Você está na página 1de 53

ROGÉRIO DO NASCIMENTO CARVALHO

ILHAS MALVINAS:

uma reflexão sobre a soberania argentina

Trabalho de Conclusão de Curso -


Monografia apresentada ao Departamento de
Estudos da Escola Superior de Guerra como
requisito à obtenção do diploma do Curso de
Altos Estudos de Política e Estratégia.

Orientador: Prof. Gustavo Alberto


Trompowsky Heck.

Rio de Janeiro

2014
C2014 ESG
Este trabalho, nos termos de legislação
que resguarda os direitos autorais, é
considerado propriedade da ESCOLA
SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É
permitido a transcrição parcial de textos
do trabalho, ou mencioná-los, para
comentários e citações, desde que sem
propósitos comerciais e que seja feita a
referência bibliográfica completa.
Os conceitos expressos neste trabalho
são de responsabilidade do autor e não
expressam qualquer orientação
institucional da ESG.

________________________________
Assinatura do autor

Biblioteca General Cordeiro de Farias

Carvalho, Rogério do Nascimento.


Ilhas Malvinas: um reflexão sobre a soberania argentina / Prof.
Rogério do Nascimento Carvalho. - Rio de Janeiro: ESG, 2014.

53 f.: il.

Orientador: Prof. Gustavo Alberto Trompowsky Heck.


Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao
Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como
requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de
Política e Estratégia (CAEPE), 2014.

1. Ilhas Malvinas. 2. Política Argentina. 3. Política Externa


Brasileira. 4. Soberania. I. Título.
A todos da minha família que, durante o
meu período de estudos, contribuíram
com ensinamentos e incentivos.
A minha gratidão, em especial, aos meus
pais, irmãos, avó e amigos, pela
compreensão, em resposta à minha
ausência e omissão, enquanto me
dediquei às atividades da ESG.
AGRADECIMENTOS

Aos meus professores de todas as épocas de minha vida escolar, por terem
sido responsáveis por parte considerável da minha formação e do meu aprendizado.
Aos estagiários da melhor Turma do CAEPE-2014, pelo convívio harmonioso
de todas as horas, ciente de que formamos uma família com laços de amizade,
fraternidade e carinho.
Ao Corpo Permanente da ESG, pelos ensinamentos e orientações que me
fizeram refletir, cada vez mais, sobre a importância de se estudar o Brasil, com a
responsabilidade implícita de ter que melhorar.
Ao meu orientador, Professor Gustavo Alberto Trompowsky Heck, pela sua
sabedoria e simplicidade, pelo auxílio e transmissão de conhecimentos.
Ao meu amigo, Caetano Tepedino Martins, pela sua incansável paciência e
fonte ímpar de saber, sem tua luz o trabalho aqui apresentado não teria o mesmo
brilho.
À minha luz magnífica, que me auxiliou neste árduo trabalho, e não poderia
deixar de render as justas homenagens pelo carinho e dedicação. Muito obrigado
Diane Vicente Amaral.
À minha família, que me apoiou em todos os momentos, principalmente nos
mais difíceis, enquanto senti saudade de cada um dos membros de minha casa.
Um país se faz com homens e livros.
Monteiro Lobato
RESUMO

O objetivo deste trabalho monográfico é o de realizar um estudo sobre as Ilhas


Malvinas e a consequente reflexão sobre a soberania Argentina. Através de
pesquisa bibliográfica, confronta o conceito de soberania argentino e britânico,
localiza diferenças que justificam a posse desse território. Buscam-se o substrato
que justifica a invasão das Ilhas Malvinas pela Argentina. Após este ato de força
unilateral dessas ilhas em 1982, a Argentina chama a atenção do mundo para a
solução da referida questão do direito que tem à soberania. A ausência de apoio
norte-americano e o apoio velado do Brasil à Argentina são faces abordadas no
presente trabalho. Através de análises desde o Tratado de Tordesilhas até o conflito
ocorrido em 1982 será abordado no presente trabalho. Esse contexto internacional
vem provocando implicações geopolíticas no Atlântico Sul, e, nos últimos anos, a
Argentina imprime uma crescente agressividade em sua política externa, baseada
no direito internacional e busca junto a organismos internacionais a abertura de
negociações para dirimir esta questão. No entanto, mesmo ciente da recém-
descoberta de petróleo e gás na área marítima que circunda as ilhas, observamos
que a questão se encontra sem solução definitiva, e não há interesse das demais
nações em dirimir o conflito territorial. Na opinião do autor, a soberania das ilhas
Malvinas pertence à Argentina.
Palavras-chave: Ilhas Malvinas. Política externa brasileira. Soberania. Argentina.
Reino Unido.
ABSTRACT

Proposes to conduct a study on the Falkland Islands and the consequent a reflection
about the Argentina´s sovereignty. Through research literature, confronts the concept
of Argentine sovereignty and British, finding differences that justify the possession of
this territory. Search a substrate that justifies the retention of the Falkland Islands by
Argentina. After undertaking the invasion in the archipelago in 1982, Argentina calls
the world's attention to solution this question. The American absence and the veiled
support of Brazil to Argentina are faces covered in this work. Through analysis since
the Treaty of Tordesillas to the conflict occurred in 1982 is discussed in this paper.
This international context has led geopolitical implications South Atlantic, and in
recent years, Argentina shows an aggressive growth in your foreign policy, based on
the international law and search in the international organizations the open
negotiations to resolve this issue. However, even aware of newfound wealth in
Malvinas’ soil, we observed that question is open, and there isn´t any interest from
other nations to resolve the territorial dispute. In the author's opinion, the sovereignty
of the Falkland Islands belong to Argentina.
Keywords: Falkland Islands. Brazilian foreign policy. Sovereignty. Argentina. United
Kingdom.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 Mapa panorâmico da Argentina e das Ilhas Malvinas.........................15

Figura 2 Telegrama de rendição das forças argentinas ....................................18

Figura 3 Mapa das rotas de apoio à Argentina..................................................32


LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AFRICACOM Africa Command


BRICS Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul
CEE Comunidade Econômica Europeia
Cenimar Centro de Informações da Marinha (Brasil)
EUA Estados Unidos da América
FA Forças Armadas
MAS Míssil ar-superfície
Mercosul Mercado Comum do Sul
MSS Míssil superfície-superfície
OEA Organização dos Estados Americanos
ONU Organização das Nações Unidas
OTAN Organização do Tratado do Atlântico Norte
PIB Produto Interno Bruto
URSS União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
TIAR Tratado Interamericano de Assistência Recíproca
UNASUL União de Nações Sul-Americanas
ZOPACAS Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................. 11
2 ILHAS MALVINAS: GEOGRAFIA E DADOS DOS 74 DIAS DE GUERRA 15
3 MALVINAS: UMA CONSTANTE ENTRE SUPREMACIA E SOBERANIA . 20
4 MALVINAS: SUPREMACIA HISTÓRICA OU NOVAS VERDADES
ECONÔMICAS..............................................................................................23
5 GUERRA FRIA: NOVO CENÁRIO INTERNACIONAL E ALIANÇAS NA
DEFESA DA SUPERMACIA ........................................................................ 28
6 BRASIL: NEUTRALIDADE INTERNACIONAL OU DEFESA DA NOVA
ALIANÇA ECONÔMICA...............................................................................37
7 CONCLUSÃO............................................................................................... 46
REFERÊNCIAS ............................................................................................ 50
11

1 INTRODUÇÃO
O mar é o grande avisador. Pô-lo Deus a bramir
junto ao nosso sono, para nos pregar que não
durmamos.
Rui Barbosa, “A lição das Esquadras”, 1898

Há mais de 180 anos, o Reino Unido1 e a Argentina mantêm uma relação


internacional caracterizada pela disputa de soberania sobre um pequeno
arquipélago denominado Ilhas Malvinas (para os argentinos) ou Falkland Islands
(para os ingleses).
Para ilustrar o tema ser abordado, transcrevemos os ensinamentos de Goebel
(1951, p. 520), acerca da soberania e territorialidade da área em litígio que irá
nortear a discussão aqui proposta:

[...] queda por considerar la cuestión de la sucesión argentina a los


derechos y reinvidicaciones españolas. El principio fundamental de los
arreglos territoriales em Sud América es El llamado uti possidetis de 1810.
Por este principio se sobreentiende El derecho de las varias repúblicas em
que se transformo El império colonial español, a las regiones
compreendidas por las primitivas unidades administrativas de aquella
nacionalidad. De esa manera, los limites de Capitanía general de Chile y los
limites del Virreinato de Buenos Aires fueron adoptados como limites de la
confederación Argentina. No puede Haber Duda de que las Malvinas
formaban parte de este virreinato. El mero hecho de que fueran colocadas
bajo la autoridad del mismo gobernador que las colônias de la Patagonia del
Sur, es prueba suficiente de ello. Este principio abonaria uma reinvidicacion
de soberania contra todos los demás estados sudamericanos. No importa
que abopne o no uma reinvidicación de soberania contra Gran Bretaña,
porque a este respecto la reinvidicación argentina está sostenida por la
práctica de las naciones, em matérias que han sigo generalmente
denominadas de sucesión de estados [...].

