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A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO JURÍDICO NO SISTEMA PRISIONAL

O presente trabalho pretende ao longo dos itens apresentados abordar as


possibilidades de atuação do psicólogo no sistema prisional juntamente aos
sentenciados que cumprem pena privativa de liberdade. Para tanto, analisa-se
o conceito de psicologia jurídica, entendem-se os aspectos psicológicos
presentes na instituição prisional, bem como discutem-se as formas dessa área
contribuir no sistema. Para articulação do tema, foi utilizada pesquisa
bibliográfica, com base em livros e artigos científicos especializados em
Psicologia Jurídica.
Para o desenvolvimento da primeira parte desse trabalho foi realizado um
estudo acerca da interface entre direito e psicologia para a melhor
compreensão do seu histórico, do conceito, bem como das possíveis áreas de
atuação. A psicologia jurídica é uma ramificação da psicologia que nasceu da
interface com o direito e seu saber é reconhecido como de suma importância
no âmbito da justiça. As atuações do psicólogo dentro sistema judiciário que na
maioria das vezes se limitava em elaborações de laudos e pareceres, hoje são
bastante abrangentes, podendo assim ser colocada como presente e
necessária em quase todo âmbito do mundo jurídico.
Antes de abordar o objetivo principal do trabalho, que é a atuação do
psicólogo no sistema prisional, apresenta-se, no terceiro item o histórico das
formas punitivas que eram realizadas desde antes da introdução do Estado na
chamada civilização. Analisa-se a passagem dos tipos de punições aplicadas
no século XVIII e as formas que eram executadas, fazendo uma comparação
com as penas dos dias atuais, com enfoque na pena privativa de liberdade.
Após ser discutido como surgiram as referidas penas e o denominado sistema
prisional, o presente trabalho aborda as questões subjetivas dos indivíduos que
cumprem pena privativa de liberdade, como também os fatores que podem ser
desencadeantes para o ato ilegal. Assim, é possível que seja analisada a
melhor forma de se intervir, a fim de se chegar ao resultado mais positivo,
visando a prevenção e não esquecendo da importância de atuar de maneira a
garantir os Direitos Humanos. Portanto, a terceira parte termina explicando o
que vem a ser os direitos humanos e a importância da garantia do mesmo.
Diante do item quatro desse trabalho podem ser analisadas as diversas
formas de atuação dentro do sistema prisional, área em que o trabalho do
psicólogo está sendo a cada dia valorizado tendo em vista os resultados
positivos que vêem sendo apresentados. Os trabalhos são realizados dentro do
sistema prisional como um todo, são analisadas as demandas existentes e as
melhores formas de intervenções, podendo ser realizados de forma individual,
grupal e dentro das Comissões Técnicas de Classificação (CTCs). Além dos
trabalhos junto aos indivíduos que cumprem pena privativa de liberdade, os
psicólogos podem também realizar trabalhos com os familiares dos mesmos,
com a finalidade de amenizar o sofrimento de ver seu parente dentro do
cárcere como também para ajudar a recebê-los quando os mesmos voltarem
ao convívio social. Cabe ao psicólogo também trabalhar junto aos funcionários
do sistema prisional, tendo em vista a precariedade das condições de trabalho
dentro das instituições como também a forma que os agentes lidam com as
pessoas que estão cumprindo pena privativa de liberdade.

Psicologia Jurídica

A psicologia jurídica é uma especialidade da ciência psicológica que aplica


os seus saberes nas várias áreas da justiça, essa especialidade está em total
desenvolvimento e se expandindo cada vez mais. A necessidade do trabalho
do psicólogo dentro do mundo jurídico já vem sendo questionada há séculos e
é visto como sendo de suma importância nessa área.

História da Psicologia Jurídica

De acordo com Jesus (2001), foi no século XVIII que surgiram os primeiros
sinais da psicologia jurídica. Ele afirma que o tema que estabeleceu a relação
entre a psicologia e o direito foi “... o sentimento jurídico do estabelecimento de
normas para o convívio comum conforme as regras e normas de conduta”
(JESUS, 2001, p. 27).
Sobre a psicologia jurídica é complexo delimitar o seu inicio, pois não
existe um único marco histórico que define esse momento (LAGO, 2009). Para
Leal (2008), foi em 1868, que a psicologia surgiu auxiliando a justiça com a
publicação do livro “Psychologie Naturelle” de autoria do médico francês
Prosper Despine, onde o mesmo apresentou estudos de casos dos grandes
criminosos daquela época. Despine dividiu os casos em grupos de acordo com
o motivo desencadeador do crime e investigou cada membro, visando suas
particularidades psicológicas.
O saber que viria dar conta do estudo da relação crime/criminoso surge no
cenário das ciências humanas em 1875, fundada por Despine, a chamada
Psicologia Criminal “denominação dada naquela época às práticas psicológicas
voltadas para o estudo dos aspectos psicológicos do criminoso” (LEAL, 2008,
p.173). Esta área da psicologia fica sendo um referencial importante para todos
os profissionais de Direito Penal.
Bonger (1943 apud LEAL, 2008) cita alguns autores que fazem parte da
pré-história da Psicologia Criminal: Pitaval, na França em 1734; Richer em
1772; Schaumann, na Alémanha em 1792, entre outros. Para ele, os autores
citados acima pecaram em não terem se preocupado em construir uma teoria
sobre os dados encontrados como também não usaram métodos rigorosos nas
escolhas dos casos.
De acordo com Lago (2009), a psicologia jurídica no Brasil teve seu inicio
em 1960, ano que a profissão foi reconhecida, porém a atuação do psicólogo
nessa área vinha bem antes dessa data, através de trabalhos informais e
voluntários. Os primeiros trabalhos foram realizados na área criminal, com a
avaliação do criminoso, prática realizada bem antes ao século XX.
O desenvolvimento da psicologia criminal se deu quando os psicólogos
clínicos começaram a colaborar nos exames psicológicos legais e em distintos
aspectos com os sistemas de justiça juvenil, nos laudos psicológicos (JESUS,
2001). É através da área criminal, da importância dada a avaliação psicológica
e a preocupação com a conduta humana que se deu a aproximação do Direito
com a Psicologia (LAGO, 2009).
A obra de Rossi, “Psicologia Coletiva”, mostra a idéia de que o direito
surgiu a partir da consciência coletiva dos povos, expandindo a discussão pelo
século XIX. No final do mesmo século, surgiram algumas reflexões sobre o
Direito e sua função na vida social, tendo como partida a psicologia e as
ciências próximas a ela, sendo exemplos a obra de Fichte (1796),
“Fundamentos do Direito Natural segundo os princípios da doutrina da ciência“,
em que formula as relações do Direito com o Estado; em 1893, Émile Durkheim
lança o conceito de anomia e Mead publica em 1917, “The psychology of
punitive justice”. Mas as grandes quantidades de trabalhos literários
relacionando o Estado, a Sociedade e a Legislação surgiram no século XX
(JESUS, 2001).
A preocupação da necessidade de conhecimentos psicológicos na Justiça
vem antes do século XX, os próprios juristas contestavam essa necessidade e
já havia publicações a respeito como a de Eckardts Hausen, “A necessidade de
conhecimento psicológico para julgar os delitos” no ano de 1792. Também no
ano de 1792, J. Schaumann escreveu sobre “A idéia de uma psicologia
criminal”, Munch, em 1799, publica “influência da psicologia criminal sobre um
sistema de direito penal” (GARZON apud JESUS, 2001).
Em 1835, foi que pela primeira vez apareceu o termo Psicologia Judicial,
através da publicação do “Manual Sistemático de Psicologia Judicial”. Nessa
obra o autor destacava a importância da Antropologia e da Psicologia
auxiliando a atividade judicial corretamente. Para Jesus (2001), a necessidade
de o juiz compreender os conceitos psicológicos fica totalmente evidenciada
com a publicação da obra: “o erro e a relação jurídica: uma investigação
jurídica- psicológica” do autor Zitelman.
Jesus (2001) cita várias publicações feitas no final do século XIX sobre o
Direito e a sua função na vida social a partir de ciências próximas da
Psicologia, mencionando o surgimento da real necessidade da aplicação da
Psicologia no Direito nesse século; cita obras como “A psicologia em suas
principais aplicações à administração da justiça” de Hoffbauer em 1808, dentre
outras.
Além das várias obras publicadas sobre a importância da psicologia no
âmbito da justiça, vários fatores estabeleceram a definitiva relação da
Psicologia com o Direito, Psicologia Jurídica, entre elas a aproximação das
ciências médicas com a psicologia e a fisiologia, tornando a psicopatologia o
tema central. Assim a psicologia criminal se destaca como uma ciência de
suma importância para a contribuição da compreensão da conduta e da
personalidade do criminoso e o crime começa a ser visto como um problema
“do Juiz, do advogado, do psiquiatra, do psicólogo, do sociólogo,” não apenas
do criminoso (DOURADO, 1965 apud LEAL, 2008, p.173).
De acordo com Vilela (2000), foi a partir do estudo experimental dos
processos psicológicos que a psicologia inicia sua trajetória cientifica, sendo as
técnicas dos testes psicológicos instrumentos importantes que aproximaram a
Psicologia do Direito. A autora ressalta a importância, por exemplo, da
veracidade de um testemunho “[...] questão para a qual é importante o
conhecimento da percepção, da motivação e emoção, do funcionamento da
memória, do mecanismo de aquisição de hábitos, do papel da repressão”
(VILELA, 2000, p.16).
Segundo Jesus (2001), no inicio do século XX, trabalhos empíricos-
experimentais foram realizados por psicólogos alemães e franceses, sobre o
testemunho e sua participação nos processos judiciais. J. M. Catttel (1895)
desenvolveu vários trabalhos sobre memória e testemunho, seus estudos
foram considerados por alguns psicólogos como ponto de partida da psicologia
no campo jurídico, pois os mesmos indicavam a importância que a psicologia
possui no campo legal. A publicação do livro de Hugo Munsternberg “on the
witness stand” 1907, “... que lançou a idéia da utilização de um teste de
associação de palavras para ajudar a estabelecer a culpabilidade ou a
inocência de acusados, tendo sido atacado duramente pelos juristas da época”
(JESUS, 2001, p.30), também teve um papel relevante.
A psicologia abriu ainda mais os aspectos de investigação, sendo eles o
“sistema de interrogatório, os tipos de fatos delitivos, a detecção de falsos
testemunhos, as amnésias simuladas, os testemunhos de criança, as rodas de
investigação etc” (GARRIDO,1994 apud JESUS, 2001, p.31), desenvolvendo
assim a psicologia do testemunho.
Em 1955, o psicólogo Clark participou como perito judicial em uma
audiência, onde apresentou dados empíricos e psicológicos que foram aceitos
pelo tribunal Supremo dos Estados Unidos da América, afirmando assim a
necessidade de fundamentação psicológica não somente no direito, mas na
prática jurista (JESUS, 2001).
De acordo com parágrafo anterior algumas publicações podem ser citadas
como The American Jury, 1966, de Kalven (jurista) e Zeisel (sociólogo) que
escreveram um projeto de análise do comportamento dos juristas. Em 1975,
Thimbaut e Walker, terminaram o programa de investigação psicológica
experimental, obra que deu impulso ao surgimento de outra muito importante,
The Social Psychology of Procedural Justice, publicada por Lindy-Tyler em
1988 (JESUS, 2001).
Sobre a atuação do psicólogo jurídico, podemos afirmar que é um trabalho
recente no Brasil. Em 1978, em São Paulo, aconteceu um concurso para
Psicólogo no Instituto Oscar Freire, Departamento de Medicina Legal, Ética
Médica e Medicina Social e do Trabalho da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (FMUSP). Em 1980, em São Paulo, psicólogos já
atuavam como voluntários, porém, só em 1981 pelo Tribunal de Justiça do
estado de São Paulo que foi realizada a primeira contratação (MARTINS,
2000).
No Brasil, o primeiro concurso público para o cargo de psicólogo jurídico
aconteceu em 1985 em São Paulo capital. No Rio de Janeiro só veio a
acontecer no ano de 1998, onde foram selecionados os primeiros psicólogos
jurídicos da cidade. (BRITO, 2000).
Os anos seguintes são o resultado de um notável desenvolvimento da
Psicologia Jurídica, especialmente nos paises de língua anglo-saxonica. Nos
paises de língua latina, partiu da Espanha, onde o crescimento e a aplicação
foram notáveis, até os paises da América Latina, que estão iniciando a
regulamentação e aplicação da Psicologia na Justiça (JESUS, 2001, p.32).

