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Revista Liberdades - Edição Especial - Reforma do Código Penal

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sumário editorial artigos

EXPEDIENTE
Instituto Brasileiro de Ciências Criminais

DIRETORIA DA GESTÃO 2011/2012


Presidente: Marta Saad

1º Vice-Presidente: Carlos Vico Mañas

2º Vice-Presidente: Ivan Martins Motta

1ª Secretária: Mariângela Gama de Magalhães Gomes

2ª Secretário: Helena Regina Lobo da Costa

1º Tesoureiro: Cristiano Avila Maronna

2º Tesoureiro: Paulo Sérgio de Oliveira

Assessor da Presidência: Rafael Lira

CONSELHO CONSULTIVO:
Alberto Silva Franco, Marco Antonio Rodrigues Nahum, Maria Thereza Rocha de
Assis Moura, Sérgio Mazina Martins e Sérgio Salomão Shecaira 2

Publicação Oficial do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais


Coordenador-chefe:
João Paulo Orsini Martinelli
Coordenadores-adjuntos:
Camila Garcia da Silva; Luiz Gustavo Fernandes; Yasmin Oliveira
Mercadante Pestana
Conselho Editorial da Revista Liberdades
Alaor Leite
Alexis Couto de Brito
Cleunice Valentim Bastos Pitombo
Daniel Pacheco Pontes
Giovani Agostini Saavedra
Humberto Barrionuevo Fabretti
José Danilo Tavares Lobato
Luciano Anderson de Souza

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RESPONSABILIDADE PENAL ARTIGOS

DE PESSOAS JURÍDICAS NO 1

PROJETO DO NOVO CÓDIGO 2

PENAL BRASILEIRO 3

Paulo César Busato

Sumário: Introdução: a adoção da responsabilidade penal da pessoa jurídica pelo


projeto de Código Penal brasileiro – 1. Da organização dos artigos – 2. Das disposições
a respeito da atribuição do crime: 2.1 Da delimitação do autor – art. 41, caput: 2.1.1
A delimitação do âmbito da autoria a pessoas jurídicas de direito privado; 2.1.2 A
responsabilidade por delitos praticados contra a administração pública, a ordem
econômica, o sistema financeiro e o meio ambiente; 2.1.3 A exigência de que a infração
seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual ou de seu órgão
98
colegiado; 2.1.4 Crime praticado no interesse ou benefício da sua entidade; 2.2 Das
disposições do §§ 1.º e 2.º. A teórica autorresponsabilidade da pessoa jurídica; 2.3 Das
disposições do § 3.º. Uma redundância abusiva – 3. Das consequências jurídicas do
delito – Referências bibliográficas.

Resumo: O presente artigo comenta criticamente o projeto de novo Código penal


brasileiro especificamente no que refere aos dispositivos legais que estabelecem a
responsabilidade penal de pessoas jurídicas. Aborda-se, primeiramente, as opções de
redação a respeito da atribuição da responsabilidade e, em seguida, comenta-se a questão
das penas estabelecidas. Aponta-se os aspectos em que a redação do texto é vacilante, em
especial no que tange à verdadeira assunção de um modelo de autorresponsabilidade,
incompatível com o anacronismo de determinadas posturas dogmáticas. No que tange
às soluções a respeito das consequências jurídicas do delito, aponta-se as dificuldades
com relação à natureza jurídica destas.

Palavras-chave: Projeto de Código penal brasileiro. Responsabilidade penal de pessoas


jurídicas. Problemas de imputação. Consequências jurídicas do delito.

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Abstract: This article provides a critical analysis of the new Criminal Code bill,
especially legal provision that address corporate criminal liability. First, it addresses ARTIGOS
reduction options in relation to liability attribution and then it comments on penalties 1
established. It points out to the fact that the writing of the text is faltering, especially
2
in relation to the true assumption of a self-responsibility model, it is also incompatible
with the anachronism or certain dogmatic positions. In regards to solutions related 3

to legal consequences of an offense, the difficulties related to their nature are also
4
mentioned.

Key words: Brazilian Criminal Code Bill, corporate criminal liability, imputation
problems, legal consequences of an offense.

Introdução: a adoção da responsabilidade penal da


pessoa jurídica pelo projeto de Código Penal brasileiro
A comissão elaboradora do projeto de Código Penal optou, segundo relata sua
Exposição de Motivos – por maioria de votos – por interpretar que a referência constitucional
à responsabilidade penal de pessoas jurídicas é meramente exemplificativa, sendo permitida
99
sua distensão para outros campos.

A expressão por maioria de votos usada na Exposição de Motivos, é a parte mais


esclarecedora a respeito do tema constante das fundamentações. Ela expõe a público a
seriíssima divergência existente entre os membros da comissão a respeito da necessidade
ou não de avançar neste ponto, que sabidamente norteia o tema desde os seus alvores.1
Outrossim, deixa entrever ainda mais, que este desacordo não se restringiu unicamente
aos limites constitucionais impostos à questão, e nem foi superado pela votação, já que se
vislumbra claramente no projeto uma proposta vacilante, insegura quanto à decisão tomada,
o que conduziu à inserção de uma série de ressalvas e senãos, que não apenas tornaram o
texto contraditório, mas que demonstraram não haver uma orientação uniforme e segura da
comissão no que respeita ao modelo teórico adotado.

O texto do projeto a respeito das responsabilidade penal de pessoas jurídicas faz entrever
que não existe uma diretriz clara do Código a respeito da teoria de base que o inspira. Não

1 ..... É sabido, porque publicado em coluna (Confira-se no site <http://www.gazetadopovo.com.br/vidapublica/


justica-direito/artigos/>, especificamente nos textos postados nos dias 27.12.2011 e 14.01.2012) pelo então relator
da parte geral do anteprojeto, o Prof. Dr. René Dotti, que a primeira pretensão era extirpar expressamente a
responsabilidade penal de pessoas jurídicas, fazendo retroagir a legislação ao tempo do Código penal da República,
que o fazia expressamente no seu então art. 25. A proposta era inserir no art. 13 a referência a “ação humana” de
modo a excluir de antemão a responsabilidade penal de pessoas jurídicas.

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se consegue ver se a opção foi por seguir atrelado a arcaicas concepções finalistas ou se houve
uma inserção político criminal capaz de revelar matizes funcionalistas e, mesmo, neste último ARTIGOS
caso, qual seria a função político criminal assinalada concretamente. 1

Na abertura do texto da Exposição de Motivos sobre a responsabilidade penal 2


da pessoa jurídica se procura deixar sentado claro que o modelo dogmático não é uma
3
construção intelectual autojustificável, o que remeteria, imagina-se, ao afastamento de modelos
parnasianos2 voltados unicamente a proporcionar a estabilidade do conjunto normativo. Em 4
seguida, o texto reconhece a realidade criminológica de realização de condutas socialmente
danosas, gerenciadas, custeadas ou determinadas por pessoas jurídicas, o que faz entrever um
desprendimento em relação às condicionantes ontológicas impostas pelo finalismo, que
importam neste caso, especialmente no que refere à teoria da ação, já que parece afirmar o
domínio da vontade da pessoa jurídica.

No entanto, a análise do texto revela um contraditório apego a bases ontológicas que


remetem ao finalismo e simultaneamente uma importante desorientação a respeito da política
criminal que compõe a diretriz do sistema punitivo.

Há vários temas ausentes na Exposição de Motivos que são as discussões fundamentais


100
a respeito do tema da responsabilidade penal de pessoas jurídicas que foram simplesmente
passados por alto, a saber: se o projeto adotaria um esquema de autorresponsabilidade ou de
heterorresponsabilidade penal das pessoas jurídicas; em que base seria reconhecida a ação da
pessoa jurídica; que limites seriam impostos pelo princípio de culpabilidade em face de tal
responsabilidade e, mesmo, qual a natureza jurídica das consequências do delito praticado
por pessoa jurídica. Nenhum destes temas foi sequer roçado pela Exposição de Motivos, o
que impele a conjecturar se eles chegaram ou não a ser discutidos previamente pela comissão
quando da opção pela responsabilização penal de pessoas jurídicas e, em caso positivo, em que
termos foi firmada a conclusão.

Dessa forma, só resta ao intérprete, utilizando suporte doutrinário, passar à análise do


texto propriamente dito e nele buscar as inferências necessárias ao desvelo do tema.

Importa referir, por último, que a maior ou menor fortuna da opção pela responsabilização
penal de pessoas jurídicas não estará aqui em discussão,3 diante do fato de que o projeto já fez
2 ..... A referência ao parnasianismo é um paralelo com a idéia de sistema autopoiético, que nas criações humanas,
próprias da ciência social, é absolutamente insustentável, como já tive oportunidade de referir em: Busato, Paulo
César. Modernas teorias do delito: funcionalismo, significado e garantismo. Reflexões sobre o sistema penal do nosso
tempo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 175 e ss., especialmente p. 202-203.
3 ..... Não obstante, sobre isso, especialmente no que tange aos fundamentos político criminais, já tive oportunidade
de discorrer em: Busato, Paulo César. Fundamentos político-criminais para a responsabilidade penal da pessoa
jurídica. Reflexões sobre o sistema penal do nosso tempo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 175 e ss., especialmente

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sua opção. Trata-se, isso sim, de discutir o conteúdo do modelo adotado, o seu desenho, a sua
fórmula, e também sua similitude, em alguns aspectos, à fórmula recentemente adotada pelo ARTIGOS
Código Penal espanhol. 1

1. Da organização dos artigos 2

3
Em primeiro lugar, cumpre referir que o relatório final do projeto corrigiu uma opção
feita na sua primeira redação que estabelecia um Título próprio, de número IV, com o nome 4
Da responsabilidade penal da pessoa jurídica, isolando-a curiosamente, do Título II (Do crime)
e do Título III (Autoria e participação). Obviamente, ao se determinar a responsabilidade
penal de pessoas físicas ou jurídicas, em concurso ou não, isto faz parte do crime, o que levou
o relatório final a agregar os três títulos sob a égide apenas do primeiro.

Situou-se, com acerto, a questão da responsabilidade penal da pessoa jurídica exatamente


após as regras de autoria e participação, aproximando temas correlatos.