Este conflito gerou uma disputa armada na década de 80 do século passado,


e traz no seu bojo alguns resquícios da malfadada “Era Colonial”, que aos olhos do
mundo está reprovada.
O fato é que o imbróglio permanece sem solução, relativamente à soberania
sobre as Ilhas Malvinas, um arquipélago com cerca de 200 ilhas localizado no
Atlântico Sul, que totaliza aproximadamente 12 mil quilômetros quadrados. O

1
Entende-se por Reino Unido o conjunto de países que são formados pela Inglaterra, País de Gales
e Escócia (estes formando o que conhecemos por Grã-Bretanha) mais a Irlanda do Norte, cujo
nome oficial é Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte. Trata-se de um Estado soberano e
para efeitos deste trabalho as referências utilizadas recairão na nomenclatura “Reino Unido”. Cabe
aqui uma observação de que em relação a competições esportivas, com exceção dos Jogos
Olímpicos, estes países competem cada um sob a sua bandeira, ou seja, separadamente, como por
exemplo, percebemos nos jogos da Copa do Mundo de Futebol (Nota nossa).
12

Produto Interno Bruto (PIB) das ilhas é basicamente provindo da exploração da


pesca (60%), o que representa US$ 40 milhões (MALVINAS, 2013). Com a recente
descoberta de petróleo na área, que poderá gerar divisas da ordem de 180 bilhões
de dólares, quando começar a exploração comercial, o tema voltou ao noticiário
(MALVINAS, 2013).
Neste caso, temos que pensar nos conceitos de nação, de soberania e nas
alianças continentais, bem como nas relações de poder, dentro dos saberes e das
práticas a que foram subjugados os povos que lá vivem e como esta influência
britânica mexe na cultura e no cotidiano dos habitantes das ilhas.
A problematização, enfoque central do presente trabalho, consolida-se nas
assertivas adiante:
(a) A Argentina e a Grã-Bretanha possuem reais vontades para negociar a
questão da soberania em relação às Malvinas?;
(b) A descoberta dos reservatórios de petróleo pode ter se tornado mais um
quesito de embate pela posse dessa área?
(c) Qual é o liame de interesse da Grã-Bretanha por este arquipélago? E qual
é a importância dessa região para o sócio-histórico do território argentino?
(d) A intermediação brasileira em apoio à pretensão da retomada da
soberania das Ilhas Malvinas pela Argentina, nos diversos foros
internacionais, tem sido uma política de estado ou de governo?
A Argentina busca apoio junto à comunidade internacional, para a devolução
da soberania sobre as ilhas, porém, é imperioso observar que não possui os
mesmos meios do Reino Unido, pois aquela, além de não ter assento permanente
no Conselho de Segurança das Nações Unidas atualmente está passando por uma
crise econômica. Na opinião do autor, os atores principais do globo não enfrentam a
questão com a devida seriedade, pois o arquipélago Malvinas é um posto de
observação e de monitoramento numa região com riquezas no fundo do mar;
respaldado pela reinstalação da Quarta Frota americana no Atlântico Sul, cujo
objetivo é o de vigiar o fluxo e intimidar os países que se opõem a Washington.
Integrando o eixo central do trabalho, faz-se um estudo acerca da
participação (acessória) brasileira no conflito armado havido em 1982 entre a
Argentina e a Grã-Bretanha pela posse das Ilhas Malvinas, discriminando o apoio
dado, incluindo a questão da soberania. Para isso buscou-se em discursos do então
chanceler brasileiro, Saraiva Guerreiro, bem como em documentos oficiais o
13

posicionamento do Brasil e sua repercussão no mundo, destacando o apoio dado à


Argentina no curso do conflito. Devido à sua importância, destacou-se a presença
atual (2014) de forças e meios militares do Reino Unido no Atlântico Sul, tendo em
vista o reflexo nas questões geopolíticas e estratégicas dos países do Cone Sul2 e
na projeção sobre o Continente Antártico, em face da aplicação do Princípio da
Defrontação3 proposto para o Pólo Norte.
Observando a sociedade argentina, notamos sua complexidade, bem como a
preocupação que têm com suas disputas marítimas e territoriais. Por outro lado,
atentamos para o fato da Grã-Bretanha enxergar nas Malvinas uma possibilidade de
estar praticando o neocolonialismo4, diante da proposta de manter sua soberania
pela força, em território disputado, muito longe da Albion. Percebemos, por fim, que
há manipulação inglesa sobre organismos internacionais no sentido de não permitir
um debate mais franco sobre o tema.
Serão igualmente analisadas, as implicações das Relações Internacionais nos
reflexos do pleito argentino junto a organismos internacionais, no sentido de
pressionar Londres a iniciar rodadas de conversação visando a traçar possíveis
contornos finais no tocante à posse e soberania das Ilhas Malvinas, porém há o
desinteresse explícito do Reino Unido em negociar o status do arquipélago, pois ao
entender que este lhe pertence de fato e de direito, inclusive pelo uso da força,
frustra as pretensões portenhas, que se vê em estado de atenção em suas fronteiras
marítimas e terrestres.
Com os novos contornos geopolíticos globais que hodiernamente estão sendo
estabelecidos, por vezes unilateralmente, ressaltamos, em especial, a reivindicação
argentina de estabelecer uma área de projeção marítima denominada “Pampa

2
Cone Sul é uma região que compreende os países austrais da América do Sul; quais sejam:
Argentina; Brasil; Chile; Paraguai; e Uruguai. Disponível em: <www.brasil.gov.br>. Acesso em: 15
ago. 2014.
3
O Princípio da Defrontação foi concebido pelo senador canadense Pascal Poirrer, em 1907, e prevê
que estados contíguos ao Círculo Polar Ártico exerçam soberania em terras e ilhas que lhe estejam
ao norte, dentro de um setor triangular cujos vértices são o Pólo Norte e os dois pontos em que os
meridianos toquem as partes extremas do território estatal. O mesmo princípio pode ser aplicado ao
Continente Antártico (Nota nossa); e Disponível em:
<http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/92444/Fontoura%20Jorge.pdf?sequence=1>.
Acesso em: 15 ago. 2014.
4
O colonialismo, e por conseguinte o neocolonialismo, já foi objeto de repúdio por Resolução da
Assembleia Geral da ONU, ao considerar que, o mesmo, nega os Direitos Humanos Fundamentais
sendo contrário ao espírito da Carta das Nações Unidas e um impedimento à paz mundial e
cooperação entre seus membros (ORGANIZAÇÃO, 1960).
14

Azul”5, nos moldes de nossa “Amazônia Azul”6, que visa proteger e explorar riquezas
marítimas. O referido programa foi lançado pela presidente da Argentina, Cristina
Kirchner, em 22 de abril de 2014, na Casa Rosada, em Buenos Aires, e cujo
"discurso" centraliza a política vislumbrada nos seguintes dizeres: “Afianzar la
presencia argentina en el Atlántico Sur en el contexto de la disputa de soberanía con
el Reino Unido”. (PAMPA, 2014, não paginado).
Finalmente, será analisado o conjunto desses fatos e reflexos explanados, e
levantadas às implicações políticas, econômicas, diplomáticas e até militares para o
Brasil, buscando-se identificar oportunidades surgidas e antecipar potenciais
ameaças, no Atlântico Sul, perfazendo-se, assim, no fecho do tema do presente
trabalho.

5
La iniciativa Pampa Azul se promueve como un programa de investigación del Mar Argentino, que
profundizará el conocimiento científico para la conservación y el manejo de los recursos naturales
que nuestro país tiene para ofrecer, a la vez que abarcará actividades de exploración, investigación
y conservación de la plataforma marina (PAMPA, 2014).
6
A Amazônia Azul, assim batizada pela Marinha do Brasil, e que inclui o mar territorial e a Zona
Econômica Exclusiva da plataforma continental jurídica brasileira, somando 200 milhas a partir da
costa. São 3,5 milhões de quilômetros quadrados, aos quais o Brasil quer somar mais 960 mil
quilômetros quadrados de área em águas internacionais, que seriam extensão da plataforma
continental brasileira. Disponível em: <https://www.mar.mil.br/dhn/dhn/amazoniazul.pdf>. Acesso
em: 15 ago. 2014.
15

2. ILHAS MALVINAS: GEOGRAFIA E DADOS DOS 74 DIAS DE GUERRA

About the South Atlantic, it is imperative that, as


soon as possible, a more comprehensive security
architecture is erected for the region. The question
is whether this will be consensual and regional or
imposed and external.
Armando Marques Guedes, The Fractured Ocean,
2012

As Ilhas Malvinas estão localizadas abaixo do paralelo 50ºS, cerca de 740


quilômetros a leste da Argentina, a 480 km a noroeste extremo sul da América do
Sul. Um arquipélago formado por duas ilhas maiores e outras 200 ilhas menores,
que totalizam uma área de 8.704 km².

Figura 1: Mapa panorâmico da Argentina e das Ilhas Malvinas


Fonte: Disponível em: <https://www.google.com.br/maps/@-43.9677836,-
71.353132,3045691m/data=!3m1!1e3>. Acesso em: 15 ago. 2014.

O arquipélago é de formação rochosa e desmatado, com predominância de


pastos, sendo sua principal economia a pesca, com participação de US$ 40 milhões
perfazendo 60% da economia local. Recentemente, o turismo tem fortalecido a
economia com a vinda de 60 mil pessoas/ano, buscando observar sua fauna, em
especial os pinguins. A exploração de petróleo e gás natural aporta um superávit de
US$ 2,9 milhões, o que leva a um PIB per capita de 22 mil Libras das Malvinas
16

(COLOMBO, 2012). Até data do conflito (1982), a economia se baseava na


agricultura de subsistência e na criação de ovelhas.
A região integra o território ultramarino do Reino Unido, com população de
aproximadamente três mil habitantes, que tem idioma oficial o inglês e moeda Libras
das Malvinas (FKP)7. O câmbio atual é de aproximadamente R$ 2,90 para cada FKP
1,00.
Durante os 74 dias de confronto armado, iniciado em 2 de abril de 1982, a
região recebeu um verdadeiro arsenal que pelo lado britânico contava com: sete mil
soldados embarcados em navios; 34 caças e caças bombardeios; 6 submarinos; 2
navios aeródromos; 2 navios anfíbios; 7 destróieres; e 15 fragatas.
Enquanto o poderio argentino contava com: 10 mil soldados nas ilhas; 67
caças bombardeios; 54 caças; 60 aeronaves de ataque ao solo; 4 submarinos; 1
porta-aviões ligeiro; 1 cruzador ("General Belgrano"); 6 contratorpedeiros; e 3
fragatas.
O ataque às Ilhas Malvinas que visava à obtenção da supremacia argentina e
o fortalecimento do patriotismo de seu povo e a alavancagem de sua economia, já
que era cogitada a existência de reservas de petróleo na região, resultou numa
fracassada ação militar, que somou: 990 mortes (258 britânicos, 649 argentinos e 3
civis malvinenses); 1.843 feridos (1.728 portenhos e 115 ingleses); 11.428
prisioneiros (11.313 argentinos, 115 britânicos); e uma perda bélica, do lado
argentino de: 35 caças; 25 helicópteros; 25 aviões tanques; 10 embarcações de
espionagem armadas; 4 aviões de carga; 4 navios cargueiros; 2 caças bombardeios;
2 barcos-patrulha; 1 cruzador; e 1 submarino. Já as perdas britânicas se resumiram
em: 24 helicópteros; 10 caças; 2 contratorpedeiros ; 2 fragatas; 2 embarcações de
desembarque; e 1 navio de carga.8
Moreira (2008 apud RIBEIRO et al, 2013, não paginado) relata alguns pontos
que marcaram o fracasso argentino durante o confronto armado:

Uma semana antes da rendição, a situação logística argentina tornara-se


crítica. Os estoques estavam no fim. O maior fracasso logístico argentino,
no entanto, deveu-se à sua dependência de fontes externas para a
obtenção de importantes peças de reposição, necessárias à manutenção de
equipamentos e sistemas em condições operacionais.

