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ORGANIZADORAS:

Francisca Ferreira Michelon


Maria Letícia Mazzucchi Ferreira.

Pelotas : Ed. da UFPel, 2011.


Dados de catalogação na fonte:
Aydê Andrade de Oliveira CRB - 10/864

S471a Seminário Internacional em Memória e Patrimônio : Memória &


esquecimento [recurso eletrônico] (5.: 2011 : Pelotas).
Anais do V Seminário... : Memória e esquecimento, 05 a 07
de outubro de 2011 / Organizadoras : Francisca Ferreira
Michelon ; Maria Letícia Mazzucchi Ferreira. – Pelotas : Ed. da
UFPel, 2011.
1 CD-ROM (1138p.) ; il. p&b e color.

ISSN: 2178-7646

1. Memória - Congressos. 2. Esquecimento. 3. Políticas de


memória. I. Michellon, Francisca Ferreira, org. II. Ferreira, Maria
Letícia Mazzucchi, org. III. Programa de Pós-Graduação em
Memória Social e Patrimônio Cultural do Instituto de Ciências
Humanas/UFPel. IV. Título.
CDD 153.12
Subsídio para uma memória gráfica de Pelotas: análise e interpretação de anúncios
do Almanach de Pelotas dos anos de 1913, 1915 e 1917

Paula Garcia Lima1


Nádia Leschko 2
Thaís Cristina Martino Sehn 3
Lucas Pereira 4

Resumo
Este artigo é uma ramificação da pesquisa Memória Gráfica de Pelotas: um século de
design, constituindo-se em um subprojeto, que estuda os reclames dos periódicos produzidos
na cidade no início do século XX e que constituem o acervo da Bibliotheca Pública Pelotense.
Dentre o manancial de periódicos e edições que compõem o projeto são contemplados aqui os
anúncios do Almanach de Pelotas dos anos de 1913, 1915 e 1917. Assim, intenta-se, neste
estudo, identificar a estética presente nos reclames, averiguando a existência de uma
identidade nestes elementos de comunicação visual dentro do campo profissional que hoje
conhecemos como design gráfico. Compreendendo os frutos desta atividade como
componentes da cultura material, como signos interpretáveis e compreensíveis, sugere-se que
estes permitam o resgate da memória da profissão e, ainda, do contexto do qual emergiram.
Palavras-chave: Memória gráfica, Anúncios, Almanach de Pelotas, Análises

Introdução

O presente trabalho é oriundo da pesquisa Memória Gráfica de Pelotas: um século de


design. Dentro desse grupo existe um subprojeto, o qual é abordado parcialmente neste
estudo, que analisa os reclames dos periódicos produzidos na cidade no início do século XX os
quais fazem parte do acervo da Bibliotheca Pública Pelotense. Dentre estes periódicos, aborda-
se aqui o Almanach de Pelotas, veiculado na cidade no período de 1913 a 1935. Pelo fato de a
pesquisa encontrar-se em fase inicial de análises, serão contempladas apenas três dentre as
primeiras edições publicadas: 1913, 1915 e 1917. O objetivo principal da investigação que vem
sendo desenvolvida, tendo como foco os anúncios, é identificar a estética existente nos
mesmos, a qual, talvez, possa indicar a presença de uma identidade nestes elementos de

1
Bacharel em Design Gráfico, Mestre em Memória Social e Patrimônio Cultural, UFPel,
paulaglima@gmail.com
2
Bacharel em Design Gráfico, Mestre em Memória Social e Patrimônio Cultural, UFPel,
nadia.projeto@gmail.com
3
Bacharel em Design Gráfico, pós-graduanda Patrimônio Cultural e Conservação de Artefatos, UFPel,
crisehn@hotmail.com
4
Graduando em Design Gráfico, UFPel, lucaspergrafico@gmail.com