No entanto, não obstante o relatório final promovesse a aproximação da imputação às


pessoas jurídicas em face da imputação das pessoas físicas, separou – quiçá, como veremos,
em um ato falho – o que chamou penas das pessoas jurídicas, do título IV, que justamente foi
101
nominado Das penas. Ou seja, o relatório final do projeto agregou o tema da imputação e
separou taxativamente o tema da sanção, entre pessoas físicas e jurídicas.

Longe de ser apenas uma distribuição tópica, esta colocação já dá a tônica do conteúdo
da disposição legal sobre a matéria, já que, como veremos, as características das chamadas
penas das pessoas jurídicas estão mais próximas das medidas de segurança do que das penas
propriamente ditas.

Em função até desta distorção de tratamento entre imputação e sanção, tudo recomenda
que se faça uma análise separada a respeito da atribuição de responsabilidade penal a pessoas
jurídicas e da forma de sancionamento delas.

2. Das disposições a respeito da atribuição do crime


Em qualquer discussão técnica sobre o tema de responsabilidade penal de pessoas
jurídicas, a primeira questão a ser definida é a da chamada autorresponsabilidade ou
heterorresponsabilidade.4 Ou seja, a definição sobre se a pessoa jurídica é responsável por si

202-203.
4 ..... Sobre a importância do tema, veja-se, especialmente Galán Muñoz, Alfonso. La responsabilidad penal de la
persona jurídica tras la reforma de la LO 5/2010: entre la hetero – y la autorresponsabilidad. Iustel, Revista General
de Derecho penal 16/7-14, (RI §410993), 2011.

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mesma, pelas práticas criminosas por ela mesma perpetradas, com a consequente remessa à
discussão dos clássicos temas dogmáticos da ação e da culpabilidade, ou se a pessoa jurídica é ARTIGOS
responsável pelos crimes através ou com suporte dela praticados por pessoas físicas, assumindo- 1
se, de entrada, o ônus claríssimo de violação do princípio da culpabilidade no que tange à
2
assunção de responsabilidade por ato de terceiro.
3
O modelo de heterorresponsabilidade é claramente insatisfatório, tanto desde um
ponto de vista dogmático, quanto político-criminal, conduzindo frequentemente a resultados 4
injustos.

Por outro lado, o modelo de autorresponsabilidade obriga ao enfrentamento de questões


dogmáticas tão centrais quanto a ação e a culpabilidade, mas é, sem dúvidas, apontado pela
doutrina como a melhor opção.5

O projeto deixa obscura a opção. Em alguns pontos, como será visto em seguida, parece
pretender afirmar uma autorresponsabilidade, mas em outros, deixa entrever que não admite
que a pessoa jurídica seja fonte decisória ou tenha domínio da ação, o que remete à opção
contrária.

2.1 Da delimitação do autor – art. 41, caput 102

O art. 41, em seu caput, apresentou as opções formuladas pelo legislador brasileiro a
respeito da delimitação da responsabilidade penal de pessoas jurídicas por meio de quatro
exigências específicas: a primeira delas, a delimitação do âmbito da autoria a pessoas jurídicas
de direito privado, o que exclui, de antemão, a possibilidade de atribuição de responsabilidade
a pessoas jurídicas de Direito Público e determina a opção pela identidade formal da pessoa
jurídica para fins de imputação; a segunda, uma opção por um decote amplo no âmbito
dos delitos pelos quais é possível responsabilizá-las, admitindo somente que elas sejam
responsabilizadas por delitos praticados contra a administração pública, a ordem econômica,
o sistema financeiro e o meio ambiente; em terceiro lugar, faz também uma exigência para a
responsabilização que corresponde ao afastamento da possibilidade de atribuir à empresa
um papel que não seja de mero instrumento da prática delitiva, ao exigir que a infração seja
cometida por decisão de seu representante legal ou contratual ou de seu órgão colegiado, o que
entrega a este, sempre, e de antemão, o domínio da vontade; finalmente, em quarto lugar,
exige como resultado específico necessário para a atribuição da responsabilidade penal que o
crime tenha sido praticado no interesse ou benefício da sua entidade.
5 ..... Cf. Bajo Fernández, Miguel. Vigencia de la RPPJ en el derecho sancionador español. In: ______; Sánchez,
Bernardo Feijóo; Gómez-Jara Díez, Carlos (Org.). Tratado de responsabilidad penal de las personas jurídicas.
Madrid: Thompson-Civitas, 2012. p. 21; Galán Muñoz, Alfonso. Op. cit., p. 14.

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Percebe-se, de entrada, várias limitações, a saber: (a) nem todas as pessoas jurídicas
poderão ser responsabilizadas criminalmente, mas apenas as de direito privado; (b) ainda que ARTIGOS
sejam pessoas jurídicas de direito privado ou empresas públicas, nem todos as suas realizações 1
criminosas poderão ser punidas, mas apenas aquelas contra a administração pública, contra
2
a administração pública, a ordem econômica, o sistema financeiro e o meio ambiente; (c)
tais condutas, de tais pessoas, só serão punidas nos casos em que a infração seja cometida por 3

decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, e (d) somente se
4
poderá castigar a atuação da pessoa jurídica, caso se verifique que esta se deu no interesse ou
benefício da sua entidade.

Aqui já restou evidente a postura vacilante de atribuição de responsabilidade penal às


pessoas jurídicas adotada. Insegura sobre o tema, a comissão, em vez de discutir e votar e, uma
vez aprovada, assumir de vez a responsabilização penal de pessoas jurídicas, optou por admiti-
la, restringindo, logo em seguida, sob vários ângulos, o seu alcance. A mensagem transmitida
com esta postura é: queremos sim a responsabilidade penal de pessoas jurídicas, mas não muito!

É claro que o tema é palpitante e que o mundo inteiro está vivendo uma transformação
importante do sistema penal que finalmente tende a alcançar a imputação das pessoas
jurídicas. Basta ver as recentes transformações, no sentido da adoção de tal mecanismo de 103
incriminação, pelos Códigos Penais de países estruturados segundo o Civil Law.6

O Código Penal francês já em 1992 passou a incluir a responsabilidade penal de pessoas


jurídicas. Holanda, Bélgica e Dinamarca optaram por seguir o modelo do Código Penal
suíco, que desde 2003 admitiu a imputação contra empresas por crimes cometidos com fins
empresariais. Também admitem responsabilidade penal de pessoas jurídicas a Islândia e a
Noruega.7 No Japão, também se admite a responsabilidade da empresa concomitante à pessoa
natural, desde a adoção do sistema Ryobatsu-Kitei. O mais recente a dobrar-se em favor da
responsabilização penal de pessoas jurídicas foi o Código Penal da Espanha, com a reforma
de dezembro de 2010, pela Lei Orgânica 5/2010, de 22 de junho.

A questão que cabia discutir era se seguiria o projeto ou não na direção das tendências
mundiais. Uma vez optado pelo caminho positivo, não há retorno possível. Vale dizer, uma
vez que se opta pela responsabilização penal de pessoas jurídicas, é preciso fazê-lo de forma
integral, de modo que, no mínimo, não sejam sacrificados os pilares básicos de desenvolvimento
das garantias do modelo de imputação.
6 ..... A referência tem pertinência por força de que os países do Common Law nunca deixaram de ter previsão legal
de responsabilidade penal de pessoas jurídicas.
7 ..... Veja-se Araújo Júnior, João Marcello de. Societas delinquere potest: revisão da legislação comparada e estado
atual da doutrina. In: Gomes, Luiz Flávio (Org.). Responsabilidade penal de pessoa jurídica e medidas provisórias em
direito penal. São Paulo: RT, 1999. p. 72-87; Bajo Fernández, Miguel. Op. cit., p. 19-20.

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A imposição de um conjunto de ressalvas não apenas contribui para uma quebra da


lógica sistemática, desajustando a responsabilidade das pessoas jurídicas em face do sistema ARTIGOS
geral de atribuição de responsabilidade às pessoas físicas, como político-criminalmente põe 1
em risco qualquer efetividade que se tenha pretendido lograr com a providência, convertendo
2
um mecanismo legítimo de defesa das pessoas em face do abuso do capital,8 novamente, em
um mecanismo meramente simbólico, sem maiores efeitos. 3

Mantida a fórmula de recorte e limitação da responsabilização penal de pessoas jurídicas, 4


este efeito placebo se cristalizará. É importante perceber que nenhuma das características
elencadas como recortes ao âmbito do imputável às pessoas jurídicas dizem respeito a qualquer
dos problemas dogmáticos comumente apontados como impeditivos da responsabilidade
penal de pessoas jurídicas. O que se procurou delimitar foi, isto sim, a questão político
criminal, fazendo opções nem sempre das mais felizes e que, ao final, resultam, inclusive,
prejudiciais à interpretação de questões dogmáticas de relevo.

Cada um destes pontos merece comentário isolado.

2.1.1 A delimitação do âmbito da autoria a pessoas jurídicas


de direito privado 104
O projeto limita a responsabilidade penal de pessoas jurídicas a pessoas jurídicas de
direito privado. Com isso, exclui, de antemão, a possibilidade de atribuição de responsabilidade
a pessoas jurídicas de direito público e determina a opção pela identidade formal da pessoa
jurídica para fins de imputação.

Ocorrem aqui duas opções infelizes simultâneas.

Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que não apenas as pessoas jurídicas de direito
privado praticam delitos, assim como não são somente particulares que, como pessoas físicas,
praticam delitos. Esta opção nega a lógica mais elementar. Sendo tão possível ao particular
cometer furto ou apropriação indébita quanto ao funcionário público cometer peculato, não
se pode negar que, se a pessoa jurídica de direito privado é capaz de cometer o delito de
poluição, uma autarquia possa igualmente fazê-lo.

Ou seja, do mesmo modo que a questão relativa ao funcionário público – pessoa física
– é resolvida por meio do regime dos delitos especiais ou próprios, caberia fazer o mesmo às
pessoas jurídicas.

8 ..... Vide Busato, Paulo César. Fundamentos político-criminais... cit., p. 175 e ss.