7
Disponível em: <https://pt.coinmill.com/FKP_USD.html>. Acesso em: 15 ago. 2014.
8
Disponível em: <http://www.terra.com.br/noticias/infograficos/guerra-das-malvinas/>. Acesso em: 15
ago. 2014.
17

Ribeiro et al. consideram que:

Outros fatores podem ser alinhados entre as causas do resultado negativo


aos argentinos, tais como o emprego de tropas inadequadas e mal
preparadas. Além disso, houve uma excessiva postura defensiva, com
pouca flexibilidade e agressividade, entregando toda a iniciativa ao
oponente. (2013, não paginado).

O exemplo dessa busca por armamentos e sobressalentes fez com que


aviões comerciais fossem modificados para o tráfico de armamento da Líbia até a
Argentina. Os voos ocorriam durante a noite, com aeronaves atravessando o
Atlântico com radares e luzes desligadas para não serem detectadas pelos radares
e vigilância inglesas. Alguns voos foram realizados entre 7 de abril a 9 de junho de
1982, sendo dois voos provenientes de Tel Aviv (Israel), sendo um com escala na
Venezuela e Peru, e outro com escala no Peru, quatro para Trípoli (Líbia) e um para
a África do Sul, conforme se dessume no mapa listado neste trabalho às folhas 32.
Porém, tal reforço externo dado à Argentina não foi suficiente para fazer
frente ao poderio britânico. Digno de nota que as forças portenhas foram duplamente
prejudicadas.
Em primeira análise, seus vizinhos não puderam colaborar para o incremento
de forças visando a defesa argentina, aliás, tivemos o Chile que colaborou com o
serviço secreto inimigo; e, por outro lado, o Brasil, maior país do continente sul-
americano, para não se indispor com o Reino Unido e os EUA, adotou um tom de
neutralidade e não colocou suas forças a disposição, deixando passar por seu
território alguns carregamentos oriundos de outros países e quiçá parco auxílio
bélico velado, para não configurar apoio a nação vizinha.
Aprofundando o certame geopolítico, as divisas argentinas no exterior
sofreram congelamento e bloqueio sistemático de países europeus, bem como o não
apoio norte-americano, conforme dessumimos em documentos do então diplomata
Antônio Azeredo da Silva, à época com a chefia da embaixada em Washington, que
assim expõe:
1) A decisão do Governo norte-americano de solidarizar-se com o Reino
Unido, na questão das Malvinas e de prestar-lhe inclusive apoio militar
representou um rude golpe para as relações dos EUA não só com a
Argentina, mas também com o conjunto de países da América Latina ( em
ambos os casos as dimensões, os interesses do Brasil ficam afetados
dadas as nossas relações tanto com Washington quanto com Buenos Aires,
e a posição de nosso país na política regional).
2) (...)
18

3) É muito ampla a irritação entre os países latino-americanos de língua


espanhola com a atitude dos EUA. De várias fontes, se sucedem as
acusações de que os EUA teriam violado os seus compromissos de
segurança com o TIAR ( e, consequentemente, com os países da América
Latina) e as declarações de que o sistema interamericano em sua
totalidade, estaria destruído ou, pelo menos, afetado de forma muito grave.
O Brasil não pode e não quer ficar indiferente a essa situação. ( AAS ew
1982.01.21, I-58 – A/10)

A economia argentina, que já apresentava sinais de dificuldades crescentes


em obter empréstimos no exterior, vai ter grandes óbices em enfrentar o poderio
britânico, o que vai culminar em sua derrocada, e este fato já era analisado pela
nossa diplomacia
Com a escalada da crise das falklands, essa percepção tende a se
modificar, em vista do congelamento dos ativos argentinos na Inglaterra, do
embargo de trinta dias impetrado pela CEE às importações de produtos
argentinos e da possível deterioração da situação interna da economia (
AAS ew 1982.04.02, I-17)

O conflito armado encerrou-se em 14 de junho de 1982, quando o general


britânico J. J. Moore, em telegrama, faz o anúncio ao governo britânico:

9 10
Figura 2: Telegrama de rendição das forças argentinas ,

9
Cópia fac-símile do telegrama enviado pelo general britânico J. J. Moore, em 14 de junho de 1982,
anunciando a rendição das tropas argentinas nas Ilhas Falklands (Malvinas), e que foi exibido no dia
2 de abril de 2012, véspera do seu leilão pela Casa "Bonhams", avaliado entre 2 mil a 3 mil libras
esterlinas. Disponível em: <http://en.mercopress.com/2012/04/03/argentine-malvinas-war-june-14-
surrender-telegram-auctioned-for-7.250>. Acesso em: 15 ago. 2014.
19

Fonte: Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/mundo/copia-do-telegrama-da-rendicao-


argentina-nas-malvinas-e-leiloada/n1597629537225.html>. Acesso em: 15 ago. 2014.

10
Tradução do telegrama: Em Port Stanley às 9 horas PM, horário local [Malvinas]. Hoje à noite, a 14
junho de 1982, o major general Menendes [sic] rendeu-se e entregou a mim, toda as forças
armadas Argentinas no leste e oeste das Falklands, junto com seu equipamento militar
[impedimenta]. Arranjos estão sendo realizados para reunir os homens para o retorno à Argentina,
para recolher seu armamento e equipamentos, para marcar e colocar em segurança sua munição.
As Ilhas Falklands estão mais uma vez sob o governo desejado. [...] Por seus habitantes. Deus
salve a Rainha. Assinado JJ Moore. Fim da mensagem (Tradução nossa).
20

3. MALVINAS: UMA CONSTANTE ENTRE SUPREMACIA E SOBERANIA

En la guerra pierden todos, es terrible y hay que


evitarla. Fue una entrega personal por reintegrar
las Malvinas a la soberanía nacional.
Washington Bárcena, capitán de navío del
destructor Bouchard

A Guerra das Malvinas acontece no fim do século XX, em um período de pós-


colonização e quando as Américas encontram-se realmente libertas de suas
amarras junto às coroas que as dominavam e buscam estabelecer alianças e seu
espaço no cenário econômico e político internacional. Porém, territórios e colônias
então remanescentes, trazem um cenário lacônico que ainda pode estabelecer certo
sentimento de subordinação e dependência à potência colonizadora.
O que nos leva a ressaltar até onde se estabelece uma soberania e uma
supremacia territorial, vide que este estudo, busca encontrar porque, apesar de
inúmeras negociações internacionais e prospectos históricos, os porquês deste
constante conflito entre a Argentina e Reino Unido pelo domínio territorial das Ilhas
Malvinas.
Apesar dos mais de 180 anos de conflito e de inúmeras bandeiras impostas
em seu solo; tais como: holandesa; inglesa; e espanhola, atualmente, a bandeira
que perdura sobre o solo do arquipélago é a inglesa e mesmo com o conflito armado
havido em 1982, o desejo argentino de agregação deste a seu território ainda é
explícito.
Mesmo com plebiscito realizado, no qual 98,8% dos kelpers (moradores das
Ilhas Malvinas) optaram pela permanência do arquipélago como uma área
dependente do governo inglês, ainda é uma intenção argentina que as 200 ilhas
integrem seu território, alegando inclusive certo desinteresse do poder inglês sobre a
área em disputa. (MALVINAS, 2013).
Isto é o que nos traz ao grifo de Sakamoto (1991) sobre a tese de Jean Bodin,
a qual apresenta como essência da soberania ─ a supremacia ─, da qual se
distinguem três implicações:

Em primeiro lugar, a supremacia em termos de sistema de valores. Em


outras palavras, a soberania se refere a um indivíduo ou um organismo cujo
valor intrínseco é considerado superior ao valor de outros indivíduos ou
organismos. Portanto, a personalidade ou órgão soberano tem o direito de
prevalecer sobre o direito dos demais. Segundo, a supremacia em termos
21

de interesse. Significa que o interesse de um indivíduo ou de um organismo


que é reconhecido como soberano deve ser considerado intrinsecamente
prevalecente sobre os interesses dos outros. Em terceiro, a supremacia
para além do sistema de valor. Não há norma moral, ética ou religiosa
superior à soberania. A soberania é uma categoria política sui generis, que
fica além do bem e do mal, do certo e do errado. Assim, a personalidade ou
órgão soberano tem a força (might) para prevalecer sobre a força dos
outros. (SAKAMOTO, 1991, p. 132-133).

