ou factual (a eficácia), daí que o direito seja um dever-ser que é.
A vigência acrescenta à validade a eficácia, mas também não se reduz a uma mera
eficácia. Se assim fosse, qualquer violação dos critérios jurídicos impostos traduziria a omissão
da vigência do direito e tal não acontece. Estamos no campo das expectativas normativas que
são contratuais: os factos que as desrespeitam não as anulam. Quando o direito vigente é
violado perde em eficácia mas não parece pois tanto o direito como a cultura admitem
pretensões, isto é, reportam,
reportam, num certo grau, transgressões. Isto compreende-se
compreende-se por ser uma
existência de valor e não de facto. No entanto, quando as exigências axiológicas que o
constituem são continuamente violadas, estamos já perante intenções de val idade que
deixaram de ser eficazes, já que deixaram de ser condicionantes dos comportamentos. Se um
valor concreto deixa de ser condicionante dos comportamentos subjectivos perde eficácia e,
por essa via, vigência.
Existe uma bipolaridade nuclear da vigência – a validade traduz uma existência ideal,
sendo o seu pólo ao nível do conteúdo (plano axiológico), enquando a eficácia traduz uma
existência real, constituindo o seu pólo ao nível factual (plano sociológico). Mas, sendo a
vigência dialecticamente modelada por estes dois pólos não se reduz a nenhum deles  – não se
identifica com a estrita eficácia (como os positivistas pretendem) porque admite, até certo
ponto, omissões; nem se equipara à validade (como
( como sustentam os jusnaturalistas) porque é
antes de mais um fenómeno social, surgindo como uma das respostas aos problemas
pro blemas que se
colocam.
Em conclusão, podemos dizer que a dialéctica que passa junto da vigência é um sinal
revelador da precariedade tanto da cultura como do direito. Por outro lado, constitui uma

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advertência no sentido de não absolutizar, no estudo do direito, um ponto de vista centrado
num dos vectores apontados.

 Modalidades normativas: modelam o universo jurídico-cultural ao nível constitutivo e


permitem-no tematizar.

- Direito Objectivo: conjunto de normas e práticas jurídicas  – normalmente compiladas


em diplomas como c Código Civil  – que regulam a nossa dimensão societária;

- Direito Subjectivo: poder jurídico reconhecido pela ordem jurídica a uma pessoa de
livremente pretender ou exigir de outrem determinado comportamento positivo (acção) ou
negativo (omissão) – direito subjectivo propriamente dito  – ou de, por um acto de livre
vontade, só de per si ou integrado por um acto de autoridade pública, produzir determinados
efeitos jurídicos que inevitavelmente incidirão na esfera jurídica de outrem  – direitos
potestativos que se desdobram em: extintivos, restitutivos e constitutivos.

 Épocas de Direito Objectivo e Direito Subjectivo: a relação entre estes dois modelos
emergiu incipientemente na Idade Média, afirmou-se comunitariamente na Idade Moderna e
foi conceptualmente tematizado apenas no século XIX. A nível dos direitos pré-modernos não
havia propriamente direitos subjectivos, mas sim estatutos sociais que os diversos actores
sociais investiam. Para o pensamento romano o direito era uma ordem objectiva que definia o
estatuto dos cidadãos e determinava a situação das coisas.
Na Idade Média, à integração do Homem na comunidade sucede a autonomizante
desintegração dela, passando a ser possível pensar com sentido nos direitos subjectivos. Na
Idade Moderna, o Homem assume a sua autonomia pessoal perante as comunidades. O
individualismo e o contratualismo vieram a estabilizar a possibilidade de existir um conjunto
de direitos subjectivamente titulados. Foi o Jusnaturalismo Moderno que instituiu a criação de
sistemas de direitos subjectivos. O Homem passou a compreender-se como um indivíduo, com
uma autonomia que se projectava nos direitos subjectivos que titulava. O direito objectivo era,
na época moderno-comunista, uma mera soma de direitos subjectivos, entre os quais se
destacava o direito de propriedade e o de liberdade. Mais tarde, com a autonomização do
direito público, emergiram outros direitos fundamentais.
Mas o século XX apresentou-se como uma época dualista: subjectivista- na linha liberal de
Locke; e objectivista – os direitos subjectivos eram reconhecidos pelo direito objectivo
segundo a tradição francesa de Montesquieu e Rosseau.
Conclui-se que quanto mais se afirmar a individualidade, mais se afirmam os direitos
subjectivos e mais se desintegra o sistema objectivamente consagrado; à medida que se afirma
vincadamente a autonomia da individualidade e se procuram incessantemente os direitos
subjectivos, o direito objectivo desvela a responsabilizante vinculação de cada um à
comunidade, o horizonte de emergência da personalidade. A hipertrofia de uma destas
categorias gera uma prática desequilibrada. Por exemplo, a sobressalência do direito
subjectivo corresponde ao apagamento da comunidade, levando à anarquia; assim como uma
unilateral acentuação do direito objectivo foi o oculto propósito de todas as ditaduras.
Actualmente, são dois pólos irredutíveis de normatividade jurídica na medida em que se
densificam reciprocamente. O Homem apresenta-se hoje como pessoa, constituído por

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centrífguas e centrípetas, a que correspondem os direitos objectivo e subjectivo. É uma pessoa
autónoma, mais responsável pela comunidade em que se insere. A normatividade jurídica só
pode ser compreendida em termos de uma dialéctica entre o direito objectivo e o direito
subjectivo. É exactamente isto que o critério do abuso do direito (artigo 334.º Có digo Civil) nos
pretende evidenciar: mesmo que tenhamos capacidade para exercer direitos subjectivos que
os titulamos, temos que respeitar o seu fundamento material, caso contrário incorremos numa
situação de abuso do direitos. Temos que ter em conta a inserção comunitária do Homem.

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15.ª Lição: A Objectivação da Normatividade Jurídica

O direito como Sistema Jurídico: o modo de objectivação da normatividade jurídica


manifesta-se num sistema. Institucionalmente, o direito surge como ordem jurídica;
intencionalmente, apresenta-se como sistema jurídico.
Qualquer sistema jurídico se caracteriza pelas notas de unidade e coerência. A unidade do
sistema jurídico é precisamente uma exigência lógica, com interesse prático, que garante a
não-contradição e assegura a programação da vida, um pressuposto da realização da
segurança através do direito. Assim, o direito tem que ser uma ordem em que se objective a
normatividade vigente. Contudo, ele também ajuíza, igualmente, em termos valoradores, os
critérios da própria acção.
O direito é necessariamente uma ordem, mas não menos necessariamente um problema.
De que tipo há-de ser o sistema jurídico? Como se manifesta ele?

-> A perspectiva normativística do sistema jurídico que traduz a concepção positivista


do direito: dominou o pensamento jurídico europeu desde o início do século XIX. Teve a
sua origem no jusnaturalismo – num pensamento lógico-abstracto e axiomático-dedutivo
que concebia o sistema jurídico como um sistema logicamente estruturado com base nas
posições abstractas que se manifestavam antes da sua aplicação concreta, sob a forma de
normas. O normativismo foi a tradução daquilo mesmo;

-> Opõe-se a esta concepção normativa uma perspectiva casuística, de que é exemplo o
direito romano clássico (um sistema jurisprudencial doutrinal), o direito medieval (um sistema
 jurisprudencial hermenêutico), ou acutalmente o sistema inglês da Common Law – um sistema
baseado em precedentes, isto é, na resolução de casos concretos, toma-se como ponto de
partida a comparação do fundamento normativo material de casos análogos precedentes. O
casuísmo era portanto uma perspectiva mais antiga, pelo que o normativismo constituiu uma
novidade. Do ponto de vista casuístico dá-se enorme importância à figura do jurista, enquanto
instância de reconstituição do fundamento jurídico nuclear e culturalmente conservadora. Era
um sistema complexo constituído por várias dimensões;
-> O racionalismo moderno mudou as coisas. Quis eliminar a pluridimensional
complexidade do sistema jurídico do direito romano e do direito pré-moderno ao afirmar a
unidimensionalidade do sistema jurídico: era composto por um só estrato imposto ao
legislador. Esta concepção normativista foi a concepção do positivismo ulterior que via o
sistema jurídico como um sistema concluso, um conjunto de normas legais que contém a
resolução de todos os problemas da vida concreta, porque direito era igual à lei;
-> Hoje, o entendimento do positivismo jurídico é insustentável. Temos que descobrir um
entendimento do sistema que se mostra liberto das aforias positivistas. Nem toda a
normatividade material que transcreve as normas pré-existentes  – não só uma normatividade
que está acima das normas legais, mas também a normatividade que está abaixo destas (a
própria normatividade jurídica numa dimensão integrante do sistema jurídico). É certo que o
positivismo jurídico falava já em princípios, mas estes não eram ainda princípios normativos,
mas sim gerais do direito (generalizações lógicas das normas positivas). Ao formarmos
princípios normativos, estamos já a fazer referência ao primeiro estrato do sistema jurídico.