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É argumento comum9 dos opositores à adoção da responsabilidade penal de pessoas


jurídicas, que se a pessoa jurídica for de direito público, haveria dupla vitimização da sociedade, ARTIGOS
já que esta também arcaria com as consequências da sanção – já fosse restritiva de direitos 1
ou pecuniária – à pessoa jurídica. O argumento é inválido. A uma, porque, a despeito da
2
sanção privativa de liberdade que se impõe aos crimes praticados por funcionários públicos,
o prejuízo derivado de suas condutas delitivas afeta, por óbvio, todo o público – vale dizer, 3

a sociedade em geral – que, entre outras coisas, mantém o salário que é pago a ele, sendo
4
que seu comportamento é deletério à administração. Isso sem contar que a multa, que se
cumula com a pena privativa de liberdade, é paga justamente com aquele salário, que deriva
da arrecadação pública.

Que o público em geral é afetado secundariamente por qualquer crime praticado por
seus representantes é óbvio. O que não é lógico, nem jurídico, é que isto seja motivo para
poupar o agente público – seja ele pessoa física ou jurídica – dos mecanismos de controle
social ativados pelo Estado. É certo que o Estado é quem efetiva a realização do controle
punitivo, por outro lado, não é menos certo que é a sociedade e não o Estado quem lhe dota
de legitimidade.

Além disso, é óbvio que haverá situações de complexa definição, por exemplo, quando 105
as pessoas jurídicas de direito privado se dediquem majoritariamente ou até completamente à
realização de atividades que constituam execução de políticas públicas.10

Assim, o mais correto seria ter optado por um regime de delitos especiais ou próprios
quando fosse o ente público a pessoa jurídica responsável pela prática delitiva. Optar por
excluí-lo permite práticas odiosas, de caráter criminoso, justamente de parte daquele que
deveria ser um exemplo de conduta.

Há ainda um segundo ponto: ao definir a responsabilidade penal de pessoas jurídicas


a partir de um ponto de vista formal, restrito às pessoas jurídicas de direito privado, remete a
que se tome como regra o que o Código Civil estabelece como tal. Ocorre que, por vezes, as
pessoas jurídicas que realizarem o crime podem carecer de personalidade jurídica em relação

9 ..... Cf. Milaré, Édis. A nova tutela penal do ambiente. Revista de Direito Ambiental. São Paulo: RT, ano 4, n.
16, out.-dez. 1999. p. 101; Figueiredo, Guilherme José Purvin; Silva, Solange Teles da. Responsabilidade penal
das pessoas jurídicas de direito público na Lei 9.605/98. Revista de Direito Ambiental. São Paulo: RT, ano 3, n. 10,
p. 47, abr.-jun 1998; Krebs, Pedro. A (ir)responsabilidade penal dos entes públicos. RT. São Paulo: RT, ano 1989,
vol. 772, p. 492, fev. 2000.
10 ... Este problema, levantado por Bernardo Feijóo Sánchez (Feijóo Sánchez, Bernardo. La persona jurídica
como sujeto de imputación jurídico-penal. In: Bajo Fernández, Miguel; Sánchez, Bernardo Feijóo; Gómez-
Jara Díez, Carlos (Org.). Tratado de responsabilidad penal de las personas jurídicas. Madrid: Thompson-Civitas,
2012. p. 62 e ss.) é de alta complexidade. O autor propõe, como solução, a atribuição de responsabilidade, com
apenamento que não afete as atividades que são prestadas como serviço público.

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ao ordenamento brasileiro, porquanto sejam empresas estrangeiras com atuação no Brasil,11


ou que estejam no limite da informalidade que não permita o seu reconhecimento jurídico ARTIGOS
como tal. 1

Evidentemente, nos dois casos, a restrição aparece como negativa, pois permite que 2

estes entes realizem práticas que são vedadas aos entes formalizados. Com isso, incentiva-se,
3
por um lado, a clandestinidade da atuação das pessoas jurídicas e, por outro, promove-se
um tratamento desigual em desfavor justamente daquele que melhor adequa adapte seus 4

procedimentos aos interesses públicos.

A par de tudo isso, a opção seletiva revela, no que tange às pessoas jurídicas, um nítido
e equivocado Direito Penal de autor.

2.1.2 A responsabilidade por delitos praticados contra a


administração pública, a ordem econômica, o sistema
financeiro e o meio ambiente
O segundo recorte do âmbito de imputação foi uma limitação ratione materiae,
admitindo somente a incriminação das pessoas jurídicas por delitos praticados contra a
106
administração pública, a ordem econômica, o sistema financeiro e o meio ambiente.

Sustentou-se, inclusive, na exposição de motivos, que em decisão majoritária, a


comissão optou por reconhecer como meramente exemplificativa e não exauriente a indicação
constitucional (art. 225, § 3.º e, mais indiretamente, art. 173, § 5.º)12 de responsabilidade
penal das pessoas jurídicas por crimes contra o ambiente, a economia popular e a ordem
econômica e financeira e, como consequência, viu-se autorizada a ampliar o âmbito de
incriminação para os delitos contra a administração pública.

No entanto, a pretensão de soar avançado e ampliativo no que tange ao âmbito de


imputação não logra disfarçar o engodo que constitui tal opção. O que se faz, na verdade,
a despeito de mencionar uma hipotética ampliação, é um indevido decote do âmbito de
imputação.

O tema constitucional, na verdade, sequer merecia ser invocado neste aspecto, já que
as normas em questão são claramente programáticas e sequer insinuam um rol taxativo. Não
11 ... O problema é levantado em face do Direito espanhol por: Feijóo Sánchez, Bernardo. La persona jurídica…
cit., p. 58.
12 ... “Art. 225. (...) § 3.º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores,
pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados. Art. 173. (...) § 5.º A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica,
estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados
contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.”

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cabia nem mesmo a discussão sobre o assunto. O fato é que a Constituição da República em
momento algum obsta a responsabilidade penal de pessoas jurídicas, chegando, em tópicos ARTIGOS
específicos, como é o caso dos artigos mencionados, a estimulá-la. 1

Assim, se a Constituição da República não veda, a referência ao tema constitucional 2


acompanhada de uma pretensa justificativa de ampliação, na verdade, disfarça o imenso
3
recorte que se faz na atribuição de responsabilidade penal a pessoas jurídicas.
4
É evidente que estas áreas são próprias da atividade empresarial e, portanto, os focos
mais suscetíveis de responsabilização, mas esta limitação abre passo a perigosas consequências
de ordem político criminal e mesmo dogmáticas, senão vejamos.

Em primeiro lugar, livres para a prática delitiva de quaisquer ordens exceto aquelas
abrangidas pelos bens jurídicos definidos na disposição legal, as pessoas jurídicas tratariam
sempre de direcionar suas condutas criminais a produção de resultados diversos daqueles,
quando não, à vista de que o tema do bem jurídico é sempre discutível doutrinariamente,
de aduzir em sua defesa que a realização de determinado delito não implica especificamente
a violação de um dos bens jurídicos indicados como objetos legalmente passíveis de aflição
criminal coletiva.
107
Ou seja, a linha hermenêutica de defesa passaria sempre por uma reinterpretação de
determinada classe de norma incriminadora, visando desconstituir sua relação com um dos
bens jurídicos que compõe o acervo de incriminação que se permite atingir as pessoas jurídicas.

Ademais, ao impedir que se imponha a responsabilização penal das pessoas jurídicas


em casos que escapem das searas determinadas, decreta-se um claro incentivo à produção de
resultados, por vezes mais danosos, que possam levar, pela via da consunção, ao completo
afastamento da responsabilidade penal das pessoas jurídicas.

Serve de exemplo a previsão das condutas lesivas do ambiente. Imagine-se um caso de


poluição, que evidentemente é um crime absolutamente suscetível de realização por pessoas
jurídicas. Caso a poluição seja de tal monta que produza efetivamente – vale dizer, que resulte
e não simplesmente que possa resultar (como refere o tipo penal do art. 54 da Lei 9.605, de
12.02.1998 – a morte de pessoas, seria de todo conveniente para a pessoa jurídica sustentar
como tese de defesa (?!?) que as eventuais mortes produzidas pela poluição seriam, na verdade,
homicídios. Ou seja, que o objetivo colimado pela empresa seria de produção deliberada dos

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resultados morte, e que a poluição seria apenas um meio para sua consecução.
ARTIGOS
Neste caso, como os crimes contra a vida não são objeto da incriminação de pessoas
jurídicas, caso se identificasse a possibilidade de prática de crime de poluição perpetrado por 1

pessoa jurídica, seria, para esta, de todo recomendável que a poluição fosse de tal monta que 2
produzisse um resultado letal, para que se pudesse assumir tal resultado como foco de um
3
dolo direto.
4
O aparente paradoxo já foi produzido anteriormente pela legislação penal brasileira,
ao castigar determinados delitos contra a ordem tributária, especialmente o art. 2.º da Lei
8.137, de 27.12.1990, com pena muito inferior ao crime de falsidade ideológica, que consta
como um dos meios de sua realização no inciso I. Não é incomum, na liça forense, quando
denunciado apenas pelo falso, que o empresário se bata por ver reconhecido que além deste
crime, ele pretendia a prática de outro (justamente a sonegação fiscal) que, por ser seu fim
último, é o que deveria ser perseguido. Mediante este expediente, logra – por paradoxal que
pareça – minimizar sua pena. É bem verdade que a solução dada pelas Cortes brasileiras não
é a mais feliz, por efetuar uma distensão desmedida da regra da consunção.

De qualquer modo, havendo uma relação de minus e plus entre crime consumido e
108
crime consumidor; somando-se a isso que o crime meio seja uma passagem obrigatória para
o crime fim, a partir do plano de execução elaborado para o autor, há boas razões para que se
empregue a regra da consunção. Sendo assim, estaria aberta a porta para a produção de um
resultado injusto.

Mais ainda. No caso em estudo, eis que se trataria não apenas de minimizar a pena, mas
de excluir a imputação!

Note-se que, se o caso corresponder às premissas do exemplo dado aqui ao tratar da


questão da vontade da pessoa jurídica, corre-se o risco de tornar absolutamente legal um
genocídio ou, quando menos, um homicídio massivo, desde que produzido em um aparato
empresarial tão intrincado que não permita identificar pessoas físicas em conexão subjetiva
com a produção do resultado!