Ou seja, como defende o próprio autor as três linhas se convergem numa


soberania, a qual se baseia na força e quando perde esse poder ou característica,
as demais se esvaem. Quando há o interesse e o poder da soberania, o Estado
consegue mobilizar tanto a população como a elite governante de um país
(SAKAMOTO, 1991).
O que leva a outro estudo realizado por Bobbio (apud CARDOSO, C.;
CARDOSO, O., 2010) que distingue a soberania entre: a interna, entre governantes
e governados; e a externa, que emerge da relação entre os Estados.
Apesar da Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA), na qual 19
Estados aprovaram as Ilhas Malvinas como sendo território argentino
(ORGANIZAÇÃO, 2012) e a Resolução 1514/1960 da Assembleia Geral da
Organização das Nações Unidas (ONU) (ORGANIZAÇÃO, 1960), que dá os direitos
a autodeterminação e escolhas políticas e desprendimento do sistema colonial. A
trama das Ilhas Malvinas não se resume apenas na Resolução de 1960 e o
confronto em 1982, mas um histórico de assembleias havidas na ONU, com
destaques para as seguintes Resoluções: 3160 de 1973; 31/19 de 1976; 37/09 de
1982; e, posteriormente aos embates, as Resoluções: 39/6 de 1984; 40/21 de 1985;
41/40 de 1986b; 42/19 de 1987; e, 43/25 de 1988. Inclusive com Carta para uma
rápida solução desse impasse histórico, assinada pelos países da América do Sul e
do Caribe, no ano de 2008. (ORGANIZAÇÃO: 1973, 1976, 1982, 1984, 1985, 1986b,
1987, 1988) e (CARDOSO; CARDOSO, 2010).
O que leva as vertentes de solução de devolução das ilhas ao
reconhecimento da soberania argentina, a não contestação da soberania inglesa
sobre as mesmas, ou à independência por definitiva das ilhas, seguindo a
Resolução de 1960, tornando-se suprema de seus direitos e interesses.
É válido esclarecer que, embora por motivos diferentes, a Argentina e o Reino
Unido adotam posturas diferentes sob a égide das resoluções das Nações Unidas.
22

A Argentina usa a interpretação da Resolução da Assembleia Geral da ONU


nº 1514 "Declaração sobre a concessão da independência aos países e povos
coloniais" (ORGANIZAÇÃO, 1960), e urge com base no princípio da integralidade
territorial e da interface ocorrida em 1833, com a expulsão dos argentinos que ali
viviam, juntamente com seus víveres e que o Reino Unido, ato contínuo, tratou de
reocupar, instalando bases militares, porém, inicialmente não povoando, gerando
tradições e uma cultura kelper, haja vista ser forte o vínculo migratório da população.
23

4. MALVINAS: SUPREMACIA HISTÓRICA OU NOVAS VERDADES


ECONÔMICAS
Si los recuerdos y las culpas quieren venir que
vengan […]. Les presentaremos batalla.
El heroe del Monte Dos Hermanas

Para a Argentina, os últimos descobrimentos de fontes de energia na região


das Ilhas Malvinas, Georgia e Sandwich Del Sur são de grande importância
estratégica principalmente no que diz respeito à Segurança Energética.
Desde a década de 70 do século passado já há estudos indicando a presença
de recursos energéticos na área, notadamente petróleo e hidrocarbonetos, o que fez
ressaltar a posição de Londres sobre a soberania britânica no território ora em litígio.
Somando-se a este fato não podemos deixar de mencionar outros motivos
que levam a Argentina a reivindicar este território, pois habita no inconsciente
coletivo argentino a sentença: “Las Malvinas son Argentinas”11.
Acrescenta-se também o fato de que as Ilhas Malvinas representam para a
Argentina e também ao Reino Unido uma base territorial importante, um posto
avançado; e ademais, aquele que deter a posse desse arquipélago estará diante de
uma excelente projeção no continente antártico com uma área oceânica de cerca de
1 milhão de km².
Com as novas descobertas de fontes energéticas no mundo, notadamente na
área do Atlântico Sul (Golfo da Guiné e do Pré-Sal brasileiro12) e com o crescimento
da demanda para países em alto crescimento na Ásia, notadamente Índia e China, a
procura por estas riquezas tende a aumentar, logo o incremento por divisas para os
países possuidores destes recursos também.
A esta altura, todo recurso proveniente na espécie moeda é de grande valia
para a Argentina que atualmente encontra-se em processo de reestruturação do
pagamento de sua dívida externa, ao qual deu "calote" no ano de 2001.
Porém, o acréscimo de receitas também interessa ao Reino Unido que
solidificou sua posição de não negociar a soberania das Ilhas Malvinas, procedendo

11
Moto nacionalista de domínio público na Argentina (Nota nossa).
12
Pré-sal é uma porção do subsolo que se encontra sob uma camada de sal situada alguns
quilômetros abaixo do leito do mar. Acredita-se que a camada do pré-sal, formada há 150 milhões
de anos, possui grandes reservatórios de óleo leve (de melhor qualidade e que produz petróleo
mais fino). De acordo com os resultados obtidos através de perfurações de poços, as rochas do pré-
sal se estendem por 800 quilômetros do litoral brasileiro, desde Santa Catarina até o Espírito Santo,
e chegam a atingir até 200 quilômetros de largura. Disponível em:
<http://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/perguntas_respostas/pre-sal/>. Acesso em: 15 ago. 2014.
24

a um plebiscito este contestado pela Argentina, pois os habitantes locais são


cidadãos britânicos e não possuem nenhum laço histórico-cultural com a pátria-mãe.
No entanto, a Grã-Bretanha, através do Tratado de Lisboa, de 2007,
consegue estabelecer, através de seu anexo II que as Ilhas Malvinas, Geórgia do
Sul e Sandwich do Sul, territórios ultramar da coroa britânica, receberão a chancela
dos demais 27 membros da União Europeia.
Em nome da Segurança Energética, por parte do Reino Unido, relembramos
que na década anterior ao conflito houveram severas crises do petróleo, com os
preços do barril aumentando consideravelmente, o que foi a motivação para o Reino
Unido utilizar um grande aparato militar, superior ao da Argentina para reconquistar
a soberania das Ilhas Malvinas.
Além do colapso na guerra, a Argentina viu também ruir o regime militar ora
vigente e o não apoio norte-americano aos argentinos teve outra conseqüência: o
esvaziamento do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), pois os
Estados Unidos da América (EUA) preferiram estar ao lado da OTAN (Organização
do Tratado do Atlântico Norte), ao qual seus membros já haviam declarado embargo
à Argentina, e com isso não foi possível adquirir armamentos oriundos desses
países, o que auxiliou na vitória do Reino Unido no conflito.
Deve ser considerado, para fins de compreensão, o fenômeno do
nacionalismo. No caso das Ilhas Malvinas, o planejamento atônito do governo
Argentino reacendeu na população uma esperança ilusória. A surpresa da operação
não se sustentou no tempo e demonstrou a fragilidade de instrumentos legais que
deveriam servir de apoio aos países americanos, como o TIAR, onde tivemos de um
lado os EUA apoiando a Grã-Bretanha e por outro, os demais países, mesmo
timidamente, como o Brasil, apoiando a Argentina.
Como ocorreu em boa parte das Américas, a Argentina, durante as décadas
de 1960 e 1980 foi marcada pelo golpe e a regime de ditadura militar, na qual
quaisquer que se opunham sofriam sanções como tortura, sequestro, detenções,
assassinatos, desaparecimentos. É neste cenário que Leopoldo Fortunato Galtieri dá
o seu "golpe dentro de um golpe", este último já existente e assume a cadeira
presidencial.
Porém a insatisfação e a instabilidade política, social e econômica, com leva o
general Galtieri a utilizar a Guerra das Malvinas para camuflar um quadro desastroso
de PIB em queda de 14%, uma dívida externa que saltara de US$ 27 bilhões, em
25

1980, para US$ 35 bilhões, além de falências de empresas argentinas, inclusive,


que somavam mais dívidas.
Utilizando-se do nacionalismo argentino, nutriam-se as expectativas e os
sonhos argentinos espalhavam-se em frases de efeito: “Melhor que ter navios de
ferro com homens de madeiras, é ter navios de madeiras com homens de ferro”; “As
Malvinas foram, são e serão argentinas”; “[somos] 27 milhões de soldados”, essa
última se referia a população nacional. (BRANDÃO; SOARES, 2009, tradução do
autor).
Segundo Romero (2006), o plano de ocupar as Ilhas Malvinas era uma
tentativa de apaziguar problemas internos, uma vez que a Argentina já se
encontrava em crise e os planos apresentados para atacar a recessão não estavam
sendo eficazes.
Porém, a ótica do então presidente Galtieri mirava outro adversário: o Chile,
com o qual a Argentina tinha questões não definidas acerca do Canal de Beagle,
que auxilia na ligação dos Oceanos Atlântico e Pacífico. Mesmo com a feitura de
dois laudos arbitrais (1977 e 1980), sendo este último elaborado pela Santa Sé, há a
recusa argentina de aceitar a resposta, qual seja, a titularidade do canal ao Chile.
Com isto, permaneceria a beligerância com aquele país, o que motivará para estar
ao lado do Reino Unido no conflito.
Ao mesmo tempo, que acreditava que a “Invasão das Malvinas” não criaria
repercussão já que a coroa britânica pouco se interessava conservar tais ilhas, já
que essas não lhe rendiam ônus nem bônus, descrevem Brandão e Soares (2009).
Mexer com o imaginário de uma nação é de extrema complexidade. As
reações não podem ser previamente medidas, e as frustrações, incalculáveis.
Poderia haver um verdadeiro derramamento de sangue, caso as operações
adentrassem o continente e território argentino, e isto houve protesto formal do
Brasil para que eventuais operações estivessem somente na superfície do
arquipélago em litígio. Nesse sentido, é cediço que várias tentativas, inclusive sob a
direção da ONU para forçar um diálogo entre argentinos e ingleses, porém os
últimos rejeitam ir para a mesa de negociações e estabelecer pacificamente o fim da
demanda.
Ressaltamos uma preocupação perene estampada na capa do periódico de
grande circulação no Brasil ─ Folha de São Paulo ─, datado de 22 de maio de 1982,
onde dois dizeres relatam o outrora escrito: “Nos Estados Unidos, o porta-voz da
26

Casa Branca disse que o governo Reagan cumpriria o compromisso com os


ingleses, excluindo apenas o envio de soldados.”, em outra parte, ressalta a
seguinte preocupação brasileira “[...] o responsável pela Superintendência Nacional
da Marinha Mercante, Élcio Costa Couto, revelou que o aumento do prêmio dos
seguros internacionais no Atlântico Sul poderá inviabilizar o comércio brasileiro para
o Pacífico.” (INGLESES, 1982, p. 1).
Sinteticamente, é imprescindível salientar que os EUA projetam seus valores
para a comunidade internacional em geral, demonstrando que ainda possuem
hegemonia no globo, portanto, sob a ideia norte-americana de poder, era tática estar
ao lado do Reino Unido, do que ao lado de parceiros históricos no continente, como
a Argentina.
Aproveitando desse revés, o Brasil enxergou uma excelente oportunidade
para aparar arestas com seu vizinho, que já fora parceiro em outros conflitos dentro
da América do Sul, porém, precisaríamos ganhar o apoio da Argentina e retirar
eventual mácula que ainda permeava o ambiente das relações bilaterais.
Para isso, ambos os países assinam diversos tratados, sendo o mais
importante o acordo nuclear bilateral, cuja finalidade é a de estabelecer o
desenvolvimento e que este se fará única e exclusivamente para fins pacíficos, bem
como o Brasil adquirir diversos produtos argentinos que estavam sob a égide do
embargo europeu.
Para corroborar a sentença acima, usamos as palavras de Jaguaribe (1985,
p. 8):

[...] os dois maiores países da América do Sul, com larga fronteira comum,
grande e crescente intercâmbio e imenso potencial de expansão, se
defrontam com uma clara alternativa: ou mobilizam seus enormes recursos
para uma política de estreita colaboração, que multiplicará em benefícios de
ambos suas recíprocas potencialidades, ou serão levados a posições de
mútua desconfiança e antagonismo, que absorverão, neutralizando-o, seus
melhores recursos [...].

