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REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE ACIDENTES COM CRIANÇAS *

BIBLIOGRAPHY REVIEW ABOUT CHILDREN' ACCIDENTS

Luiza Jane Eyre Xavier de Souza **


Maria Grasiela Teixeira Barroso ***

SOUZA, L.J.E.X. de; BARROSO, M.G.T. Revisão bibliográfica sobre acidentes com crianças. Rev.Esc.Enf.USP., v.33, n.2,
p. 107-12, jun. 1999.

RESUMO

O objetivo do estudo consistiu, em apresentar uma revisão bibliográfica dos acidentes com. crianças. Utilizaram-se as
pesquisas documental e bibliográfica como metodologia.. Os dados evidenciam que o acidente com criança é um dos
maiores problemas de saúde pública na Inglaterra. Nos Estados Unidos aconteceram, em 1989, cerca de 2.700 mortes
como re sultado de acide nte s e m crianças ab aix o de 11 anos. No Brasil, també m registram-se e levad os índice s d e
atendimentos envolvendo os acidentes domésticos e, em Fortaleza, no Ceará, esses casos também são identificados.
Conclui-se que os acidentes com crianças são alarmantes e merecem atenção específica com uma abordagem preventiva.

UNITERMOS: Acidentes domésticos. Criança. Enfermagem. Prevenção de acidentes.

ABSTRACT

The study's proposal was to evidence a. bibliography review about children' accidents. The bibliography and documental
re se a rche s we re used a s me thod ology. The data mad e cle a r tha t child re n a ccide nts a re the bigge r p ub lic hea lth
problem in. England. In the United States, in 1989, had happened about 2.700 deaths as accident results in children
under 1 . 1 years old. In. Brazil has been registered high index of attendance at pediatric emergencies that involves
home accidents. It has been concluded that the se cases have been increasing and they need special atte ntion and
preventive approach,.

UNITERMS: Accidents home. Children. Nursing. Accidents prevention.

1 INTRODUÇÃO

Culturalmente. os acidentes são percebidos Cuidando de crianças acidentadas há 10 anos,


como situações inevitáveis, não desejadas pelas descobrimos que os fatores predisponentes dessas
pessoas e até acreditamos que nunca acontecerão ocorrências são múltiplos e, ao mesmo tempo,
conosco. Porém, quando enfrentamos um acidente e específicos a um determinado contexto social. A
refletimos como aconteceu, podemos descobrir que literatura refere que existem características
poderia ter sido evitado. peculiares quando se estuda o acidente com a
criança porque tanto o agente, como o hospedeiro e
A medida que se intensificam os métodos o meio ambiente estão se alterando de acordo com
preventivos contra as doenças infecciosas mediante a fase de desenvolvimento da criança, obrigando a
o progresso das medidas de higiene e elevação do soluções diferentes (MAcKELLAR, 1991; BRAYDEN
nível de vida dos povos, o mundo observa um et al., 1993; PHALP, 1994; EHIRI; WATT, 1995;
aumento importante da morbidade e mortalidade SCHVARTSMAN, 1977).
envolvendo crianças em acidentes (LEVENE, 1992;
BRAYDEN et al. , 1993; JONES, 1993; PHALP, 1994; Para a Organização Mundial de Saúde -
JORGENSEN, 1995). OMS. acidente é todo acontecimento fortuito que

*Elaborado a partir do 2º capítulo da dissertação de mestrado Envenenar é mais perigoso: uma abordagem etnográfica, defendida
em março de 1997 na UFC e apresentado no II Seminário de Pesquisa em Enfermagem - Universidade Estadual do Ceará, em 1997.
**Doutoranda em Enfermagem da Universidade Federal o Ceará, Enfermeira o Instituto Dr. José Frota.
***Prof. Emérito da Universidade Federal o Ceará.