Na verdade, bem se sabe que nem todos os crimes são suscetíveis de realização pelas
pessoas jurídicas. Porém, basta que se refira o Código à responsabilização das pessoas jurídicas
por crimes realizados por ela. Em que consiste esta realização é trabalho para os hermeneutas,
para os intérpretes e juristas e não para o legislador.

Outra solução seria indicar que as pessoas jurídicas são individualmente responsáveis –

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independentemente da responsabilidade penal das pessoas físicas que a compõem, dirigem ou


gerenciam – pela prática dos delitos compatíveis com sua natureza e capacidade de realização, ARTIGOS
deixando, novamente, em aberto a interpretação a respeito dos limites impostos por sua 1
natureza e sua capacidade de realização.
2
Dessa forma, não estariam contempladas apenas todas as possibilidades de realização
3
de delito existentes atualmente, mas também todas as que se pudessem, eventualmente,
engendrar no futuro. 4

Aqui, temeroso por avançar em um modelo de verdadeira responsabilização penal de


pessoas jurídicas, o projeto fez concessões a interesses exclusivos das corporações, desprezando
completamente a realidade criminológica que mostra a produção de graves resultados jurídicos
perpetrados por entes coletivos, fora do âmbito estrito dos bens indicados como passíveis de
tal responsabilização.

2.1.3 A exigência de que a infração seja cometida por


decisão de seu representante legal ou contratual ou de seu
órgão colegiado
109
A disposição legal sobre a responsabilidade penal de pessoas jurídicas, no projeto, faz
também uma exigência para a responsabilização, consistente em que o delito tenha sido
cometido “por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado”, o que
constitui outra opção não apenas absolutamente dispensável como, também, dogmaticamente
equivocada.

É dispensável porque em um verdadeiro esquema de autorresponsabilidade, a


responsabilidade penal da própria pessoa jurídica deve existir independentemente da decisão
tomada por qualquer representante legal ou contratual, o qual, por seu turno, igualmente
tem responsabilidade penal independente e pessoal pela contribuição que tenha dado para o
delito. Do mesmo modo, os representantes de um órgão colegiado que delibere no seio da
empresa possuem, sendo pessoas físicas ou jurídicas, cada qual sua responsabilidade penal
independente, na medida de suas contribuições para o delito.

Do ponto de vista dogmático, a opção resulta completamente equivocada por várias


razões.

Em primeiro lugar, se efetivamente o crime se realiza orientado pela vontade, a


disposição legal distorce a distribuição de responsabilidade penal. Note-se: o projeto presume
que a decisão que é a orientadora da vontade da ação que efetivamente realizou um delito,

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é dos sócios ou representantes da pessoa jurídica, isolando, de consequência, a admissão de


que esta possa ter vontade diversa da de seus sócios. Logo, não é a vontade da pessoa jurídica ARTIGOS
que se realiza, tampouco é ela que, na prática, produz fisicamente o resultado. Ora, se a 1
realização criminosa não é da pessoa jurídica desde um ponto de vista ontológico da produção
2
do resultado, nem desde um ponto de vista da expressão da vontade, pois não foi ela quem
tomou a decisão, ela se converte em um simples instrumento. A realização que dá azo à 3

responsabilidade como autor a partir do domínio da vontade é um caso de autoria mediata,13


4
que, neste caso, tem o agravante da admissão – ainda que implícita – de que o instrumento
(pessoa jurídica) não goza de vontade própria. Sendo assim, não caberia imputar a condição
de autor à pessoa jurídica de nenhuma forma.

Claro que se poderia discutir aqui toda a questão a respeito do Täter hinter dem Täter,
a que alude a doutrina,14 levando-se a conclusões das mais diversas a respeito da fórmula da
autoria, se coautoria ou autoria mediata, as quais poderiam inclusive admitir um autor de
trás de outro autor. Porém, em qualquer caso, uma vez negada a existência de uma vontade
própria da pessoa jurídica, diversa da de seus dirigentes – decisão que não parece adequada, ao
menos ao quadro de uma pretensão de fixação de autorresponsabilidade –, parece impossível
atribuir a ela a condição de autora. Afinal, se a ação é produto da vontade e, ao lado do 110
resultado, constitui a totalidade do desvalor do crime, para a identificação de um crime da
pessoa jurídica, é passagem necessária a discussão de sua vontade.15

Negar a vontade da pessoa jurídica e manter a expressão de que a decisão a respeito do


crime é de seu representante legal ou contratual equivale ao estabelecimento de responsabilidade
penal objetiva, o que constitui um claro equívoco.

Se, ao contrário, a decisão reflete a vontade da pessoa jurídica e não das pessoas físicas
que, por exemplo, compuseram um colegiado de voto do qual se originou a vontade, como
no exemplo antes indicado – a vontade única que orienta a ação é da pessoa jurídica, sem
qualquer possibilidade de atribuição jurídica do resultado aos dirigentes como pessoas físicas.

Portanto, o que o dispositivo estabelece, em realidade, caso interpretado como


regulatório de uma decisão efetivamente plasmada em uma ação, é a responsabilidade por fato
13 ... Roxin, Claus. Autoría y dominio del hecho en Derecho penal. Trad. Juaquín Cuello Contreras y José Luis
Serrano González de Murillo. Madrid: Marcial Pons, 2000. p. 569.
14 ... Sobre a discussão a respeito da responsabilidade para o homem de trás há interessante e atualizada compilação
das mais importantes ideias dogmáticas tendo por pano de fundo o chamado caso Fujimori, em: Ambos, Kai;
Meini, Iván. La autoría mediata. Lima: Ara, 2010.
15 ... Sobre a existência de uma vontade penal específica da pessoa jurídica veja-se: Busato, Paulo César. Vontade
penal da pessoa jurídica. Reflexões sobre o sistema penal do nosso tempo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 211 e
ss. O tema não apenas deve ser enfrentado a partir das possibilidades dogmáticas na seara penal, mas também pode
e deve ser remetida à clássica vinculação do nosso Direito Penal à concepção civilista da teoria da ficção de Savigny,
em oposição à teoria organicista de Otto Gierke.

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de outrem, o que realmente conduz a uma violação básica do princípio da culpabilidade.16


ARTIGOS
2.1.4 Crime praticado no interesse ou benefício da sua
1
entidade
2
O último, mas nem por isso menos indevido recorte realizado no art. 41, é a exigência,
3
para a atribuição da responsabilidade penal a pessoas jurídicas, que o delito seja praticado em
benefício ou no interesse da pessoa jurídica, seguindo, neste ponto, a diretriz do Código Penal 4
espanhol que propôs que os crimes das pessoas jurídicas deveriam ser cometidos en nombre o
por cuenta de las mismas, y en su provecho.

O texto pode ser interpretado de duas formas: primeira, é possível entender que o
interesse ou benefício da entidade seja um resultado específico derivado do crime perpetrado;
segunda, que se trate de um especial fim de agir que deve ser adicionado aos tipos como
recorte de identificação da responsabilidade penal de pessoas jurídicas.

Nos dois casos, de qualquer modo, a exigência não faz o menor sentido.

Visto como resultado específico do delito, a contrario sensu, presumirá que onde o
interesse ou benefício da entidade não se produza esta não pode ser incriminada, a despeito 111
de que tenha sido ela quem realizou a prática delitiva.17 A primeira impressão é da exigência
absurda e contraditória de um exaurimento para o reconhecimento de uma consumação.
Sim, pois a questão de que haja ou não benefício ou atendimento de interesses derivados da
prática delitiva não diz respeito necessariamente à produção de um resultado delitivo. Há
uma infinidade de delitos praticados que, a despeito do evidente prejuízo que provoquem à
vítima, são incapazes, por si sós, e em todos os casos, de gerar qualquer benefício ao autor,
como, por exemplo, o homicídio, as lesões corporais ou a poluição. A existência ou não de
benefício ou interesse poderá ser uma mera derivação não obrigatória consistente em pós-fato
impunível, por cuidar-se de exaurimento.

Não se pode olvidar que uma das razões pelas quais se evoluiu para a discussão da
responsabilidade penal de pessoas jurídicas foi justamente o complexo emaranhado dos sistemas
hierárquicos de atividades e responsabilidades no campo empresarial, que não poucas vezes
inviabilizava completamente a possibilidade de atribuição individual de responsabilidades18
e, neste caso, identificada a prática delitiva, identificada a relação com a atividade empresarial,
16 ... A crítica é feita por Bajo Fernández, justamente direcionada às opções que se pode fazer entre a
autorresponsabilidade e a heterorresponsabilidade da pessoas jurídica (Bajo Fernández, Miguel. Op. cit., p. 21).
17 ... De modo similar a observação de: Galán Muñoz, Alfonso. Op. cit., p. 28, apenas referindo não aos crimes
realizados pela pessoa jurídica, mas por pessoas físicas em seu seio.
18 ... Nesse sentido Gómez-Jara Díez, Carlos. Fundamentos de la responsabilidad penal de las personas
jurídicas. In: Bajo Fernández, Miguel; Sánchez, Bernardo Feijóo; Gómez-Jara Díez, Carlos (Org.). Tratado de
responsabilidad penal de las personas jurídicas. Madrid: Thompson-Civitas, 2012. p. 110.
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e não sendo possível a imputação individual, caso o resultado não se produza em favor do
interesse ou em benefício da empresa, não haverá responsáveis, a despeito dos prejuízos que ARTIGOS
possam ter sido causados à vítima que, no mais das vezes, poderá ser uma extensa coletividade. 1

O contrário também será verdade: realizado um delito que beneficie ou se ajuste 2


aos interesses de uma pessoa jurídica, mesmo tendo sido fruto claramente de uma decisão
3
conduzida e realizada pelo seu representante legal, em que a empresa operaria meramente
como instrumento, haverá atribuição de responsabilidade – ao menos, concomitante – para 4
o ente coletivo.

Pior ainda, justamente a punibilidade de delitos que não trazem proveito algum à
pessoa jurídica, como pode ser um vazamento de poluição radioativa, estariam, malgrado
fossem ajustados aos demais limites de intervenção, fora do âmbito de responsabilidade
daquela, o que revela não apenas que o uso da expressão é desnecessário, como também que
é politico-criminalmente indesejável.