O vencimento da desconfiança mútua e o início do período de cooperação vai


dar origem o que hoje conhecemos como Mercado Comum do Sul (Mercosul), tendo
em vista a derrota argentina no confronto das Ilhas Malvinas e o conseqüente
alinhamento EUA-Reino Unido na região do Atlântico Sul.
Em consequência disso, o Brasil, com anuência da ONU, busca, na criação
da Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul (ZOPACAS), que em sua formação
27

original, de 24 membros, teve no lado sul-americano: Brasil; Argentina; e Uruguai e


pelo lado africano: Angola; Benin; Camarões; Cabo Verde; Congo; Costa do Marfim;
Guiné Equatorial; Gabão; Gâmbia; Gana; Guiné; Guiné-Bissau; Libéria; Namíbia;
São Tomé e Príncipe; Senegal; Serra Leoa; Togo; e Zaire. A incorporação da África
do Sul só veio em 1994, após este país superar o regime segregacionista do
apartheid, cujo objetivo e a de tornar a área do Atlântico Sul em uma zona
desnuclearizada, conforme a resolução da ONU nº 41/11, de 27 de outubro de 1986
(ORGANIZAÇÃO, 1986a).Contudo, podemos sintetizar que a Guerra das Malvinas e
o seu resultado teve um consequente lógico de se pensar regionalmente a
segurança sul-atlântica, mesmo com os grandes obstáculos culturais e da
potencialidade dos países envolvidos, porém nessa mesma região a ideologia
nacionalista surge com mais força, e onde residem os países mais pobres, desiguais
e violentos do mundo. Para ressaltar essa ideia do nacionalismo por parte da
Argentina no tocante ao conflito das Malvinas, relembramo-nos nas lições de
Iglesias (2012, p. 25), onde nos diz que:

[...] lo que nos trae de nuevo a Malvinas, uma guerra decidida cuando se
agotó la “plata Dulce”, epopeya fundacional Del ´deme dos´ argento
periodicamente em auge; comenzaron las protestas sociales y la dictadura
no tuvo mejor Idea que huir para adelante apelando al caballito de batalla
Del nacionalismo argentino: Malvinas. Las consecuencias fueron
desastrosas em todos los sentidos, comenzando por la clausura de toda
posibilidad de recuperar las islas pacificamente, devolución que El Reino
Unido estaba evaluando, según demuestran documentos recientemente
desclasificados [...].
28

5. GUERRA FRIA: NOVO CENÁRIO INTERNACIONAL E ALIANÇAS NA DEFESA


DA SUPREMACIA

Realmente Malvinas significó mucho. Fueron días


muy duros allí, pero lo bueno es que logramos
defender la soberanía argentina, demostrando que
somos realmente fuertes.
Soldado desconhecido

A Guerra das Malvinas trouxe aos olhos do mundo as mudanças geopolíticas


e econômicas reforçadas pelo efeito da Guerra Fria e suas nuances. Enquanto os
Estados Unidos da América e a União Soviética vinham num embate pelo poderio
ideológico e econômico mundial, os países que não soavam destaques no cenário
internacional buscavam se reestruturar e atingir notoriedade dentro desta nova
realidade.
Após séculos de confrontos, Brasil e Argentina firmaram no século XX as
primeiras parcerias econômicas, válido lembrar o Acordo Tripartite de Cooperação
Técnico-Operativa sobre Corpus-Itaipu13 (1979). Já em 1982, a Argentina era a
segunda parceira econômica do Brasil, perdendo apenas para os EUA, passando de
US$ 340 milhões, em 1978, para US$ 1 bilhão, em 1981. (SANTOS, 2010).
O destaque de confronto se dá entre a parceria e a solidariedade brasileira,
apesar da sua política de neutralidade, enquanto os EUA, causam um retrocesso de
defesa dos interesses continentais, priorizando as ações defendidas pela OTAN e
pela Comunidade Europeia.
O confronto armado também apresentou características peculiares, como nos
apresentam Brandão e Soares (2009, p. 2):

[...] superioridade tática e bélica dos ingleses frente a proximidade


geográfica do conflito favorável aos argentinos, a presença do filho da
Rainha Elizabeth II, o príncipe Andrew entre os combatentes britânicos; a
utilização de submarinos nucleares como forma de intimidação inglesa;
enquanto o nacionalismo argentino aguçado, apoiando as forças portenhas;
além da participação da Guerra Fria, por meio dos EUA e URSS dentro
desse conflito [...].

13
Acordo Tripartite de Cooperação Técnico-Operativa sobre Corpus-Itaipu, assinado pela Argentina,
Brasil e Paraguai na cidade Presidente Stroessner, em 19 out. 1979. Disponível em:
<https://unibhri.files.wordpress.com/2010/12/deborah-carvalho-a-relac3a7c3a3o-brasil-e-
argentina_desdobramentos-do-perc3adodo-pc3b3s-redemocratizac3a7c3a3o-atc3a9-o-sc3a9culo-
xxi.pdf>. Acesso em: 15 ago. 2014.
29

É válido lembrar que as Ilhas Malvinas durante toda a sua história sempre
estiveram presentes em meio a conflitos territoriais, jaz que esteve hasteada em seu
solo bandeiras da Holanda, França, Espanha, Reino Unido e Argentina. Porém, nos
últimos 150 anos, o desejo de agregação do país sul-americano ao seu território
vem sendo um debate nas esferas internacionais sem grande êxito, mantendo sob o
poderio da coroa britânica o território como sua colônia.
Cardoso, C. e Cardoso, O. (2010) ressaltam a aprovação da Resolução
1.514, pela ONU em 14 de dezembro de 1960, (ORGANIZAÇÃO, 1960) que
consiste na Declaração de Concessão de Independência a Povos e Países
Coloniais, que transcrevem os autores:

2º § “todos os povos têm direito a determinação, podendo livremente definir


sua condição política [...] 5º § determina medidas imediatas que devem ser
tomadas para que todos os territórios que não tenham alcançado a
independência recebam todos os poderes inerentes a tantos, sem
condições ou reservas, de acordo livremente expressa, e, sem qualquer
distinção de raça, credo ou cor.

Tal documento abriu precedentes para que a Argentina reforçasse o processo


de integração do território do arquipélago à sua supremacia, levando a mais um
embate de negociações em 1965, no qual, mais uma vez, não obteve o resultado
esperado pelo país sul-americano. Groussac considera que:

[...] Inglaterra, bien convencida hoy de que La Republica Argentina no le


dará jamás quitanza de tal desposesión, no puede ya retroceder ante la
única solución honorable y definitiva Del conflito: El arbitraje. Le es más
digno y más prudente no esperar la hora – próxima – em que la Argentina,
com El derecho de hacerse justicia, tendrá también los médios [...]. (1982, p.
18).

Alegação essa que o governo britânico contrapunha, já que não considerada


aquela região como uma colônia, mas uma extensão territorial e ponto de apoio para
bases militares do povo inglês. Isto se contrapõe ao entendimento argentino, que se
considera herdeira da Espanha, como nos mostra Groussac:

[...] El examen reflexivo de los documentos y actos históricos, me há llevado


a la convicción de que la República Argentina, como heredera de España,
tiene sobre las islas disputadas exactamente los mismos derechos que
sobre la Patagonia, y provenientes de los mesmos Orígenes [...]. (1982, p.
19).
30

Não se pode olvidar que durante o conflito a Grã-Bretanha teve o apoio


positivo e eficaz do então Mercado Comum Europeu (hoje União Europeia), do
Parlamento Europeu, da ONU (na qual é membro permanente do Conselho de
Segurança), e dos EUA. Por outro lado, coube à Argentina o apoio distante de Cuba,
da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e da OEA, o que não
desequilibrou a balança de poder a seu favor.
Nesse ínterim, trazemos à baila o resumo de um documento, então
classificado com grau de sigilo "secreto", de número 17.852, expedido em caráter de
urgência do Centro de Informações da Marinha do Brasil (Cenimar), subordinado ao
então Ministério da Marinha (hoje vinculado ao Ministério da Defesa), que assim
expõe:

[...] os soviéticos solicitaram a KHADAFI, que a Líbia fornecesse a Argentina


aviões e mísseis russos, para que a União Soviética não surgisse sozinha
como responsável pelo fornecimento de armas. O Embaixador cubano em
Buenos Aires, cujo avião foi interceptado no espaço aéreo brasileiro, foi
portador de uma mensagem de FIDEL CASTRO aos argentinos em que, em
nome do governo de ANGOLA, oferece as bases aéreas angolanos como
escala operacional para manter uma ponte aérea entre a Líbia e a Argentina
[...]. (BRASIL, 1982, p. 2).