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A relevância da Metodológica do Sistema Jurídico: vivemos num sistema de legislação
 – os casos susceptíveis de serem reconhecidos como juridicamente relevantes podem ser
solucionados pela mediação das normas jurídicas. O legislador tem uma perspectiva
privilegiadora de criação da normatividade vigente – mas não tem o monopólio! As normas
não dão a solução concreta, são mobilizadas para orientar o decidente, mas a solução concreta
é-nos dada pela sentença judicativa, isto é, a decisão judicativa.
Estamos perante duas categorias metodológicas muito importantes: a norma e a decisão
e, entre elas, intervém uma terceira  – o juízo (a fundamentação da decisão). A decisão radica
na afirmação de uma vontade, é um “quero, posso e mando” e como tal tem de ser
fudamentada pelo juízo que racionaliza a passagem da norma a decisão. O juízo assimila a
norma com a decisão. Como? O juíz utiliza a norma para justificar a decisão, mas tem que
inserir a norma num contexto mais amplo, o sistema jurídico.

Estratos do Sistema Jurídico


1) Princípios Normativos: constituem o específico momento de validade da
normatividade jurídica. São uma intenção prática que se deve reconhecer como fundamento
normativo e de validade do direito. Têm um carácter indeterminado e surgem como exigências
de sentido a cumprir. Não nos dão directa e imediatamente um critério de imputação, mas
identificam a orientação de um caminho a seguir.

Nota: - princípios normativos = normas: os princípios normativos enunciam uma


intenção regulativa na solução desses problemas, não prescindindo por isso de uma mediação
concretizadora. São mais elásticos e abertos do que as normas ; estas pretendem, pela sua
estrutura lógica, oferecer a solução imediata de um caso- não conseguem porque são gerais e
abstractas, enquanto os casos são particulares e concretos. Tendem a ser critérios acabados,
fechados.

- fundamentos = critérios: referentes em que se baseiam as decisões concretas =


modelos predispostas à sua mais imediata disquisição.

Os princípios normativos aparecem como intenções práticas a seguir na solução de casos


concretos: é o legislador que os cria. Mas também o pensamento jurídico tem competência e
capacidade para os construir. A jurisprudência judicial tem legitimidade para realizar a
explicitação, assimilação e autónoma constituição jurídica dos vários tipos de princípios. Este
poder deriva da sua autoridade social (é a única instância que fala em nome do direito),
legitimidade formal (é a instância de realização do direito) e legitimidade política (tem a
função política de não ser política).
Os princípios tornam-se próprios de direito quando: se apreresentarem em consonância
com a ideia de direito tal como a compreendemos; virmos neles a nota societária que
apresentamos à normatividade jurídica; poderem ser justificadamente mobilizados na decisão
de um caso concreto; apresentarem um carácter integrante; os pudermos considerar vigentes.
A função normativa dos princípios começou por ser meramente subsidiária e integrante –
o pensamento tradicional só mobilizava os princípios em desespero de causa, isto é, quando
não houvesse lei. Hoje, os princípios são elementos materiais do próprio sistema jurídico, pelo

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que actuam em todos os momentos de constituição do direito, embora intervenham mais
notoriamente quando não houver mediação de uma norma na realização do direito.

Tipos de princípios
- > p. positivos: estão expressa ou implicitamente consagrados no sistema jurídico;
- > p. transpositivos: constituem as condições normativo-transcendentes e conferem
sentido especificamente constitutivo aos vários e diferenciados domínios jurídicos;
- > p. supra-positivos: são constitutivos do fundamento último do direito relacionando-se
com a dignidade ética da pessoa humana.

 Modo de objectivação
- > escritos: aqueles mais elaboradamente tematizados;
- > não-escritos: aqueles que se vão propondo em resultado de uma mais
aprofundadamente relfectiva intelecção de juridicidade.

 Intencionalidade Normativa
- > abertos: só estamos perante princípios normativos se estes puderem ser
racionalizados no âmbito de um determinado processo especial. A justiciabilidade apresenta
duas dimensões: formal (garantida pelo processo) e material (garantida pela compreensão do
 juízo tal como ele deve ser entendido metodologicamente);
- > em forma de norma: são susceptíveis de ser adequadamente mobilizados em juízo
com o objectivo de dar uma resposta pronta a pertinentes interrogações que se podem
levantar.

 Origem normativa
- > p. que explicitam a ideia de direito, ou seja, que são imediatas explicitações da
normatividade da ideia de direito (ex: dignidade da pessoa humana);
- > p. que traduzem juridicamente valores e poderes ético-sociais (ex: boa-fé);
- > p. especificamente jurídicos (ex: não retroactividade das leis).

O problema das relações entre lei e direito é o problema de maior dimensão da função
normativa dos princípios. Até agora afirmaram-se dois princípios extremos para a solução
deste problema: legalismo e o jusnaturalismo. Opta-se por uma solução de meio-termo: como
as leis devem ser interpretadas segundo a constituição, supomos também que pode sustentar-
se que as normas devem ser interpretadas conforme os princípios. No entanto, a antinomia
lei/direito pode ser radical, ou seja, pode acontecer que uma norma viole certos princípios e
valores e aí deverá preferir-se imediatamente por estes últimos já que a norma seria injusta e,
portanto, inválida. Além disso, pode bem acontecer que as normas apareçam a limitar os
princípios. Temos outro modo de superar as antinomias lei/direito.

2) Normas Jurídicas: visam determinar / solucionar um dado problema pela sua estrutura
lógica, já que ligam a uma certa hipótese, que prevêem, determinada consequência jurídica.
No entanto, não deverão ser só concebidas como premissas lógicas, como entendia o
positivismo. Só ganham sentido quando referidas ao princípio que as fundamenta. Na verdade,
se nós compreendermos a norma como uma premissa lógica, a única coisa que nos importaria

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era determinar o sentido que ela própria (para o objectivismo), ou o legislador através dele
(para o subjectivismo) visa comunicar com o texto dessa mesma norma. Se pelo contrário
virmos a norma como solução tipificada do problema concreto, então vemos nela tudo o que
constitui – os fundamentos em que radica e os casos que visa resolver.
A norma é uma das determinações possíveis da intencionalidade mais difusa dos
princípios normativos. Há sempre um excesso normativo dos princípios em relação às normas.
Quanto à norma temos que considerar dois momentos: racional (fudamenta-se nos
princípios); imperativo (é o resultado da opção entre várias possibilidades que se abrem ao
legislador para objectivar a intenção normativa dos princípios fundamentais da norma).

Classificação das normas:


- norma de determinação dos comportamentos (como critério de sanção): acentua o
seu valor sociológico;
- norma de valoração da acção: acentua o seu carácter axiológico-prático;
- norma de decisão: critério de juízo.

3) Jurisprudência Judicial: participa na tarefa de reconstituição da normatividade vigente,


sendo em muitas ocasiões chamada a desempenhar a tarefa de autónoma constituição ex
novo dessa mesma juridicidade. Os precedentes constitucionais são o resultado disso mesmo,
passando a ser critérios mobilizáveis no futuro, para a resolução de casos análogos
posteriores. Quando um precedente puder ser invocado a favor ou contra uma decisão deve o
mesmo ser alegado. Aquele que pretender afastar um precedente tem o ónus da contra-
argumentação.

4) Jurisprudência Dogmática: as normas e os precedentes jurisdicionais são apenas


moléculas do sistema jurídico. Sendo este uma unidade racional, prática e totalizante,
necessita de outra dimensão  – a dogmática. São os juristas que tratam disto, cumprindo-lhe
assumir as intenções práticas do direito para discernir o seu sentido e elaborar em termos
prático-racionalmente unitários os princípios, as normas e os princípios jurisdicionais. Os
 juristas elaboram modelos de decisão que tornam o direito prático (metodologicamente
utilizável). À Dogmática cabe explicitar as virtualidade normativas contidas nas próprias
normas, já que a intencionalidade da norma acaba por ser mais rica do que quando
inicialmente formulada.
Por vezes a norma não oferece imediatamente critérios disponíveis para resolver certos
problemas mas, de acordo com as virtualidades normativas contidas nas próprias
implicitamente, podemos chegar a esses critérios explicitando as normas.
A dogmática desempenha assim uma função complementar, antecipante (na medida em
que permite encontrar os critérios decisórios) e projectante  – os critérios enunciados pelas
decisões jurisprudenciais podem constituir pontos de partida e de orientação para futuros
casos análogos, explicitanto a intencionalidade normativa das normas que podem ser
mobilizadas na resolução desses casos. Desempenha ainda outras funções: estabilizadora:
compensa a abertura do universo prático-normativo; dinamizadora: permite a revelação de
novos problemas; desoneradora: dispensa uma problematização infundável dos pressupostos
da sua decisão; técnica: preocupa-se com o tratamento sistemático das diferentes matérias; de

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controlo: permite o controlo mais adequado das decisões judicativas; prático-normativa: não
se basta com uma função sistemática conceitual da explicitação de normas positivas.