Essa especialidade da Psicologia é a que mais está crescendo nos últimos


anos e é um campo de um futuro promissor, mas falta profissional
especializado nessa área (LEAL, 2009).

Conceitos da Psicologia Jurídica

A psicologia jurídica é uma prática interdisciplinar, que surgiu de acordo


com as demandas que foram aparecendo nas áreas destinadas às práticas
jurídicas, porém a psicologia, de acordo com Arantes (2004) ainda não se
movimenta sozinha em função das exigências especificas ditadas pelo Direito,
logo, a demanda psicológica é indicada pelo Direito.
A relação da psicologia com o direito é uma relação que já estava prevista,
pois as duas ciências estão diretamente ligadas ao comportamento humano. A
Psicologia busca a compreensão do comportamento humano e o direito com as
regras de condutas “certas” para que esse comportamento se enquadre no
contrato social para se viver em comunidade. O Direito também age para
solucionar conflitos que surgem para a mesma finalidade acima (TRINDADE,
2009).
Jesus (2001), também destaca a certeza de que essa relação Psicologia e
Direito teria que acontecer pela mesma razão colocada por Trindade (2009),
tendo em vista o complemento que a psicologia fornece ao direito, e a
importância de não querer ir além do que lhe compete:
A Psicologia, por um lado, procurando compreender e explicar o
comportamento humano, e o Direito, por outro, possuindo um conjunto de
preocupações sobre como regular e prever determinados tipos de
comportamento, com o objetivo de estabelecer um contrato social de
convivência comunitária (JESUS, 2001, p. 34).

De acordo com Jesus (2001), a Psicologia Jurídica tem como finalidade


estudar o comportamento dos atores que formam o jurídico se constituindo de
uma investigação especializada da psicologia. Também é conhecida como
Psicologia Forense, mas o mais adequado é a primeira denominação que
abrange atividades além das realizadas no foro.
França (2004, p. 74) também a denomina como uma especialização que se
relaciona com o sistema de justiça, ressaltando a diferença da Psicologia
Jurídica e da Psicologia Forense. A primeira está relacionada ao direito como
um todo, sendo que “a palavra jurídico é concernente ao Direito, conforme as
ciências do Direito e aos seus preceitos”. Já a Psicologia Forense esta
relacionada ao Foro Judicial, sendo que “o termo forense é relativo ao foro
judicial. Relativo aos tribunais”. Então, quando se fala de Psicologia Jurídica
estamos nos referindo a todos os procedimentos realizados no âmbito da
justiça, dentro e fora dos foros judiciais.
Para qualificar e delimitar a psicologia como jurídica, Popolo (1996 apud
FRANÇA, 2004), diz ser os comportamentos complexos (conductas complejas)
o objeto de estudo da Psicologia Jurídica. Esses comportamentos ocorrem ou
podem vir a ocorrer e devem ser de interesse do jurídico.
Apesar de todas essas afirmativas sobre a relação da psicologia e do
direito, há profissionais da área do Direito que acham impossível tal relação, de
modo que as duas ciências pertencem a mundos diferentes. A Psicologia
pertencente ao mundo do ser e relacionada a causalidade e o Direito
pertencente ao mundo do dever-ser e relacionado a finalidade. Porém Trindade
(2009) critica essa linha de pensamento ao dizer que o homem como um todo
pertence aos dois mundos: o ser e dever-ser. “Essa linha de pensamento, por
vezes referenciada à distinção entre ciências naturais e as ciências do espírito,
esquece que o homem, na verdade, é cidadão de dois mundos e pertence,
simultaneamente, ao reino do ser e do dever-ser” (TRINDADE, 2009, p. 23).
De acordo com Altoé (2001 apud LEAL, 2008) todas as coisas
relacionadas ao mundo do Direito, principalmente as questões humanas, são
complexas. Não são apenas burocráticas ou processuais, por trás estão
situações delicadas recheadas de sentimentos dolorosos. A autora cita alguns
exemplos como, por exemplo, pais que disputam à guarda dos filhos; maus
tratos e violência sexual contra criança; jovens que se envolvem com trafico;
entre outros.
Silva (2007 apud LEAL, 2008) diz ser nesse contexto que a psicologia
entra, colocando seus conhecimentos e assessorando determinadas ações,
tratando de uma profunda análise dos aspectos tanto conscientes como
inconscientes, do falado e não falado, entre outros tão importantes,
ultrapassando as colocações dos fatos.
Tamaso (2000) afirma que nos dias atuais, houve uma grande mudança no
que diz respeito às relações familiares, sociais e também na área tecnológica
que a ciência do Direito não acompanhou, apontando assim, a total relevância
do trabalho do psicólogo nesse âmbito. “Imprescindível é colocarmos em cada
campo o que lhe é devido. Problema psicológico deve ser resolvido no âmbito
de inúmeras formas de psicoterapia, não no âmbito jurídico” (TAMASO, 2000,
p. 101).
Hoje em dia é necessário o trabalho interdisciplinar, pois o mundo moderno
está marcado pela complexidade. Trindade (2008) afirma que a crise da ciência
é uma pós disciplinar, pois as ciências isoladas já não têm mais lugar no
mundo moderno. O objetivo final de cada ciência é diminuir de alguma forma o
sofrimento humano.
De acordo com Bedim (2000), a Organizaçao Mundial de Saúde (OMS),
tem propostas de formar equipes Inter e Multiprofissionais, mas sabe-se que na
teoria o trabalho é de suma importância, porém na prática não é tarefa fácil.
A mesma autora coloca como seria enriquecedor juntarmos os vários
saberes, atuando em um mesmo objeto: o ser humano. Essa interação das
várias ciências confirma a “[...] ideia de que não há verdades absolutas nem
universos acabados”. (BEDIM, 2000, p. 204). A interdisciplinaridade mostra que
nada está isolado, nenhum fato ou nenhuma solução, e sim relacionados com
vários fatores, não podendo ser visto de uma só maneira. Enfim, a
aproximação do pensamento da psicologia com o jurídico, é de suma
importância para que as duas ciências trabalhem juntas “harmonizando as
perspectivas entre as especialidades, bem como seu próprio objeto de estudo”
o ser humano.
“Ademais, os psicólogos judiciários têm um trabalho árduo e fundamental
na participação da construção da interdisciplinaridade, apresentando para os
novos profissionais da área a Psicologia aplicada à área do Direito” (TAMASO,
2000 p. 101).

Áreas de Atuação do Psicólogo Jurídico

Como relatado no primeiro tópico 2.1 desse trabalho, a psicologia jurídica


iniciou sua trajetória quase exclusivamente na elaboração de pareceres
psicológicos, baseados no psicodiagnóstico, nas realizações de perícia e
exames criminológicos. Porém nos dias atuais o trabalho do psicólogo jurídico
está cada vez mais amplo, não se limitando apenas em um trabalho de caráter
avaliativo, na elaboração de relatórios, pareceres ou laudos (LAGO, 2009).
Existe uma grande demanda psicológica no que se refere à Justiça como um
todo. Toda prática do saber psicológico relacionado “às práticas jurídicas
podem ser nomeadas Psicologia Jurídica” (LEAL, 2008, p.180).
Dentro da psicologia jurídica está a psicologia forense, que se refere aos
procedimentos psicológicos realizados dentro do Foro, são atuações que
sempre estarão sendo avaliadas judicialmente. As atividades realizadas pelo
psicólogo criminal, psicólogo judiciário, como também pelo psicólogo assistente
técnico estão incluídas dentro desses procedimentos, logo podemos dizer que
são um subconjunto da psicologia forense.
A psicologia criminal segundo Bruno (1967 apud LEAL, 2008) estuda o
aspecto psicológico do criminoso e o que o leva a ação. Nesse campo de
atuação está inserida a psicologia do delinquente, a psicologia do delito e a
psicologia das testemunhas. Já a psicologia judiciária corresponde às práticas
que são exercidas a mando e a serviço da justiça e é nessa prática que são
realizados os trabalhos periciais. Popolo (1996 apud FRANÇA, 2004) ressalta a
importância do psicólogo perito saber até onde pode ir, tendo em vista o limite
da sua atuação, sendo necessário estar sempre atento aos instrumentos e
modelos a serem utilizados para que haja uma boa fundamentação no parecer
final.
“A Psicologia Judiciária corresponde à prática profissional do psicólogo
judiciário, sendo que toda ela ocorre sob imediata subordinação à autoridade
judiciária” (LEAL, 2008, p. 182).
França (2004) fundamentou-se na classificação do Colégio Oficial de
Psicólogos de España, executando algumas modificações no que diz respeito
aos termos, para mostrar as subdivisões da Psicologia Jurídica. São elas:
Psicologia jurídica e o menor, sendo que no Brasil por causa do Estatuto da
Criança e Adolescente (ECA) essa área de atuação é denominada Psicologia
Jurídica e as questões da Infância e Juventude; No direito de família, o
psicólogo pode intervir nos casos de separação, disputa de guarda dos filhos,
na regulamentação de visitas como também da destituição do pátrio poder; No
Direito Civil, o psicólogo atua nos casos de interdição, indenizações ou
qualquer outra ocorrência cíveis; Na área da Justiça Trabalhista, no caso de
algum acidente de trabalho; No contexto Direito Penal, o psicólogo opera em
alguns procedimentos que estão em fase processual; Psicologia Judicial ou do
testemunho, Jurado, em que o trabalho psicológico está voltado para o estudo
dos testemunhos; Psicologia penitenciária, o trabalho nessa área está ligado à
execução das penas restritivas de liberdade; Psicologia Policial e das Forças
Armadas, o psicólogo faz um trabalho de seleção e formação dos profissionais
dessa área; Vitimologia, nesse caso o psicólogo opera no atendimento a vítima;
Mediação, o psicólogo atua de forma imparcial, apenas conduz, as partes são
responsáveis pela solução do conflito; fora todas essas áreas citadas acima a
autora também menciona a formação e atendimento aos juizes promotores
como sendo um trabalho realizado por psicólogos que está incluído nessa
subdivisão da psicologia, a Psicologia Jurídica.
Lago (2009) cita o Direito da Família, Direito da Criança e do Adolescente,
Direito Civil, Direito Penal e Direito do Trabalho como sendo os principais
campos de atuação do Psicólogo Jurídico, afirmando serem esses “[...] os
ramos do Direito que frequentemente demandam a participação do psicólogo”
(LAGO, 2009, p. 3).
Para Jesus (2001) a Psicologia dos Juízes, Psicologia dos Jurados,
Psicopatologia Forense, Psicologia Penitenciária e a Psicologia Policial são
importantes campos de atuação do psicólogo jurídico.
Tendo em vista nessa primeira parte a história e o conceito da Psicologia
Jurídica como também suas áreas de atuação, há a importância de se falar no
próximo item sobre o sistema prisional para que possamos perceber as
demandas existentes dentro dessa instituição.