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comunicação visual na localidade de Pelotas, em um período considerado ainda inicial dentro
do campo profissional que hoje conhecemos como design gráfico. A sugestão à incipiência do
campo se deve ao fato de que alguns pensadores e teóricos apontam que o seu surgimento
oficial tenha ocorrido com a institucionalização da profissão, através da abertura do primeiro
curso superior de design na ESDI no Rio de Janeiro, em finais dos anos 1950. No entanto,
considera-se que mesmo antes da existência de cursos capazes de conferir um diploma ao
profissional, já existiam pessoas que desempenhavam as funções que os futuros graduados
designers desempenhariam.
Este artigo busca compreender um pouco mais sobre a cultura do período, tendo em
conta que, assim como Lima (2010), entende-se que o design gráfico é um elemento da cultura
material, dado que permite aproximá-lo do campo da memória. Esta proximidade legitima-se
ainda mais através do pensamento de Prown (1993), que se desenvolve baseado na ideia de
que a apreciação do estilo e das formas dos objetos fornece dados para o entendimento
cultural. Com base nisto, intenta-se realizar análises de cunho estético, além de localizar
informações que permitam traçar e esclarecer a obscuridade que envolve o início e a
consolidação da profissão na cidade.
A metodologia empregada para estes exames consiste, num primeiro momento, na
realização do inventário desses anúncios através de uma ficha, especialmente elaborada para
esta atividade, composta por várias informações, com uma avaliação mais subjetiva, como a
estética dos reclames e outra mais objetiva como a coleta de dados sobre tipógrafos,
ilustradores, gráficas etc. Acredita-se que as descrições feitas nestes dois campos facilitarão o
trabalho do pesquisador no sentido de estabelecer leituras mais subjetivas e simbólicas, ao
buscar-se relacionar estes aspectos formais e estéticos ao tipo de produto propagandeado
pelo anúncio.
A partir do cruzamento destes diferentes dados que compõem a ficha – diretos e
interpretativos – visa-se compreender e construir significados para estes objetos que se
encontram quase um século distantes da temporalidade atual. Ao realizar-se tais análises,
têm-se a consciência de que as motivações que hoje regem os observadores destes anúncios
são díspares das ambições daqueles que os observaram no período no qual surgiram e que
também podem ser diferentes das intenções daqueles profissionais que construíram estes
objetos que constituem o corpus deste estudo.
Desta forma, considera-se fundamental adentrar no campo da semiótica, através de
seusà o eitosà aisà si osàdis utidosà oàli oàdeàMa ti eàJoll à ,à I t oduç oà àa liseà
deài age ,àpois,àassi àcomo este grupo , ela também busca esses preceitos com o intuito de

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o p ee de à elho àoà ueà àu aài age ,àoà ueà diz àu aài age àe,àso etudo,àcomo diz à
(JOLLY, 1996, p 32 – grifo da autora). Tendo em vista que se está a lidar com pesquisadores,
compostos de subjetividades e cargas de experiência e conhecimento diferentes, que estão
debruçados em objetos interpretáveis, que por sua vez encontrarem-se deslocados
temporalmente de seu contexto original de criação e veiculação – pensa-se que esta ciência
permite esclarecer as inúmeras possibilidades de significados que podem ser gerados. Por este
motivo, antes de serem apreciados os anúncios, serão traçados alguns destes conceitos
básicos da semiótica.

Semiótica: uma ferramenta que auxilia a construção de possíveis significados

A origem da palavra semiótica vem do termo grego semeion,à ueà ue àdize à sig o .à
Para Ferdinand Saussure (In: JOLLY, 1996) o signo é composto de duas faces indissociáveis: o
significado e o significante, o primeiro caracterizando o som e o segundo, o conceito.
Inicialmente a semiótica era mais aplicada na área lingüística, entretanto, esse campo de
estudo cresceu através de teóricos como Charles Sanders Peirce, que iniciou sua pesquisa em
busca de uma teoria geral, que também abrangia o som e as palavras, mas não só isso. Para
este autor, um signo era compreendido através de um ou vários sentidos, sendo que sua
materialidade poderia ter cor, textura, som, odor ou, até mesmo, sabor.
A propriedade fundamental do signo é sempre estar presente representando outra
coisa que está ausente, sendo composto, segundo Peirce, por três pólos: o primeiro é sua face
pe ept el,à ueàeleàde o i aà o oà ep ese ta e àouàsig ifi a te;àoàsegu doà àoà ueàestaà
fa eà ep ese ta,à ha adoà o oà o jeto àouà efe ente; e, por último, o que significa, que pode
se à ha adoàdeà i te p eta te àouàsig ifi ado.à PEI‘CE,à àapud.àJOLLY,à .à
Vale lembrar que para este estudo serão analisadas mensagens visuais fixas e
heterogêneas, ou seja, imagens impressas que contêm signos icônicos, signos plásticos (cores,
fo a,à o posiç oà i te a,à te tu a à eà ta à sig osà li gü sti os,à ouà seja,à à aà suaà elaç o,à
sua interação, que produz sentido que aprendemos a decifrar mais ou menos conscientemente
e que uma observação mais siste ti aà aiàajuda àaà o p ee de à elho à JOLLY,à ,àpà .
Para Jolly (1996), aquele que examina não deve tentar entender o que o autor da
imagem queria passar, e sim, deve se colocar na posição que já ocupa: a de receptor, levando
em consideração o contexto histórico e as informações oferecidas no material de análise,
verificando possíveis causas de bons ou maus funcionamentos da mensagem, de acordo com a
afinação entre os elementos icônicos, plásticos e lingüísticos, em prol de uma leitura mais

