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Revista Eletrônica Acervo Saúde/ Electronic Journal Collection Health ISSN 2178-2091

Impacto do trabalho na qualidade de vida dos enfermeiros da estratégia da


saúde da família

Impact of work on the quality of life of nurses from family health strategy
Impacto del trabajo en la calidad de vida de los enfermeros de la estrategia de salud familiar

Cátia Botelho da Costa1, Janaína da Silva Santana1, Nathalia Romeu de Mazzi1., Raquel Mori
Pires de Camargo1.

RESUMO
Objetivo: Compreender a percepção dos enfermeiros que atuam na Estratégia de Saúde da Família sobre
a influência do trabalho na qualidade de vida. Método: Pesquisa descritiva e exploratória, de abordagem
qualitativa realizada por meio de entrevistas semi-estruturadas com 10 enfermeiros. A análise dos
resultados deu-se por meio da técnica de análise de conteúdo, modalidade temática. Resultados: A alta
demanda assistencial e gerencial foi apontada pelos participantes como uma influência negativa na
qualidade de vida do enfermeiro. Todavia, a satisfação de trabalhar na atenção primária foi citada como
fator positivo. Conclusão: O processo do trabalho colaborativo pode aprimorar a qualidade de vida do
enfermeiro e, por conseguinte, o cuidado.
Palavras-Chave: Enfermeiras de Saúde da Família; Qualidade de Vida; Condições de Trabalho.

ABSTRACT
Objective: To understand the perception of nurses working in the Family Health Strategy on the influence of
work on quality of life. Method: Descriptive and exploratory research, qualitative approach performed
through semi-structured interviews with 10 nurses. The analysis of the results was done through the
technique of content analysis, thematic modality. Results: The high care and management demand was
pointed out by the participants as a negative influence on the nurses' quality of life. However, the satisfaction
of working in primary care was cited as a positive factor. Conclusion: The process of collaborative work can
improve nurses' quality of life and, therefore, the care.
Keywords: Family Nurse Practitioners; Quality of life; Working Conditions.

RESUMEN
Objetivo: comprender la percepción de los enfermeros que trabajan en la Estrategia de Salud Familiar
sobre la influencia del trabajo en la calidad de vida. Método: investigación descriptiva y exploratoria,
abordaje cualitativo realizado a través de entrevistas semiestructuradas con 10 enfermeros. El análisis de
los resultados se realizó a través de la técnica de análisis de contenido, modalidad temática. Resultados: la
alta demanda de cuidado y manejo fue señalada por los participantes como una influencia negativa en la
calidad de vida de los enfermeros. Sin embargo, la satisfacción de trabajar en la atención primaria se citó
como un factor positivo. Conclusión: El proceso de trabajo colaborativo puede mejorar la calidad de vida de
los enfermeros y, por lo tanto, la atención.
Palabras Clave: Enfermeras de Familia; Calidad de Vida; Condiciones de Trabajo.