Sistema Prisional

De acordo com Kolker (2004), a instituição denominada prisão surge junto


ao capitalismo. Essa instituição nasce para que se tenha o controle das
pessoas que de alguma forma eram consideradas perigosas. No século XIV as
prisões eram lugares onde os criminosos aguardavam o seu julgamento, e para
que pudessem aplicar penas como a de trabalho forçado.
“O banimento e a deportação estiveram associados ao processo de
exploração colonial e a prisão com ou sem trabalho forçado esteve intimamente
ligada à emergência a ao desenvolvimento do modo de produção capitalista”
(KOLKER, 2004, p.159).
Evolução das Penas

Antes de falar de sistema prisional, é importante fazer uma passagem


sobre penas e as formas de execução, pois são a partir delas que se faz o
surgimento do denominado sistema prisional.
De acordo com Bessa (2007) a vida em sociedade naturalmente nos leva a
colocar as regras de convívio, sendo condutas aceitáveis e não aceitáveis.
Com o surgimento do Estado o mesmo fica responsável por observar a
sociedade como um todo, punindo os que se enquadram nas condutas não
aceitáveis. Bem no início do que chamamos de civilização, antes da formação
do Estado como citado acima, a religião impunha suas regras, sendo a ordem
política confundida com a ordem religiosa, logo esta a causa de algumas penas
aplicadas. A pena nessa época tinha um caráter vingativo, a vingança era
quase sempre maior do que o ato de infração cometido, e por esta razão não
existia limites na aplicação da pena. Essa fase é citada como “[...] fase da
vingança privada” (BESSA, 2007 p. 17). A sociedade foi evoluindo e
consequentemente as formas de punição também, surgindo assim a Lei de
Talião conhecido como Olho no olho dente por dente abandonando um pouco a
desproporcional vingança privada. A composição também é mencionada, como
uma forma de punição mais branda, em que o ofensor fica livre das punições,
uma vez que tenha como pagar por meio de armas, gados, entre outros, o
ofendido. Surgindo daí a lei das doze tábuas em que está escrito na tabua VII:
se alguém fere alguém, que sofra a lei de talião, salve se houver composição.
Já na idade antiga, as punições estavam totalmente voltadas para a
religiosidade, assim as punições eram aplicadas pelos sacerdotes, na crença
de que eram deuses quem estavam ali punindo. As punições eram muito duras
chegando a ser totalmente desumanas, a fim de purificar a alma do criminoso.
Com o passar do tempo e a então introdução do Estado, as formas
punitivas eram aplicadas em praça pública, sendo conhecida como suplício.
Foucault (apud BESSA, 2007) diz ser o suplício um ritual de manifestação do
poder, não sendo apenas um ato de punição, mas sim uma forma para que
esse poder se tornasse mais poderoso. Essa forma de punir expressava o total
poder de controle do soberano sobre a sociedade. Um exemplo clássico de
punição por forma de suplício no Brasil foi a morte de Tiradentes.
Como se pode perceber as formas de punição mudam de acordo com as
mudanças da sociedade em geral Kolker (2004) e Silva (2007) confirmam essa
colocação quando falam do surgimento da nova forma de punir denominada
por Foucault de disciplina, que se caracteriza por uma forma de punição onde o
foco é a vigilância individual, perpétua e ininterrupta. Essa nova aplicação de
pena surgiu logo após o chamado suplício em decorrência da sociedade que
deixou de feudal monárquica e passou a ser considerada como sociedade
capitalista. De acordo com Foucault (apud KOLKER, 2004, p. 166) “[...] mais
eficaz e mais rentável vigiar que punir”.
Surgindo assim a nova ordem jurídico administrativa, em que a justiça
deixa de funcionar através de tribunais arbitrários e passa a ser administrada
pelo Estado. A partir dos princípios dessa nova forma de justiça, todos
deveriam ser tratados de forma igual perante a lei, ao contrario do que era visto
no período feudal, quando não havia leis e sim castigos definidos pelo
soberano. A partir daí surge a noção de infração, que pode ser considerada
como um ato que descumpre as ordens do Estado, sendo o infrator alguém que
rompeu o pacto social (KOLKER, 2004).
Para Foucault (apud KOLKER, 2004) a sociedade tem a liberdade como
sendo seu bem maior, assim a pena passa a ser a privação da mesma onde
sua medida principal é o tempo de sua suspensão. “A pena passa a
representar uma represália da própria sociedade aquele que violou o pacto
social” (BESSA, 2007, p. 23), sendo assim até os dias de hoje. Porém, com o
passar do tempo, surgiu a humanização das penas, uma vez que o século XIX
teve essa característica de penas mais brandas e de respeito aos direitos
humanos (SILVA, 2007).
De acordo com Bessa (2007) Cesare de Beccaria com sua obra Dos
Delitos e das Penas 1764, John Howard 1777 que escreveu The State of
Prisions in England and Wales e Jeremy Bentham autor de Teoria das Penas e
das Recompensas do ano de 1811, foram importantes pensadores nesse
período de humanização das penas.
Guimarães (apud SILVA, 2007) apresenta brevemente um histórico das
penas desde o século XIX até a Lei de Execução Penal. O autor relata que em
1808 inaugurou a prisão de Aljurbe, ressaltando a superlotação da mesma,
onde a capacidade era de 20 pessoas em cumprimento de pena privativa de
liberdade, porém havia 390. No ano de 1812 inaugurou a Cadeia Velha na
capital imperial, onde a mesma foi desativada em 1841. Foi em 1890 o
surgimento do código penal da república, em 1940 a introdução do regime
progressivo de penas e por fim no ano de 1984, surge a Lei de Execução
Penal.
De acordo com Pedroso (apud SILVA, 2007), foi em 1769 que ocorreu a
instalação da primeira casa de correção no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro,
a mando da Carta Régia do mesmo ano. Porém não fica claro se houve ou não
nesse período a instalação de fato dessa casa de correção, pois segundo
Araújo (2004), esse projeto não saiu do papel por falta de capital.
Segundo Luiz de Vasconcelos, uma Carta Régia de 8 de julho de 1769 mandou
estabelecer uma Casa de Correção, que sendo “utilíssima” não soube dizer
porque este projeto não foi executado. Uma das hipóteses que levantamos se
baseia na falta de capital para a construção da nova prisão que deveria contar
com espaço suficiente para abrigar um número cada vez maior de criminosos.
Além disso, deveria ser capaz de promover o trabalho dos detentos tirando-os
do ócio. Era um projeto interessante, mas demandava dinheiro, escasso
naquele período (ARAUJO, 2004, p. 28-29).

A primeira referência à prisão no Brasil está no Livro V das Ordenações


Filipinas de Reino, sendo este o “código de leis portuguesas que foi implantado
no Brasil durante o período colonial” (PEDROSO apud SILVA, 2004, p. 32),
quando eram segregados aqueles culpados por ferimentos por arma de fogo,
quem tentava ou invadia as casas dos outros, aqueles que descumpriam as
ordens judiciais, falsificavam documentos e os que contrabandeavam metais e
pedras preciosas (SILVA (2007).
Nesse período, as prisões não eram realizadas em presídios ou cadeias,
os aprisionamentos eram realizados em diversos locais, como as masmorras,
torres, castelos, enfim, qualquer lugar que servisse para essa finalidade.
De acordo com Silva (2007) e Bessa (2007), um sofisticado modelo de
prisão foi criado por Jeremy Bentham, já citado acima como figura importante
na fase de humanização das penas, o chamado Panóptico que se
caracterizava por ser uma construção circular onde no centro situa uma torre
com visibilidade total das pessoas em cumprimento de pena privativa de
liberdade ali encarceradas. Assim, as mesmas se sentiam vigiados o tempo
todo, sendo esse o objetivo descrito por Foucault (apud SILVA, 2007, p.19).
Induzir no detento um estado consciente e permanente de visibilidade que
assegura o funcionamento automático do poder, fazer com que a vigilância seja
permanente em seus efeitos mesmo se é descontínua em sua ação, que a
perfeição do poder tenda a tornar inútil a atualidade de seu exercício, que esse
aparelho arquitetural seja uma maquina de criar e sustentar uma relação de
poder independente daquele que o exerce, enfim, que os detentos se
encontrem pessoas em cumprimento de pena privativa de liberdade numa
situação de poder de que eles mesmos são os portadores.

Porém, esse modelo criado por Bentham não surtiu o efeito esperado, pois
não se obteve a recuperação das pessoas em cumprimento de pena privativa
de liberdade, fato previsto já naquela época e esperado até os dias atuais
(SILVA, 2007).
Foucault, (apud Silva 2007) afirma que a prisão de alguma forma cola um
rótulo naqueles que ali passam, surgindo uma “[...] patologização do sujeito,
apresentando à sociedade como portador de um vírus imbatível, o vírus da
delinquência” (SILVA, 2007, p. 19).