5) Realidade Jurídica: não é apenas um campo inerte de aplicação do direito. De facto, o


modo como o Direito é levado à prática pelos seus destinatários reconstitui a normatividade
vigente. É composta pelas realidade económica, política e cultural.

6) Dimensão Procedimental: é o cumprimento dos operadores técnico -argumentativos


que o jurista deve utilizar para poder cumprir de um modo adequado a tarefa de que está
incumbido – a realização judicativa concreta do direito.

Por referência à categoria histórica da vigência, podemos dizer que os princípios são
reversíveis mas benefeciam de uma presunção de validade; as normas benefeciam de uma
presunção de autoridade; os modelos elaborados pela dogmática de uma pretensão de
racionalidade; os precedentes jurisdicionais de uma presunção de justeza; a realidade jurídica
de uma pretensão de eficácia; e os bordos procedimentais de uma pretensão de justabilidade.

 O Sistema Jurídico e a sua dinâmica: o Sistema Jurídico é aberto (porque atende à


realidade), material (porque integra princípios) e dinâmico (marcado para uma regressividade
à posteriori). Ao ser aberto traz problemas novos. É composto por um conjunto de critérios
que têm de se reconstruir para responder aos novos problemas. E reconstrói-se de uma forma
regressiva à posteriori: os estratos que vão sendo inventados hoje reincidem sobre o que
tínhamos adquirido ontem.

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16.ª Lição: As fontes do Direito

Tipos fundamentais de Experiência Jurídica Constituinte

a) Exp. Jurídica Consuetudinária: no horizonte das consensuais sociedades tradicionais


que se reviam no passado, o Direito manifestava-se (constituía-se) como costume jurídico  –
como um comportamento comunitariamente estabilizado, reiteradamente observado (corpus:
elemento externo e objectivo), com a convicção da sua obrigatoriedade (animus: elemento
interno e subjectivo). Uma determinada regra da vida social que desse boas provas devia
continuar a seguir-se - e o comportamento social institucionalizado, que assim se menciona,
identifica precisamente o referido costume jurídico.
Esta experiência jurídica apresenta uma normatividade radicada na força do tempo e
experiencialmente sedimentada ao longo de gerações. É a normatividade, com uma
fundamentante validade intencional, que suscita o seu reconhecimento social como direito.

b) Exp. Jurídica Legislativa: tem uma índolo estatal porque nos reporta ao poder político.
Cumpre-se na prescrição de regras ou normas num intenção de regulamentação e
programática relativamente à realidade social ou político-social, que é o seu objecto.
A dimensão do tempo aqui patente é o futuro, já que o direito é compreendido como um
comando que se dita hoje para resolver problemas que se levantam amanhã. A constituição do
direito – anterior e autónomo do problema da sua aplicação – destaca-se portanto da
sociedade e afirma-se como uma estratégia politicamente orientada.
Estamos agora perante uma forma organizada e deliberada de constituir a normatividade
 jurídica, que apresenta as seguintes notas tipificadoras:

- o direito destacava-se dos comportamentos, precipitando-se em normas ou regras


definidoras de critérios abstractos susceptíveis de os regulamentar;
- as normas ou regras pressupõem uma decisão racionalizante proferida  – razão que se
articula com a vontade. Visam inovar a normatividade jurídica anterior. Têm nos textos uma
dimensão autenticamente constitutiva e, ao mesmo tempo, garante da racionalidade
prosseguida e determinante do carácter hermenêutico-cognitivo do pensamento jurídico em
que se cumpriu. Têm atrás de si um poder que assume uma certa estratégia que ocorre para a
politização do Direito.

c) Exp. Jurídica Jurisdicional: tem uma índole prudencial, a assumir processualmente


pelo julgamento, o que implica a autonomização da constituenda normatividade jurídica e do
pensamento que a reflecte. A dimensão do tempo que aqui revela é o presente: importa
decidir hoje sobre os problemas que hoje se levantam.
A constituição do direito ocorre aquando da judicativo- concreta resolução das
controvérsisas juridicamente relevantes. E, na verdade, surgem problemas com um mérito
particular que fazem apelo a fundamentos de validade intersubjectivamente reconhecidos e
estruturantes que as instâncias com legitimidade para proferir decisões judicativas mobilizam,
objectivando a normatividade vigente. Esta situação implica a intervenção de um mediador a
quem compete proferir a normatividade constituinte da decisão judicativa (deve ponderar a
solução adequada da controvérsia judicativa). Trata-se de um mediador objectivo  – porque

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chamado a projectar a constituenda validade pressuposta no decidendo problema
controvertido-, mas também subjectivo  – porque colocado entre as partes desavindas,
cumprindo-lhe ajuizar do método jurídico das respectivas posições. A normatividade
objectivada em referência a casos concretos pode vir a ser posteriormente reconvocada
quando se estiver perante um problema análogo.

Teoria Tradicional das Fontes de Direito

Aepnas são fonte de direito os modos de constituição que a lei reconheça como tal. A lei
afirma-se como fonte principal e determinante do direito. Esta caracterização é dogmática já
que, além de ser teoricamente postulada, pretende dar uma solução ao problema obtido,
aproblematicamente através de uma mera análise descritiva do direito positivo; e tem um
carácter político-estatista: é o legislador que tem político-constitucionalmente reconhecido o
poder para criar normas jurídicas obrigatórias.
Então, se só a lei pode criar direito, o valor que se pode reconhecer aos tradicionais
modos de construção do direito é aquele que a lei determinar. Assim, da óptica político-
constitucional, não se reconhece o estatuto de fonte de direito nem à jurisprudência – embora
alguns autores reconheçam algum relevo ao direito jurisdicional, compreendendo-o como uma
manifestação do direito consuetudinário, o que é insustentável -, nem à doutrina (o resultado
da reflexão dos juristas).
O positivismo impunha à jurisprudência o dever de obediência à lei, só que isto assenta
numa falácoa pois oculta um passo muito importante: aquando da realização concreta do
direito pela mediação das normas, estas têm de ser interpretadas. Para o mesmo tipo de casos
os tribunais podem efectuar diferentes interpretações, em termos metodicamente adequados.
Esta falta de uniformidade da jurisprudência é inaceitável, tanto mais que o positivismo
 jurídico privilegia a previsibilidade e a certeza do direito. Deste modo, todos os sistemas de
legislação criaram antídotos para pôr fim a este veneno.
Entre nós criou-se o instituto dos assentos: atribuía-se a um órgao jurisdicional o poder
de, para além de decidir o caso, prescrever uma norma geral e abstracta, vinculativa para
todas as controvérsias que, no futuro, justificassem a observância do género instituído. São
revogados em 1995 ( -> 732º CPC).

Crítica: a perspectiva fenomenológica normativa postula que o direito não se reduz à lei.
O direito vigente está para além das normas legais. O próprio sistema jurídico é hoje
compreendido em termos normativos porque contém uma pluralidade de estratos. O
problema das fontes de direito deve ser encarado de uma perspectiva fenomenológica  –
normativa (porque centrada no fenómeno da constituição da normatividade jurídica), no
horizonte de uma comunidade histórico concretamente considerada.

Momentos de construção da normatividade vigente


1) Momento material: o direito é exigido e constitui-se para uma certa realidade
histórico-social, que tem a sua densidade própria e à qual o direito tem de se adequar
problematica e intencionalmente para se poder tornar vigente. A realidade é pois co-
determinante da normatividade jurídica;

12
2) Momento de validade: o direito vigente intenciona uma específica validade. O
momento de validade identifica a dimensão pressuposta pelo direito, viabilizadora da posição
de problemas de direito. Serve para ajudar a resolvê-los. O pensamento jurídico vai
discernindo fundamentos e instituindo dogmaticamente critérios. É este momento que
possibilita a emergência de problemas juridicamente relevantes e impõe a respectiva solução.
Por outro lado, é também ele que nos revela não ser o direito uma qualquer prescrição
formalmente jurídica do poder. Legitimidade política é diferente da validade jurídica pelo que
apenas podem ser qualificadas como de direito as prescrições consonantes com o sentido que
reconhecemos à normatividade vigente;

3) Momento constituinte: está relacionado com a identificação de certas instituições


sociais que devem ser convocadas para a constituição do direito, colocando-as perante a
questão da autoridade constituinte. A constituição consuetudinária do direito não pode ser o
modo de constituição do direito nuclear numa sociedade actual, virada para o futuro e que
não é tradicional, mas racional. O que não invalida que o costume possa ter ainda hoje alguma
autoridade normativa. Na verdade, o modo de constituição do direito no âmbito da sociedade
actual é a legislação.