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determina uma lesão reconhecível e constitui, EINSENSTEIN: SOUZA, 1993: PHALP, 1994).
atualmente, importante problema pediátrico e de O acidente coloca a família e responsáveis
saúde pública pela sua incidência e repercussões ( pelas crianças acidentadas em contato com
EISENSTEIN; SOUZA, 1993; SCHVARTSMAN, situações geradoras de estresses, de diversas
1977). maneiras de perceber o mundo, de conflitos intra e
inter-familiares, onde cada família tem o seu
Atualmente, os pesquisadores sociais vêm
universo cultural e, dentro desse universo, ainda
colocando em discussão a "acidentalidade" dessas
existem as diversidades que necessitam ser
ocorrências, pois os acidentes não são tão inevitáveis
apreendidas pelo profissional que presta cuidados de
como possam parecer e nem tão acidentais, sendo,
saúde ao homem, um ser que é, ao mesmo tempo,
portanto, na sua grande maioria, passíveis de serem
complexo e rico de experiências (SOUZA, 1997).
Prevenidos. A prevenção consiste em antecipar os
acontecimentos. evitando que algum dano aconteça, Os acidentes domésticos em crianças são mais
mediante o exercício de cuidados físicos, materiais, freqüentes do que imaginamos e contribuem para
emocionais e, mormente sociais, motivo pelo qual as elevar a morbi-mortalidade da epidemiologia dos
precauções se fazem necessárias, devendo ser acidentes. Diante do exposto entendemos que esta
compreendidas e praticadas pelas famílias (LEVENE. temática necessita de estudos freqüentes e que
1992: EISENSTEIN: SOUZA, 1993; KRUG et al.. ocasionem discussões que possam culminar com a
1994: SOUZA, 1997). elaboração de estratégias para diminuir tão sério
problema de saúde pública.
Confirmando a compreensão anterior, vários
autores buscam fortalecer a promoção do No período de revisão da literatura para
desenvolvimento humano, favorecer o contexto construir nossa dissertação de mestrado
social e ambiental. reforçar os fatores de proteção e constatamos que nos periódicos brasileiros de
de educação. fundamentais no contexto do acidente enfermagem, o assunto tem sido divulgado de forma
doméstico. porque estes casos penalizam as incipiente. Portanto o trabalho teve como objetivo
crianças, em plena fase de crescimento e apresentar uma revisão bibliográfica do acidente
desenvolvimento, não Podendo deixar de referir, as doméstico com crianças.
repercussões familiares e sociais que essas situações
carreiam (BLANK et al.. 1980: BRAYDEN et al., 2 METODOLOGIA
1993; EISENSTEIN; SOUZA. 1993: HU. WESSON; O estudo foi desenvolvido mediante Pesquisa
KENNEY, 1993; PHALP. 1994: EHIRI : WATT. 1995). documental complementado com a Pesquisa
bibliográfica. A pesquisa documental iniciou-se em
Percebemos que o contexto do acidente inclui julho de 1994, época em que uma das autoras
todos os níveis de prevenção, como a primária, com coletava dados para contextualizar a dimensão do
programas educativos e medidas de segurança, a problema do acidente em criança, no seu cotidiano,
secundária, tratando eficazmente e minimizando visando a construção de um projeto que seria
Seqüelas físicas, emocionais e sociais, e a terciária, submetido à seleção do mestrado em enfermagem da
reabilitando e reintegrando a criança e seus Universidade Federal do Ceará, área de
componentes físicos e socioculturais no contexto concentração) em Enfermagem Comunitária. Estas
familiar e mi sociedade (SOUZA, 1997). coletas documentais prolongaram-se durante o ano
de 1995 para compor a revisão de literatura da
Sendo assim. a família é responsável em
dissertação) em curso no referido ano.
manter a integridade da criança e proporcionar
ambiente saudável e seguro para o seu crescimento, Trabalhando em um hospital de emergência,
desenvolvimento e possibilidades de conquistar seu da rede pública municipal, especializado no
espaço no contexto produtivo e social e, sendo o atendimento ao grande politraumatizado, em
núcleo ma is intrínseco. desempenha papel Fortaleza, Ceará, para atingir o nosso Propósito,
importante nas várias etapas de descoberta da vida, consultamos os livros de atendimentos nas Unidade
com a finalidade de acompanhar. proteger. educar e de Emergência, Internação Pediátrica, Centro de
iniciar as diversas fases de socialização (lesse novo Tratamento de Queimados e Centro de Assistência
ser. Toxicológica do Ceará – CEATOX, localizados no
A prevenção deve ser abrangente, incluindo próprio hospital.
as ações dos profissionais de saúde e educação. dos A pesquisa bibliográfica, iniciada com a
especialistas e (tos responsáveis pela viabilização pesquisa documental, prolongou-se durante todo o
das estruturas socioeconômicas. E comentada pela ano de 1996, sendo consultado o sistema de
literatura como uma ação antecipada, tendo como comutação da Universidade Federal do Ceará,
objetivo interromper ou anular a evolução dos abrangendo periódicos integrados ao LILACS e
agravos à saúde (SCHVARTASMAN, 1977: BLANK et
al.. 1980: LEVENE, 1992; PELICIONI; GIKAS, 1992:

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3.2 Contexto nacional


MED LINE e , para acessá-lo s, u samo s como
indexadores as palavras acidentes, acidentes em No Brasil, os trabalhos que abordam o acidente
crianças, acidentes domésticos em crianças, na infância ainda são reduzidos necessitando pois,
enfermagem, epidemiologia, prevenção de acidentes, de publicações freqüentes. Este enfoque foi iniciado
não se fazendo restrição aos idiomas espanhol, inglês com Orlandi e Almeida em 1951, que referiram o
acidente na infância como causa de seqüelas e óbitos
e f r an cê s . D e s te mo do , re ce be mo s a r ti g o s
(PELICIONI; GIKAS, 1992). Em 1966, Wilson
p r o ve n i e n te s d a A u st r á l i a , Ca n ad á , Cu b a ,
Dinamarca, Índia, Inglaterra, entre outros. efetuou estudo analisando as características dos
i mprevistos do mésti cos, e m Vi l a Madalen a,
De posse dos artigos, mediante a revisão desta Município de S ão Paulo ( PELICIONI; GILAS ,
literatura e da pesquisa documental efetuada, 1992).
conseguimos identificar um breve perfil dos
acidentes com crianças o qual esboçamos nos Em 1979, Mello Jorge estudou a mortalidade
contextos mundial, nacional e local. por causas violentas no Município de São Paulo,
onde concluiu que o acidente de trânsito tinha sido a
principal causa de morte nas faixas de 0 a 4 anos e de
3 ACIDENTES COM CRIANÇAS 5 a 14 anos, seguida de afogamento (PELICIONI;
GIKAS, 1992). Em 1980, em trabalho realizado, foram
3.1 Contexto mundial identificadas as cinco principais causas de óbito na
infância, no Estado do Rio de Janeiro, e mostraram a
A literatura consultada revela que o acidente importância dos acidentes na faixa superior a 4 anos
com criança é o maior problema de saúde pública (PELICIONI; GIKAS, 1992).
na Inglaterra, onde mais de 700 crianças morrem Outros estudiosos dedicaram-se a esses
por ano, 125.000 são admitidas em hospitais e infaustos acontecimentos na infância, com especial
cerca de 2.000.000 são atendidas nos serviços de atenção para as intoxicações exógenas, dando
emergência em razão dos acidentes (LEVENE, 1992). ênfase aos produtos químicos de uso domiciliar e
Nos Estados Unidos, em 1989, às plantas venenosas (SCHVARTASMAN, 1977;
aproximadamente 2.700 crianças, abaixo de 14 SCHVARTASMAN et al. , 1984).
anos, morreram como resultado de infortúnios Na cidade de Porto Alegre, em 1980, foi
acontecidos no interior das residências (JONES, realizado um trabalho sobre a importância de
1993). No Canadá, em 1990 - 1991, foi realizado prevenção na infância, e os autores observaram que
estudo com crianças admitidas na emergência os acidentes infantis continuam sendo subestimados
do Hospital de To ro nto , na te ntativ a de pelas pessoas que deveriam preocupar-se com a
identificar os fatores predisponentes e os materiais saúde da criança (BLANK et al., 1980).
envolvidos nos sinistros domésticos. Os resultados
comprovaram que um dos meios mais eficazes para A preocupação em prevenir tais casos com a
reduzir a taxa dessas ocorrências é o conhecimento criança foi se intensificando entre os profissionais
dos pais ou responsáveis sobre o estágio em que a de saúde e, no ano de 1987, foi realizado um trabalho
criança se encontra e os diversos perigos que são para investigar alguns fatores de risco relacionados
encontrados no ambiente doméstico, pois entre 4.195 ao ambiente do mésti co e su a rel ação com a
crianças atendidas. 1.538 (37%) foram sinistradas escolaridade e renda familiar, entre a população que
no lar (HU. WESSON; KENNEY, 1993). freqüentou o Pronto Socorro do Instituto da Criança,
do Hospital das Clínicas dia Universidade de São
Em Oslo. entre 1983 e 1988, 445 crianças Paulo. Identificaram o fato de que quase a totalidade
foram admitidas em um hospital infantil em das mães não havia sido instruída sobre as regras
decorrência de intoxicação exógena, representando, mais elementares de segurança ou de prevenção de
portanto. 0.5% de todas as admissões (CAMPBELL; acidentes com crianças no domicílio (WAKSMAN,
OATES, 1992). Na Escócia, a cada ano, mais de 100 SCIVARTSMAN; DORA FILIO, 1987).
crianças morrem como resultado de acidentes, cerca
de 16.000 são admitidas nos hospitais e, em torno
de 160.000, recebem atendimentos nos centros de 3.3 Contexto local
emergências ( SMITH, 1991). No Ce ará, n a cidade de Fo rtale za, n as
Na África do Sul, a intoxicação com produtos unidades de emergência de um hospital público, que
químicos. especialmente o querosene, é um dos atendem o politraumatizado e com referência em
acidentes mais comuns em crianças, principalmente q u e i m a d u ras , aci de nte s e n dio scó pi co s e
nas menores de 3 anos e, em estudos realizados, envenenamentos, os dados epidemiológicos
estimou-se que pelo menos 16.000 crianças são retrospectivos, referentes aos acidentes infantis
hospitalizadas anualmente ( YACI, 1994; KRUG et totalizam grande número.
al., 1993) .
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Durante os primeiros quinze dias do mês de faringoscopias,laringoscopias, esofagoscopias e