No entanto, em recentes revelações de documentos secretos por parte do


Governo Brasileiro, e estampados em periódicos de grande circulação no país,
dentre eles, o Globo, mostram uma realidade diversa àquela manifestada do nosso
então chanceler, Saraiva Guerreiro, sobre o envio de material bélico a Argentina,
conforme descrito acima, porém negada pelo Governo Brasileiro, à época dos fatos,
em transcrição de documento secreto de audiência ao embaixador britânico acerca
da crise das Malvinas e do Vulcan, conforme segue:

[...] sobre a alegação de trânsito pelo Brasil de armas destinadas à


Argentina, no caso concreto denunciado ao Itamaraty pela Embaixada
Brasileira (avião de Aerolíneas Argentinas que fizera escala em Recife,
procedente da Líbia), os serviços brasileiros tinham visitado a aeronave,
nada encontrando de natureza militar [...]. (BRASIL,1982, não paginado)

Entretanto, em reportagem do próprio jornal O Globo, datado de 21 de abril de


2012, mostra uma realidade diversa àquela explanada pelo nosso então chanceler,
em sentido oposto, o que comprova aquiescência do Governo Brasileiro em apoiar
Buenos Aires no conflito, senão vejamos:
31

[...] o fluxo na ponte aérea de armas para Buenos Aires crescia. Chegou à
média de 2 voos diários com escalas em Recife. Outros cargueiros
entravam na rota e nem sempre eram civis. Alguns desfilavam pela pista
pernambucana exibindo na fuselagem bandeiras de países “neutros” como
Libéria e África do Sul [...]. (CASADO, 2012, não paginado).

Mas documentos pertencentes ao serviço secreto inglês dão a mesma


dimensão, e mostram a tendência do governo brasileiro no apoio discreto à
Argentina:

[…] in this context, they are well aware that argentine military and other
aircraft have used and are still using Brazilian airfields when transporting
military equipment for by Argentina. If the Brazilian authorities take action to
restrain a British aircraft which sought emergency facilities of a kind
guaranteed by international practice, it would seem no less appropriate that
they should impound such argentine aircraft and their lethal cargoes [...].
(SPREZZAPIA, 2014, não paginado).

O governo brasileiro optou por retardar qualquer operação britânica que


passasse por seu território, mas isso não era suficiente para barrar a operação
orquestrada por Margaret Thatcher, e quando o Brasil percebia que suas ações
incomodavam os ingleses a ponto de gerir atrito, era visto um recuo inteligente de
nossa “boa vontade”.
Outro fator preponderante dentro do cenário dos conflitos armados foi uma
intenção da União Soviética em apoiar tal fronte, na expectativa de expansão de
sobrepor o seu regime comunista dentro da América Latina.

A União Soviética passou a vista como um dos polos da crise, por sua
inclinação verbal – e talvez apoio material – ao regime ditatorial de Buenos
Aires. “Estamos utilizando apoio que os soviéticos nos ofereceram, mas isso
não significa que estamos entrando na sua orbita de dominação”, descreveu
alto funcionário do Palácio San Martin, chancelaria argentina. [...]
[...] sabia-se que um grande navio de espionagem russo da classe Primorye
passara a acompanhar fielmente a rota do transatlântico Canberra, que
integrava a Armada britânica [...]. Além disso, pelo menos um avião de
conhecimento Tupolev 45 – dos cinco que estariam fazendo o mesmo
serviço – foi visto na sexta-feira sobrevoando o porta-aviões Invincible. [...].
E, de concreto, havia ainda o Akademik Knipovich aportado no porto
argentino de Ushuaia. Oficialmente registrado como “navio de pesquisa de
pesca”, trata-se na realidade de um navio de espionagem antigo, com
capacidade limitada de coleta de informações, mas com radares aptos a
detectar submarinos. (PORRO et al., 1982, p. 31).
32

14
Figura 3: Mapa de rotas de apoio à Argentina
Fonte: Disponível em: <http://oglobo.com/infográficos/brasil--malvinas>. Acesso em: 16 jul.
2014.

Porém, os EUA mesmo acatando a decisão de sanções ao Estado portenho,


decidiu optar por uma linha política e não econômica, o que tornaria ineficaz, já que
não efetuou o bloqueio de bens e tampouco suspender o comércio entre as duas
nações.
Em palestra proferida na Escola de Guerra Naval na data de 13 de agosto de
2007, o Cel. Av. Wille Dobson, adido de defesa do Reino Unido no Brasil acerca do
tema "Antecedentes político-diplomáticos do conflito das Ilhas Malvinas", expõe o
ponto de vista inglês sobre a questão. (DOBSON, 2007).

14
Além da operação de fornecimento de armamento da Líbia, via Brasil e Peru; a Argentina efetuou
compras em Israel. Disponível em: <http://oglobo.com/infográficos/brasil--malvinas>. Acesso em: 16
jul. 2014.
33

Segundo o representante inglês, o referido arquipélago encontra-se sob


contínuo controle britânico desde 1833, com protestos argentinos e sem veredicto da
Corte Internacional. Ressaltou ainda que há justificativas históricas dos dois lados.
A Espanha, então império colonial, argumentava sob a égide do Tratado de
Tordesilhas de 1494, que as terras a leste da linha de 370 léguas de Cabo Verde lhe
pertenciam, inclusive o arquipélago aqui em questão; porém, o Reino Unido se
encontrava e "reivindicava o direito de enviar navios para a descoberta das regiões
desconhecidas e desabitadas do mundo". (DOBSON, 2007).
Apesar de conflitos referentes a soberania, envolvendo Espanha, Grã-
Bretanha e até a França, a verdade é que o ponto estratégico não era reconhecido,
pois os habitantes de então, em sua maioria, eram degredados.
Para a Argentina, com sua independência recém-conquistada no ano de
1816, vai se utilizar do mesmo argumento espanhol anterior, aliás que perdura até
os dias atuais, consubstanciado no princípio da continuidade geográfica como
legítima sucessora nos direitos de Espanha de 1494.
Ressalta ainda Dobson que a Grã-Bretanha sempre irá defender os desejos
dos habitantes das ilhas, ao contrário da Argentina, que não compartilha da mesma
ideia, mas sim da integridade territorial. (DOBSON, 2007).
A tentativa britânica de estabelecer um condominium com a transferência de
soberania à Argentina e administração inglesa pelo período de 30 anos foi
rechaçada pelos argentinos que almejavam para o prazo de 10 anos.
No fundo, a ideia britânica era o estabelecimento de uma cooperação, porém
de difícil conciliação, dado a instabilidade política do regime argentino, concluiu
Dobson. (DOBSON, 2007).
Também é inegável que a Guerra Fria teve entre os seus dramas a Crise do
Petróleo na década de 1970, o que se tornou um alarmante, visto que as economias
do globo dependiam grandemente desta fonte energética, em especial na América
Latina. Válido um parênteses que nesse período o Brasil veio desenvolver as
pesquisas com etanol para uso como automotivo, na busca de tentar se
desvencilhar desse caos que colocaria diversas potências do mundo num verdadeiro
emaranhado econômico, com grandes perdas de divisas.
Também, na busca de evitar o conflito armado, o presidente estadunidense,
Ronald Reagan ligou para o então presidente argentino Galtieri, que o fez esperar
por mais de 40 minutos e lhe informou que não havia como persuadi-lo, já que “[...]
34

we learn there is possibility off oil there [...]”15, como descreve o político americano
em seu diário (REAGAN, 2007, p. 77).
Moniz Bandeira (2012) ressalta que o Secretário de Estado Americano,
Alexander Haig, havia descrito que as Malvinas estavam localizadas sobre um largo
campo petrolífero, que despertava interesse de ambas as partes, sugerindo que
poderia haver uma parceria nos direitos de exploração. Essa possibilidade só foi
confirmada em 1993 pela British Geological Survey que anunciou a exploração de
petróleo na região até 200 milhas em torno das ilhas, com uma produção de 500.000
barris diários (NIKANDROV, 2010 apud BANDEIRA, 2012).
O que reforça a teoria que, naquele momento, a integração daquelas 200
ilhas seria uma ótima saída para a recuperação da economia e o fortalecimento da
imagem da ditadura argentina, em contraponto, à renovação da economia britânica e
do seu poderio, dentro do cenário político-econômico internacional.
O mesmo ocorria com o Reino Unido, pois se a eventual operação militar
redundasse em fracasso, o governo “trabalhista”16 de Margareth Thatcher não
sobreviveria no comando do país.
É válido ressaltar que, anteriormente a 1982, a Argentina sempre havia
contado com apoio norte-americano, inclusive na preparação e formação estratégica
de seus militares. Porém, os mesmos Estados Unidos da América foram os
primeiros a recusar aos pedidos, quando o embate armado surgiu. Os EUA passou a
ser tratado pelo povo argentino como um “traidor”, já que rompera o TIAR de 1947 o
qual apoiava em todas as nuances a supremacia das Américas diante de qualquer
ação extracontinental, como descreve seu art. 3.1:

The High Contracting Parties agree that an armed attack by any State
against an American State shall be considered as an attack against all the
American States and, consequently, each one of the said Contracting
Parties undertakes to assist in meeting the attack in the exercise of the
inherent right of individual or collective self-defense recognized by Article 51
of the Charter of the United Nations. (ORGANIZATION, 1947).

Com o incremento do apoio ao Reino Unido junto a OTAN, além de ser uma
das lideranças dentro das Nações Unidas, o que poderia tornar-se um agravante
para as alianças latino-americanas quando de tratativas no comércio europeu,

15
[...] soubemos da possibilidade de ali haver petróleo [...] (Tradução nossa).
16
Disponível em: <http://www.revistaoutubro.com.br/edicoes/03/out3_04.pdf>. Acesso em: 15 ago.
2014.
35

inclusive na direção contrária ao do comunismo liderado pela União Soviética, caso


se opusesse a essa força internacional.

[...] os EUA mostraram-se um verdadeiro aliado da Inglaterra, inclusive


transmitindo-lhe informações obtidas por seus satélites, etc., embora sem
intervir militarmente [...] um dos mistérios da decisão argentina, que jamais
consegui penetrar, era a avaliação que teria sido feita de que os Estados
Unidos da América se manteriam neutros. [...] A Argentina era muito menos
importante para todos os seus planos. (GUERREIRO, 1992, p. 106).