Isso porque, em uma interpretação restritiva – como deve ser sempre em matéria penal
– o uso da expressão significa que caso o delito tenha sido praticado pela pessoa jurídica,
porém seu resultado não seja proveitoso, vale dizer, não seja no seu interesse ou benefício,
112
não haverá delito! Trata-se, como é óbvio, de uma opção em favor do pior, pois justamente o
crime que a ninguém beneficia, apenas prejudica a vítima ou as vítimas, não alcançará a pessoa
jurídica, o que parece um despropósito e também um indevido privilégio às pessoas jurídicas,
na medida em que as pessoas físicas não gozam de igual tratamento, sendo castigadas por
delitos, a despeito de que tenham obtido proveito ou não com suas práticas.

Caso, ao contrário, não se interprete a expressão como a produção de um resultado no


interesse ou em benefício da pessoa jurídica, mas apenas como um especial fim de agir que
deverá estar presente nos crimes praticados por pessoas jurídicas, faz menos sentido ainda o
uso da expressão, pois se estaria criando uma limitação de ordem subjetiva que deveria ser
demonstrada caso a caso, para a definição do autor e não do fato, levando a uma indevida
distinção da imputação conforme o autor, vale dizer, a um Direito Penal de autor. Sim, pois,
o mesmo tipo, eventualmente praticado em concurso de pessoas entre a pessoa física e a
jurídica poderia restar configurado para a primeira, mas não para a segunda, embora o fato
seja objetivamente o mesmo!

Mais que isso, caberia ainda discutir uma dificuldade adicional: sendo um especial
fim de agir, quem deveria atuar orientado por tal finalidade específica? Se entendermos que
se trata da atuação da pessoa jurídica, como parece lógico esperar, isso vem de encontro à

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disposição imediatamente anterior, qual seja, de que a decisão sobre a infração seja tomada
pelos dirigentes da pessoa jurídica, já que a atuação – presume-se – é produto da decisão. Se, ao ARTIGOS
contrário, entendermos que o elemento subjetivo consistente em um especial fim de agir deve 1
traduzir a expressão de sentido do tipo de ação realizado justamente pelo dirigente, o resultado
2
é cair novamente na armadilha da responsabilidade por fato alheio, com aflição do princípio da
culpabilidade. 3

Enfim, os resultados da inserção deste recorte, seja interpretado como elemento subjetivo, 4
seja como resultado objetivo, na prática, caminham céleres para os braços da injustiça.

Isso não quer dizer que não seja possível ou desejável limitar os delitos das pessoas jurídicas
às fórmulas de crimes de resultado,19 mas o resultado aqui deve ser, sempre, aquele próprio do
tipo, não um resultado genérico e separado, relacionado com uma figura que mais se aproxima
de um exaurimento.

2.2 Das disposições do §§ 1.º e 2.º. A teórica


autorresponsabilidade da pessoa jurídica
O § 1.º do art. 41 traz disposição a respeito da distribuição de responsabilidade entre
113
pessoas físicas e jurídicas, sustentando a absoluta independência entre a responsabilização de
pessoas físicas que eventualmente atuem em concurso com a pessoa jurídica.

Com este texto, o legislador pretende fazer crer que opta – em princípio correta e louvável
– pela separação e individualização das responsabilidades penais de pessoas físicas e jurídicas.

Com efeito, a responsabilidade de pessoas físicas pode ocorrer concomitantemente a das


pessoas jurídicas, de modo completamente independente destas; aliás, é justamente o modelo
de autorresponsabilidade das pessoas jurídicas uma tendência que cada vez mais se afirma na
doutrina e na própria legislação de outros países como o adequado.

A chamada heterorresponsabilidade – responsabilidade penal da pessoa jurídica quando


uma pessoa física atua através ou em favor desta – traduz uma violação nítida ao princípio da
culpabilidade, implicando responsabilidade por fato de outrem. No entanto, é justamente a

19 ... Aparentemente é que propõe Gómez-Jara Díez em seu sistema de autorresponsabilidade de pessoas jurídicas,
ao tomar como base a criação e realização do risco como elementos caracterizadores do ilícito praticado por pessoas
jurídicas. Cf. Gómez-Jara Díez, Carlos. El injusto típico de la persona jurídica (tipicidad). In: Bajo Fernández,
Miguel; Sánchez, Bernardo Feijóo; Gómez-Jara Díez, Carlos (Org.). Tratado de responsabilidad penal de las personas
jurídicas. Madrid: Thompson-Civitas, 2012. p. 135 e ss., especialmente p. 141-145. A despeito de ser oportuna a
limitação pelos critérios de risco (criação e realização de risco permitido), a forma de identificação destes critérios
proposta por Carlos Gómez-Jara Díez não convence, remetendo ao contexto do funcionalismo sistêmico, podendo,
isto sim, ser realizada da forma mais tradicionalmente utilizada na doutrina que debate o tema para atribuição de
responsabilidade a pessoas físicas.

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esta perspectiva que o legislador pátrio se viu impelido por não ter logrado cortar o cordão
umbilical que o une às vetustas bases teóricas do finalismo, especialmente no que tange à ARTIGOS
teoria da ação. 1

É evidente que o pensamento voltado a uma ação como movimento voluntário dirigido 2
a uma finalidade, como acontecimento ontológico que deve servir de base a ulteriores
3
valorações jurídicas, conduz inexoravelmente a uma exigência incompatível com a natureza
das pessoas jurídicas. 4

As mais atualizadas concepções jurídicas que não negam a normativização da base


do sistema de imputação,20 reduzindo as funções da ação a uma função de delimitação
negativa e a uma ideia de garantia do Direito Penal do fato. Por outro lado, cada vez mais
se adotam conceitos axiológicos de ação, especialmente o conceito significativo,21 que torna
perfeitamente viável a identificação da autorresponsabilidade penal da pessoa jurídica.

É possível afirmar, com estreita margem de dúvida, que parte da incongruência do


projeto em face da completa e adequada adoção da responsabilidade penal de pessoas jurídicas
deriva de um inaceitável ranço finalista.

Se isso não transparece diretamente do texto dos parágrafos 1.º e 2.º do art. 41, fica 114
evidente a partir de seu cotejo com as disposições do caput.

A primeira questão é a contradição para com o texto do caput que afirma a dependência
da responsabilidade da pessoa jurídica de uma decisão de seu representante, dirigente ou órgão
colegiado.

A única interpretação que permite salvar o § 1.º, conduz obrigatoriamente a um dos


resultados criticados no caput, ou seja, para que haja realmente a responsabilidade independente
20 ... Por normativização se entende, aqui, uma contraposição aos pré-condicionamentos ontológicos difundidos
e defendidos pelo finalismo de perfil welzeliano. Um bom apanhado sobre as sucessivas etapas da tendência da
dogmática jurídico penal a uma normativização e uma preocupação com suas consequências está em: Roxin,
Claus. La evolución de la política criminal, el Derecho penal y el Proceso penal. Trad. Carmen Gómez Rivero e María
del Carmen García Cantizano. Valencia: Tirant lo Blanch, 2000.
21 ... Veja-se, por exemplo, além do precursor Vives Antón, Tomás Salvador. Fundamentos del sistema penal.
Valencia: Tirant lo Blanch, 1996; Martínez-Buján Pérez, Carlos. Derecho penal económico y de la empresa. Parte
general. 2. ed. Valencia: Tirant lo Blanch, 2007; Fletcher, George. The Grammar Of Criminal Law. New York:
Oxford Universisty Press, 2007; Orts Berenguer, Enrique; González Cussac, Jose Luiz. Compendio de derecho
penal. Parte general y parte especial. Valencia: Tirant lo Blanch, 2004; Gorriz Royo, Elena. El concepto de autor
em derecho penal. Valencia: Tirant lo Blanch, 2008; Ramos Vázquez, José Antonio. Concepción significativa de la
acción y teoría jurídica del delito. Valencia: Tirant lo Blanch, 2008. No Brasil, assumindo expressamente a dimensão
linguística na formulação da teoria do delito: Busato, Paulo César. Direito penal e ação significativa. 2. ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2010; Mascarenhas Júnior, Walter Arnaud. Ensaio crítico sobre a ação. Porto Alegre: Nuria
Fabris, 2009. Adotando o modelo comunicativo de um conceito de ação, ainda que sem referência aos trabalhos de
Vives e Fletcher:Tavares, Juarez. Teoria do crime culposo. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 200 e ss. De
modo um pouco mais superficial também Queiroz, Paulo. Direito penal. Parte geral. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2008. p. 9.

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da pessoa jurídica, a decisão referida no caput há de ser uma decisão não realizada ou, no
mínimo, que não representa concretamente a vontade realizada no fato, esta sim pertencente, ARTIGOS
de modo exclusivo, à pessoa jurídica. 1

O problema é que, assim, a decisão referida aparece como uma situação de cogitatio ou ato 2
preparatório completamente impune e, portanto, absolutamente dispensável. Afinal, com ou
3
sem decisão do dirigente, a vontade expressa na conduta delitiva, para gerar responsabilidade
pessoal à pessoa jurídica, há de pertencer a ela própria. 4

Uma segunda questão, menos problemática, mas ainda dogmaticamente intrincada


com relação a esta disposição legal, é a referência a que as pessoas físicas podem ser autoras,
coautoras ou partícipes do mesmo fato praticado pelas pessoas jurídicas.

Ora, se for uma situação de coautoria, efetivamente não há qualquer problema a


respeito de uma divisão de tarefas, de um domínio funcional do fato entre pessoa jurídica e
pessoa física. Tampouco há qualquer problema quando a pessoa física seja um partícipe da
conduta realizada pela pessoa jurídica, tendo esta o domínio da vontade.

Somente aparecem algumas dificuldades, com relação às formas de participação de


pessoa jurídica em uma conduta que tenha como autora a pessoa física. 115
Quando o dispositivo refere à possibilidade de concurso de pessoas e ao lado da
coautoria aponta para a possibilidade de concurso onde a pessoa física seja autora, relega
a pessoa jurídica à condição de partícipe. A cumplicidade, como forma de participação é
efetivamente possível, mas a instigação e especialmente a indução praticadas por pessoas
jurídicas são figuras, no mínimo, discutíveis, porquanto se trata do convencimento dirigido à
uma prática delitiva, cujo conteúdo da vontade, que na pessoa jurídica só pode ser expresso,
virá, na verdade, manifesto na conduta da pessoa física.