4) Momento de objectivação: designa a integração do direito que foi sendo constituído


nos momentos anteriores num sistema jurídico que assim ganha vigência em sentido
normativo próprio. Só estaremos diante de direito próprio sensu quando uma específica
validade se afirmar como societariamente eficaz.
A compreensão de qualquer problemática no âmbito do direito há-de mostrar-se em
consonância com a própria concepção do direito.

A importância da legislação na sociedade actual

- de ordem política: vivemos num Estado de Direito de Legalidade Formal. Há princípios a


respeitar como a reserva e a prevalência da lei;

- de ordem sociológica: tem uma função planificadora e problemática da nossa sociedade


que sobretudo reclama a institucionalização de um sistema regulamentar;

- de ordem funcional: a lei revela-se partircularmente apta para realizar certas funções
(ordenadora, planificadora, regulamentadora, de integração e garantia).

Limites da legislação

1) Limites funcionais: são a contra face daquilo que afirmamos quando dizemos que a lei
pode tudo. Têma ver com aquilo que não se pode esperar da legislação num Estado de Direito
como o nosso. Há coisas que só a legislação pode tratar, mas há outras nas quais ela não se
pode inserir;

2) Limites normativos

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2.1) Limites objectivos: há sempre mais problemas juridicamente relevantes do que as
normas susceptíveis de serem mobilizadas para os solucionar. Na verdade,, o legislador não
pode prever todos os problemas juridicamente relevantes que surgem numa sociedade, já que
esta é muito complexa e a vida irrompe com toda a sua imprevisibilidade. Este problema vem,
aliás, a identificar-se com o problema das lacunas.

2.2) Limites intencionais: mesmo que uma determinada norma assimile a intencionalidade
normativa de um dado caso, ela sofre sempre de uma insuficência intencional. A norma é geral
e abstracta e o caso particular é concreto e a distância intencional que vai entre a generalidade
e a abstracção da norma e a particularidade do caso concreto tem que ser reflexivamente
percorrida pela instância institucionalmente incumbida de proferir a decisão concreta  – a
instância jurisdicional. A ela compete mobilizar as normas, apresentando-as à especificidade
do caso concreto, o que não pode ser feito em termos silogísticos, pois o discurso jurídico é
sempre constitutivo de novos sentidos. É necessário, por outro lado, fundamentar em termos
normativamente adequados a mobilização daquela norma para solucionar aquele caso.

2.3) Limites Temporais: as normas vivem num plano abstracto que é, por definição, a-
temporal. Julgam-se subsistentes enquanto não forem objecto de revogação formal. Têm
pretensão à eternidade, pelo que exigem um acto violento do legislador para serem
revogadas. Contudo, estão sujeitas à erosão do tempo. É possível, então, estarmos perante
uma nomra que, embora se mantenha formalmente em vigor, seja considerada caduca (perde
a validade por não se mostrar em consonância com os princípios normativos que constituem a
dimensão de validade do sistema jurídico) ou obsoleta (perdem a eficácia: a prática já não
coloca problemas que solicitem a mobilização daquela norma).

3) Limites de validade: a normatividade jurídica manifesta determinados princípios que a


prejudicam e intencionalmente a caracterizam e que um configuram um direito diferente de
lei. Estes princípios perfilam-se como instância crítica de validade jurídica das próprias normas.
De modo que se estas últimas não estiverem em consonância intencional com aquela
 juridicidade translegal, teremos que concluir pela invalidade normativa dos mencionados
preceitos legislativos que deverão ser desqualificados como leis já não integrantes do corpus
iuris vigente.

Num sistema jurídico como o nosso, o legislador já não detém o monopólio na criação do
direito: estes limites são a prova da existência de um espaço aberto à criação do direito por via
não legislativa. Há outras instâncias com legitimidade para participar no processo de criação
do direito: a jurisprudência judicial, a dogmática (aprsentando modelos práticos de decisão
para os histórico-concretos casos jurídicos), etc.

14
17.ª Lição: Metodonomologia

Meta (objecto) + Odos (caminho) + Nomos (juízo concreto) + Logos (racionalização) -> o
termo sintetiza o caminho racionalizadamente percorrido pela reflexão judicativa para que em
concreto se realize a intenção prático – normativa e, portanto, fundamentalmente regulativa
do direito.

Objecto da Metodonomologia: tem a ver com a tarefa prática de reconstituinte


mobilização ou mesmo da inovadora constituição do direito. Só por si não soluciona os caos
 juridicamente relevantes, mas sem ela não pode pretender-se discernir racionalizadamente
uma fundamentante solução normativamente consonante. No discurso jurídico
metodonomologicamente intencionado, há tempo para discutir e para decidir. É com o juízo
decisório que se fecha a decisão do caso.

Problemas cardeais da Metodonomologia

1) Disquisição da racionalidade: pré-ordenada à fundamentação da concludência


discursiva do juízo decisório em consonância intencional com as prático-problematicamente
radicadas exigências que inervam o específico sentido que se tiver reconhecido ao direito;

2) Elaboração do correspondente modelo metódico: ou seja, do conjunto de operações


reflexivas a que importa submeter os fundamentos / critérios jurídicos com o objectivo de
testar a respectiva prestabilidade para a normativo-juridicamente adequada resolução de cada
caso decidendo.

Orientações Metodonomológicas -> as sucessivas compreensões da Metodonomologia


Jurídica são função das diversas intelecções do Direito que se manifestaram ao longo do
tempo. Até ao Positivismo Jurídico afirmaram-se três modelos dominantes de racionalidade:

1) R. Retórico-prudencial (Roma): inucleou o juízo metódico /metodológico em


contextualmente discernidas validades comunitárias;
2) R. Hermenêutico-dialéctica (Idade Média): concorreu para o centrar em textos de
autoridades igualmente contextualizados;
3) R. Axiomático-dedutiva (normativismo moderno): absolutizou descontextualizados
sistemas epistemologicamente estruturados de normas gerais, abstractas e formais.

E ao longo deste extenso ciclo histórico manifestaram-se três tipos diferenciados de


pensamentos jurídicos metódico / metodonomologicamente comprometidos:

1) O Casuísmo Jurisprudencial Romano: que ia constituindo o corpus iuris por mediação


da resolução dos problemas concretos;
2) A Hermenêutica Jurisprudencial Medieval: elaborou o Direito a partir de textos
(nomeadamente do Corpus Iuris Civilis e do Corpus Iuris Canonici) referidos ao contexto
cultural em que a normatividade jurídica encontrava o seu fundamento e interpretados
consoante a questão em disputa segundo o prescrito método escolástico;

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3) Os Juristas Modernos preocuparam-se em elaborar antecipadamente sistemas
racionalmente abstractos de normas que seriam posteriormente aplicados de acordo com o
método silogístico – subsuntivo.

O legalismo identificador do revolucionário Estado de Direito Demo Liberal francês e o


historicismo emblematicamente assumidos pela cultura alemã concorreram para reduzir o
Direito a mero objecto-dado e determinaram a emergência de uma corrente metódico-jurídica
de carácter teorético.

Notas tipificadoras da Orientação Teorética: o Direito apresentava-se ao Jurista como


um heterónomo objecto de conhecimento. O Sistema Jurídico era uma entidade
racionalmente diferenciada, unilateralmente consistente (sem atinomias ou contradições),
universalmente pleno (sem lacunas) e problematicamente auto-suficiente (fechado).
Como devia o jurista proceder? Depois de conhecer o pré-dado direito-lei, pré-
disponibilizado pelas instâncias com legitimidade para o criarem, deve aplicá-lo em termos
racionalmente objectivos e cientificamente neutrais: num primeiro momento, o que importava
era conhecer a legalidade que, num segundo momento, independente daquele outro, seria
aplicada a casos compreendidos como espécies. Estávamos perante uma aplicação de carácter
estritamente lógico-dedutivo: o direito, que se reduzia à lei, era a premissa maior, os factos a
menor e da lógico-formal articulação de ambas resultava a solução.