1
Universidade do Oeste Paulista (Unoeste).

DOI: 10.25248/REAS234_2018

Recebido em: 3/2018 Aceito em: 4/2018 Publicado em: 5/2018

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INTRODUÇÃO
A Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) está associada ao bem estar e satisfação no ambiente de
trabalho, sendo possível entendê-la como um parâmetro que contribui com a satisfação das necessidades
do trabalhador, impulsionando a desenvolver suas atividades e colaborando com o aumento da
produtividade, fatores que fortalecem as organizações no cotidiano em saúde (AMARAL et al, 2015).
A QVT é subjetiva, sendo percebida individualmente entre os empregados, estando relacionada a
algumas condições, tais como: um trabalho que valha a pena ser feito; remuneração e benefícios
adequados; feedback quanto ao seu desempenho; e oportunidade de crescimento e de aprendizado no
emprego (RENNER et al., 2014).
No âmbito da atenção primária, o enfermeiro que atua na Estratégia de saúde da Família (ESF) possui
funções diversificadas que envolvem desde a organização das atividades da ESF e seu funcionamento, até
a assistência direta ao indivíduo e comunidade, além de cumprir metas, participar de reuniões e, ao mesmo
tempo, atender a imprevistos e questões administrativas (DIAS et al., 2014; CAÇADOR et al., 2015).
Algumas dessas atribuições realizadas pelo enfermeiro podem impactar de forma negativa no ambiente
de trabalho, acarretando sobrecarga de serviço, insegurança, falta de autonomia e surgimento de conflitos
entre a equipe, comprometendo a assistência em saúde. Além disso, os profissionais da Estratégia de
Saúde da Família passam por situações múltiplas em relação às demandas físicas e psíquicas dos
usuários, devido ao contato direto com a realidade das comunidades – geralmente carentes em vários
aspectos, o que os expõem a consequências físicas e também emocionais (TRINDADE e PIRES, 2013).
Dessa forma, o enfermeiro quando exposto a um estímulo externo, sendo ele positivo ou negativo, está
propenso a desenvolver o estresse, o qual poderá afetá-lo diretamente tanto nas tarefas desenvolvidas no
ambiente de trabalho como em sua qualidade de vida. Percebe-se, então, que todas as situações
particulares do trabalho na ESF podem desencadear uma insatisfação no trabalho que, por sua vez, podem
influenciar diretamente na QVT dos profissionais de enfermagem (CAÇADOR et al., 2015; TRINDADE e
PIRES, 2013; BARROS et al., 2016).
Visto o exposto, a relevância da presente pesquisa se dá pela necessidade de avaliar a influência do
trabalho de enfermagem na qualidade de vida dos profissionais que atuam nas ESFs, podendo gerar
subsídios para auxiliar em mudanças na lógica de trabalho que impactem de modo positivo no bem-estar do
enfermeiro nos serviços e, consequentemente, no cuidado (CAÇADOR et al. 2015). Portanto, o objetivo
desse trabalho foi compreender a percepção dos enfermeiros que atuam na Estratégia de Saúde da Família
sobre a influência do trabalho na qualidade de vida.

MÉTODO
Estudo qualitativo, de natureza descritiva e exploratória, realizado com 10 enfermeiros que atuam nas
ESFs de um município do interior do estado de São Paulo (MINAYO et al., 2016). A abordagem desses
participantes ocorreu, primeiramente, por contato telefônico, a fim de combinar data e horário oportunos
para a realização da entrevista. A escolha dos entrevistados ocorreu de forma aleatória, sendo que a
delimitação da amostra deu-se por meio de saturação. É importante ressaltar que nenhum enfermeiro
abordado recusou-se a participar da pesquisa (MINAYO et al., 2016; FONTANELLA et al., 2011).
O critério de inclusão dos participantes foi a atuação na ESF do município de, no mínimo, 6 meses. Os
critérios de exclusão, por sua vez, foram os seguintes: atuação com tempo menor de 6 meses na ESF do
município e participante em período de licença ou férias no período de coleta de dados.
O estudo foi realizado entre os meses de julho e setembro de 2017, sendo coletados os dados por meio
de um roteiro semi-estruturado, composto por duas partes distintas: 1) questões para caracterização do
perfil do sujeito e 2) questões abertas relacionadas ao trabalho do enfermeiro na atenção primária e a
qualidade de vida, incluindo a percepção sobre o trabalho na atenção primária, qualidade de vida e a
relação entre processo de trabalho, qualidade de vida do enfermeiro e qualidade da assistência.

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As entrevistas foram gravadas e transcritas na íntegra, sendo que todas elas foram realizadas no local
de trabalho do participante. A duração média das entrevistas foi de, aproximadamente, 10 minutos. O
material obtido com as transcrições foi analisado por meio da análise de conteúdo de Bardin, modalidade
temática (BARDIN, 2009).
Com relação às considerações éticas, o presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
da universidade proponente, com n° CAAE 66948717.5.0000.5515, sob o parecer 2053283.