dezembro de 1993. foram computados, 286 casos, na broncoscopias, além d a a n g ú s t i a r e s p i r a t ó r i a
faixa de 0 a 13 anos, com traumatismos variados e o t r a u m a d a hospitalização (SOUZA, 1996).
decorrentes de algum tipo de imprevisto. No período E s s es a c i d en t es o c o r r em t a n t o n a z o n a
de julho a dezembro, daquele ano, de um total de ur ba na qua nto na z ona r ur a l, a dquir indo a s
210 crianças admitidas na Unidade de Internação peculiaridades características dos locais, e estão,
P ed i á t r i ca d o h o s p i t a l e m es t u d o , 6 4 f o r a m ainda, relacionados com a faixa etária da criança.
acomet idas de -acident es domésticos, E m dec or r ência des s as s it ua ções, r egis t r a mos
representando. portanto. 30,5% pontos percentuais grande númer o de atendimentos e inter nações de
das ocorrências relatadas ( SOUZA, 1995). crianças acidentadas no lar.
No Cen tr o de Tratamento de Queimados Conforme exposto, na maioria das vezes, a
foram registrados 566 casos de atendimentos, necessidade, a falta de cuidado dos responsáveis
ambulatorial e hospitalar, a crianças queimadas na na pr oteção e segurança da cr iança tor nam-se as
faixa etária de 0 a 14 anos, durante os meses de causas desses registros. Observamos que não há uma
janeiro e fevereiro de 1994, causados, na sua grande preocupação evidente por parte dos r esponsáveis
maior ia, por líquidos diver sos, álcool e choque p a r a e v i t a r e s s es t r a n s t o r n o s ; o q u e h á s ã o
el ét r ico, ta nt o da Gr a nde F or ta leza como d e sentimentos de culpa, arrependimento e, até mesmo,
vários municípios do Estado (SOUZA, 1995). cenas de conformismo e resignação como fatos pré-
Ao r ec on h ec er a pr ob lemá t ica des sa s dest ina dos, c onf or me ext er ior iza m pa is e
.eventualidades domésticas, TEIXEIRA (1994), responsáveis. Perpetua-se essa culpa caso ocorram
co m ent a a s es t a t ís t ica s d os qu ei ma d o e, seqüelas irreversíveis ou êxito leta l. E, não é raro,
independentemente do nível sócio-econômico, 60% essas ocorr ências ocasionar em u m desajuste na
dos casos são em crianças entre 1 e 5 anos. estr utura familiar quando o homem tr ansfer e à
Os acidentes atingem os menor es que estão mulher a total responsabilidade dos cuidados e dia
em c o nt a t o c o m os f a t or es d e r is c o, c o mo a s educação dos filhos.
ex p o s i ç õ es n o s l o ca i s p er i g o s o s , o u s eja , na Nos anos de 1992 a 1996, de acor do
cozinha, banheiro, áreas de s erviços, escada s, com os dados estatísticos do Centro de Assistência
jardins. sem a vigilância adequada da família ou Toxicológica do Ceará - CEATOX, localizado em
de um adulto responsável. Esses incidentes no lar u m hosp ital de emer gência, do Mu nicípio d e
guardam relação com os aspectos socioculturais dia Fortaleza, foram registrados 4.436 atendimentos de
família. com o estilo de vida dos pais, com a idade intoxicações exógenas a cr ianças na faixa etária
da criança, sua etapa de desenvolvimento psicomotor de 0 a 14 a nos, s endo os medica ment os, os
e situações facilitadoras de risco. p r odu t os qu í mic o- i n du s t r ia is e os d e h ig i en e
Outr o ponto impor tant e nesta discussão é do més t ica os indu t or es p ela ma i or ia da s
que não se evidencia um planejamento voltado para intoxicações (SOUZA. 1997).
os p a dr õ es d e s eg u r a n ça e p r ev en çã o d es s es Essas intoxicações exógenas, causadas, na
episódios, qua ndo os r esponsá veis estã o sua maior ia, pelos medicamentos e Pr odutos de
arquitetando e realizando o planejamento estrutural u s o d o mi c i l ia r , es t ã o en r a i za da s n os há b it os
das edificações e r esidências. Podemos notar em cu lt u r a is da s f a mí l ia s . É co mu m p r es enc ia r o
n o s s a s r es i d ê n c i a s q u e a a l t u r a d a s t o ma d a s acondicionamento do produto químico de largo uso
elétricas é em torno de 40 centímetros do piso, o que n o a mb i e n t e d o m é s t i c o , e m v a s i l h a m e s i e
cons t it u i u m a tr at ivo par a a cr ia nça ex p lor ar . refrigerantes. A criança, que já tem conhecimento
D es s e mo do, r egis tr a m- s e a s qu ei ma du r as por e o ex p er i m e n t o u , n ã o h es i t a e m l ev a r b o c a
choqu e elétr ico. ocasionando, em alguns casos, qualquer garrafa sem se importa r qual seja o seu
parada cardíaca que pode se tornar irreversível e conteúdo, tor nando-se, assim, vulnerável a esses
culminar com o óbito. da n os t óx i c os . E m n os s o mei o , t a mb ém é u m
hábito a automedicação fa miliar , ficando ess es
Durante um per íodo de 3 anos, no Setor de medicamentos ao pleno alcance de ser manuseado
Endoscopia Perioral de um hospital de emergência, pelas próprias crianças.
localizado na cidade de Fortaleza. foram registrados
2.004 atendimentos a menor es de 14 anos, com Lembramos que, nas fichas de atendimentos e
suspeita ou pr esença de cor po estranho nas vias prontuários, nem sempre é registrado o local do
aéreas. Sendo a espinha do peixe. as moedas e o osso a c i d e n t e, o q u e p o d e l e v a r d e d u ç ã o d e s u b -
de ga linha os pr incipa is cor pos estr a nhos estimativas, mas esse leve perfil epidemiológico
identif icados. Essas cr ianças submet er am - s e a c a r a c t er i z a a s g r a v es s i t u a ç õ e s a q u e e s t ã o
procedimentos endoscópicos como expostas nossas crianças.