Linhas Principais das Orientações Teoréticas


Escola da Exegese: as codificações da França saídas da Revolução pretendiam-se obras
definitivas. Não surpreende que se imposesse aos Juristas conhecer antes a lei codificada para
depois a aplicarem lógico-dedutivamente. A tarefa do jurista consistia na Exegese, isto é, na
interpretação filológico-gramatical da lei codificada. Todavia, a natural polissemia das palavras
e a incontornável historicidade da vida forçavam por vezes os juristas a arriscar algo mais, não
obstante a desconfiança do então dominante pensamento autocrático relativamente a
quaisquer exercícios suspeitos de conduzirem a uma manipulação da lei prescrita pelo poder
político. Recorria-se ao espírito da lei, à vontade do legislador que consistia na intenção
histórico-subjectiva que ele havia tido ao criar o Direito-Lei e, para o apurar, era fulcral
compensar os trabalhos preparatórios e, complementar ou subsidiariamente, inserir a norma
interpretanda no sistema instituído pelo Código pela meadiação de argumentos puramente
lógico-formais: o legislador era lógico- formalmente coerente.
Depois de interpretada a lei, o jurista aplicava-a em termos lógico-dedutivos, de acordo
com o sistema do silogismo judiciário.
Quando havia casos omissos, era admitida apenas uma auto-integração da lei, mediante a
explicitação lógica de todas as suas virtualidades dogmáticas e pelo recurso a expedientes
hermenêuticos – analogias.
Críticas:
- > o jusnaturalismo caducara histórico-culturalmente com a filosofia prática e não podia
ser mais a base da sustentação do valor absoluto da lei;
- > o legalismo confrontava-se com exigências quer jurídico-sociais de uma nova
sociedade, quer político-jurídicas de um Estado Novo com pressupostos normativo  – jurídicos
a que não podia dar resposta;

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- > os códigos mostravam-se obras legislativas precárias, condenadas a serem
historicamente ultrapassadas com cada vez maior rapidez e além disso irremediavelmente
lacunosos.

Jurisprudência dos Conceitos (Alemanha): Ranke esboçou a sua teoria da natureza do


Estado como instância portadora da história e da política. O seu específico problema era o da
adequada compreensão do próprio Direito através da sua apreensão.
Para a Escola Histórica, o Direito era um produto histórico, do espírito do povo. Segundo
Savigny, a normatividade jurídica estava imersa nas instituições culturais do povo  – e
manifestava-se, portanto, como uma objectividade cultural que os jurists deveriam apurar
cognitivamente.
Dimensões da ciência do Direito segundo Savigny:

1) D. Histórica: voltada para o passado. Esteve na base da procura do Direito Germânico


e contribuiu para instaurar um método puramente exegético;
2) D. Sistemática: determinou a compreensão do Direito como uma unidade orgânica de
instituição com um sentido histórico-social coerente;
3) D. Prático-Normativa: traduziu a autonomização do momento da aplicação concreta.

A razão de ser do Direito era agora identificada com os conceitos, aparecendo o texto
legal como mero ponto de partida empírico para o respectivo apuramento.
Savigny é o responsável pela emergência desta Jurisprudência. A ela se deve a noção
de interpretação como “a operação intelectual teoreticamente colimada à desvelação
da verdade interior da lei”, bem como a acentuação da importância dos elementos
clássicos (gramatical, histórico, sistemático e lógico) no processo interpretativo das
leis consideradas separadamente. Pelo que respeita à interpretação das leis, Savigny
chamou a atenção para os problemas da unidade e da universalidade do Sistema
Jurídico. A ausência de unidade era susceptível de gerar contradições que deveriam
ser resolvidas no quadro orgânico do instituto concretamente em causa. Por seu
turno, um défice de universalidade poderia originar omissões (lacunas), integráveis
por analogia orgânica ou, em casos muito raros, por criação de um novo instituto
 jurídico.

O horizonte erguido pela Escola da Exegese e o instituído pela Jurisprudência dos


Conceitos acabaram por fundir-se. Surgiu assim o Método Jurídico. Funções:

1) Interpretação das normas tomadas na sua auto-suficiência suficiente;


2) A construção conceitual realizada a partir dessas normas e instrumentalizada ao
apuramento da natureza jurídica dos institutos reflectidos;
3) A sistematização lógico-formalmente articulada do Direito;

Tem por objecto racionalizada realização judicativo-concreta do Direito. O direito é um


abstracto objecto pré-posto, vazado em normas, contrapostas às decisões concretas, que os
respectivos destinatários deveriam mobilizar.

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Dimensões do Método Jurídico:

1) Hermenêutica: interpretação teorético-cognitiva das normas jurídicas;


2) Epistemológica: construção/sistematização lógica dos conceitos inferidos pela
actividade interpretativa;
3) Técninca: aplicação silogístico-subsuntiva dos mencionados conceitos aos factos
conformadores dos casos decidendos.

Críticas:

a) De carácter empírico: no plano da realidade as coisas não decorriam como se


afirmava- as componentes do juízo do julgador era mais prático-valorativas do que lógico-
axiomáticas;

b) De carácter especificamente metodológico: as coisas não deveriam ser como se


sustentava – emergiram então correntes que desvelaram não passar a norma de eventual
pressuposto do Direito judicativamente realizado.

- > o Positivismo (e o Método que prescreveu):

1) não proporciona uma fundamentação adequada ao decidente quando este não dispõe
de critérios pré-objectivados e circunstancialmente mobilizáveis  – e que não problematiza
concludentemente a insuficiênica da fundamentação que estes últimos, quando disponíveis,
parecem garantir;

2) não lhe oferece cânones de uma indiscutível vinculatividade, quer para a interpretação
das normas, quer para a consideração dos factos relevantes, remetendo-o, no limite, para um
arbítrio inconfinado (nem orienta o decidente nas irremissíveis valorações postuladas por
estas tarefas);

3) não consegue controlar as ponderações constantemente pressupostas pela reflexão


 judicativo-decisória.

As Orientações Práticas
Livre Investigação Científica do Direito (Geny): este fez uma crítica ao pensamento
exegético, nomeadamente ao “direito=lei”. A lei não era suficiente para resolver os problemas
de direito, na medida em que era lacunosa e insuficiente. Quando houvesse lei esta deveria
prevalecer; na sua ausência ou insuficiência, defendia-se a livre investigação científica do
direito.
Nesta lógica, Geny restarou outras fontes de direito, como o costume e sobretudo a
 jurisprudência judicial e doutrinal. À ciência jurídica caberia investigar os elementos objectivos,
os dados em que o direito materialmente se revelaria e que traduziam os diversos factores ou
elementos analíticos da natureza das coisas; à técnica jurídica competia a elaboração desses
dados, construindo esquemas conceituais, modelos normativos, regras e cri térios, nos quais o
direito se revelasse e que pudessem ser utilizados na orientação da vida social e na decisão dos
casos jurídicos concretos.

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Quanto à intenção da lei, defendia o direito se baseava em dados pressupostos de
carácter histórico-social (costume, tradição), de carácter racional (dados revelados pela razão
como princípios superiores ou postulados de natureza humana), de carácter ideal (valores
humanos que orientem os humanos e a vida social) e de carácter real (condições da vida
humana e social). Para além disso, havia a técnica que permitia que os dados fossem utilizados
como critérios normativos.

O Movimento do Direito Livre : em sentido amplo, “direito livre” exprime todo o direito
que se constituiu e manifestou para além do direito legislativo. Em sentido restrito, significa
apenas a formação do direito extra-legal.
É um movimento escandaloso porque quis que o direito fosse livre, quis mostrar a
insuficiência da lei, mas disse mais: o juíz devia ter a liberdade de decidir um problema de uma
forma concreta, contra a própria lei se necessário. A norma podia ser mobilizada à posteriori
para legitimar a decisão, mas esta radica na vontade do decidente. A decisãod este podia ser
contra legem se:
- a lei não lhe oferecesse uma solução indubitável;
- se concluir que o poder estadual existente ao tempo da decisão não tem
provavelmente ditado a solução prescrita na lei.

Hoje em dia nada disto é estranho ou escandaloso, basta pensa nos limites temporais das
normas.
Contudo, na altura, a dimensão do escândalo percebeu-se bem porque o direito era
compreendido por referência às normas legais que objectivavam e a racionalidade
interveniente no discurso jurídico era lógico-dedutiva (racionalismo e intelectualismo). Mas,
como a única racionalidade conhecida na viragem do século era a lógico  – dedutiva, o
Movimento não foi capaz de encontrar uma alternativa, defendendo então o irracionalismo e
o voluntarismo:
- o fundamento criador do direito não é a razão, mas a vontade (primado da vontade)
impulsionada por proposições intuitivas e irracionais (irracionalismo);
- tanto a lei como a racionalidade normativa que era possível construir a partir das
normas da decisão funcionariam apenas como expedientes complementares, elementos de
 justificação ou de controlo normativo-jurídico à-posteriori.

Por um lado, pretende-se fundar a decisão na norma mas, por outro, a utilização das
normas legais, perante aqueles factores prático-emocionais da génese da decisão só poderia
entender-se nos termos de uma a posteriori realização normativa – já em função do controle
sobre a vontade e a intuição, já em vista a satisfazer uma comum exigência de possível
objectividade.

Crítica: este Movimento teve o mérito de ter posto em evidência o problema das lacunas;
de chamar a atenção para o momento decisivo da decisão concreta; de acentuar a participaçã
de factores não lógico-formais (analógicos, emocionais, teleológicos) no juízo jurídico;
esclarecer a impossibilidade de confundir o direito com a lei.

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Mas, como se radicalizou na antítese intelectualismo/racionalismo – irracionalismo,
imposta pela época cultural em que o Movimento surgiu, dificilmente se poderia juntar à
censura de condenar o direito ao arbítrio e ao puro subjectivismo.