Não se desconhece a existência de uma atitude criminógena de grupo, ou seja, que existe
um clima, o ambiente corporativo, no âmbito das empresas, que oferece uma espécie de
cobertor para a atividade delitiva.22

De qualquer forma, ainda que restrita à cumplicidade da pessoa jurídica, a referência à


pessoa física na condição de autora não afronta completamente a dogmática jurídico penal.

Resumidamente, é possível dizer que o parágrafo primeiro contém uma disposição que
se aproxima muito do adequado, remetendo, isto sim, à necessidade de alteração do caput.

No § 2.º, apenas reforça-se a questão da independência das responsabilidades ao afirmar


22 ... Cf. Feijóo Sánchez, Bernardo. La persona jurídica... cit., p. 50.

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que sequer a dissolução da pessoa jurídica ou a sua absolvição não exclui a responsabilidade da
pessoa física. ARTIGOS

É um dispositivo absolutamente desnecessário, porque repetitivo. Ora, se as 1

responsabilidades penais de pessoas físicas ou jurídicas são independentes, como quer afirmar 2
o § 1.º, é evidente que a morte ou dissolução das pessoas jurídicas não afeta a responsabilidade
3
destas. O parágrafo abre indevido espaço para a discussão sobre os efeitos da dissolução da
pessoa jurídica que, evidentemente, só pode ter acontecido depois do fato criminoso e, como 4
tal, é absolutamente irrelevante para a apuração do fato com relação a terceiros. Pretender o
contrário seria equivalente à admissão da comunicabilidade da causa extintiva da punibilidade
derivada da morte do agente, o que é um rematado absurdo. O Código não deveria ocupar-se
de prever situações e interpretações absurdas.

Na verdade, ambas as disposições poderiam muito bem ser condensadas em um único


texto que afirmasse: a imputação do fato à pessoa jurídica é independente da imputação das
pessoas físicas que eventualmente guardem qualquer relação de concorrência para o delito.

2.3 Das disposições do § 3.º. Uma redundância abusiva


Em primeiro lugar, cumpre ressaltar que o início do texto do § 3.º, na parte grifada, 116
simplesmente repete de forma literal o texto do caput do art. 38. É completamente inútil
e redundante. Não faz o menor sentido. Menos ainda, como parágrafo, dependente de um
caput que não trata de distribuir responsabilidade entre agentes em concurso.

Em complemento a isso, adiciona texto colecionando um grande número de


participantes de uma pessoa jurídica, quais sejam, o diretor, o administrador, o membro de
conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário, colocando-os todos
em uma inusitada e equivocada posição de garantidor.

Sim, porque determina que qualquer dessas pessoas que tome conhecimento de uma
conduta criminosa de outrem esteja obrigado a impedi-la, se tem condições de atuar para
evitá-la.

Vale dizer: se o crime é cometido por outra pessoa – não se especifica sequer se estamos
falando de pessoa jurídica ou física e nem se o crime praticado tem relação com atuação
de pessoas jurídicas – as pessoas em questão convertem-se automaticamente em garantes
da evitação do resultado criminoso, desde que tenham condições de agir no sentido desta
evitação.

Note-se que não se restringe a exigência de atuação aos casos em que não implique

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prejuízo pessoal para o sujeito que se omite. Exige-se a atuação, ainda que ela se traduza
em um prejuízo ou sacrifício pessoal do omitente. Imagine-se, por exemplo, que para evitar ARTIGOS
a prática do delito por parte do terceiro, o administrador se veja obrigado ao sacrifício do 1
próprio emprego ou da própria integridade física. Os casos forçosamente cairiam em situações
2
de justificação ou exculpação, independentemente da previsão legal aqui contida.
3
O parágrafo converte as pessoas nele indicadas em partícipes obrigatórios do fato de
outrem, independentemente de qualquer vínculo subjetivo, em evidente violação do princípio 4
de culpabilidade, no que tange à exigência de contribuição subjetiva para a produção do
resultado delitivo.

Finalmente, cumpre observar que, desde um ponto de vista político-criminal, ainda


que se entenda a pretensão do legislador, em atribuir responsabilidade para determinados
agentes especialmente colocados na posição de garantidores, o local apropriado para esta
discussão não é o art. 41, ao menos por duas razões.

A primeira, que a questão deve estar ajustada à regra geral de determinação da


responsabilidade em comissão por omissão e, portanto, deve pertencer à regulamentação
geral dos delitos omissivos.
117
A segunda, que o caput trata da responsabilidade penal de pessoas jurídicas, enquanto
que o parágrafo quarto diz respeito única e exclusivamente a pessoas físicas ocupantes de
cargos em uma estrutura empresarial que realmente não tem nenhuma relação e dependência
com o caput.

3. Das consequências jurídicas do delito


Primeiramente, cumpre referir que o elenco de penas atribuídas às pessoas jurídicas,
bem como os detalhes a respeito da sua forma de aplicação estão situados topicamente
imediatamente após a regulamentação da imputação às pessoas jurídicas, mas curiosamente
fora do Título III, que é o que cuida Das penas.

Este aparente ato falho do legislador diz muito a respeito da natureza jurídica das
consequências jurídicas do delito praticado por pessoas jurídicas. Aparentemente, elas exigem
tratamento apartado daquele referente às penas em geral. Outrossim, não apenas se reservou o
legislador a destacar dentro do capítulo das penas as peculiaridades destas em face das pessoas
jurídicas, mas afastou-as do próprio título regulatório das penas.

Analisando-se detidamente os artigos que regulamentam a aplicação de tais

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consequências, a razão desta separação revela-se associada a uma franca oposição entre as
características gerais das penas e das consequências aplicáveis às pessoas jurídicas que, não ARTIGOS
obstante, revelam muitas características próprias das medidas de segurança. 1

A Exposição de Motivos do Projeto do Código Penal refere que as sanções de privação 2


de liberdade trazidas pelos tipos penais não são compatíveis com a realidade das pessoas jurídicas,
3
e que, por este motivo, se estabelece uma regra de substituição.
4
A intenção, com a providência, teria sido a de tornar proporcional a sanção aplicável,
diante do agravo ocorrido, tendo como única exceção a liquidação forçada da pessoa jurídica,
que foi considerada a pena mais grave aplicável às pessoas jurídicas.

A opção por criar um sistema de substituição obrigatória, na forma do art. 42, é


bastante útil, no sentido de permitir que o delito seja aferido segundo a pena cominada, não
causando problemas no que tange à contagem de prazo prescricional, regras de competência,
substitutivos penais e demais aspectos que levam em conta a dimensão da pena privativa de
liberdade prevista para o crime.

No entanto, a tratativa revela uma similitude evidente para com as medidas de segurança,
que também se aplicam em substituição às penas, sem prejuízo da aplicabilidade das demais 118
regras penais e processuais, tomando por referência a pena cominada para o delito apurado.

Este aspecto fica ainda mais evidente quando analisado o parágrafo único do art. 42,
que prevê a liquidação forçada com perdimento do patrimônio para o fundo penitenciário. O
fundamento apontado para que se proceda desta forma é ter sido a pessoa jurídica constituída
ou utilizada preponderantemente com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime.

Perceba-se que o fundamento não se refere ao fato específico apurado cuja pena
privativa de liberdade é substituída por restritiva de direitos ou multa, mas sim a uma atitude
geral da pessoa jurídica, que somente pode revelar-se pela habitualidade, pois, a verificação
de que ela é usada preponderantemente para permitir, facilitar ou ocultar a prática de delito,
demanda analisar sucessivas atuações. Neste caso, tal consequência se desvincula da relação
proporcional derivada da culpabilidade, e associa-se muito mais à ideia geral de periculosidade,
que fundamenta a medida de segurança.

Mais uma evidência da natureza jurídica de medida de segurança das penas aplicadas às
pessoas jurídicas encontra-se no § 1.º do art. 43 que trata de explicar a suspensão de atividades,
prevista no inciso I do caput do mesmo artigo. O parágrafo estipula um período máximo

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de um ano para a suspensão de atividades e, no entanto, prevê a renovação de tal prazo se


persistirem as razões que o motivaram ou quando a pessoa jurídica não estiver obedecendo as ARTIGOS
disposições legais ou regulamentares relativas à proteção do bem jurídico violado. 1

Ora, a pena, como se sabe, uma vez firmada e aplicada, não pode ser ampliada, sob pena 2
de violação da ideia de proporcionalidade, ínsita ao princípio de culpabilidade. A previsão
3
de prorrogação, no entanto, é admitida na figura da medida de segurança se não cessada a
periculosidade. O sistema brasileiro – diga-se, indevidamente – mantém hoje medidas de 4
segurança que podem ser prorrogadas indefinidamente, coisa que o projeto pretende extirpar
(vide art. 96, § 2.º). Note-se, ainda, que o fundamento para a prorrogação da suspensão
de atividade é a persistência das razões que a motivaram, ou seja, fato posterior que não faz
mais parte do crime pelo qual ela foi aplicada. Do mesmo modo, a desobediência à lei ou
regulamento que protegem os bens jurídicos violados pelo crime, são fatos posteriores que
não constituem o próprio crime, portanto, não tem qualquer relação com a culpabilidade,
mas sim com uma ideia singular de periculosidade.

Na verdade, faz muito mais sentido que a consequência jurídica do delito praticada
por pessoa jurídica seja medida de segurança e não pena. Esta, inclusive é uma opinião que
encontra importante aceitação doutrinária23 e revela-se bem mais equilibrada que os múltiplos 119
intentos que se fez de explicar a culpabilidade de pessoas jurídicas.

Em realidade, os intentos de forjar um conceito de culpabilidade como elemento do


delito perpetrado por pessoas jurídicas, até hoje, esbarraram basicamente em três tipos de
impedimentos: ou representaram claramente a culpabilidade por fato alheio, em desobediência
ao perfil do princípio em questão, por distintas e variadas razões; ou procuraram forjar sua
identidade a partir de bipartições do Direito Penal, compondo diferenças entre a culpabilidade
de pessoas físicas e de pessoas jurídicas, dando origem a um Direito Penal bifronte, com as
consequências negativas que lhe são ínsitas; ou, finalmente, tiveram de apelar para teorias de
base que oferecem perspectivas pouco garantistas para o sistema de imputação como um todo
ou que já foram definitivamente superadas porque demonstrada sua inconsistência.