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agradável. Neste estudo, os elementos supracitados serão analisados em conjunto.

Um pouco sobre o objeto de análise: O Almanach de Pelotas

O suporte das análises é relevante para os estudos da história da cidade, pelo seu grau
de notoriedade em sua época, descortinando um panorama de Pelotas, composto por uma
visão positivista de enaltecimento da cidade, da sua vida social, cultural e seus progressos.
Esta publicação, editada anualmente, servia primordialmente de calendário-agenda,
acompanhando o pelotense durante o ano inteiro, trazendo-lhe informações úteis e de
e t ete i e to.à E aà di ididoà e à seç es,à o oà po àe e plo,à Va iedades ,à ueà t aziaà dadosà
sobre melhorias na cidade, informações sobre personalidades, artigos sobre instituições de
atendimento ao público,àse p eàilust adoà o àfotog afias.àNaàseç oà P opaga da àlo aliza-se
a maior parte dos anúncios, entretanto, vale ressaltar que estes são encontrados em quase
todas as páginas do Almanach, desde a capa até os espaços mais restritos no rodapé das
páginas, configurando o tom comercial da peça. Todos os comerciantes e industriais faziam
questão de anunciar no Almanach, dada a extensa vigência da peça (anual), sendo consultado
pelo público leitor sempre que precisava de informações úteis. Assim sendo, pode-se traçar
um panorama da vida econômica de Pelotas a partir dessa publicidade, que abrangia de
vestuário à mobília para casa, de tratores e colheitadeiras aos motores elétricos e carros, de
alimentos e bebidas aos medicamentos e produtos veterinários.
Quanto ao ponto de vista gráfico da peça, esta apresenta dimensões de página aberta
29 x 21 cm, contendo em torno de 120 a 200 páginas, sendo toda impressa em processo de
tipografia com a presença de clichês fotográficos5. A encadernação não é a original, pois os
exemplares da Bibliotheca Pública Pelotense encontram-se sem a capa da época e
acondicionados em um formato maior de capa.
Segundo Gastaud e Silva (2010, p. 12), de 1913 a 1920 os volumes foram impressos
pelas Officinas Typográficas do Diário Popular; de 1921 a 1928, pela Tipografia Guarany e, até
1935, última edição, pelas Oficinas tipográficas da Livraria do Globo. A fundação foi do
alog adoà eà saudosoà o te eoà D .à á to ioà Go esà daà “il a,à Ig ioà ál esà Fe ei aà eà
Capitão Florentino Paradeda, este h à uitosà a osà j à seuà i oà di eto à eà p op iet io à
(PARADEDA, in: Almanach de Pelotas, 1928, p.72)

5
Os clichês usados em tipografia são placas de metal, sendo que nestes a imagem gravada é reduzida a
pontos. A junção e proximidade desses pontos dão a ilusão de claro e escuro, simulando tons contínuos.

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Construindo subsídios: análises e interpretações dos anúncios

Com base nos objetivos colocados no projeto os quais, em parte, buscam-se


contemplar neste trabalho, são apresentados aqui cinco anúncios representativos dos estilos
presentes nos três almanaques em foco nesta abordagem, levando-se em consideração
elementos que se mantiveram recorrentes durante o período e outros que sofreram
modificações, sejam elas em virtude de avanços tecnológicos ou possíveis modismos que
surgiram entre 1913 e 1917.

An’ncio Locomoveis e Semifixas – 1913: Anúncio com gravura.