RESULTADOS
Com relação à caracterização dos pacientes, dentre os 10 entrevistados, 90,0% eram do sexo feminino,
70,0% desses sujeitos tinham entre 30 e 40 anos, 80,0% eram graduados em enfermagem há 10 anos ou
mais e 60,0% atuavam na Estratégia de Saúde da Família entre 5 e 10 anos. A análise dos dados realizada
por meio das entrevistas, por sua vez, possibilitou a formação de duas categorias, apresentadas a seguir.
As falas dos participantes foram identificadas pela letra E, seguidas pelo número de ordem, a fim de garantir
o anonimato.
Categoria 1: A atuação do enfermeiro na Estratégia de Saúde da Família e sua relação positiva com a
qualidade de vida
De acordo com os entrevistados, o trabalho na ESF é algo que proporciona satisfação, uma vez que é
possível acompanhar o indivíduo integralmente, tendo a possibilidade de intervir e observar os resultados
decorrentes das ações realizadas.
O positivo é o êxito que a gente tem que a gente vê as resoluções. [...] Você consegue, de
alguma forma, por menor que seja, um bom resultado. [...] (E6)
[...] Eu acho que tem muita coisa pra melhorar [...]. Mas o positivo eu acho que são os
resultados que a gente acaba alcançando com esse trabalho todo. (E2)
[...] Eu acredito né, o modelo da estratégia da saúde da família, que visa à mudança da
qualidade de vida, a mudança do território, a mudança da vida das pessoas, então eu acredito
muito nisso [...]. (E8)
Tendo a família papel central no trabalho desenvolvido na atenção primária, os participantes salientaram
a importância das ações de prevenção e promoção à saúde e o modelo do cuidado integral como um
aspecto relevante na proposta da Estratégia de Saúde da Família, citando também o trabalho em equipe
multiprofissional.
Meu trabalho na ESF, o que eu vejo dele, a grande importância é conduzir saúde, promover
saúde, prevenir doenças oportunistas. Então, quando a gente fala de social, ambiental... Precisa
da saúde daquele local também para que a pessoa tenha acesso à saúde física e mental. (E6)
[...] Eu gosto de saúde da família, [...] eu acho que é um trabalho bem bacana, assim....
Quando todo mundo trabalha junto, é um trabalho que você consegue ir além... É muito diferente
da UBS. [...] Eu acho que [...] essa parte do paciente, da gente poder realmente ver a parte
integral dele, conseguir ver. O acompanhamento tanto do paciente como da família [...]. (E1)
A longitudinalidade do cuidado também foi um fator citado pelos entrevistados como aspecto
positivo na qualidade de vida do enfermeiro.
[...] Aqui a gente acompanha a evolução [...] do paciente, é um ponto positivo para gente até ter
essa qualidade de vida [...]. (E3)
Nesse sentido, o "gostar do que faz" foi apontado como principal motivo de satisfação no trabalho para
profissionais da atenção primária. O trabalho motiva a qualidade de vida por meio do exercício da profissão
que agrada os enfermeiros, bem como o alcance de bons resultados, interferindo positivamente na
qualidade de vida.

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[...] Então, é assim, a minha qualidade de vida se dá quando eu tenho motivação, quando eu
consigo êxito no meu trabalho. [...] Eu acho que trabalhar no que eu gosto, com pessoas que eu
gosto, dentro do ambiente que eu gosto, ou seja, o que eu gosto, com quem gosto e onde gosto,
me proporciona qualidade de vida. (E6)
[...] Eu tenho uma ótima qualidade de vida. Eu trabalho... Eu amo o que eu faço! [...] (E8)
O fato de ser bem remunerado e a garantia de todos os direitos trabalhistas foram relacionados à
satisfação no trabalho, influenciando de maneira positiva na qualidade de vida.
[...] A gente é funcionário público, então, a gente tem um monte de benefícios. [...] A gente é
bem remunerado, infeliz de quem fala que não é, porque é, somos bem remunerados. Então,
recebemos todos os direitos trabalhistas, não atrasa o salário [...]. (E8)
Os entrevistados afirmaram ainda que ao prestar o cuidado o profissional se vê motivado a
cuidar de si, vendo a situação de saúde de quem está sendo cuidado, dando também estimulo a
ter hábitos de vida saudáveis.
[...] Se eu cuido do outro, eu penso que eu também preciso me cuidar. [...] (E2)
Que se a gente está prestando uma assistência para alguém que não se cuidou, talvez [...] é o
que mais fortifica a gente para ter uma boa qualidade de vida, para evitar na prevenção. Como a
gente trabalha na prevenção, a gente tem que ter uma boa qualidade de vida para prevenir as
doenças. (E3)
Além disso, o ato de cuidar foi relacionado à adoção de hábitos pessoais que proporcionam qualidade de
vida, como alimentação saudável, prática de exercícios físicos e estar com as pessoas que amam.
[...] Eu pratico atividade física, tenho uma alimentação saudável [...]. (E3)
[...] Hoje eu faço caminhada às vezes, mas eu prefiro estar com ele. Então, para mim eu não
tenho que falar da qualidade de vida, porque se hoje eu não pratico esporte, [...] se eu não
frequento festa, balada, se eu não leio mais livros é porque eu sou muito mais feliz assistindo
desenho com meu filho. Porque antes eu trabalhava demais, era sempre muito cansada [...]. (E4)