Evidentemente, não caberia aqui – dados os objetivos eminentemente práticos do


presente trabalho – discutir uma a uma as diferentes fórmulas de culpabilidade de pessoas
jurídicas, apontando seus inconvenientes. Porém, é possível fazer breves apontamentos a
23 ... Schünemann, Bernd. Cuestiones básicas de dogmática jurídico-penal y de política criminal acerca de la
criminalidad de empresa. Anuário de Derecho Penal y Ciencias Penales. Trad. Daniela Bruckner e Juan Antonio
Lascurain Sánchez. Madrid: Ministerio de Justicia, tomo XLI, fasc. 1, p. 529-58, p. 551-554, enero-abr. 1988;
Zugaldía Espinar, José Miguel. La responsabilidad penal de empresas, fundaciones y asociaciones: presupuestos
sustantivos y procesales. Valencia: Tirant lo Blanch, 2008. p. 124.

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respeito delas.
ARTIGOS
Há algumas formulações que pretendem identificar uma culpabilidade própria da
pessoa jurídica a partir de reconhecê-la como derivação da culpa dos entes que a compõem. 1

Trata-se de uma perspectiva que peca por não conseguir desvincular a existência da pessoa 2
jurídica em face das pessoas físicas a ela associadas.
3
,24
Busch por exemplo, sustentou que há uma culpabilidade da pessoa jurídica que é
4
coletiva e justamente produto da contribuição de todos os sócios que a compõem. Ou seja,
cuida-se do reconhecimento de que a existência de uma culpabilidade coletiva, ainda que sob
forma de uma expressão do espírito normativo da pessoa jurídica, como moral da comunidade
organizada, não é mais do que uma criação de todos que dela participam. A fórmula era muito
parecida com a proposição de Schroth25 de uma culpabilidade funcional do órgão (funktionale
Organschuld) deriva diretamente de uma formação de vontade coletiva delituosa, a qual é
nada mais do que a soma das formas de comportamento agrupadas organizativamente na
empresa, uma decisão coletiva pelo injusto.

Esta perspectiva possui dois problemas evidentes: o primeiro é a atribuição de


responsabilidade por fato alheio, na medida em que se reconhece que a culpabilidade das
120
pessoas jurídicas decorre da culpabilidade das pessoas físicas que a compõem; o segundo, é que
a proposição é injusta, ou inútil, pois se efetivamente restou demonstrada a conexão subjetiva
de todos os sócios com o evento delitivo e deles derivou a responsabilidade da pessoa jurídica
esta de converteu em simples instrumento, sendo inútil a atribuição de responsabilidade a ela,
se, do contrário, esta atribuição deriva justamente da não identificação da conexão subjetiva
dos sócios, resvala-se para uma injusta responsabilidade penal objetiva.

Uma contraposição a este modelo, especialmente focada na ideia da existência


independente da pessoa jurídica, foi inaugurada ainda antes da proposta de Busch. Iniciada
pela clássica forma de culpabilidade de pessoas jurídicas oferecida por Hafter26 é quiçá a que
mais se aproxime de uma solução lógica para a atribuição, na medida em que reconhece que
a soma das vontades dos sócios não é igual à vontade da pessoa jurídica que guia a ação. Mais
recentemente, de modo parecido, partindo igualmente da ideia fundante de que a essência
da pessoa jurídica é mais do que a soma das pessoas individuais que a compõem, Hirsch27
também reconheceu a necessidade de afirmação de uma culpabilidade da pessoa jurídica
24 ... Busch, Richard. Grundfragen der strafrechtlichen Verantswortlichkeit der Verbënde. Leipzig: Weiche, 1933. p.
181.
25 ... Schroth, Hans-Juergen. Unternehmen als Normadressalten und Sanktionssubjekte: eine Studie zum
Unternehmensstrafrecht. Gie en: Brühlscher, 1993. especificamente p. 203 e ss.
26 ... Hafter, Ernst. Die Delikts-und Straffhigkeit der Personenverbände. Berlin: Springer, 1903, p. 94 e ss.
27 ... Hirsch, Hans Joachim. Derecho penal. Obras completas. Trad. Patricia Ziffer, Buenos Aires: Rubinzal-
Culzoni, 2002. t. III, p. 109 e ss.

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independente das culpabilidades individuais, afirmando textualmente que “a essência da


corporação consiste justamente em que não é uma mera some de pessoas individuais, mas constitui ARTIGOS
uma estrutura independente que se separa delas”.28 1

Entretanto, tanto no modelo clássico de Hafter, ao preservar um conceito de ação 2


ontológico e um conceito de culpabilidade como fato de consciência – ambos próprios do
3
causal naturalismo –, quanto no modelo de Hirsch, ancorado no ontologicismo finalista,
existe um problema de base que é a estruturação do sistema de imputação a partir de um 4
conceito ontológico de ação. Como produto disso, ambos acabam forçados a admitir que a
execução da vontade em forma de ação se terceiriza às pessoas físicas.

Além disso, no caso de Hafter, como o conceito deve conjugar-se com uma teoria
psicológica da culpabilidade, sustenta-se que existe “uma inteligência especial, uma energia
especial, uma consciência especial da associação”,29 ou seja, uma consciência própria da pessoa
jurídica que deriva da decisão conjunta do órgão colegiado. A artificialidade da expressão é
mais do que evidente.

No caso de Hirsch,30 sustenta-se que a culpabilidade das pessoas jurídicas se baseia


na evitabilidade do fato pela corporação por suas falhas de organização que permitem a
121
instauração de uma política empresarial criminosa, o que não deixa de ser uma contradição31
à sua própria perspectiva de que “a culpabilidade requer sempre uma concreta referência psíquica
ao fato”,32 já que, certamente, não se pode situar uma culpabilidade psíquica da pessoa jurídica.
Justamente esta falha na organização é o traço característico das tentativas mais
recentes de reconhecimento de uma culpabilidade específica das pessoas jurídicas. De modo
geral, se reconhece na não evitação da instauração de uma cultura corporativa proclive à
prática criminosa a violação de um dever capaz de gerar responsabilidade. Sobre este idêntico
fundamento é possível reconhecer um amplo espectro de variações.

Anne Ehrhardt,33 por exemplo, entende que a realização do crime pela pessoa física
pode ser atribuído à pessoa jurídica, em face de esta não ter realizado um adequado controle
interno da produção destes resultados. Ou seja, defende o reconhecimento da culpabilidade
da pessoa jurídica pelo simples fato de que “a empresa pode fazer algo em relação ao fato de seu

28 ... Idem, p. 122-123.


29 ... Hafter, Ernst. Op. cit., p. 95.
30 ... Hirsch, Hans Joachim. Op. cit., p. 136.
31 ... A contradição é apontada por: Gómez-Jara Díez, Carlos. La culpabilidad de la persona jurídica. In: Bajo
Fernández, Miguel; Sánchez, Bernardo Feijóo; Gómez-Jara Díez, Carlos (Org.). Tratado de responsabilidad
penal de las personas jurídicas. Madrid: Thompson-Civitas, 2012. p. 158.
32 ... Hirsch, Hans Joachim. Op. cit., p. 137.
33 ... Assim, por exemplo, Ehrhardt, Anne. Unternehmendelinquenz und Unternehmensstrafe: Sanktionen gegen
juristische Personen nach deutschem und US-amerikanischem Recht. Berlin: Dunker & Humblot, 1994, p. 186 e ss.

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representante”.34 Com isso acaba caindo na incômoda posição do reconhecimento de uma


culpabilidade por fato alheio. ARTIGOS

Outros, como Lampe35 ou Heine36 pretendem reconhecer que a culpabilidade das 1

pessoas jurídicas consiste em uma reprovação ético-social que não se refere precisamente a
2
determinada ação, mas sim ao seu modo de ser, à sua “tendência criminosa”,37 justamente
porque criou e preservou uma filosofia criminógena, em função de certas práticas 3

organizacionais deficientes, formando um caráter empresarial defeituoso, ou uma defeituosa


4
condução da atividade empresarial prolongada no tempo.38 Aqui, à toda evidência, surge um
indesejável paralelo com a chamada culpabilidade por condução de vida,39 de triste memória,40
e admiti-la implica revolver as páginas mais lamentáveis da história do Direito Penal.

Avançando ainda mais na ideia de escapar da responsabilidade por fato alheio,


Dannecker41 pretendeu fixar a culpabilidade penal das pessoas jurídicas por meio de uma
subdivisão entre duas fórmulas de culpabilidade; uma culpabilidade própria do indivíduo
pessoa física (Individualschuld) e uma culpabilidade própria da pessoa jurídica (Verbandschuld),
sendo que, enquanto a primeira corresponde a um juízo de reprovação individual, a segunda
corresponde a um juízo de reprovação social. Esta culpabilidade social estaria representada na
mesma fórmula de déficit organizacional ou ético da pessoa jurídica, coisa que fundamentaria 122
não apenas a culpabilidade mas o próprio injusto da pessoa jurídica. A culpabilidade como
reprovabilidade da pessoa jurídica residiria justamente no fato de este sistema social não ter
criado mecanismos de evitação da realização do injusto. Ou seja, a esta opção são aplicáveis
simultaneamente todas as críticas dirigidas às anteriores, porque aqui estão cumulados os seus

34 ... Idem, p. 192.