Este anúncio divulga um produto que é base de qualquer indústria: o motor. Essa
informação confere que há demanda por este tipo de equipamento, sugerindo a presença de
fábricas na cidade. Entretanto, são anunciados motores a vapor em uma época onde a
eletricidade era vigente. Pode-se inferir que há uma predisposição para a industrialização, mas
que os meios necessários para que essa indústria se desenvolva, como o acesso à energia
elétrica, ainda são restritos.
Quanto à diagramação, como é de praxe na composição dos anúncios dos Almanachs,
o conteúdo está inserido em uma moldura retangular com bordas internas arredondadas e
com cantos preenchidos. Há grafismos acompanhando toda a borda da moldura.
O alinhamento é centralizado, com exceção das áreas onde estão situadas as imagens.
Estas merecem destaque, tanto pela presença quanto pela posição que ocupam. São gravuras
a traço, com rica representação dos motores. Tratam-se de ilustrações bastante detalhadas.

FIGURA 1 - á ioà Lo o o eisàeàse ifi as ,àp gi aà àdoàál a a hàdeàPelotasàdeà ,àe,àaoàlado,àoàdetalheàdoà


clichê. Fonte: Acervo da Bibliotheca Pública Pelotense

As linhas justapostas e espaçadas conferem às áreas de preenchimento, sombra e luz,


proporcionando volume ao desenho. O incomum na colocação das figuras é a localização não

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centralizada e contendo texto ao lado, sendo que estão em posições opostas uma à outra.
Nota-se a preocupação do compositor em conferir movimento à composição, mantendo o
equilíbrio da mesma.
Quanto ao texto, está composto em tipo serifado6 com exceção das palavras ao lado
das gravuras e assinatura do importador. As linhas subsequentes de cada parágrafo
apresentam-se deslocadas para a direita e justificadas. O título apresenta tipo em caixa alta. O
corpo do texto é um tipo de inspiração humanista7, serifado, modulado e a julgar pelo
desgaste de algumas partes, trata-se de uma tipografia de uso recorrente nos impressos.
Percebe-se que o parágrafo abaixo da primeira imagem está em negrito e faltam algumas
letras que foram substituídas por outras, de fonte diferente e sem nenhum parentesco com a
família8 do tipo utilizado. As tipografias que acompanham as ilustrações não apresentam
serifas. A assinatura do anúncio apresenta nome do importador no primeiro tipo e locais de
atuação no segundo.
De um modo geral, é possível perceber a estética dominante na composição dos
anúncios do Almanach através da moldura, grade centralizada, tipografia bem marcada e
presença de clichês, ornamentando e expondo o produto anunciado.

An’ncio )deal – Concerto : A diferenciação através da tipografia 9 .

Este é um anúncio de um serviço de entretenimento disponível para o pelotense já


naquela época: o cinema. Não são anunciados filmes em exibição em função do período de
vigência do anúncio, um ano. Assim, a preocupação focalizou-se em informar ao leitor acerca
do período das sessões, qualidade dos filmes e estrutura do estabelecimento, principalmente
quanto à existência de instalações contra incêndios, preocupação da época, uma vez que os
filmes eram muito inflamáveis.

6
Serifa: pequeno traço ou prolongamento das hastes das letras. A presença ou não de serifas, bem como
seu formato, são formas de classificação de tipos.
7
Segundo Lupton (2006, p. 15) os tipos humanistas, desenvolvidos à época do renascimento, são
inspirados na letra da antiguidade clássica como as primeiras fontes romanas.
8
A família do tipo representa as variações do mesmo tipo quanto a peso, largura e inclinação.

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FIGURA 03 - Anúncio Ideal-Concerto, página 30 do Almanach de Pelotas de 1913.
Fonte: Acervo da Bibliotheca Pública Pelotense

Com relação à estrutura do anúncio, trata-se de uma diagramação típica com base
somente em tipos. Não há moldura. O alinhamento é centralizado e, para criar diferenciação
de pesos entre os textos, são utilizados tipos e tamanhos diferentes. Assim sendo, temos uma
mistura de tipografias sem serifa com serifados, geométrico9 com modulados, caixa alta e caixa
baixa; variando de uma linha para outra, repetindo-se em alguns momentos.
Percebe-se aí que os tipos se repetem nos anúncios analisados, o que sugere poucas
opções de famílias tipográficas à disposição do compositor. O que é marcante nesse anúncio é
a tentativa de se criar hierarquia de informação tendo como base somente a tipografia e o
traço pa aàp ee he àespaço,à o oà asàpala asà I dios àeà Di isa .