Categoria 2: As condições de trabalho na Estratégia de Saúde da Família: o prejuízo na qualidade de


vida do enfermeiro e na prática assistencial
A inadequação dos meios de trabalho dificulta a efetivação dos objetivos da assistência de Saúde da
Família. A falta de ambientes adequados para o atendimento são aspectos citados pelos participantes que
podem comprometer a qualidade de vida e a assistência oferecida.
[...] E outro problema que eu vejo que é muito sério é o ambiente para almoço. Como a gente
mora distante, a gente almoça aqui, nós não temos um ambiente para sentar para almoçar. [...]
(E5)
[...] A gente não tem nenhuma sala pra atender. Então, é paciente vindo toda hora conversar
com a gente, vai entrando no meio da consulta, você não consegue atender. [...] Então, é
complicado. (E1)
Embora o trabalho na ESF possa proporcionar satisfação por meio da proposta de assistência da
atenção primária, os enfermeiros citam que o serviço realizado também pode prejudicar a qualidade de vida
e, por consequência, o cuidado ao paciente, citando a burocracia e o cotidiano agitado como alguns desses
fatores.
[...] O excesso de burocracia, a falta de tempo pra realizar tudo... Eu acho que isso é bem
negativo. (E2)

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[...] São muitas metas a cumprir, o Ministério acaba estipulando, designando ao profissional
enfermeiro muitos afazeres. Isso acaba atrapalhando sim, porque muitas vezes você não
consegue fazer por completo o processo de trabalho como, por exemplo, a sistematização. O
tempo hoje é o maior inimigo do enfermeiro. (E6)
O número de atendimentos é relacionado ainda à mudança na lógica de trabalho, sendo referida uma
dinâmica de serviço mecanizada.
O número de atendimento é excessivo com um tempo limitado de atendimento. Nós temos que
atender tipo robô, você não consegue programar as coisas para fazer. Você chega e vai
atendendo... [...] (E5)
O próprio envolvimento com a população, citado anteriormente como algo positivo na qualidade de vida,
foi relatado também como algo que prejudica o bem-estar do enfermeiro, exemplificado pela ocorrência de
certas situações de desrespeito de alguns pacientes com a equipe de saúde e a pouca compreensão da
população sobre o modelo assistencial da Estratégia de Saúde da Família.
[...] Nosso trabalho está muito estressante por conta de tanto trabalho burocrático e do
envolvimento que a gente tem com os pacientes. [...] Acaba interferindo sim na qualidade de vida
[...]. (E2)
As fragilidades eu acho que é até a população, [...] que é uma população mais carente, [...] que
não entende o nosso trabalho. Isso eu acho que é uma fragilidade que a gente tem, de chegar
alguém aqui gritando [...] e isso é o que a gente tem que se manter em equilíbrio [...]. (E3)
O uso inadequado do serviço de saúde interfere negativamente [...] O paciente que quer usar o
serviço de forma errada, mesmo sabendo que está fazendo a coisa errada e acaba atrapalhando
no andamento da unidade [...]. (E 10)
Em contrapartida, citam que a grande fila de espera para o atendimento ambulatorial causa frustração no
profissional, afirmando que tais condições relacionadas ao serviço secundário interferem negativamente na
qualidade da assistência prestada na atenção primária.
[...] Porque é frustrante você encaminhar um paciente com deficiências especiais e ele tem que
enfrentar uma fila imensa! [...] (E4)
[...] Mas o ponto negativo é que você até gostaria de fazer mais, mas tem coisas que não está
ao seu alcance, pois depende de uma rede de especialidades e outra coisa não depende só de
você. [...] (E9)
Sendo assim, os participantes citam que para o desenvolvimento de um trabalho com qualidade é
essencial que o profissional esteja bem, tanto fisicamente como psicologicamente, situação que não ocorre
com a situação atual de sobrecarga de trabalho.
[...] Se eu estou estressada, se eu estou cansada, isso vai interferir na qualidade da
assistência. [...] (E2)
[...] Quando estou satisfeita e estou bem no trabalho consigo realizar mais coisas para o
paciente, pois estou bem comigo. Prestar uma assistência de qualidade [...]. (E10)