35 ... Lampe, Ernst J. Systemunrecht und Unrechtssysteme. Zeitschrift für die gesamte Strafrechtswissenschaft. Berlin:
Walter de Gruyter, 1994. p. 683 e ss.
36 Heine, Günter. New Developments in Corporate Criminal Liability in Europe: Can Europeans learn from the
American Experience or Viceversa? St. Louis-Warsaw Transatlantic Law Journal, 1998. p. 187-191.
37 ... A expressão kriminell anfällig é usada por: Lampe, Ernst J. Op. cit., p. 697.
38 ... Assim opina: Heine, Günter. Modelos de autorresponsabilidad penal empresarial. Propuestas globales
contemporáneas. Cizur Menor (Navarra): Aranzadi, 2006. p. 47-51.
39 ... A circunstância não passou despercebida pela doutrina, conforme se vê em Silva Sánchez, Jesús-María. La
responsabilidad penal de la persona jurídica y las consecuencias accesorias del art. 129 del Código Penal. Derecho
penal económico. Manuales de formación continuada 14. Madrid: CGPJ, 2001. p. 324; e Galán Muñoz, Alfonso.
Op. cit., p. 13.
40 ... O tema da culpabilidade por condução de vida foi tratado por: Mezger, Edmund. Rechtsirrtum und
Rechtsblindheit, in Probleme der Strafrechtserneuerung. Festschrift für Eduard Kohlrausch zum 70 Geburtstag.
Berlin, 1944, p. 180 e ss. Sobre o perfil do Direito Penal nazista e a contribuição de Edmund Mezger para sua
construção, veja-se: Muñoz Conde, Francisco. Edmund Mezger e o direito penal do seu tempo. Trad. Paulo César
Busato. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, especificamente mencionando a culpabilidade por condução de vida.
41 ... Dannecker, Gerhard. Zur Notwendigkeit der Einführung kriminalrechtlicher Sanktionen gegen Verbände.
Überlegungen zu den Anforderungen und zur Ausgestaltung eines Verbandsstrafrechts. Goltdammer’s Archiv für
Strafrecht, 2001, p. 112 e ss.. Um bom resumo de seus argumentos pode ser encontrado em: Dannecker, Gerhard.
Reflexiones sobre la responsabilidad penal de las personas jurídicas. Revista Penal. Salamanca: La Ley, n. 7, 2001,
especialmente p. 47-48, onde o autor trata da capacidade de culpabilidade da empresa.

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defeitos.
ARTIGOS
A tese que encontrou mais aceitação entre aqueles que reconhecem como fonte da
culpabilidade uma falha na estrutura de funcionamento da pessoa jurídica foi a chamada 1

culpabilidade por defeito de organização (Organisationsverschulden), defendida especialmente 2


,42
por Klaus Tiedemann a qual se aparta completamente de qualquer reprovação de caráter
3
pessoal, para reconhecer como fonte material da responsabilidade a falha de organização da
pessoa jurídica que permitiu a atuação de pessoas físicas na prática criminosa.43 A culpabilidade 4
deriva da omissão em tomar medidas prévias que assegurassem um funcionamento empresarial
isento de delito.44

Há uma infinidade de críticas que se pode fazer a esta concepção. Em primeiro lugar
uma evidente falta de coincidência temporal entre a realização do delito e o momento da
culpabilidade, que Tiedemann45 tenta salvar com o socorro à vetusta teoria da actio libera in
causa; em segundo lugar, a responsabilidade por fato alheio, já que só admite como realizador
do delito as pessoas físicas que estão sob a égide da pessoa jurídica; e, em terceiro lugar, a não
previsão de formas de exculpação, que são inerentes à afirmação da culpabilidade, sob pena
de caracterização de uma responsabilidade penal objetiva.46
123
Finalmente, ainda dentro do quadro de busca de configuração de uma culpabilidade da
pessoa jurídica com suporte na ideia de descumprimento de obrigações quanto à organização
e funcionamento das empresas, aparece a proposta de Carlos Gómez-Jara Díez, nominada
pelo autor culpabilidade por cultura empresarial de descumprimento da legalidade ou conceito
construtivista de culpabilidade.47 Conquanto pretenda o autor sustentar diferenças substanciais
para com as concepções anteriores que se relacionam ao mesmo ponto, não é o que se observa
na prática. O autor apenas acrescenta à ideia de descumprimento dos deveres organizacionais
para fundamentar a culpabilidade, uma hipótese de exculpação, consistente na exigência de
atendimento a programas de compliance. A par disso, procura relacionar tais posturas – de
culpabilidade ou exculpação – às exigências do rol de cidadão, segundo as teorias de base do
42 ... Veja-se Tiedemann, Klaus. Die “Bebußung” von Unternehmen nach dem Zweiten Gesetz zur Bekämpfung
der Wirtschaftskriminalität. Neue Juristische Wochenschrift. Frankfurt am Main: C. H. Beck, 1988. p. 1169 e ss. Há
versão espanhola como Tiedemann, Klaus. Punibilidad y Responsabilidad Administrativa de las Personas Jurídicas
y de sus Órganos. Revista Jurídica de Buenos Aires. Buenos Aires: Facultad de Derecho y Ciencias Sociales de la
Universidad de Buenos Aires, vol. 2, p. 11 e ss., 1988, especialmente, p. 28-30. Aderindo a esta perspectiva, veja-se,
por exemplo, BACIGALUPO, Enrique. “La responsabilidad penal y sancionatoria de las personas jurídicas en el
Derecho Europeo”, in Derecho Penal Económico. Enrique Bacigalupo [dir.] Buenos Aires: Hammurabi, 2004, p. 88.
43 ... Tiedemann, Klaus. Die “Bebußung” von Unternehmen... cit., p. 1172.
44 ... Idem, ibidem.
45 ... Idem.
46 ... Cf. Gómez-Jara Díez, Carlos. La culpabilidad de la persona jurídica... cit., p. 165-166. Mais detalhadamente
em: idem, p. 156 e ss.
47 ... Cf. Idem, p. 167. Mais detalhadamente em: idem, p. 201 e ss.

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chamado funcionalismo sistêmico.48


ARTIGOS
Com isso, nada acrescenta de novo, pelo contrário. A justificação que apresenta para
1
a exigência de obediência aos programas de compliance consiste no reconhecimento de que
a complexidade empresarial moderna impede a heterorregulação da atividade empresarial 2

pelo Estado, remetendo a uma autorregulação meramente contextual, o que faz com que seja
3
injustificada a culpabilidade de pessoas jurídicas de baixa complexidade, quando não, inviável
sua exculpação! Por outro lado, os chamados programas de compliance foram considerados por 4

grande parte da doutrina como meras maquiagens da realidade criminológica das empresas,
totalmente ineficazes à realização de qualquer classe de prevenção, como bem exemplificado
pelos recentes casos de delinquência empresarial nos Estados Unidos da América49 e, como
tal, insuficientes para serem assumidos como uma fórmula de exculpação.

Além disso, a fragilidade político-criminal da teoria dos sistemas como fundamento do


sistema de imputação50 resulta ser um preço extremamente caro para admitir a culpabilidade de
pessoas jurídicas, especialmente quando é perfeitamente possível remetê-la à regulamentação
por via das medidas de segurança.

Finalmente, cumpre dizer que todos estes diferentes esquemas que partem da afirmação
124
da culpabilidade por defeito na organização ou similares, padecem, ainda, de vários problemas
comuns, consistentes em avaliações normativas incompatíveis com o juízo binário de
afirmação da culpabilidade, muito bem explicitados com a série de perguntas lançadas por
Galán Muñoz: “quando se dará realmente um dos defeitos organizativos que podem gerar
responsabilidade penal dos entes coletivos? Quando tal efeito é suficientemente grave para
determinar sua responsabilidade? É indiferente onde se dê o defeito? Qualquer defeito será
suficiente para tornar automaticamente responsável a pessoa jurídica dos fatos que cometam
pessoas físicas em seu seio? E mais, seria possível supor que sempre que se dê um delito no
seio de uma empresa, esta não se teria organizado corretamente?”.51

Todas essas razões fazem crer que a opção melhor e mais viável seja a adoção das
medidas de segurança, como consequência jurídica própria ao injusto penal cometido por
pessoas jurídicas.
48 ... Cf. Gómez-Jara Díez, Carlos. La culpabilidad de la persona jurídica... cit., p. 168. Mais detalhadamente :
idem, p. 221 e ss, especialmente p. -231.
49 ... Veja-se as críticas em Carbonell Mateu, Juan Carlos. Comentarios a la reforma penal de 2010. Valencia:
Tirant lo Blanch, 2010. p. 67 e ss.; e Schünemann, Bernd. La responsabilidad penal de las empresas y sus órganos
directivos en la Unión Europea. Constitución Europea y Derecho penal económico. Mesas Redondas de Derecho y
Economía. Madrid: Ramón Areces, 2006. p. 154.
50 ... Veja-se críticas em Roxin, Claus. La evolución de la política criminal... cit., p. 53; e Schünemann, Bernd.
Kritische Anmerkungen zur geistigen Situation der deutschen Strafrechtswissenschaft. Goltdammer’s Archiv für
Strafrecht, 1995. p. 217 e ss.
51 ... Galán Muñoz, Alfonso. Op. cit., p. 10-11.
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A par das inconveniências das artificiais fórmulas de culpabilidade de pessoas jurídicas,


há pelo menos três razões que recomendam o uso das medidas de segurança nestes casos. ARTIGOS

Em primeiro lugar, o fato de que as medidas de segurança já são utilizadas à larga como 1

consequência de práticas de injustos por pessoas carentes de culpabilidade, como é o caso dos 2
portadores de doença mental, desenvolvimento mental incompleto ou retardado e as crianças
3
e adolescentes infratores, cujas consequências, ainda que recebam a eufemística denominação
própria de medidas sócio-educativas, têm todas as características daquela.52 4

Em segundo lugar, uma óbvia constatação criminológica: se o fundamento das


medidas de segurança é a periculosidade, em contraposição à culpabilidade dos imputáveis,
é impossível negar que o comportamento de prática de injustos penais por pessoas jurídicas
é, em geral, muito mais perigoso que o gerado por crianças, adolescentes ou portadores de
enfermidades mentais. A obediência ao princípio de intervenção mínima praticamente obriga
a este reconhecimento, afinal, não é possível que o sistema penal siga cuidando de controlar
crianças e enfermos mentais e simplesmente negligencie as pessoas jurídicas.

Em terceiro lugar, porque isso remete a uma discussão político criminal de fundo:
se devemos ou não preservar um sistema de medidas ao lado do sistema de penas como
125
consequência jurídica do injusto dentro do campo do controle social penal e quais os limites
derivados de princípios que a este devem ser impostos. Quiçá, com a companhia das pessoas
jurídicas seja possível lograr um esquema de garantias apropriado aos carentes de culpabilidade.

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Paulo César Busato


Professor adjunto da Universidade Federal do Paraná e da FAE.
Doutor em problemas atuais do Direito penal pela Universidad
Pablo de Olavide, de Sevilha, Espanha.
Procurador de Justiça no Estado do Paraná.

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