Os EUA, ao mirarem a sua pátria-mãe e ao se aliar a então Comunidade


Econômica Europeia (CEE), no tocante a adoções de sanções econômicas à
Argentina, trará o rompimento do então desacreditado TIAR, que em outras palavras
significaria a “proteção” americana para a região.
Destarte a falência de confiança no TIAR, a América Latina se vê órfã ante o
conflito Norte-Sul, o que a deixou a mercê dos países, dotados de poder nacional
superior e, já organizados em sistemas coletivos, sejam econômicos ou mesmo de
defesa, como a CEE, OTAN etc.
Com esta leitura, o Brasil procurou não se aliar totalmente a nenhum dos
lados, devido às boas relações que queria manter após o conflito. Isto não significou
que não seríamos solidários à Argentina, pois conforme já foi demonstrado neste
trabalho houve um apoio velado àquele país, pela defesa da soberania pela
Argentina do arquipélago, desde os tempos do Brasil Império (1833).
A este fato podemos aliar o seguinte raciocínio: a Argentina, sem informações
providas por satélites, não poderia realizar um contra-ataque eficaz. Sua maior
possibilidade de obter na URSS um aliado de peso foi dissuadida através de
negociações secretas com os EUA, o que anulou a possibilidade de uso de arsenal
militar de origem soviética pelas forças portenhas. Soma-se também o fato do Brasil
fornecer apoio precário dentro de uma premissa que consistia o de “não
engajamento ostensivo”.
Em oposição aos apoios amealhados pelo Reino Unido contra a Argentina
destacamos o Peru, que foi o único país sul-americano a atender prontamente as
necessidades de Buenos Aires, com envio de aviões e armamentos, porém
tomavam cuidado com a rota de suprimentos, que precisava ser desviada do Chile,
que devido ao litígio pela posse do canal de Beagle com a Argentina, optou em ficar
ao lado do Reino Unido, e pôs à disposição suas bases e mísseis a serviço dos
36

britânicos, como forma de retaliação por não ter, naquela época sua contenda
resolvida com Buenos Aires.
Todavia, como já cediço neste trabalho, o apoio vital dos norte americanos
para sua pátria mãe mostrou o verdadeiro jogo geopolítico em relação as Américas,
em especial na sua parte sul.
A visão dos EUA para a América Latina é a de que as recém-democracias
têm eleito para os cargos majoritários representantes cujo mote vai de encontro aos
interesses da “Pax Americana”, sem contar com o aumento de rejeição ao povo
americano como sendo "neocolonizador".
A partir de 2008, aparece um grande óbice para a América do Sul, e que é um
desdobramento da guerra das Malvinas, a reativação da 4ª. Frota Americana, que
havia sido desativada em 1950. A justificativa norte-americana foi a de que as
democracias no Atlântico Sul (América do Sul e África), onde se inserem Brasil e
Argentina não estariam preparadas para combater ações terroristas, pirataria, tráfico
de pessoas e de armas, e por isso adotou esta medida. Contudo, na verdade, o que
dessumimos é o desejo dos EUA de conter o avanço da China na região, bem como
os interesses das empresas americanas nos recursos naturais recém-descobertos.,
no litoral desses países, onde em seu extremo sul encontra-se as Ilhas Malvinas,
onde recentemente foi descoberto reservas de petróleo.
37

6. BRASIL: NEUTRALIDADE INTERNACIONAL OU DEFESA DA NOVA ALIANÇA


ECONÔMICA
Si bien fue una causa justa, la guerra no se la
deseo a nadie. No es bueno para un país.”
Rubén Darío Martinelli, tesorero del Centro de
Veteranos de Malvinas de La Matanza

A dicotomia da política externa brasileira trouxe no tocante da análise da


política latino-americana um discurso no mínimo ambíguo. Refletindo o ocorrido no
conflito das Ilhas Malvinas, percebe-se que o Brasil deu claras indicações de
alinhamento com as pretensões argentinas, mesmo que o seu discurso oficial seja o
de não ingerência nos assuntos internos de outros países.
A política externa brasileira, que possuía maior capacidade dissuasória nos
anos 1970, soube tirar melhor proveito do conflito, lembrando que esta política,
segundo as palavras do professor Henrique Altemani de Oliveira, ditas em palestra
proferida na Universidade de São Paulo, em 11 de julho de 2000, é aquela que “[...]
projeta para outros Estados aspectos relevantes da política Interna de um Estado”.
(OLIVEIRA, 2000, não paginado).
O Itamaraty, nos anos 70 do século passado, tinha um poder maior, porém
com o desenvolvimento do país, as questões externas passaram a sofrer influência
de outras pastas ligados a Indústria e Desenvolvimento, Fazenda e Casa Civil. No
entanto, percebe que houve certa ausência da sociedade civil organizada
(empresariado) e o distanciamento da sociedade na questão das Malvinas.
Desta feita, a consequência lógica era a necessidade de conhecer os lados e
seus riscos. O Brasil, como cediço, apoiaria totalmente a Argentina, mas o risco de
eventual isolamento ante a comunidade de nações com as quais interagia levou a
repensar o direcionamento, tanto de sua realidade interna (para não haver reflexo do
conflito no território nacional) quanto de sua realidade externa.
Apesar do apoio e solidariedade no conflito à Argentina, o Brasil tinha clara
ciência da situação da qual poderia ter com o apoio americano ao Reino Unido e o
Brasil precisando de dinheiro externo para poder sustentar seu desenvolvimento e a
rolagem de sua dívida externa, não lhe restou alternativa, conforme explicita
Jaguaribe (1985):

[...] à semelhança dos Estados Unidos, mas em posição reversa à destes, a


crise das Malvinas também afetou de forma contraditória os interesses
38

brasileiros. Profundamente vinculado à economia internacional, tendo que


administrar uma enorme dívida externa que atingiu em fins de 1982 a casa
dos US$ 70 bilhões e deverá continuar a se avolumar por um prazo ainda
largo, o Brasil não pode colocar em risco a fluidez de suas relações
comerciais e financeiras com os países centrais [...].

Apesar de o governo brasileiro alegar ter sido pego de surpresa, inclusive


com relatos famosos de nosso então chanceler Saraiva Guerreiro, que se
encontrava em Nova Iorque, regressando de uma viagem à China, quando soube
pela Imprensa da invasão argentina, e não pelos canais oficiais do governo
brasileiro, as primeiras impressões de nosso chanceler, que depois foram publicadas
em livro de sua autoria ─ Lembranças de um empregado do Itamaraty ─, podem ser
expostas como:

Parecia óbvio, mas não tanto, embora tivesse sido dito de chofre. Havia
implicações importantes, que, senão a imprensa, pelo menos alguns
diplomatas estrangeiros perceberam claramente: 1) reconhecia-se o direito
argentino não como simples opção política de momento, inspirada em
circunstâncias regionais, mas em conseqüência de uma posição brasileira
mais que secular; 2) em nenhum momento se dizia nada sobre a ação
militar argentina, omissão que, nas circunstâncias da situação do Brasil, era
a forma mais suave de se dessolidarizar de tal ocupação; 3) dava-se ênfase
à solução pacífica, mesmo naquele momento, o que implicava o
favorecimento das iniciativas de negociação que evitasse o pior e, ao
mesmo tempo, indiretamente envolvia um critério adverso ao uso inicial da
força pela Argentina [...]. (GUERREIRO, 1992, p. 102).

Deve-se observar, por conseguinte, o não apoio dos EUA à Argentina em


detrimento do Reino Unido e demais países da Europa Ocidental, coloca o Brasil em
uma posição desconfortável, pois deixaria o país em evidência negativa com atores
globais.
A partir dessa compreensão de estratégia brasileira, qual seja, um discurso
oficial de neutralidade, porém, de atuação velada com apoio logístico à Argentina,
mostra-se o zelo de nossa diplomacia na condução desta questão da geopolítica sul-
americana.

Durante todo o episódio das Malvinas, foi necessário, como era natural,
manter boa coordenação interna, quer diretamente com outros ministérios,
quer com o Planalto. O presidente esteve a par e decidiu sempre com muita
segurança. Houve, entretanto, vários momentos de muita tensão. Em
algumas ocasiões, houve sondagens sobre possível fornecimento de armas
sofisticadas que, se atendidas, descaracterizariam nossa posição neutra.
39

17 18
Felizmente, não tínhamos tais armas (exocets de aviação, radar picket ,
etc.) e foi possível negarmo-nos a atender às sondagens, alegando
honestamente que não dispúnhamos de tais equipamentos. Cedemos um
ou dois Bandeirantes de patrulha, `bandeirulhas` na gíria da Aeronáutica.
Eram aviões muito úteis para fins essencialmente de defesa do litoral.
(GUERREIRO, 1992, p. 111).

Em suma, é importante compreender a construção do pensamento brasileiro,


com a variável de agradar a todos os atores envolvidos, porém, ciente do papel que
possuía na região.
Poderíamos aqui nos questionar se esta política é uma política de estado ou
de governo?
Em nosso sistema republicano, a formulação da política externa é
determinada pelo Presidente da República que possui a capacidade definida pela
Constituição Federal. Entretanto, quem a elabora é a Chancelaria (Ministério das
Relações Exteriores), com posterior aval do Presidente da República. A Política
Externa do Brasil ainda sofre na formulação influência de grupos ligados aos
ministérios da área econômica.
Salientamos que a Política Externa é uma política pública, porém o que a
difere das demais políticas reside no seu alcance, pois esta se dirige não apenas no
território brasileiro, e no caso em estudo, teve o âmago de agir mudando a realidade
do país em questão (no caso envolvendo a Argentina, Reino Unido, demais países
da América do Sul e EUA).
Esta política externa é elaborada em função da realidade internacional,
visando o contexto regional e tendo impacto direto e repercutindo dentro do âmbito
estabelecido no Atlântico Sul.
Tendo em vista esses preceitos, não poderíamos nos olvidar da dimensão
territorial que possuem Brasil e Argentina e da amizade recíproca. No tocante ao
conflito envolvendo as Ilhas Malvinas, desde a época da Regência do Padre Antônio
Feijó já havia documentos oficiais de apoio aos argentinos e de veemente protesto
ao governo de Londres.