Subjetividade e Fatores Desencadeantes para o Ato Delituoso

O comportamento criminoso está em crescente vigência no que se refere à


violação das leis, da moral e da ética necessária no convívio social, os
indivíduos que cometem atos delituosos estão cada vez mais ousados fazendo
com que cada vez mais desperte a curiosidade dos estudiosos em pesquisas
sobre esse comportamento anti-social.
De acordo com Fiorelli (2010) desde a antiguidade se busca resposta para
o que vem a ser o fenômeno delitivo. O delinquente na Grécia antiga era
expulso do clã, sendo considerado um ser anormal. No século III, segundo o
mesmo autor as pessoas que não cumpriam as regras sociais tinham esse
comportamento por estarem sendo influenciados pelo demônio. Somente
depois passam a ver o homem “[...] como dono de seu próprio destino e
reconduzido à sua condição humana...” (FIORELI, 2010, p.322). É nessa fase
que começa a busca da humanização da pena como citado no tópico anterior.
Alguns autores se destacaram pelos estudos realizados sobre a pessoa
que infringe as leis de convívio social. De acordo com Kolker (2007) o primeiro
foi Morel que no ano de 1857 apresentou sua tese sobre degeneração, em que
mencionou que “[...] esta condição engendrava verdadeiros tipos
antropológicos desviantes, hereditariamente destinados a uma vida imoral, à
alienação e ao crime” (KOLKER, 2007, p. 176).
Já para Serafim (2003), foi Prichard o primeiro a estudar sobre as condutas
antissociais no ano de 1835, colocando a insanidade moral em destaque. Em
seguida no ano de 1838 é Esquirol quem estuda os indivíduos com a visão das
monomanias, já em 1858 Boudert denominou de enfermidade do caráter. Só
então o autor cita Morel, no ano de 1853 descrevendo os indivíduos de
comportamentos antissociais como degenerados. No ano de 1887 surge
Lombroso, referido como pai da criminologia e criador da antropologia criminal
(LEAL, 2008).
Na teoria de Lombroso, o indivíduo já nascia criminoso, posto que o crime
era um fenômeno hereditário, como também suas características físicas e
psicológicas serviam para identificá-los, além da reincidência ser uma regra
entre eles (KOLKER, 2004).
De acordo com Leal (2008) o fundador da psicologia criminal foi Despine,
que estudou os aspectos psicológicos das pessoas que cometiam algum crime.
Em sua opinião o delinquente não tem interesse em si próprio, possuindo
assim uma deficiência no que diz respeito à empatia ao próximo, a consciência
moral, e a sentimento de dever e o indivíduo também não se arrepende de
seus atos.
No que diz respeito às pesquisas mais atuais, o ato criminoso está
relacionado a vários aspectos. Para Serafim (2003) os parâmetros biológicos
contemporâneos estão divididos em fatores genéticos, bioquímicos,
neurológicos e psicofisiológicos. O autor ressalta a importância de se analisar
também os parâmetros psicológicos e sociais do indivíduo antissocial.
De acordo com Fiorelli (2010) a delinquência pode surgir em decorrência
de vários fatores. O autor afirma que pessoas que sente prazer em ver o outro
sentir dor, pode se caracterizar como uma pessoa de personalidade antissocial
onde “[...] o indivíduo agride a sociedade, representada pelo objeto da raiva; o
agredido não passa de coisa; o prazer de agredir contrabalança a frustração de
não poder destruir; eventualmente, chega à fatalidade” (FIORELLI, 2010, p.
223). Mencionando também a importância de se observar dois tipos de
fenômenos: o condicionamento e a observação de modelos, sendo o primeiro
relacionado ao reforço positivo, em que o indivíduo que está exposto sempre à
mesma situação acaba aprendendo e colocando-a em prática. Já o segundo
diz respeito às formas observadas aos comportamentos agressivos e repeti-los
mais tarde. O autor diz ser na infância que esses fatores são adquiridos.
Davoglio (2010) coloca a dificuldade de se avaliar os aspectos de
personalidade principalmente no que diz respeito a implicação legal, pois
geralmente os indivíduos que obtém um desvio de conduta, como um
transtorno de personalidade antissocial (TPAs) e ou traços psicopatas tendem
a negar ou minimizar esses desvios. E ressalta a importância de não confundir
o indivíduo com TPAs com psicopatas, pois geralmente os dois estão
associados, contudo o psicopata geralmente apresenta tal transtorno mas os
indivíduos que os possuem nem sempre podem ser comparados a um
psicopata.
Partindo desses contextos de que é preciso verificar toda a história do
indivíduo, passando pelos aspectos biológicos, psicológicos e sociais para se
chegar a uma conclusão referente ao ato criminoso, além de ser interessante
colocar a questão da imputabilidade e inimputabilidade.
De acordo com Trindade (2010) imputável diz respeito àquela pessoa que
cometeu o fato delituoso e é capaz de entender sua conduta. Nas palavras de
Davoglio (2010), a pessoa considerada imputável é aquela capaz de
responsabilizar-se por suas condutas. Quando o indivíduo não é legalmente
responsável por seus atos, ou quando “o delito envolve a capacidade de
julgamento do indivíduo ou o controle do próprio comportamento“ (DAVOGLIO,
2010, p. 113) são considerados inimputáveis. Existem também os casos de
semi-imputabilidade, neste caso a culpabilidade é diminuída no caso do
indivíduo apresentar transtorno de intensidades leves (TRINDADE, 2010). De
acordo com o art.26 do Código Penal:
A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de
perturbação da saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou
retardado, não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou
de determinar-se de acordo com esse entendimento (BRASIL, 1940).

O primeiro caso brasileiro de inimputabilidade foi reconhecido na década


de 20 e foi o primeiro preso da instituição Manicômio Judiciário do Brasil. O
preso de número um tinha o nome de Febronio Índio do Brasil. De acordo com
Silva (2007), foi ele quem permaneceu mais tempo preso em nosso país. Teve
sua prisão decretada pela primeira vez com 21 anos, sua trajetória no crime
passou por práticas ilícitas de menos importância, falsidade ideologia entre
outros, chegando ao episódio em que Febronio abusou sexualmente e
estrangulou dois rapazes em 1927, porém havia relatos de outras vítimas onde
o criminoso tinha de praxe tatuar o corpo das vítimas. A partir dessa época não
saiu mais da prisão onde morreu aos 89 anos de edema pulmonar e
completamente senil (SILVA, 2007).
A psicologia no que diz respeito aos atos antissociais necessita investigar
todos os fenômenos ligados ao comportamento do indivíduo que transgride a
lei. É importante a verificação do que levou o indivíduo cometer o ato, quais as
circunstâncias em que ele cometeu e seu histórico, como já mencionado, para
que se possa fazer uma elaboração de planos de intervenção, sendo assim, o
processo de reabilitação fica mais fácil de ser atingido e trabalhos preventivos
podem ser realizados de forma mais positiva (SERAFIM, 2003).
Porém, é difícil na prática a realização desse trabalho de análise do
indivíduo infrator mencionada como de grande importância, pois de acordo com
Fernandes (2000) o número de profissionais é bem reduzido em relação à
demanda existente.
Nos deparamos com pessoas em cumprimento de pena privativa de liberdade
com diagnostico de Alcoolismo, Pedofilia, transtorno Psicótico e Transtorno
Anti-Social de Personalidade dentre outros, assim como pessoas que
cometeram crime e não apresentam transtornos de Personalidade algum, e
não conseguimos individualizar a pena, o que interfere de forma a agravar seus
sintomas (FERNANDES, 2000, p. 221).

Enfim, os sujeitos que cometem ato ilegal existem desde o início da


sociedade, porém a forma de lidar e enxergar esses indivíduos não mudou
quase nada. Fiorelli (2010) afirma que devemos nos alertar da mesma forma
que Foucault disse no final do século XVIII, que vivemos em uma crise de
ilegalidade popular, onde “[...] o preconceito se encarrega de colocar um rótulo
geográfico nos acontecimentos”. (FIORELLI, 2010, p. 245).
Foucault (1987 apud FIORELLI, 2010) já apontava o desequilíbrio das
penas para as diferentes formas de infração, sendo a justiça mais eficaz no que
se refere às penas das pessoas menos desfavorecidas. Furto e roubo são
associados ao moreno pobre enquanto fraude está ligada ao branco rico e
respeitado.
Essa percepção viciosa faz com que as pessoas naturalmente percebam
comportamentos indicadores de delitos que se ajustam às suas crenças
arraigadas a respeito dos prováveis praticantes. Uma mentira que veste Armani
não passa de um lapso de memória ou uma inocente confabulação que Freud
explica, enquanto o esquecimento do desdentado Sebastião, receptador de
autopeças no popular desmanche da periferia, é visto como uma estratégia
ingênua para burlar a policia e falsear o testemunho (FIORELLI, 2010, p. 246).

Os Direitos Humanos

Os direitos das pessoas foram surgindo na sociedade de acordo com as


necessidades de cada época, assim as pessoas lutam pela efetivação dos
seus direitos conforme a demanda social. Os primeiros registros de
documentos que garantiam direitos às pessoas é o código de Hamurabi, do
ano de 1694, e a partir desse ano os direitos foram sendo adquiridos
lentamente de acordo com a evolução da sociedade, no que se refere à
política, economia e tecnologia (FIORELLI, 2010).
As leis e normas de uma sociedade servem para disciplinar as relações de
identidade, cidadania e o respeito às diversidades existentes. O código penal e
o código civil são normas constantes, e há também as normas gerais das
convenções de direitos que são relativas aos direitos humanos e possuem
características como a imprescritibilidade, inalienabilidade, irrenunciabilidade,
inviolabilidade, interdependência, universalidade, efetividade e
complementaridade (FIORELLI, 2010).
As Organizações das Nações Unidas (ONU) aprovou em 10 de dezembro
de 1948 a Declaração dos Direitos Humanos. Os direitos humanos constituem
em direitos básicos e liberdades fundamentais que pertence a todos os seres
humanos. A declaração é formada por 30 artigos classificados por cinco
categorias de direito: civis, políticos, econômicos, sociais e culturais.
Fiorelli (2010) ressalta a importância de destacar que a discriminação
racial, discriminação contra a mulher, os direitos das crianças e dos
adolescentes e estatuto dos refugiados foram itens dos anos posteriores a data
acima.
Os direitos humanos surgiram para valorizar as pessoas e para que haja
uma igualdade entre as mesmas, visando uma melhoria referente às relações
sociais promovendo assim o progresso e a melhoria na qualidade de vida.
A Lei de Execução Penal de 1984 (LEP), além de prever a individualização
da pena dos indivíduos que estão cumprindo pena privativa de liberdade e a
readaptação dos mesmos à sociedade, reconhece os direitos humanos
garantindo assistência médica, jurídica educacional, social, religiosa e material.
Em seu terceiro artigo, no parágrafo único, ressalta que não poderá haver
qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política no que se
refere à aplicação das penas (BRASIL, 1984).
Porém não é isso que vemos no Brasil, pois há relatos encontrados em
que a Lei é descumprida nos estabelecimentos prisionais, ao contrario do que
prevê a LEP. “Nossas prisões são muito diferentes do que estabelece a lei”
(KOLKER, 2004, p.197).
Segundo Machado (2009), as prisões são lugares impróprios para se
conseguir algum efeito benéfico em respeito ao desenvolvimento e a
ressocialização da pessoa encarcerada, pois enquanto está cumprindo sua
pena é influenciado pelas leis internas que predominam no sistema carcerário
não sendo permitida a ele uma fuga nem dos comportamentos ali exigidos.
Foucault (apud ARANTES, 2004) em Vigiar e Punir relata bem a
ineficiência das prisões, sendo a mesma inútil no que se refere a qualquer
mudança positiva da pessoa que ali cumpre sua pena. O mesmo autor em seus
estudos sobre a prisão concluiu que a mesma “destina-se a realizar um ideal
de exclusão por inclusão”. (FOUCAULT apud ROCHA, 2000, p. 205).
ROCHA (2000, p. 207) também coloca sua opinião a respeito do sistema
penal:
A proposta principal do Sistema Penal sustentada pelo tripé
„ressocializar/reintegrar, punir e intimidar‟, apresenta-se a nosso ver,
principalmente em relação as duas primeiras, como uma alternativa que se
destina ao fracasso, especialmente pela forma incongruente em que se
executam as normas da legislação e as condições que existem para que estas
sejam cumpridas.