Jurisprudência dos Interesses: esta Escola Alemã, de clara inspiração sociológica-


finalista, contra o formalismo conceitualista então dominante na Alemanha, louvou-se no
finalismo de matriz sociológica – afinal, o referente intencionado pelos interesses privados e
públicos e do mais diverso tipo (sociais, morais, económico, mundividenciais) que deram o
nome à Escola.
Para Ihering, o Direito deve o seu sentido a fins societariamente relevantes (o fim é a
causa natural do Direito) e tendencialmente equivalentes, que o vão adequando às exigências
de cada tempo e concorrem para assegurar a subsistência da própria sociedade em
conformidade com a ética pragmática e utilitarista indisfarçavelmente pressuposta. O
interesse deveria substituir a vontade como elemento decisivo na constituição do Direito
Privado. Cada um, para sobreviver, tinha que fazer algo por si, não devendo entregar-se sem
oposição às forças que o desafiavam. Apenas aqueles que não capitulassem quando se
sentissem espezinhados mereciam protecção jurídica.
A lei é a emblemática expressão da autonomia da comunidade jurídica e tem por
objectivo solucionar ponderadamente um certo conflito de interesses – razão porque é fulcral
respeitar a sua face material, densificada pelos interesses em que radica, para que se possa
concluir pelo normativo-juridicamente adequado cumprimento do dever de obediência.
Legou-nos a teoria da interpretação jurídica: para compreender o sentido normativo da
norma, para aceder à intelecção decisiva ratio legis e para pôr o Direito ao serviço da vida, o
intérprete deveria considerar o conflito de interesses que a norma interpretanda tivesse
dirimido de determinado modo, impondo-se-lhe depois repensar inteligentemente esse
critério, atenta a especificidade do caso. A norma era o modelo de uma ponderação prática e o
próprio caso um problema com uma autónoma relevância normativo-jurídica que importava
apurar.
Distingue-se:

- Problemas normativos (questões jurídicas relevantes, radicadas em co nflito de


interesses que importava solucionar em termos prático-teleologicamente adequados) =
Problemas de Formulação (traduziam preocupações associadas à sistematicamente articulada
e pedagogicamente empenhada exposição das soluções);

- Sistema Interno (unitariamente estruturada consideração dos Problemas Normativos e


das suas soluções específicas) = Sistema Externo (a expositiva reprodução, especialmente
determinada por objectivos didácticos dos conteúdos jurídicos)

A determinação da relevância do critério interpretando impunha uma criteriosa


investigação e ponderação de interesses. O caso-problema decidendo era autonomamente
analisado pelo Jurista em ordem ao esclarecimente do conflito de interesses em que radicava.
A mobilização daquele critério problemático para a resolução deste caso-problema só seria
admissível se e quando o conflito de interesses decidido pelo legislador na norma fosse
semelhante ao conflito de interesses constitutivo da controvérsia concreta.

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A vontade normativa viabilizou a interpretação correctiva: a possibilidade de correcção
das normas numa sua aplicação formalmente contra legem mas para justamente respeitar a
material vontade normativa contra o teor formal da norma (a criteriosa adaptação da
intencionalidade prática da norma às circunstâncias ocorrentes que o legislador não tinha
considerado). Há um dever de obediência inteligente à prescrição legislativa, com as correntes
desvalorização da letra da lei e ultrapassagem dos limites fixados pelas tradicionais
interpretações extensiva e restritiva.
Relativamente ao problema das lacunas, a Jurisprudência dos Interesses diz-nos que:
eram reais; o Sistema Jurídico era inconcluso e omisso na consideração de muitos interesses
ingualmente dignos de protecção; o importante era poderar adequadamente os interesses que
não tivessem sido, mas devessem ser, juridicamente protegidos.
O decidente podia sustentar a relevância jurídica de interesses marginalizados pelas
normas legais pré-objectivadas, mas já estava vinculado aos juízos de valor das normas não
imeditamente aplicáveis.
Operados mobilizáveis no processo de integração de lacunas:

1) Analogia: quando procedesse para o caso omisso a ponderação de interesses em que


radicava a norma directamente reguladora de um caso prático-normativamente semelhante,
não deveria hesitar-se em lançar mão da mencionada norma para solucionar o caso não
previsto;
2) Juízos de valor dominantes na Comunidade Jurídica ou pelos Juízos de valor do
Legislador;
3) O decidente era remetido para a sua Valoração Própria. Também aqui se esperava que
a ciência prática do Direito lhe oferecesse as ponderações determinantes para a decisão
valorativa a que não podeira então eximir-se.

Motivos de superação da Jurisprudência dos Interesses

a) Insuficiência na sua base sociológica: considerou apenas os interesses em situações de


conflito, esquecedo que eles podem apresentar-se também em convergência;
b) Insuficiência criteriológica: ao atender apenas a interesses, nunca logrou distinguir o
objecto da valoração do fundamento de valoração. Contrapôs os interesses em geral aos
interesses de decisão, mas estes últimos não representavam qualquer superação do pl ano
daqueles primeiros;
c) Insuficiência sistemática: não conseguiu compreender adequadamente a problemática
do Sistema Jurídico. Relevou o sistema interno, mas nele não se nos manifesta nem a
pluralidade de estratos que reconhecemos no corpus iuris, nem a particular dialéctica que o
anima, nem a específica intencionalidade que o autonomiza (e é precisamente na
consideração deste último ponto que radica o carácter normativístico da Jurisprudência e o
atomístico casuísmo que justificadamente se lhe censura);
d) para a Jurisprudência dos Interesses, o sentido do Direito não implicava qualquer
dimensão de idealidade ou de espirtiualidade ou apenas se dispunha a considerar as
mencionadas dimensões quando elas se manifestassem como factos sociais  – a denunciar um
indisfarçável finalismo instrumental radicado num estrito Positivismo fáctico -social.

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Jurisprudência da Valoração: representa a superação do redutivismo sociológico dos
pensamentos jurídico-causais e contribuiu para a retribuição do discurso prático e da clássica
filosofia prática. Teremos sobretudo em conta os pensamentos hermenêutico e tópico.
“Tópica” -> produz-se num pensamento que considera os problemas práticos do d omínio
de prudência e não de ciência e os resolve por juízos de argumentação dialéctica que invocam
fundamentos consensuais (comunitariamente aceites) considerados pertinentes ou adequados
à indole prático-social dos problemas decidentes. É, pois, um pensar de problema segundo
critérios que a própria prática histórico-social vai oferecendo num continuum de prudência e
renovação.
A tópica material (fornecedora de fundamentos comunitariamente aceites) é insuficiente,
sendo necessária uma tópica formal que se traduz na argumentação retórica e na
hermenêutica. A metodologia jurídica terá que levar sempre hermeneuticamente referida, no
horizonte transpositivo, o direito, assumido uma pré-compreensão, na intencionalidade
significante, ou interpretar os textos jurídicos positivos, pois interpreta-os como textos de
direito e assim como instrumentos discursivos da sua intencionalidade.

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18.ª Lição: A concorrência de normas no tempo

Importa saber quais as normas susceptíveis de mobilização aquando da emergência do


direito. Este problema resulta da intercepção de três vectores:
- > as normas sucedem-se cronologicamente;
-> as situações jurídicas também têm o seu tempo de vida que, em regra, não coincide
com o tempo de vigência das normas que se lhe referem. Por isso, podem se ter constituído
situações juridicamente relevantes, sob o domínio de uma norma que, todavia, permanecem a
produzir efeitos, apesar da alteração das normas susceptíveis de serem convocadas para as
regular;
- > a justaposição entre o tempo de vigência das situações jurídicas nem sempre
ocorre;

 Critérios orientadores da aplicação da lei no tempo

1) Sobrevivência da lei antiga: considera que cada situação é regulada pela lei que vigora
no tempo da sua constituição (rejeitanto a aplicação de eventuais novas leis que surjam a
regular essas situações). Problema: gerava uma contradição de regimes, pois a mesma
categoria de situações estava submetida a regimes diferentes (umas seriam reguladas pela lei
antiga, outras pela nova). Por outro lado, a sobrevivência da lei antiga não daria guarida à
consideração de que, em favor da lei nova, se pode invocar quase sempre uma maior
adequação prático normativa das orientações por ela consagrada;

2) Imediata adequação da lei nova: a lei nova aplicar-se-ia imediatamente às situações


 jurídicas anteriormente constituídas (não respeitanto sequer os direitos já adquiridos e as
situações definitivamente consolidadas na perspectiva dos particulares)  – retroactividade
plena. Problema: não respeita nem protege a legítima confiança criada pelo antigo regime,
frustrando, em muitos casos inevitavelmente as legítimas expectativas dos sujeitos das
relações jurídicas.

3) Divisão dos âmbitos de aplicabilidade: que circunstacialmente se cruzam – a lei antiga


aplicar-se-ia até ao momento da entrada em vigor da lei nova, altura em que se aplicará esta
lei nova, imediatamente. Problema: é também susceptível de errar uma diversidade de
regimes aplicáveis à mesma situação jurídica.