DISCUSSÃO
A família se relaciona com o desenvolvimento dos indivíduos, visto que é no centro familiar que são
emitidos os valores que servirão de base para o processo de socialização e condições de saúde e doença.
A Estratégia de Saúde da Família é uma atenção voltada ao cuidado das famílias que aposta na criação de
vínculos entre profissional e indivíduo, valorizando o contexto de vida e os determinantes sociais para o
planejamento do cuidado, contrapondo-se ao modelo hegemônico (SILVA et al., 2011).

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O trabalho do enfermeiro na ESF está voltado para atividades clínicas e focalizado na prevenção e
promoção de saúde, com intuito de atender as necessidades de saúde da população por meio de
indicadores epidemiológicos. Acompanhando de forma integral e continuada o usuário, o enfermeiro tem em
mãos certa autonomia de intervir na qualidade da assistência e dar seguimento aos resultados alcançados
(LIMA et al., 2014).
Os relatos dos entrevistados corroboram a ideia de que o enfermeiro tem se preocupado em atender os
preceitos da Estratégia de Saúde da Família em sua prática e reconhece a sua importância para a
qualidade da assistência. Há satisfação do enfermeiro quando ele consegue dar resolubilidade aos
problemas de seus usuários, assim como afirmam a relevância dos atributos da integralidade e
longitudinalidade no serviço básico de saúde, visto que são essenciais para uma prática em saúde
humanizada e resolutiva (ARCE e SOUSA, 2014).
Estudo realizado sobre a satisfação de profissionais que atuam na atenção básica também encontrou
resultado semelhante, uma vez que a resolubilidade e a aplicação da proposta da ESF foram alguns dos
aspectos citados como determinantes para a satisfação da equipe no trabalho (TRINDADE e PIRES, 2013).
Realizar um trabalho que aprecia no qual seja possível ver os resultados das ações efetuadas na
assistência prestada ao indivíduo, assim como trabalhar em equipe, são aspectos que tem grande influência
para a satisfação profissional, visto que a ESF possibilita ao profissional a formação do vínculo que compõe
relações entre equipe e população, subsidiando a atuação frente às intervenções referentes ao processo
saúde-doença (LIMA et al., 2014).
A partir dos dados coletados observou-se que, a qualidade de vida no ambiente profissional está
diretamente ligada à satisfação no trabalho, pois indivíduos satisfeitos apresentam melhor qualidade de vida
e menores probabilidades de adoecerem fisicamente e psicologicamente. A motivação, por sua vez, pode
vir de acordo com a autonomia e resultados nas ações realizadas pelo profissional, dando caminhos para
processar as adversidades que possam surgir nas práticas do enfermeiro (DUARTE et al., 2013).
Conforme os relatos, o enfermeiro ao prestar o cuidado preventivo e curativo em sua rotina na ESF
motiva-se a cuidar da própria saúde, relacionando tal motivação ao ato de prestar o cuidado ao usuário que
por algum motivo não se cuidou e adoeceu. Assim, para que possam motivar o outro para mudar hábitos de
vida o profissional sente a necessidade de cuidar da sua saúde, tornando-se, de certo modo, um modelo a
ser seguido.
Ter qualidade de vida é importante para o desenvolvimento do trabalho do enfermeiro, uma vez que está
inserido diretamente no processo saúde-doença dos indivíduos. Um dos fatores que colabora para a
qualidade de vida é o trabalho exercido, o que implica satisfação e bem-estar na efetivação das atividades
(COSTA, 2014).
Segundo os entrevistados diversos aspectos podem impactar negativamente em sua qualidade de vida e
na prática assistencial, como é o caso da sobrecarga das atividades e carência na estrutura física. Os
profissionais de enfermagem necessitam de condições adequadas para o desenvolvimento de suas ações,
visto que o ambiente e as condições de trabalho são pontos importantes para a execução de uma
assistência de qualidade ao paciente (AMARAL et al., 2015).
Existem ainda outros fatores que interferem na qualidade da assistência de saúde, sendo que motivos de
desprazimento dos profissionais afetam diretamente o cuidado prestado. Alguns desses motivos incluem:
dificuldades de colaboração de usuários, famílias e comunidade no processo assistencial, dificuldades para
a realização do trabalho em equipe por conta de objetivos e interesses divergentes, ambiente e área física
da unidade, o aumento do serviço burocrático, a falta de autonomia para resolutividade de problemas
relacionados aos usuários, demanda incompatível com o quantitativo dos profissionais (DUARTE et al.,
2013).
Tais fatores corroboram com os resultados do presente estudo, uma vez que os entrevistados afirmam
que a dificuldade de colaboração dos usuários, traduzida pelo entendimento errôneo sobre o papel da
atenção primária, a área física da unidade, o serviço burocrático e a pouca autonomia para resolução de