An’ncio )deal-Concerto 9 5 – As molduras geométricas

FIGURA 3 - Anúncio Ideal-Concerto, página 35 do Almanach de Pelotas de 1915.


Fonte: Acervo da Bibliotheca Pública Pelotense

Comparando-se a publicidade do ano de 1913 com a de 1915, nota-se a utilização das


molduras que, no primeiro ano de publicação, ainda eram muito incipientes e dois anos depois

9
Com desenho inspirado em formas circulares.

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começam a aparecer de maneira geométrica, com linhas retas e decoradas discretamente.
Provavelmente esses ornamentos eram feitos com os recursos tipográficos: fios que eram
rearranjados para caracterizar os adornos. Algumas páginas repetem exatamente a mesma
moldura, outras o mesmo estilo e uma minoria apresentam padrões distintos.
A página do ano de 1915 que trouxemos para este estudo, é a da empresa de cinema
Ideal-Concerto, já analisada no ano de 1913. Comparando os dois anúncios percebe-se
claramente a evolução da publicação, comentada no parágrafo anterior. Neste anúncio nota-
se a utilização de tipos mais largos e rebuscados, assim como alguns com desenhos mais
orgânicos. Ainda observa-se a presença de tipografias com e sem serifa.
Além das soluções tipográficas para definir a hierarquia de informações, como
diferenciação de tamanho, espessura e famílias de letras; outros recursos utilizados são os
ornamentos tipográficos (traços retos, ondulados, espirais, o desenho de uma mão apontando
para uma frase) ao lado de linhas, ou separando as distintas informações sobre o cinema.
O anúncio é simétrico, sua moldura possui o mesmo ornamento composto por
quadrados nos quatro cantos do retângulo. Ao centro das linhas, tanto verticais quanto
horizontais, um desenho também se repete, ainda composto por quadrados, mas dispostos de
maneira diferente, desta vez, enfileirados e divididos por pequenos riscos que se repetem,
causando a impressão de ter um traço mais grosso em tom de cinza.

An’ncio A Torre Eiffel – 1917

FIGURA 4 - Anúncio A Torre Eiffel, página 18 do Almanach de Pelotas de 1917.


Fonte: Acervo da Bibliotheca Pública Pelotense

Esteàa io,àe o t adoà aàp gi aà àdaàediç oàdeà àpe te eà àe p esaà áàTo eà


Eiffel ,à u aà asaà deà p odutosà deà odaà ueà suposta e teà i po ta aà suaà at ia-prima

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diretamente da Europa. A peça, de orientação vertical, é predominantemente simétrica e se
apropria do estilo de composição utilizado na maioria dos anúncios.
Entretanto, o anúncio selecionado apresenta clara evolução em relação aos
anteriormente analisados, se forem considerados, sobretudo, os aspectos formais da peça.
Apesar de não apresentar nenhuma gravura, ilustração ou fotografia; sua moldura e seu
tratamento tipográfico estão, de maneira geral, mais discretos e delicados. O alinhamento do
texto interno (justificado e com hifenização), por exemplo, demonstra a preocupação do
diagramador em manter coesão visual.
Em relação às tipografias utilizadas, a peça apresenta um tipo decorativo rebuscado
para o nome da empresa, um mais simples para o primeiro bloco de texto, tipografia sem
serifas no segundo bloco bem como no endereço do estabelecimento (porém este com peso
negrito), tipografia serifada e texturizada para o nome da cidade e serifada com baixo
contraste de espessura de traços para a aplicação do provável nome do anunciante.
Todavia, o elemento que mais se destaca neste anúncio é a moldura, que, mesmo
utilizando clichês já encontrados em outras diversas propagandas, foi claramente mais
trabalhada. A moldura, geometrizada, apresenta aberturas na caixa, fazendo com que ela fique
vazada. Isso foi proposital, já que foram inseridas informações de destaque nessas aberturas,
que estão situadas no canto superior esquerdo e no canto inferior direito, transmitindo a ideia
de sobreposição de planos.