As soluções logicamente lineares nem sempre se revelam prático-normativamente


aceitáveis. A intensidade da relação entre as normas que regulavam uma determinada
situação jurídica no passado e as que inovadoramente se lhes refere pode ser muito diversa:

- > Retroactividade autêntica: a lei nova é chamada a valorizar situações já


definitivamente decididas por um lei antiga, produzindo efeitos jurídicos antes da sua entrada
em vigor;

- > Retroactividade inautêntica: a lei nova é chamada a regular imediatamente, mas


apenas para o futuro, situações jurídicas constituídas no passado e que viveram, durante
relativamente bastante tempo, submetidas a um diferente estatuto legal;

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- > a lei nova é chamada a regulamentar situações jurídicas continuadas, em termos
adequados à respectiva especificidade, o que nem sempre é fácil discernir. Baptista Machado
fala este propósito em vários graus de retroactividade: máximo, normal e mínimo.

Resolver estes problemas é tentar compatibilizar dois objectivos teoricamente


contrários:

- o da garantia da estabilidade das situações envolvidas (respondendo ao interesse de


estabilidade e segurança, confiança e protecção);
- o da descoberta, para cada situação decidenda, da solução normativamente mais
adequada (respondendo ao interesse público da adequação do direito às exigências da
realidade).

Existe uma extrema dificuldade em satisfazer simultaneamente estas duas exigências


 já que se a estabilidade implica, na maioria das vezes, a subsistência do regime adquirido pela
lei antiga, a da maior adequação normativa (densificada pelo princípio da segurança) postula,
com frequência, a preferência pelo regime da lei nova. Assim, o pensamento jurídico tende a
diferenciar as situações decidendas em termos normativamente adequados com o propósito
de resolver os problemas concretos.

 Critérios de resolução da concorrência das normas no tempo:

1) Doutrina dos direitos adquiridos: a estabilidade justifica-se para os direitos adquiridos,


razão porque não deve ser chamada a operar quando estiver em causa meras expectativas (a
lei nova teria que respeitar os direitos validamente adquiridos à sombra da lei antiga, as
simples expectativas não se impunham ao respeito da lei).
Crítica: apesar de esta doutrina estar em consonância com o princípio da protecção da
confiança, é inefeciente como critério de distinção, pois a distinção entre direito adquirido e
mera expectativa é na prática difícil de traçar; os autores acabram por chamar expectativas a
umas situações e direitos adquiridos a outras, consoante pretendem ou não a aplicação da lei
nova. Nota: direitos subjectivos não são direitos adquiridos.

2) Doutrina do facto passado: enquadra-se nas exigências de um Estado de Direito, já que


harmoniza “protecção da confiança” das pessoas na “estabilidade” dos actos juridicamente
relevantes da sua vida e o “interesse público”.

3) A lei nova apenas prescreve para o futuro, regulando somente os factos constitutivos,
modificativos e extintivos das situações jurídicas e os efeitos desses factos, verificados desde o
início da sua vigência. A opção pela lei nova ou pela antiga põe-se somente para os factos (e
seus efeitos) mas não para os direitos.
A lei vigora para o futuro  – primado da irrectoactividade da lei – não sendo
imediatamente aplicada aos factos e aos efeitos jurídicos de situações anterior à nova lei,
aplica-se a lei antiga.

Nota: -leis retroactivas: quando aplicadas a situações jurídicas definitivamente decididas


são consideradas inconstitucionais por violação do princípio do Estado de Direito;

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- leis retropesctivas: aquelas que se projectam para o futuro em situações
 jurídicas preexistentes, mas que continuam a produzir efeitos.

O artigo 12.ª do Código Civil consagra a doutrina do facto passado, em matéria de


aplicação de normas no tempo, compatibilizando a estabilidade das situações e a adequação
normativa das respeitantes soluções concretas.
No âmbito do Direito Privado as duas exigências a ter em conta são: o princípio a
protecção da confiança, que exige a aplicação da lei antiga; o princípio da salvaguarda do
interesse público que exige a preferência pela lei nova.

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19.ª/ 20.ª Lição: A Interpretação Jurídica

A Interpretação Jurídica reflecte a concepção fundamental do Direito de cada época e


pressupõe o contexto cultural que vai no horizonte significante dos Juristas. É co-determinada
pela perspectiva epistemológico-metodológica do pensamento jurídica e vê-se orientada pelos
imediatos objectivos práticos da realização do direito.

 Sentido geral da sua problemática: é uma actividade metodológica destinada a


determinar o sentido jurídico-normativo de uma fonte jurídica (uma lei, um costume, um
negócio jurídico, uma sentença ou qualquer texto jurídico) de modo a obter dele um critério
orientador para a resolução dos casos problemáticos da vida histórico-social no âmbito de uma
problemática realização do direito e enquanto momento normativo metodológico dessa
mesma realização.
A autoconcreta realização do direito não pode dispensar a interpretação jurídica. Seria
dispensável se a fonte interpretada fosse um texto claro e inequívoco, combatendo desse
modo o arbítrio judicial e garantindo a estreita certeza do direito.

A interpretação jurídica tem uma natureza normalmente constitutiva, daí que o poder
legislativo não só tenha reservado só para si o poder de interpretar leis, mas também tenha
proibido a interpretação por outras instâncias que “ele” próprio. O poder legislativo reservou
para si esse poder com o objectivo de controlar as decisões judiciais e reafirmar a legalidade
contra o poder juridicamente criador dos juízes, através da actividade interpretativa.
O carácter normativamente constitutivo da interpretação jurídica não deixa de suscitar
uma outra questão que se fundamenta nos princípios:

- p. geral de Estado de Direito: exige que o direito seja pré-determinado aquando da


sua aplicação como garantia de segurança, objectividade, igualdade e imparcialidade;
- p. da separação de poderes: impunha que apenas o legislador tenha poder de criar o
direito;
- p. da legalidade: síntese dos outros pos poderia ver-se fustigado pela criação do
direito no acto concreto da sua realização.

Esta questão confunde-se com o problema do direito jurisprudencial, ou seja, o problema


da validade constitucional do direito criado pela jurisprudência no cumprimento da tarefa de
realização do direito. Questão resolvida do seguinte modo:

- > Reconhecendo a existência do direito jurisprudencial e da sua indispensabilidade,


procurando definir os limites constitucionais do seu âmbito legítimo de criação jurídica;
- > vendo na sua especfífica racionalidade metodológica a garantia da sua objectividade
normativo-jurídica;
- > ponderando a evolução dos princípios da separação dos poderes, concluindo que esse
princípio dá ao legislador a prerrogativa da criação do direito, mas não o monopólio dessa
criação;
- > passando a respeitar o princípio da legalidade ou obediência à lei, não obedecendo à
lei mas antes ao direito, pois esse distinguir-se-ia dela e repor-se-lhe-ia dela.

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 A índole do problema da interpretação é prático-normativa: o problema do
pensamento jurídico em geral é o de decidir justamente. Logo o seu ponto de vista decisivo é o
prático (função normativa) e o seu último valor é a justiça (no positivismo legalista, o
decidente limitava-se a interpretar  – conhecer a lei e o seu sistema.
O problema da interpretação jurídica não está no significado textual da lei, mas em saber
de que modo prático-normalmente se deve assimilar o seu sentido jurídico-normativo para
que ele possa ser critério também juridicamente adequado de uma justa decisão do problema
 jurídico-concreto.

 Objecto da Interpretação Jurídica: o intérprete debruça-se sobre a norma-problema: o


objecto da interpretação não é o texto da lei como texto mas a norma que esse texto pretende
manifestar (no positivismo, era a norma textual).
A interpretação jurídica é vocacionada para um justo decidir.

 Teoria Tradicional da Interpretação Jurídica


 Objectivo da Interpretação
A)Polémica entre o subjectivismo e o objectivismo interpretativos

- > para a teoria subjectivista, o objectivo essencial da interpretação era reconstituir o


pensamento real do legislador histórico formulado na lei, ou seja, esta teoria visava
determinar o fim querido pelo legislador no momento que elabora a norma;
- > a teoria objectivista entende que a interpretação deverá orientar para o sentido
objectivamente assimilado pelo texto da lei, ou seja, o intérprete pretende ficar o sentido
normativo incorporado na norma.

Ponto comum: consideração do texto como objecto de interpretação.


Ponto de divergência: o subjectivismo pretende mostrar no texto a vontade do legislador,
enquanto que o objectivismo pretende encontrar o seu sentido.