110 Rev.Esc.Enf.USP, v.33, n.2, p.107-12, jun. 1999.


Revi s ão Bi bli ográfi ca sobre aci dente s com cri anças Luiz a J ane E yre X avier e S ouza e M ari a Grasiel a Tei xei ra Barros o

4 CONCLUSÃO REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Conhecer e divulgar os dados que evidenciam a


ABAD, A. M. C. et al. Accidentes mas frecue ntes en el hog ar:
realidade do acidente doméstico em criança é uma pap el de l a e nf er mer a. Rev . Cub ana En f . , v . 5, n. 3,
postura crítica e social dos profissionais que formam p. 203-16, 1989.
a área de saúde e, em especial, os que cuidam
BERGMAN, A. B.; RIVARA, F. P. Swedens's experience in
diretamente de crianças.
reducing childhood injuries. Pediatric., v.88, n.1, p.69-74,
Vale ressaltar que é de vital importância a 1991.
necessidade do atendimento e participação dos
BLA NK, D. et al. Prev enção de a cident es na infância: o papel d o
pais ou responsáveis por ensinar, desde cedo, à pediatra. R. AMRIGS, v. 24, n.4, p.308-10, 1980.
criança a compreensão dos riscos do ambiente
que a e nvolve e sabe r como evitá-los. A BRAYDEN, R. M. et al. Behavioral antecedents of pediatric
enfermagem deve reforçar esses ensinamentos junto à poisonings. Clin. Pediatr., v. 32, n. 1, p.30-5, 1993.
família e à sociedade, conhecendo os aspectos
CAMPBELL, D.; OATES, R.K. Childhood poisoning: a changing
socioculturais e fortificando sua responsabilidade profile with scope for prevention. Med. Aust., v.156, n.17,
como detentora do cuidado. p.238-40, 1992.
A literatura enfatiza a importância da atuação
EHIRI, J. E.; WATT, G. C. M. The role of health visitors in the
dia enfermeira na prevenção do acidente com prevention of home accidents involving children: time for a
crianças, seja no cuidado domiciliar, através de rethink ? Health Bull., v.53, n.1, p.20-5, 1995.
palestras educativas para o público específico, nas
EI S ENST EI N, E.; S O U Z A , R . P . S i tu a ç õe s d e ri s c o à s aúd e
consultas de enfermagem inseridas nos programas d e c ri a n ça s e a d ol e s c e nt e s : me n sa g e ns bá s i ca s e a ç õe s d e
de atenção à saúde dia criança e adolescente, como pr evençã o para cri anças e ad olescentes de/na r ua e
comunidades. Petrópolis, Vozes, 1993.
t a m b é m . n o s a te n di me n t o s e t r a t a m e n to s
hospitalares (ABAD et al., 1989; LEVENE, 1992; HU, X.; WESSON, D.; KENNEY, B. Home injuries to children.
JONES. 1993: EIIRI: WATT, 1995; SOUZA, 1995, Can. J. Public. Health, v. 84, n. 3, p.155-8, 1993.
1996. 1997).
JONES, N. E. Childhood Residential Injuries. Haten Child
A literatura enfoca o fato de que é necessário Nurse, v.18, n.3,p.168-72, 1993.