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alguns problemas, como o acompanhamento do paciente em nível secundário, são aspectos que impactam
na qualidade de vida do enfermeiro e, por conseguinte, na assistência prestada à população.
Com relação à dificuldade de acesso do usuário aos serviços de atendimento secundário, a articulação
fragilizada dos serviços no Sistema Único de Saúde é citada por profissionais de saúde como aspectos de
insatisfação no serviço básico, já que a proposição de continuidade da assistência e acesso aos serviços
não são atendidas. A insatisfação do enfermeiro com tal situação, por sua vez, atinge de modo direto sua
qualidade de vida, pois o profissional de enfermagem motiva-se ao atingir bons resultados na sua prática
assistencial (LIMA et al., 2014).
Por sua vez, o trabalho no qual a enfermagem está inserida requer elementos que, relacionados,
desencadeiam processos de desgastes, sejam eles físicos ou psíquicos, estabelecidos pela exposição dos
trabalhadores a cargas de trabalho excessivas durante a jornada de trabalho, esses fatores podem
contribuir no desenvolvimento do estresse decorrente sobrecarga de atribuições e responsabilidade
burocrática que poderá desencadear em um processo de desgaste emocional e profissional (FREIRE e
COSTA, 2016).
Isso acontece, pois apesar dos entrevistados citarem a proposta da ESF de cuidado integral e trabalho
em equipe como aspectos que impactam positivamente na qualidade de vida dos enfermeiros e da
assistência à população, na prática dos serviços de atenção primária o modelo de saúde vigente ainda se
traduz em um processo de trabalho pouco colaborativo, ou seja, a gestão da unidade de saúde da família
ainda permanece centrada na figura do enfermeiro, ocasionando sobrecarga de trabalho.
Para superação desse modelo e, consequentemente, da sobrecarga de atividades relacionada a
questões gerenciais do serviço, uma proposta seria operar a organização da unidade por meio de uma
gestão compartilhada, motivando a construção dos objetivos e estratégias de forma mais participativa, com
objetivo de não sobrecarregar o trabalho do enfermeiro e possibilitando o compartilhamento e ampliação
dos compromissos e responsabilidades de outros profissionais pelo processo administrativo e burocrático
referente à unidade de saúde (JONAS et al., 2011; SULTI, 2015).

CONCLUSÃO
Os enfermeiros que atuam na Estratégia de Saúde da Família acreditam no modelo em que estão
inseridos, relacionando qualidade de vida ao trabalho efetuado, uma vez que sentem-se satisfeitos com sua
prática. Entretanto, a burocracia e o modelo de gestão centralizado impactam negativamente na qualidade
de vida do profissional que atua na atenção básica, influenciando na qualidade da assistência prestada.
Devido à sobrecarga de trabalho do enfermeiro na Estratégia de Saúde da Família, faz-se necessário
investir na transformação efetiva da lógica do processo de trabalho para um modelo interprofissional,
proporcionando maior satisfação para a realização de tarefas e, por conseguinte, aprimorando a assistência
por meio de um agir colaborativo.

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