Os principais problemas, no que tange à instituição prisional, são: a


superlotações carcerárias, a violências exercidas entre os próprios detentos, os
abusos de autoridades que estão relacionados aos maus tratos e as torturas,
não havendo a existência da garantia aos direitos humanos dentro do
cárcere. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2008).
De acordo com o Conselho Federal de Psicologia (2008), além de todos
esses fatores, a lei também não se faz cumprir quando as estatísticas mostram
que o perfil dos indivíduos apenados é na maioria pobre, com baixa
escolaridade e do sexo masculino, sugerindo a veracidade do dito popular:
“quem tem dinheiro não fica preso”.
Nas palavras de Zaluar (apud Guedes 2006, p. 563)
Os sujeitos pertencentes às classes de baixa renda tendem a sofrer maior ação
da justiça através do aparato judiciário policial. Assim, as prisões ficam cheias
de pobres e se reproduz um estereotipo de criminoso como aquele proveniente
de bolsões de pobreza, não sendo a população carcerária uma amostra
fidedigna do conjunto total de infratores.

O termo penitenciária se define como lugar destinado aos indivíduos que já


teriam conhecimento de sua pena e essa seria caracterizada pela reclusão de
regime fechado por um determinado tempo, sendo que este local por lei
deveria ter condições essenciais para abrigar o apenado, determinando
condições que não afetam a saúde do mesmo e alojando-os em celas
individuais. Para as mulheres, prevê a inclusão de uma seção para gestantes e
uma creche para o abrigo e assistência aos filhos das mesmas (SAFFI, 2003).
Entretanto, a situação real das penitenciárias no Brasil não está de acordo
com o citado acima, pois “[...] as penitenciárias no país vem se tornando cruéis
masmorras, onde se encontram pessoas em cumprimento de pena privativa de
liberdade provisórios misturados com condenados, empilhados num espaço
físico mínimo, prevalecendo o mais absoluto caos” (MACHADO, 2009, p. 2).
Apesar de todas essas colocações a respeito do sistema prisional,
Azevedo (2000) relata um interesse por parte de algumas penitenciárias no
Brasil de uma política com o foco na ressocialização, resgatando o direito de
cidadão dos indivíduos apenados, tentando assim colocar a LEP em prática. O
trabalho do psicólogo está totalmente voltado para o compromisso social e a
práticas que possam contribuir para que se faça cumprir essa Lei de 1984 a
partir de intervenções baseadas na prevenção, educação, justiça e
responsabilização dos sujeitos e da sociedade (SILVA, 2007).
Para Azevedo (2000) o trabalho do psicólogo na área dos Direitos
Humanos tem como objetivo defender os mesmos, combatendo as várias
formas de exclusões existentes na sociedade, contribuindo para a cidadania e
fazendo com que a sociedade reflita sobre a violação desses direitos.
No ano de 1998 foi fundada a comissão dos direitos humanos na cidade de
São Paulo, no aniversário de 50 anos da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, o trabalho tem como base o Código de Ética do Psicólogo seguindo
assim os seus princípios fundamentais (AZEVEDO, 2000).
Analisando esse capítulo fica evidente a importância do trabalho do
psicólogo dentro do sistema prisional, visando não apenas a subjetividade do
indivíduo como também o combate à violação dos Direitos Humanos. Assim a
psicologia tem um trabalho amplo dentro da instituição carcerária, o qual será
descrito a seguir.

Atuação do Psicólogo no Sistema Prisional

A intervenção realizada pelo psicólogo dentro do sistema prisional está


ligada a uma atuação em que se procura promover mudanças satisfatórias não
só em relação às pessoas em cumprimento de pena privativa de liberdade,
mas também de todo sistema. “A intervenção em sistemas penitenciários
implica em uma atuação planificada e dirigida a promover a mudança das
prisões para torná-las mais eficientes e eficazes na resolução de seus
problemas” (JESUS, 2001, p. 68).
O trabalho do psicólogo dentro das instituições prisionais existe há mais de
quarenta anos por meio de trabalhos informais e voluntários, mas só a partir da
promulgação da LEP de 1984 que o trabalho foi reconhecido oficialmente e
vem sendo objeto de estudo em vários debates e fóruns do Brasil (CARVALHO
apud LAGO, 2009). O Conselho Federal de Psicologia (CFP) junto ao
Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) e o Ministério da Justiça (MJ)
estão em parceria nessa discussão sobre a importante atuação do psicólogo
nessa área (SILVA, 2007).
De acordo com a resolução do CFP 012/2011, em todas as práticas
realizadas dentro do âmbito do sistema prisional o psicólogo deverá visar
fielmente os direitos humanos dos sujeitos em cumprimento de pena privativa
de liberdade, procurando construir a cidadania por meio de projetos para a sua
reinserção na vida social. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2011).
Para Silva (2007, p.104) é importante seguir essa colocação quando
menciona que:
A psicologia deve ocupar espaço de atuação na transdisciplinaridade, o que
destacará a sua importância no processo de construção da cidadania, que
deve ser objetivo permanente dos profissionais, em contraposição à cultura de
primazia da segurança, de vingança social e de disciplinarização do indivíduo.

A atuação do psicólogo dentro do sistema prisional é bastante abrangente,


pois as demandas são muitas. Além de participar das Comissões Técnicas de
Classificação, o psicólogo pode trabalhar junto aos sujeitos que estão
cumprindo pena privativa de liberdade, familiares e comunidade como também
dos próprios profissionais que atuam dentro da instituição.

Psicologia e a Comissão Técnica de Classificação (CTC)

A Lei de Execução Penal (LEP) fundou as Comissões Técnicas de


Classificação (CTCs), formadas por uma equipe especializada, orientada pelo
diretor e composta por dois chefes de serviço, um psiquiatra, um psicólogo e
um assistente social, devendo existir em cada estabelecimento (MENEZES,
2003). De acordo com artigo 9º da LEP, cada membro da comissão deve
contribuir com seu saber, visando um plano de individualização da pena do
indivíduo que está encarcerado para que se tenha um tratamento penal
adequado, podendo entrevistar pessoas, requisitar informações a qualquer
estabelecimento privado ou repartições, além de proceder a exames ou outras
diligencias que se fizerem necessárias. Segundo o artigo 6º da LEP, a CTC
poderá elaborar o exame criminológico, com a finalidade de estabelecer um
programa individualizador da pena privativa de liberdade adequada ao
individuo que cumpre pena privativa de liberdade.
Entretanto, nos últimos meses, houve um debate sobre a realização do
exame criminológico por parte dos profissionais de psicologia, pois o papel
ético do psicólogo é completamente oposto ao que determina tal exame.
De acordo com o Conselho Federal de Psicologia, não cabe aos
psicólogos efetuarem qualquer tipo de parecer sobre a periculosidade das
pessoas em cumprimento de pena privativa de liberdade e sua
irresponsabilidade penal. Para Rauter (2007, p. 43) é totalmente contraditório a
atuação do psicólogo no que se refere à elaboração de laudos e pareceres que
“[...] vão no sentido ao contrario à ética profissional”. De acordo com o mesmo
autor “[...] ao psicólogo é solicitado fazer previsões de comportamento através
de laudos que instruem a concessão de benefícios e a progressão de regimes,
exercendo uma espécie de futurologia científica sem qualquer respaldo teórico
sério”. Já Silva (2009) coloca que o exame criminológico “é um dispositivo que
viola, entre outros, o direito a intimidade e a personalidade” (SILVA, 2007, p.
106).
Quanto ao EC exigido do psicólogo, pretende inferir sobre a periculosidade do
sujeito, tendendo a naturalizar as determinações do crime, ocultando os
processos de produção social da criminalidade. Desnaturalizar, ouvir, incluir,
respeitar as diferenças, promover a liberdade são missões do psicólogo.
Classificar, disciplinar, julgar, punir são missões impossíveis para o psicólogo
(CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2010, p. 55).

Diante do citado acima, o Conselho Federal de Psicologia, na resolução


09/2010, que regulava a atuação do psicólogo no sistema prisional,
estabeleceu no Art. 4 que, de acordo com a lei nº10792/2003:
É vedado ao psicólogo que atua nos estabelecimentos prisionais realizar
exame criminológico e participar de ações e/ou decisões que envolvam prática
de caráter punitivo e disciplinar, bem como documento escrito oriundo da
avaliação psicológica com fins de subsidiar decisão judicial durante a execução
da pena do sentenciado.