um inteiro conhecimento acerca da natureza e
magnitude do problema, especialmente quando JORGENSEN, I. M. The epidemiology of fatal unintentional child
associado a peculiaridades regionais. Os acidentes injuries in Denmark.: Banish medical bulletin, J. Health Sc., v.
42, n. 3, p. 211-300, 1995.
te nde m mais a acontece r e m famílias
e c o n o m i c a me n te de s f a vo re ci d a s , co m o o s KRUG, A. et al. The impact of chil-resistant containers on the
envenenamentos, por exemplo, que ocorrem, na sua incidence of paraffin (Kerosene) ingestion in children. South
maioria, em lares onde predomina o estresse, tais African Med. J., v.84, n.11, p.730-4, 1994.
como depressão dos pais ou desemprego. Esse
conhecimento direcionará uma prevenção mais LEVENE, S. Pr ev ent ing accident s. Pr act iotioner, v. 236,
p.776-7, 1992.
abrangente, pois o caminho para a redução dos
acidentes em crianças encontra-se na abordagem MAcKELLAR, A. Child safety and demonstration homes. Med.
preventiva, com programas educacionais, uma J. Austr., v.154, n.6, p.575-6, 1991.
engenharia voltada para as medidas de segurança e
o cumprimento, em toda a sua extensão, das normas P ELI CIONI , M. C. F.: GIK AS, R. M. P rev ençã o de aci de nt es e m
e s c ol a r e s : p r o p o s t a d e m e t od ol og i a d e d i a g n ó s t i c o p a r a
e medidas de proteção ( BERGMAN & RIVARA, prog ra ma e duc ativ o. R ev . Bra s. Saú de Esc . , v .2 , n .1 ,
1991: WIDOME, 1991: LEVENE, 1992; PELICIONI & p.23-6, 1992.
GIKAS. 1992: JONES, 1993; KRUG et al., 1994;
EHIRI & WATT. 1995: SOUZA, 1997). PHALP, A. Child accidents: common, serious and preventable.
Practiotioner., v.238, p.766-9, 1994.
Compreendemos, então, ser relevante SCHVA R T SMA N, S. A c i d entes na I nfâ nci a . I n: CAR VA LHO, O.
abordarmos o tema para que a sociedade conheça a M a nu a l d e p e d i a t r i a . R i o d e Ja ne i r o, Gu a na b a r a K oog a n ,
1977. cap. 13, p. 140-1.
realidade dos acidentes que envolvem crianças, e
procurem exercer a sua co-participação na tentativa SMITH, T. Accidents, poisoning and violence as a cause of hospital
de diminuir os traumas físicos e emocionais que admissions in children. Health Bull., v.49, n.4, p.237-44, 1991.
nossas crianças vivenciam quando são acometidas,
por algum tipo de "acidente", durante seu processo
de crescimento e desenvolvimento.

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Revi s ão Bi bli ográfi ca sobre aci dente s com cri anças Luiz a J ane E yre X avier e S ouza e M ari a Grasiel a Tei xei ra Barros o

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