Anúncios da página 53 de 1917: aperfeiçoamento da moldura

FIGURA 5 - Anúncio Cruzeiro do Sul / Vinho de Quinal, página 53 do Almanach


de Pelotas de 1917. Fonte: Acervo da Bibliotheca Pública Pelotense

A peça em questão se enquadra no estilo recorrente dos anúncios, ou seja, grande


variedade tipográfica, moldura, alinhamento centralizado e predominância simétrica. À

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primeira vista parece se tratar de uma peça única, devido à moldura externa e ao tratamento
tipográfico já citado, porém, após leitura detalhada, percebe-se que se trata na verdade de
dois anúncios isolados e separados por uma divisória central na moldura, sendo o primeiro de
uma companhia de seguros e o segundo, de um medicamento. O diferencial deste anúncio se
encontra novamente na moldura, pois esta foi pensada de maneira a dar ênfase na separação
entre os dois reclames, além de ser bem trabalhada e rebuscada em seu traçado sinuoso e
chicoteado.

Primeiras conclusões

Percebe-se uma nítida evolução no estilo da publicidade, pois no primeiro exemplar


analisado, o de 1913, havia pouca presença de molduras nos mesmos e, quando apareciam,
eram singelas e estreitas, assim como as tipografias utilizadas também eram mais simples,
variando entre sem serifas e com serifas, a maioria indicada para leituras longas. Já com o
decorrer dos anos, torna-se mais frequente a utilização de tipos fantasia, com desenhos
rebuscados e orgânicos, assim como as molduras passaram a ser mais onipresentes e com
desenhos rebuscados, muitas vezes repleto de curvas e ornamentos florais. Possivelmente a
gráfica foi adquirindo novos clichês e peças tipográficas com a função específica de
ornamentação e dentro do modismo da época, mesclando os novos tipos com os antigos, que
continuaram presentes nos anos seguintes. As análises indicam uma preocupação com o
projeto gráfico em uma época anterior à consciência da profissão de design gráfico no âmbito
local.
Ao efetuar-se a seleção e análise dos anúncios aqui presentes, buscou-se conferir
relevância e visibilidade ao projeto gráfico dos mesmos, que até então passava despercebido
aos olhos dos pesquisadores habituais desta peça, repleta de informações acerca da memória
e história da cidade: o Almanach de Pelotas. Esse novo viés de interpretação, baseado nos
signos gráficos, desvela camadas de subjetividade na mensagem que a leitura verbal não
alcança.
Assim sendo, além de haver indícios de atividade projetual logo nas primeiras décadas
do século XX, período anterior ao que se convencionou como início da atividade de design
gráfico no Brasil, foi possível estabelecer um novo olhar para os anúncios analisados,
conferindo-lhes o status de peça gráfica, olhar este que traz à tona uma tradição gráfica rica na
cidade de Pelotas e pouco comentada, ou ainda, envolta em um manto de esquecimento,
possivelmente por desconhecimento do grande público da atividade de projeto que

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caracteriza o design gráfico.

REFERÊNCIAS

GASTAUD, Carla. SILVA, Fernanda Oliveira da. Dicionário de História de Pelotas. Beatriz Ana
Loner, Lorena Almeida Gill, Mario Osório Magalhães (organizadores). Pelotas: Ed. da Ufpel,
2010

JOLY, Martine. Introdução à análise da imagem. Campinas: Papirus, 1996.

LIMA, Paula Garcia. Estudo da memória e do conceito de design através das peças gráficas e
fotografias do Parque Souza Soares (Pelotas, 1900-1930). Dissertação (Mestrado em Memória
Social e Patrimônio Cultural) – Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2010.

LUPTON, Ellen. Pensar com Tipos. Tradução: André Stolarski. São Paulo: Cosac Naify, 2006.

PARADEDA, Florentino. Almanach de Pelotas, Pelotas: Livraria do Globo, 1928

PARADEDA, Florentino. Almanach de Pelotas. Pelotas: Officinas Typographicas do Diário


Popular, 1913

PARADEDA, Florentino. Almanach de Pelotas. Pelotas: Officinas Typographicas do Diário


Popular, 1915

PARADEDA, Florentino. Almanach de Pelotas. Pelotas: Officinas Typographicas do Diário


Popular, 1917

PROWN, Jules David. The truth of material culture: history or fiction?. In: LUBAR, Steven;
KINGERY, David W. (orgs.). The history from things: essays on material culture. Washington:
Smithsonian Institution, 1993. p.1-19.

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