Porém, apesar de previsto na Resolução 09/2010, do Conselho Federal de


Psicologia, o judiciário demandou a continuação da elaboração dos exames
criminológicos por parte dos psicólogos. Diante da polêmica existente, o
Conselho Federal de Psicologia em sua resolução nº 19/2010 suspendeu os
efeitos da resolução CFP nº09/2010 pelo prazo de 6 meses, para a realização
de audiências públicas em prol de se chegar a um acordo. O prazo da
suspensão dos efeitos da resolução 09/2010 foi novamente prorrogado, por
mais seis meses. Após debates sobre o assunto, em maio de 2011 foi
elaborada a resolução nº 12/2011 que disciplina a atuação do psicólogo no
sistema prisional.
De acordo com a Resolução 12, de 2011, do Conselho Federal de
Psicologia, no que se refere à elaboração de documentos escritos por
psicólogos com finalidade de auxiliar alguma decisão judicial na execução das
penas, não poderá ser realizada por profissionais psicólogos que atuem como
profissionais de referência para “o acompanhamento da pessoa em
cumprimento da pena ou medida de segurança, em quaisquer modalidades
como atenção psicossocial, atenção à saúde integral, projetos de reinserção
social, entre outros” (art. 4º). E é também vedada ao psicólogo a realização de
qualquer tipo de prognóstico criminológico de reincidência do apenado ou a
verificação de periculosidade do mesmo.
Sendo assim, os casos das pessoas em cumprimento de pena privativa de
liberdade que chegam à instituição prisional para o cumprimento de suas
penas, passam pela CTC para que seja respeitada sua subjetividade, sua
história de vida, visando à intervenção mais adequada (CHAVES, 2010, p. 7). A
autora exemplifica:
Se o preso é analfabeto, encaminha-se para alfabetização; se não tem
profissão, para curso profissionalizante; se tem hipótese de transtorno mental,
encaminha-se para avaliação psiquiátrica pelo SUS; se tem alguma doença,
passará por avaliação medica detalhada; se tem histórico de abuso de drogas,
poderá participar de grupos específicos com a Psicologia, e assim por diante.

De acordo com Kolker (2004), uma das atribuições da CTCs é aprimorar a


execução penal estudando e propondo medidas para que isso aconteça,
reduzindo os prejuízos de convivência e ajudando na capacitação das pessoas
que estão em cumprimento de pena restritiva de liberdade para o convívio
social. Porém esse tipo de tratamento individualizado previsto em lei é difícil de
ser atingido nos presídios brasileiros pela superpopulação existente nos
mesmos, sendo tarefa difícil proporcionar um tratamento penal individualizado
para esses indivíduos.
Chaves (2010) também ressalta a dificuldade existente de uma atuação
eficiente com os indivíduos que cumprem pena privativa de liberdade, pois as
atividades citadas acima como importantes do desenvolvimento da
individualização das penas nem sempre estão disponíveis para os que
necessitam.
De acordo com Ibrahim (2000) é de suma importância acompanhar a
pessoa que está cumprindo pena privativa de liberdade durante toda a
execução da pena, desde sua chegada na instituição onde passaria pela CTC
até sua reinserção na sociedade conforme prevê a Lei de Execução Penal de
1984.
Para Silva (2007, p. 106) no que se refere à CTC, o psicólogo deve prestar
atenção nas práticas realizada dentro da mesma, opinando nas pautas
debatidas sempre de acordo com o Código de Ética Profissional, evidenciando
os instrumentos nacionais e internacionais de direitos humanos, incentivando
debates sobre “saúde, educação e programas de reintegração social”.
Atenção Individualizada à Pessoa em Cumprimento de Pena

A atenção individualizada à pessoa em cumprimento de pena diz respeito a


todo atendimento “psicológico, psicoterapêutico, diálogo, acolhimento,
acompanhamento, orientação, psicoterapia breve, psicoterapia de apoio,
atendimento ambulatorial entre outros” (CONSELHO FEDERAL DE
PSICOLOGIA, 2009, p. 19) que podem ser realizados pelos psicólogos junto
aos sentenciados que cumprem pena privativa de liberdade. De acordo com o
Conselho Federal de Psicologia (2009), os atendimentos individuais podem ser
solicitados não só pelo próprio apenado como também pelos funcionários da
instituição prisional ou até mesmo pelos familiares. Este tem como objetivo
compreender as pessoas em cumprimento de pena privativa de liberdade,
avaliar sua saúde mental, dar acolhimento, escutar suas demandas, promover
saúde e defender os direitos humanos.
Segundo Fernandes (2000), o atendimento individual é composto por
várias entrevistas. Quando há uma demanda de emergência o autor denomina
de entrevista de adaptação ou emergência, que são realizadas no caso de
crise do preso, tendo como objetivo ajudar o mesmo a encontrar soluções para
que não acarrete em indisciplinas ou em algum tipo de comportamento que o
prejudique dentro do sistema prisional. Outro tipo é colocado pelo autor como
entrevista de acompanhamento que se caracteriza por um atendimento breve
ou limitado e pode ser determinado pelo Juiz, encaminhado por professores e
administradores ou a pedido do próprio preso.
Nascimento (2000) nomeia como entrevista de orientação o
acompanhamento do preso pelo psicólogo durante a execução da pena. O
apenado encaminha um bilhete ao psicólogo solicitando a entrevista na busca
de orientação sobre saúde, família, situação jurídica, sobre dificuldades a
respeito do convívio com as outras pessoas em cumprimento de pena privativa
de liberdade, como também dificuldades pessoais. É a partir dessa entrevista
que se observa a demanda e a vontade do indivíduo para o trabalho de
orientação psicológica. Esse procedimento atende melhor as solicitações do
sujeito quando o mesmo está disposto a aceitar a intervenção, pois tem uma
função mais terapêutica. A autora sugere esse acompanhamento em:
Casos de soropositividade para HIV, síndrome de abstinência, na fase que
chamamos de saturação, que se refere aquelas pessoas que tem diversas
passagens pelo sistema e que procuram compreender o porque isso acontece
(porque não conseguem viver „lá fora‟), e aqueles que estão prestes a sair e se
angustiam com a expectativa e com o medo do retorno, manifestando
sentimentos ambivalentes: alegria e medo, insegurança. (NASCIMENTO, 2000,
p.105).

Podem também ser realizados plantões psicológicos. Esse tipo de


intervenção é realizado de forma individual visando um atendimento de
emergência e tem como objetivo o acolhimento ao indivíduo que está
cumprindo pena restritiva de liberdade fornecendo assim uma atenção
psicossocial aos mesmos. “Esse sistema pede uma disponibilidade para se
defrontar com o não planejado e com a possibilidade de que o encontro seja
único” (MAHFOUND, apud GUEDES, 2006, p. 562).
Para Silva (2000, p. 378) é responsabilidade do psicólogo que trabalha
dentro do sistema prisional abranger sua prática para além da tarefa de
classificação do apenado, oferecendo possibilidades “terapêuticas” a esses
indivíduos excluídos pela sociedade. “Longe de se revelar como uma proposta
utópica, o que a experiência tem demonstrado é que para além da miséria
social e moral, o acesso à própria verdade é o que possibilita ao ser humano
seu próprio crescimento”.
O atendimento psicológico é valorizado pelas pessoas que cumprem pena
privativa de liberdade, quando os mesmos passam a enxergar que ali é um
espaço que oferece a eles uma reflexão sobre sua atuação como indivíduo
social que fica escondido enquanto pessoas encarceradas, como também um
momento de privacidade, o qual é praticamente impossível de acontecer no
âmbito do cárcere (GUEDES, 2006).

Atenção Grupal Realizada pelo Psicólogo

Os trabalhos realizados em grupo são na maioria das vezes uma


oportunidade de oferecer aos sentenciados algum tipo de intervenção, pelo
grande número de pessoas e de poucos profissionais da área sendo também
um espaço único de convivência, podendo o preso se relacionar e trocar
experiências. Esses grupos podem surtir efeitos internos em seus participantes
e com isso pode ser mudada a forma como eles se relacionam com a
sociedade como um todo (CHAVES, 2010). A dinâmica do grupo dentro das
prisões é a mesma realizada fora delas se baseando na maioria das vezes nas
características dos indivíduos que compõe o grupo.
Os grupos dentro das instituições prisionais podem servir para várias
finalidades, dependendo das demandas apresentadas pelas pessoas que estão
em cumprimento de pena privativa de liberdade, podendo também ser usadas
técnicas de diferentes tipos como oficinas terapêuticas, grupos de reflexão e
conscientização, grupo operativo, psicoterapia de grupo entre outros
(CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2009).
De acordo com Nascimento (2000, p.105) o trabalho em grupo tem como
objetivo a interação entre os indivíduos em cumprimento de pena privativa de
liberdade e também possibilitar reflexões “sobre aspectos referentes à
dignidade, ética, autoestima, respeito por si e pelo outro, cidadania,
participação política, favorecendo a vida em sociedade”.
Para Azevedo (2000) os grupos podem ser formados com o intuito de
trabalhar situações da vida prisional, como as penas, conhecimento da história
do sistema em que ele está inserido, as drogas, questões de saúde
(DST/AIDS), conflitos que surgem no cotidiano dos apenados, relações
interpessoais, bem como seus direitos e deveres.
É muito importante esse trabalho grupal com os indivíduos que cumprem
pena privativa de liberdade, pois:
Se eles ficam presos, escutam muitas vezes vozes contaminadas de possíveis
companheiros de cela, comprometidos com a cultura do crime. Os grupos são
possibilidades de resgatá-los para a sociedade da qual de fato fazem parte e
que, em alguns casos, por um momento (ou uma vida), negou sua existência
(CHAVES, 2010, p. 17).

De acordo com Chaves (2010), Conselho Federal de Psicologia (2009) e


Fernandes (2000), o trabalho grupal dentro do sistema prisional é muitas vezes
visto como um trabalho arriscado, nem sempre possível de ser realizado diante
das regras de segurança de algumas unidades. Sendo assim, é necessário
tomar medidas de segurança, como informações do clima da instituição no dia
da realização do trabalho, entre outras.
Apesar da colocação acima, muitos são os trabalhos realizados em grupos
com as pessoas que estão cumprindo sua pena privativa de liberdade no
sistema prisional brasileiro.
Grupos com preso em regime fechado têm a finalidade de preparar o
indivíduo que está encarcerado para a progressão da sua pena, visando a
diminuição da ansiedade causada pelo cárcere, para dar possibilidade de
condutas positivas e saídas mais saudáveis, sendo empregadas várias
técnicas, como dramatização, filmes e debates, temas livres, entre outras
(FERNANDES, 2000).
Nos grupos de dependentes químicos, o objetivo é tratar os detentos
dependentes de substancias psicoativas dos variados tipos, maconha, cocaína,
álcool entre outras (FERNANDES, 2000).
Nos grupos de prevenção a DST/AIDS, o objetivo é orientar e esclarecer a
respeito das doenças sexualmente transmissíveis, visando mudanças na
conduta do preso com base na conscientização do comportamento que pode
ser de risco (FERNANDES, 2000).
Chaves (2010) é psicóloga atuante da Penitenciária Estadual de Foz do
Iguaçu (PEF), que é uma unidade penal de segurança máxima destinada aos
presos do sexo masculino em regime fechado. Segundo a autora existe dentro
da penitenciária um espaço em que se pode planejar e sugerir projetos para
favorecer o desenvolvimento do indivíduo que cumpre pena privativa de
liberdade.
O modo de trabalhar que descobri foi criando e recriando projetos.
Organizamos um grupo, desenvolvemos, analisamos os resultados,
concluímos. Encontramos dificuldades, a energia desgasta. Pensamos em uma
alternativa. Energia renovada: outro nome, outra temática, outra proposta. Um
novo trabalho. Novos participantes. E diante de pequenas vitórias insistimos
(CHAVES, 2010, p. 17).