- > A orientação subjectivista: foi historicamente a primeira a surgir, daí que reflicta a
soberania do legislador, a separação dos poderes, a vinculação ao direito constituído, a
segurança. O subjectivismo traduz uma concepção material e hermenêutica de cariz
epistemologicamente positivista, segundo a qual os sentimentos culturais seriam entidades
empíricas, fenómenos psíquicos e, por isso, interpretá-los seria imputá-los psico logicamente
ao seu autor, perspectivá-los pelo processo da sua génese histórico-psíquica.
O subjectivismo concebe o direito em termos imperativo-decisivistas, como um conjunto
de imperativos, de regras simplesmente imputáveis a um poder que se titula e personaliza no
legislador, e que este imporia por livre decisão político-jurídica. Esta concepção propôs uma
interpretação fixa da lei, pois a vontade que se pretende descobrir é a vontade histórica do
próprio legislador. Visa assegurar uma estrita obediência ao poder constitutivo e à segurança
 jurídica;

- > A orientação objectivista: surgiu na segunda metade do século XIX. É o reflexo quer de
um entendimento da cultura, quer de uma intenção especificamente compreensiva da
hermenêutica. As expressões significativas passam a reconhecer-se já na autonomia e

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objectividade próprias do ser cultural, já como irredutíveis manifestações histórico-culturais do
específico objectivo.
O objectivismo concebe o direito como uma ordem significativo-normativamente
objectiva em que se assimile o projecto histórico-cultural comunitário. O legislador dirige-se
sempre à lei e esta perspectiva aceite da hermenêutica geral a ideia de que a lei pode ser
 juridicamente mais sábia do que a intenção do seu autor, isto é, o intérprete pode
compreendê-lo melhor do que a entendeu o próprio legislador.
Esta perspectiva é mais actual e adequada à dinâmica histórica. Usa a justeza das soluções
obter pela interpretação, pois assume uma perspectiva que lhe permite uma evolutiva
compreensão e actualização das exigências jurídicas da aplicação e do contexto normativo.

- > o artigo 9.º do Código Civil privilegia uma tese mista/gradualista:


- o intérprete devia primeiro procurar o sentido histórico que o legislador tenha
atribuído à lei (componente subjectivista);
- se isso não for decisivo, deve recorrer a outros elementos orientando-se em último
termo pela presunção do legislador razoável (componente objectivista).

B) Interpretação Dogmática e Teleológica

- I. dogmática: traduz-se em reconduzir ou perspectivar o sentido da norma interpretada


ao sentido do auto-subsistente do sistema jurídico. Procura o sentido lógico da norma que seja
coerente com o sistema pré-definido (perspectiva do sistema);

- I. Teleológica: o intérprete é movido pelos fins visados pela mesma norma. Procura-se
interpolar a norma, revelando os fins práticos (perspectiva do problema).

Aparentam ser antagónicas – no entanto, embora diferentes são complementares.


Harmonizam-se compreendendo o sistema como uma estrutura logicamente encadeada, um
universo de referências axiológico-práticas. Toda a prática supõe uma irrecusável nota de
dogmática, todo o problema tem de encontrar uma fundamentação, um critério de resolução
no sistema (na dogmática); por sua vez, todo o sistema só encontra a sua utilização no
problema.

 Elementos da Interpretação: o texto da lei é composto pela letra e pelo espírito.

- de acordo com o elemento interpretativo gramatical (a letra), o objecto da interpretação


era o texto – compreensão hermenêutica da interpretação jurídica. O texto delimita a
interpretação e só são admissíveis os sentidos da lei que fossem possíveis segundo o texto;

- elemento histórico (co-determinante do espírito): diz respeito à génese do preceito


interpretando, ao contexto jurídico-social do seu aparecimento. É um elemento importante
para a Jurisprudência dos Interesses;

- elemento sistemático: traduz-se na integração da norma interpretada no conjunto de


princípios e normas do mesmo sistema. A norma integra um todo unitário e concreto;

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- elemento teleológico/racional: impõe o sentido que a norma se determina pela ratio
legis, isto é, em função da própria razão de ver ou do seu objectivo prático. O sentido deste
elemento sofreu uma evolução que traduziu também uma evolução da interpretação jurídica,
que passou de um sentido normativo, de um direito dogmático para um objectivo teleológico
de uma interpretação como acto metódico autónomo, para uma interpretação como
momento de realização do direito.

O artigo 9.º do Código Civil consagra um modelo de interpretação em que concorre o


conjunto destes factores.
A interpretação tradicional gravitou à volta da dicotomia espírito/lei. Considera-se a lei
enquanto objectividade gramatical no seu valor próprio. A letra da lei define logo um sentido
ao quadro de sentidos filológico-gramaticais possíveis abstractamente, sem referência ao caso
concreto. O espírito apenas determinava um dos sentidos possíveis da letra da lei a que se
recorria quando o sentido da norma não ficar determinado naquele primeiro passo. Hoje, o
elemento teleológico compreende-se como ratio iuris – a distinção entre elemento teleológico
e sistemático já não faz sentido. Fundiram-se em termos análogos à fusão da interpretação
dogmática e teleológica.

 Os resultados da Interpretação

- I. declarativa: o sentido que se recolhe da letra da lei coincide com o extraído do


espírito;
- I. restritiva: quando a letra é mais ampla que o espírito da lei. Para os fazer coincidir, o
intérprete restringe a letra da lei de modo a esta coincidir com o espírito;
- I. extensiva: quando a letra da lei é menos ampla que o espírito da lei. Para os fazer
coincidir, o intérprete alarga a letra da lei;
- I. enunciativa: com recurso a argumentos lógicos, deduziam-se da lei eventuais
conclusões que ele possa virtualmente adquirir;
- I. revogatória: quando é impossível conciliar a letra da lei com o seu espírito;
- I. correctiva: a preterição do texto em favor do cumprimento da intenção prático-
normativa da norma.

- Resultados interpretativos de natureza diferente: com a acentuação da interpretação


teleológica, os resultados da interpretação enriquecem-se de outros tipos de relevo prático e o
que têm de comum é aceitarem o cumprimento efectivo da intenção prático-normativa da
norma – o caso decidendo e princípio metodológico.
É o que se verifica com a interpretação correctiva da Jurisprudência dos Interesses, pela
qual se admite que o intérprete sacrifique o texto da lei para realizar a intenção prática da sua
norma sempre que o respeito pelo seu teor verbal implicasse a frustração daquela intenção
prático-normativa.
Fala-se de redução teleológica quando se exclui ou reduz o campo de aplicação de uma
norma, casos em que estão abrangidos pela sua letra, com fundamento na teleologia,
imanente à mesma norma. Por seu turno, a extensão teleológica diz respeito ao alargamento
de campo de aplicação de uma norma definida pelo texto, com fundamento também da sua
imanente teleologia, a casos que por aquele texto não estariam formalmente abrangidos.

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Estas diferem da interpretação extensiva e restritiva pois não há divergências entre a letra
e o espírito, há um confronto entre o âmbito da realização da norma e a realidade jurídica que
convoca. Estes resultados são fundamentalmente orientados pelo elemento teleológico (causa
final) e não pelo elemento literal.

 Linhas de Superação da Teoria Tradicional: a letra da lei tinha um valor determinante e


autónomo. Isto conduz à distinção entre:

- sentido negativo: a letra da lei determina um conjunto de sentidos admissíveis,


excluindo aqueles que não podem de todo ser-lhes imputados;
- sentido positivo\selectivo: de entre todos os sentidos que a lei prevê, seria o que mais
naturalmente correspondia àquela prescrição legislativa.

Para a perspectiva tradicional, a letra da lei tinha um valor duplo (positivo e negativo); o
pensamento tradicional atribuía um valor autónomo, determinante e normativo da letra da lei.
Para a Jurisuprudência dos Interesses, tem um valor meramente negativo (interpretação
correctiva). Hoje, a interpretação correctiva corresponde à possibilidade de afastamento da
letra da lei para dar maior relevo à vontade normativa da norma, daí o aparecimento da
redução e extensão teleológica.
Na interpretação tradicional estava apenas em causa um exercício de carácter filológico-
gramatical – procurava-se abstractamente o sentido da norma. Hoje, o sentido da norma só é
muitas vezes deselado em relação ao caso concreto que a mobiliza.
- Os outros elementos de interpretação foram ganhando um outro sentido com a
passagem da perspectiva hermenêutico-cognitiva para a perspectiva prático-normativa:

- elemento gramatical: não pode ser considerado como um factor autónomo e


determinante da interpretação, dado que passaram a admitir-se interpretações de natureza
diferente;
- elemento linguístico: tinha a ver com a génese histórica da norma. Hoje, interessa mais o
problema que está na base daquela norma, isto é, o contexto histórico-político em que a
norma surgiu;
- elemento sistemático: tem a ver com a compreensão das normas e do direito, com os
princípios transpositivos e com uma racionalidade prático-normativa;
- elemento histórico: tem a ver com o espírito e refere-se à génese do preceito;
- elemento teleológico: a consideração da ratio legis. O objectivo prático visado pela
norma, a sua finalidade ou razão de ser.

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