Chaves (2010) descreve alguns projetos realizados por ela no início da sua
atuação dentro da Penitenciária Estadual de Foz do Iguaçu, onde alguns já se
encerraram e outros permanecem ativos até hoje.
Grupo de orientação para liberdade, o objetivo principal é fornecer ao
sujeito em cumprimento de pena restritiva de liberdade um espaço de diálogo,
orientando e informando a respeito da vida em sociedade (CHAVES, 2009).
Nos grupos psicoterapêuticos, em cada encontro é debatido um tema
específico, como família, sociedade, crime, futuro. E são utilizadas dinâmicas
como forma de trabalho. Porém, segundo Chaves (2009), é uma prática
limitada, pois dentro do sistema prisional não há muito espaço e não se pode
tocar um no outro por motivos de segurança e preservação dos membros.
O Grupo resgatando memórias faz com que a pessoas que se encontra
encarcerada tente resgatar aspectos referentes à sua história de vida, sendo
uma oportunidade de “[...] reorganizar sua história e pensar no legado da
família e na sua identidade” (CHAVES, 2009, p. 24).
O grupo resgate da responsabilidade social surgiu do interesse das
próprias pessoas em cumprimento de pena privativa de liberdade em resgatar
a sua cidadania, mostrando a sociedade “[...] algo de sua vivência criminal“
(CHAVES, 2010, p. 24). Como exemplo a autora menciona que em parceria
com o Centro Integrado de atendimento ao Adolescente Infrator, um dos
integrantes do grupo citado acima foi relatar os prejuízos que obteve em sua
vida através do crime.
Já os Grupos de Apoio ao Dependente Químico, têm como objetivo
proporcionar reflexões e apoio diante do problema da drogadição tão presente
dentro da instituição carcerária (CHAVES, 2010).
Nos grupos de Dança de Salão, além de se proporcionar autoestima,
autoimagem e autoconceito para aqueles que estão cumprindo pena privativa
de liberdade, o objetivo é melhorar a relação conjugal, pois o grupo é dirigido
aos casados que recebem com frequência a visita de sua esposa (CHAVES,
2009).
No grupo Re-parar para Re-construir, o foco é o sujeito em cumprimento
de pena privativa de liberdade reincidente, e o objetivo é intervir de forma que
possibilite ao indivíduo reflexão sobre a sua vida colocando em evidencia os
projetos de vida (CHAVES, 2009).
Por fim, a autora descreve os grupos Agente Multiplicadores de Saúde e
Oficina de Sexo Seguro, que ajudam os sujeitos que se encontram
encarcerados a terem mais informações a respeito das doenças focalizando a
prevenção das mesmas (CHAVES, 2009).

Atendimento aos Familiares

Os psicólogos que trabalham dentro do sistema prisional podem também


atuar juntamente aos familiares dos indivíduos que estão cumprindo pena
dentro do sistema prisional. Essa intervenção pode ser realizada através de
entrevistas que geralmente tem objetivo de se obter uma melhor compreensão
do caso de cada indivíduo que cumpre pena privativa de liberdade. Orientações
a respeito de como receber o familiar que se encontra preso de volta ao lar.
Acolhimento e escuta, pois muitas vezes os familiares não aceitam a situação
na qual se encontram, como também podem ser realizados atendimentos para
compartilhar informações sobre o preso, as condições de saúde e o
acompanhamento do caso (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2009).
O atendimento familiar é muito importante, pois além de esclarecer as
dúvidas sobre o sistema carcerário e sobre a situação do preso para a família,
tem objetivo de resgatar e manter esse vínculo familiar (NASCIMENTO 2000).
Para Fichtner (apud HASSON, 2003), a família é essencial para o ser
humano podendo a mesma interferir na vida do indivíduo de forma positiva ou
negativa dependendo da sua estrutura.
A família é a matriz mais importante do desenvolvimento humano e também
principal fonte de saúde. Entretanto, quando não se constitui uma unidade de
experiência, de aprendizagem e de criatividade, poderá se tornar um fator de
doença (FICHTNER apud HASSON, 2003, p. 81).

De acordo com Guedes (2006) muitos são os indivíduos que cumprem


pena privativa de liberdade que depois de serem presos dizem valorizar mais a
estrutura e o convívio familiar. Os familiares que são presentes na vida da
pessoa que se encontra encarcerada acabam sendo uma ponte de ligação do
mundo dentro do sistema carcerário e o mundo fora dele, a sociedade
(BASTOS apud GUEDES, 2006).
É importante o trabalho com a família do individuo que está encarcerado,
visto que quando a mesma está preparada para receber a pessoa que estava
presa como integrante do núcleo familiar auxilia na sua readaptação na
sociedade (INALUD, [19--]).
Muitos familiares justificam a ausência nas visitas pela dificuldade de se
deslocar da sua residência até a prisão, por não terem condições financeiras
para isso, pela tristeza de ver seu familiar preso e também pelo
constrangimento de passar pela revista íntima obrigatória para entrar na prisão.
A revista íntima de acordo com Soares e Ilgenfritz é apontada “como um
procedimento constrangedor, humilhante e ineficiente, já que nem sempre
consegue impedir a entrada de drogas, celulares e outros objetos ilícitos dentro
do cárcere” (SOARES; ILGENFRITZ apud GUEDES, 2006, p. 567).

O Trabalho Junto aos Egressos do Sistema Prisional

A Lei de Execução Penal de 1984, em seus Art. 25, 26 e 27, prevê a


assistência aos egressos do sistema prisional orientando e apoiando na
reintegração a vida social, se necessário disponibilizando abrigo e alimentação
durante dois meses, prazo esse para que o egresso busque emprego e
condições de moradia. Caso seja comprovada a necessidade, pode ocorrer
uma prorrogação desse período. É dever dos profissionais capacitados
colaborarem para a que o egresso consiga trabalho. São considerados
egressos todos os indivíduos liberados do sistema prisional até um ano após
esse fato, e os que são liberados condicionais e estão no período de prova
(BRASIL, 1984).
Porém, de acordo com o Conselho Federal de Psicologia (2008) não se vê
o cumprimento da lei em todo o Brasil, uma vez que muitos egressos não
possuem nem a passagem de ônibus quando retornam à sociedade. Portanto,
é necessário e urgente que o “Estado brasileiro viabilize a construção de um
programa nacional de apoio aos egressos, envolvendo – entre outras medidas -
a atenção psicossocial” (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2008, p.
32).
O objetivo de um programa para atender a população egressa no Brasil
não deve se focar na diminuição de casos reincidentes e sim na promoção da
reintegração do egresso na sociedade, pois assim consequentemente o índice
de reincidência diminui naturalmente. A forma mais eficaz de isso acontecer é
colaborar para que o egresso gere sua própria renda de forma legal, pois esta
é uma forma do indivíduo ser visto não só pelos familiares, mas pela sociedade
como um integrante da mesma facilitando a reintegração dentro do contexto
família sociedade (ILANUD, 19--).
Para um bom funcionamento do programa é importante que haja uma
equipe multiprofissional atuando junto aos egressos. De acordo com Ilanud (19-
-), os assistentes sociais, os psicólogos e advogados são profissionais
indispensáveis na equipe dando ênfase ao trabalho psicólogo, sendo colocado
como o mais importante, tendo em vista o grau de vulnerabilidade em que se
encontram os indivíduos quando saem de dentro do sistema prisional.
De acordo com o Conselho Federal de Psicologia (2009) o trabalho com os
egressos não é tarefa fácil, pois há muito preconceito da comunidade e dos
próprios familiares, dificultando a reabilitação social, além da grande falta de
políticas públicas referentes a essa área.
Diante desse contexto, existe o instituto Elo, que é uma associação privada
sem fins lucrativos fundada por profissionais capacitados da área social, na
qual elaboram projetos, visando a inclusão dos indivíduos em situação de
vulnerabilidade social. Os programas CEAPA, Fica Vivo!, Mediação de
Conflitos, e o Programa de reintegração do Egresso do Sistema Prisional
(PrEsp), fazem parte desse instituto
De acordo com Assis (2009), O PrEsp visa trabalhar junto aos egressos do
sistema prisional os direitos humanos, seus deveres e direitos, discutir
questões como a vulnerabilidade social, as causas e consequências do seu
ingresso no crime, a família, a afetividade, além de promover formas de
crescimento e inclusão através da educação, profissão e sociedade
executando projetos em prol disso (ASSIS, 2009). Quando os indivíduos saem
do sistema prisional, os mesmos são informados do programa e da
obrigatoriedade da presença para atendimento. Esse programa tem o objetivo
de:
Promover a reintegração social do egresso do sistema prisional, mediante
políticas públicas e sociais que possam garantir e ampliar os direitos que estão
dispostos na Lei de Execuções Penais (LEP), nº 7210\ 84, que visa criar
perspectivas favoráveis para o rompimento do ciclo de violência em que os
egressos se encontram, em sua maioria, inseridos, diminuindo assim a
reincidência criminal (ASSIS, 2009, p. 9).

Diante desse contexto, oficinas são realizadas com o intuito de trabalhar


temas como cidadania, afetividade, violência doméstica, questões de gênero e
racial, atividade cultural, que ajudariam em uma nova interpretação de suas
vidas para que tenham novas perspectivas do futuro. Os temas variam de
acordo com as necessidades apresentadas pelos egressos.
No que se refere aos cursos profissionalizantes, Assis (2009) menciona a
dificuldade da realização do mesmo para a qualificação dos indivíduos no
sentido de ajudá-los a ter mais chances no concorrido muno dos trabalhos.
São muitas as dificuldades para realizar cursos profissionalizantes, devido a
falta de uma rede mais organizada e por se tratar de um público que em sua
maioria não tem documentação, tem baixa escolaridade e não tem recursos
financeiros para o transporte (ASSIS, 2009, p. 19).

Em relação à obtenção de renda e oportunidades de emprego por parte


dos egressos é importante destacar o paradoxo existente, pois o Estado
promove a reinserção do indivíduo no campo de trabalho referente à iniciativa
privada, porém não aceita o egresso para cargos públicos. De acordo com
Inalud (19--) a proibição do egresso a cargos públicos deveria ser revista:
Tomar a condenação criminal como sinônimo de inidoneidade moral importa a
equivalência, a priori, entre violação de regra jurídica (crime) e violação de
regra moral; tal equivalência pressupõe a fundamentação moral de todo e
qualquer crime, algo que contesta desde a laicização do Estado (que o Brasil
deu-se coma constituição de 1891). E por fim, a incapacidade eterna de
exercício de cargo público terminaria por perpetuar um dos efeitos da sentença
penal condenatória (Código Penal, art. 92), e a CR proíbe, em absoluto, as
penas de caráter perpétuo (art. 5º, inc. XLVII, alínea b) (INALUD, 19--, p. 111).

Inalud (19--) descreve a falta de documentação uma importante causa das


situações constrangedoras que o egresso do sistema prisional passa, pois ao
sair, muitos não possuem documento, portando somente a carteirinha de
livramento, aumentando assim, o sentimento de vulnerabilidade pessoal.
Portanto é essencial que os programas de atendimento aos egressos
ofereçam primeiramente orientações para a obtenção de documentos pessoais,
pois é também uma forma do egresso se sentir cidadão, aumentando o
sentimento de integração social, além de a documentação ser necessária para
“[...] o exercício de muitas atividades inerentes ao status de cidadão: desde o
direito de voto [...] até a possibilidade de abrir um crediário em uma loja”
(INALUD, 19--, p. 107).
É importante também que seja determinado um tempo específico para o
atendimento ao egresso para que diminua a possibilidade de se criar um
vínculo de dependência entre os programas e os atendidos, já que os mesmos
saberão que as atividades que eles realizam têm data certa para acabar. “O
importante é que , seja qual for a atividade a se desempenhar, haja sempre um
prazo máximo de duração para cada uma delas, e que esse prazo seja pré-
estabelecido e informado ao egresso desde o inicio do tratamento“ (INALUD,
19--, p. 109).
Muitos são os caminhos que estão sendo desenvolvidos para lidar com
esse desafio da reintegração dos egressos na sociedade, onde primeiramente
devem ser resolvidos as lacunas inerentes a baixa escolaridade e, como citado
acima, a falta de documentação, conscientizar e responsabilizar a comunidade
como um todo para a ressocialização dos egressos (CONSELHO FEDERAL
DE PSICOLOGIA, 2009).
De acordo com o Conselho Federal de Psicologia (2008), no Brasil não se
acredita na readaptação das pessoas em cumprimento de pena privativa de
liberdade na sociedade,
Não apenas muito dos técnicos e funcionários que trabalham no sistema
penitenciário, mas também grande parte dos membros do Ministério Público,
da Magistratura e da polícia estão convencidos de que a idéia de “recuperação”
dos condenados às penas privativas de liberdade não possui consistência , e
expressaria , tão somente , uma visão ingênua (CONSELHO FEDERAL DE
PSICOLOGIA, 2008, p. 33).
Porém não há fundamentação teórica sobre essa colocação, conforme
pode ser evidenciado em pesquisas realizadas sobre a reabilitação das
pessoas em cumprimento de pena privativa de liberdade. Nas quais mostram
de forma positiva o resultado dos trabalhos com os egressos do sistema
prisional, que apontam uma diminuição no que se refere à reincidência criminal.
Vale ressaltar que não importa o tipo de abordagem que é usada nos
programas, o importante é que os “[...] programas de reabilitação com detentos
ou egressos do sistema penitenciário devem ser implementados de forma
correta” (GENDREAU apud CFP, 2008, p. 35) para que se tenha um resultado
positivo.

Trabalho Junto aos Agentes Penitenciários

A profissão agente penitenciário é bastante antiga. Foram várias as


denominações já existentes no decorrer dos anos, como carrascos,
carcereiros, guarda de presídio, entre outras. De acordo com Lopes (2000),
independente da fase histórica os agente penitenciários estão sempre ligados a
situações de “exclusão, vigilância, fiscalização, humilhação, agressão, e tortura
[...] utilizados regularmente com a finalidade de aplicar o castigo considerado
justo, punir o desvio, promover a adequação e manter uma determinada ordem
social” (LOPES, 2000, p. 330).
Segundo Lopes (2000) as prisões são vistas pelos agentes penitenciários
como sendo pertencentes a um outro mundo, caracterizado por ser um lugar
pesado, cheio de ameaças, em que as pessoas em cumprimento de pena
privativa de liberdade são o perigo maior. Eles denominam os indivíduos
encarcerados como “[...] seres de outra espécie dotados apenas de qualidades
negativas” (LOPES, 2000, p. 330). Para solucionar problemas gerados dentro
do sistema pelas pessoas em cumprimento de pena privativa de liberdade, os
agentes usam de humilhação verbal até tortura, guiados pela precipitação, pelo
preconceito, por falta de orientação e até mesmo por pura vingança.
O mesmo autor cita que de acordo com o ambiente de trabalho que se
encontra a instituição prisional fica difícil a atuação do agente de forma
saudável, não havendo condições de desenvolvimento para isso.
Se considerarmos que o ambiente de trabalho e a relação que o trabalhador
mantém com ele é parte da identidade do equilíbrio psíquico daqueles que
trabalham, é possível imaginar qual a realidade de saúde dos agentes de
segurança em ambientes como prisões (LOPES, 2000, p. 331).

Podemos então colocar o trabalho do agente penitenciário como árduo,


difícil, gerador de stress. Segundo dados de uma pesquisa realizada por Rocha
(2000) a maioria dos agentes penitenciários apresentam grau elevado de
stress, onde os sintomas principais são irritação, estado de tensão, sugerindo
em parte a causa dos atos violentos realizados dentro do sistema prisional.
Porém nada justifica tal violência.
Lopes (2000, p. 331) também concorda quando coloca que a dinâmica do
trabalho dentro do sistema prisional “agentes/sentenciados/prisões” acaba
resultando em muito stress e se manifestando na maioria das vezes por meio
da violência. “Parecem ter a função de baixar os níveis de tensão na prática
cotidiana”. E quando a violência não está direcionada as pessoas em
cumprimento de pena privativa de liberdade, está voltada para o próprio
agente, que acaba adoecendo e tendo que se afastar do trabalho.
Portanto, é visível a necessidade de um trabalho dos psicólogos junto aos
agentes penitenciários. Segundo Lopes (2000, p.332) os próprios agentes
reclamam da falta de atendimento referentes a eles. “Os agentes se sentem
menosprezados em relação aos sentenciados, no entendimento deles seria o
mesmo que dizer que aqueles que cometem crimes merecem mais respeito do
que aqueles que trabalham na prisão”.
Em algumas penitenciárias brasileiras isso já ocorre, de acordo com o
Conselho Federal de Psicologia (2009), os psicólogos que atuam dentro do
sistema prisional oferecem aos funcionários do presídio atenção psicológica,
realizando orientações, avaliações, entrevistas e se necessário fazem o
encaminhamento aos serviços especializados. Além dos atendimentos
individuais, podem ser realizados trabalhos em grupo, com palestras, debates
entre outros. Como todo trabalho em grupo, os temas trabalhados podem ser
diversos e a escolha do mesmo surge de acordo com as demandas dos
participantes (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2009).
“Foi apontado como tarefa do (a) profissional psicólogo (a), o compromisso
de melhorar as condições de vida do presídio, bem como transformar a cultura
institucional e garantir os direitos das pessoas presas” (CONSELHO FEDERAL
DE PSICOLOGIA, 2009, p. 24).
De acordo com Jesus (2001) a Psicologia é totalmente capaz de realizar
um ótimo trabalho dentro do sistema prisional, seu saber é de suma
importância e visivelmente necessário para atender as diversas demandas
existentes dentro do sistema prisional.
Diante o exposto, é possível perceber a importância do trabalho da
psicologia no âmbito da justiça, uma vez que sua atuação é realizada de várias
formas, sendo todas essenciais e indispensáveis nos dias atuais.
O trabalho do psicólogo dentro do sistema prisional está a cada dia sendo
mais valorizado, pelos resultados positivos apresentados pelos profissionais
atuantes dentro dessas instituições. Entretanto, percebe-se que é visível o
preconceito existente nessa área por diversas partes, como: comunidades,
familiares, alguns funcionários que trabalham dentro do sistema prisional e até
mesmo de certas pessoas que cumprem pena. A violência está tão banalizada
que a maioria das pessoas não vêem soluções para amenizar esse caos,
sendo assim, falar de readaptação, ressocialização em relação aos indivíduos
que estão cumprindo pena em regime fechado é uma ilusão para muitos.
Diante disso, podemos dizer que o trabalho do psicólogo é de suma
importância para que se possa mudar essa maneira de enxergar esse
problema, devendo assim atuar junto aos que estão cumprindo pena privativa
de liberdade, aos familiares dos mesmos, à comunidade, aos egressos e até
mesmo realizar trabalhos com os funcionários do sistema prisional.
O trabalho do psicólogo junto às pessoas que estão em cumprimento de
pena privativa de liberdade ajuda os mesmos a perceber o seu papel como
cidadão na sociedade, resgatando neles vários interesses que na maioria das
vezes ficaram latentes por muito tempo. Diante disso, faz com que surja uma
possibilidade de mudança em sua vida para que sejam inseridos na sociedade,
posto que muitos dos que estão cumprindo pena dentro da instituição
carcerária já eram excluídos da sociedade de alguma forma e nunca tiveram
oportunidade de fazer valer seu papel como cidadão.
A família ocupa na maioria das vezes um lugar muito importante na vida
dos sujeitos, portanto é essencial trabalhar junto aos familiares esse contexto,
para que possam receber seu parente que estava encarcerado. O egresso do
sistema prisional que se sente parte do núcleo familiar tem mais facilidade para
se readaptar na vida social. Porém não adianta só a família dar apoio, a
comunidade precisa também acolher os egressos, visto que, excluindo o
individuo, o mesmo não terá chance de mudança, tendo assim maior
probabilidade de reincidir no ato ilegal.
A precariedade do sistema prisional brasileiro é mais do que notória, o
modelo deve ser repensado. Portanto, o trabalho do psicólogo dentro do
sistema prisional é indispensável tendo em vista que sua atuação é totalmente
voltada para a garantia dos direitos humanos, procurando fazer com que a LEP
seja efetuada de fato para que se possa ter um resultado satisfatório.
Para o psicólogo, trabalhar com as pessoas que estão cumprindo pena
privativa de liberdade não é o mesmo que "enxugar gelo" como muitos dizem, é
um trabalho que visa não só o bem estar dessas pessoas que se encontram
encarceradas, mas o bem estar da sociedade como um todo. O trabalho
realizado por uma equipe multiprofissional na qual o psicólogo está inserido, é
de suma importância no que se refere a tentativa de mudar os conceitos e
preconceitos existentes dentro e fora do sistema prisional, dando ênfase no
trabalho de readaptação das pessoas que cumprem pena privativa de
liberdade. Muitas pessoas, que acham que segregar e excluir esses indivíduos
que cometem atos ilegais é a melhor solução, esquecem que um dia esses
mesmos indivíduos irão voltar a fazer parte do convívio social que a elas
pertencem.

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