17
Míssil antinavio ar-superfície (MAS), de origem francesa, designado como: MAS "Exocet". Nessa
época, o Brasil possuía somente mísseis superfície-superfície (MSS) "Exocet" (Nota nossa).
18
Radar picket (piquete radar) refere-se à classificação de uma plataforma radar, aérea ou de
superfície, que tem a finalidade de realizar a primeira detecção de um alvo aéreo ou de superfície,
em virtude de estar posicionada distante da própria força combatente, na direção da provável
ameaça (Nota nossa).
40

Brasil e Argentina são eternos rivais quando o assunto é tratado dentro das
quatro linhas do campo de futebol, porém, é inquestionável o grande potencial de
ambos, compreendido desde o Oiapoque até a Tierra Del Fuego e trata-se de
potenciais complementares, que em sinergia, trarão bons resultados a ambos os
países, desde que sejam aliados, superando o descrédito, sendo este um dos
motivos pelos quais o Brasil prestou apoio logístico à Argentina na Guerra das
Malvinas.
A possibilidade de perder o acesso aos mercados estadunidense e da Europa
Ocidental, leva o país a não participar desse conflito, porém, tendo em vista nosso
posicionamento firmado desde 1833 e explicitado em discurso proferido na Escola
Superior de Guerra pelo então Ministro das Relações Exteriores, Saraiva Guerreiro,
quando afirmou categoricamente que o Brasil sempre apoiou a reivindicação
argentina, ao referir-se do momento “[...] quando as Malvinas foram ocupadas pela
força pela Grã-Bretanha [...]” (GUERREIRO, 1982, não paginado).
Em 1982, estava em curso no Brasil, em conjunto com o Paraguai, aquela
que seria a construção da maior usina hidrelétrica, localizada na região da Tríplice
Fronteira, a Usina de Itaipu, que serviria para fomentar o crescimento brasileiro, com
incremento energético, gerando desenvolvimento e renda.
Entretanto, além das negociações com o governo paraguaio, visto o leito de o
rio ser um condomínio entre os dois países, a Argentina, com receio do
aproveitamento energético por parte do Brasil, posiciona Itaipu como um conflito
geopolítico de interesses.
Neste momento, há uma clara conotação estratégica de ampliação de
horizontes comerciais, com a nítida visão, dentro do panorama do Pragmatismo
Responsável19 do então presidente Geisel, onde o Universalismo20 encontra eco na
tentativa de obtermos mais parceiros que nos ofereçam maiores vantagens para
diminuirmos nossas dependências junto aos Estados Unidos da América.

19
Entendido como um plano geral de política externa, esse estilo de conduta da Chancelaria
brasileira teve nos Estados Unidos um dos fatores chave para sua própria definição. Além de visar
ao desenvolvimento nacional, tratava-se de uma postura não-alinhada, onde as ações tomadas pelo
governo poderiam variar de acordo com as circunstâncias. A inexistência de aliados preferenciais,
sem a definição a priori por um ou outro lado, e a busca por novos pólos de interação foram duas
características básicas da política externa de Ernesto Geisel (15 mar. 1974 a 15 mar. 1979).
Disponível em: <http://sumario-periodicos.espm.br/index.php/seculo21/article/viewFile/1822/100>.
Acesso em: 15 ago. 2014.
20
Universalismo – para efeitos didáticos, consideramos como a opinião ou ordem que não reconhece
outra autoridade maior, sendo a concepção formada o de consentimento universal. É a forma para
materializar um sistema, impor um sentido..
41

No tocante a América do Sul, é imprescindível não sermos beligerantes com a


Argentina. Por isso, assinamos em 19 de outubro de 1979 Acordo Tripartite de
Cooperação Técnico-Operativa sobre Corpus-Itaipu com intuito de colocar ponto
final em qualquer iniciativa que poderia se transformar em óbice e tornar ainda mais
complexa as difíceis relações com aquele país.
Destarte manter a paz com a Argentina significava não ter problemas com
este grande projeto capitaneado pelo Brasil. Portanto, não é coincidência, nem
acaso, a decisão governamental brasileira de oferecer suporte logístico à Argentina
na Guerra pelas Ilhas Malvinas21.
Outro fato de importante é de que o Brasil se refira ao arquipélago como ─
Ilhas Malvinas ─ e não Falkland Islands, o que denota per si o nosso pensamento,
que vem acumulado há mais de um século.
Porém além das questões petrolíferas, não foi visto com bons olhos pelos
EUA essa parceria velada do Governo brasileiro em apoio à Argentina pela posse
das Ilhas Malvinas, conforme nos relata Moniz Bandeira:

Ao governo de Washington não interessava, absolutamente que o Brasil,


cuja a presença se consolidava na África Ocidental – Angola, Guine Bissau
e Cabo Verde ─ e contribuía para sustentar o regime de esquerda, ao lado
da União Soviética e Cuba, passassem a dominar o Atlântico Sul,
juntamente com a Argentina. Não convinha que o Atlântico Sul, rota de
fundamental importância para a Segurança dos Estados Unidos se tornasse
visivelmente um “lago brasileiro” dado que o carregamento de petróleo do
Golfo Pérsico, circundando o Cabo da Boa Esperança, transitava por suas
linhas marítimas, com destino ao Caribe e à Europa Ocidental. E os
militares americanos receavam que URSS, com poderosa frota de
submarinos e cruzadores anti-submarinos, viesse a estabelecer bases no
Atlântico Sul, em Luanda e Cabo Verde. O fato de dominar a maior parte da
costa oriental daquele oceano e quase toda a extensão da rota do Cabo da
Esperança passando pelo gargalo de Natal e Dacar, até as proximidades da
Bacia do Caribe, conferia ao Brasil, portanto uma enorme relevância
estratégica para a proteção do tráfego marítimo. (2012, p. 160).

21
“O governo brasileiro reafirma seu apoio à complementação integral da Resolução 502 do conselho
de Segurança, referente a questão das Ilhas Malvinas. É de fundamental importância o papel que as
nações unidas podem e devem desempenhar no encaminhamento de uma solução pacífica e
negociada para essa questão que afeta de perto os países latino-americanos. O Brasil reitera, a
esse respeito, seu apoio aos direitos de soberania argentina sobre as Ilhas Malvinas e expressa sua
preocupação crescente com que se possa cogitar de uma militarização daquela área. É posição
brasileira que o Atlântico Sul deve permanecer uma área de paz e concórdia.” XXXVIII Sessão
Ordinária da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas – 1983 – Ministro Ramiro
Saraiva Guerreiro (ORGANIZAÇÃO, 1982b).
42

Pelo exposto, podemos dessumir que, apesar de nosso limitado apoio à


Argentina no conflito bélico22 e de nossos protestos constantes desde 1833 contra a
soberania britânica no arquipélago malvinense. Apesar de veladamente
contribuirmos para a logística bélica argentina no conflito, não podemos nos olvidar
de que possuímos uma política de Estado em relação a este fato.
Aqui, não se trata apenas de solidariedade com nossos “hermanos”23, mas
sim, pela égide de nossa Política Externa e ainda mais pela posição brasileira sobre
a ZOPACAS, cujo objetivo primaz é de cooperação em defesa e segurança no
entorno estratégico do Atlântico Sul.
Porém, há esse óbice da presença britânica, que não é membro deste
organismo internacional, mas que possui diversos enclaves, com objetivo de efetuar
monitoramento de forças militares no Atlântico Sul e, também, explorar riquezas no
solo e subsolo marinho. A cobiça vem sendo despertada devido à descoberta
recente de riquezas, principalmente petróleo na costa sul-americana e africana,
inclusive na região aqui estudada.
Não é de hoje que o Reino Unido tem forte interferência dentro da história da
América Latina. Estudos nos levam a crer que a abolição da escravatura de 1888,
ocorrente no Brasil foi um trâmite para o crescimento dos mercados europeus
(britânicos) com seus produtos industrializados, ampliando o público consumidor. As
constantes dívidas contraídas, através de empréstimos, levaram os países sub ou
em desenvolvimento a abrir ou favorecer o seu mercado interno aos países
fornecedores de produtos industrializados.
Outro episódio que marcou as relações continentais sul-americanas no seu
quadrante centro-leste foi a Guerra do Paraguai, que teve financiamento britânico
provido à Tríplice Aliança24, em nome de seus interesses fundamentais. O Reino
Unido via o Paraguai como uma verdadeira ameaça mercantil, o que a levou a

22
“A Chancelaria apoiou a resolução do Conselho de Segurança da ONU, em seus três aspectos
coerentes com a conduta tradicional (cessação das hostilidades, retirada de tropas argentinas,
negociação), mas ressalvou o direito argentino sobre as ilhas e manteve uma neutralidade favorável
ao país vizinho, ao perceber que contra ele se voltava todo o Norte. A crise revelou que a OEA
tornar-se impotente para solucionar quaisquer conflitos, que a OTAN preponderava sobre o TIAR,
que ao Brasil mais uma vez foi útil sua estratégia global de não-confrontação externa, ao servir de
locutor entre Argentina e Grã-Bretanha.” (CERVO, 2002, p. 453).
23
“[...] a diplomacia brasileira, quando reagiu diante da derrota da Argentina, buscou salvar a unidade
da América Latina de forma realista, evitando desvios introspectivos que a haviam comprometido no
passado, e mirou o lado do entendimento com a Argentina, que a ocasião poderia reforçar em favor
de um processo gradual e flexível de integração, mais tarde efetivamente iniciado.” (CERVO, 2007,
p. 209).
24
Brasil, Argentina e Uruguai (Nota nossa).
43

induzir a países vizinhos a se oporem ao este país irmão, num conflito que o levou a
grandes endividamentos. Futuramente o Paraguai tornar-se-ia parceiro comercial
dos aliados que o combateram,
Com suas dimensões continentais, o Brasil sempre despertou grande
interesse comercial por parte dos os países europeus, inclusive o Reino Unido.
Sendo a única potência dentro da América Latina, que não foi colonizada pela
Espanha, firmou muitas parcerias com a "Coroa britânica", durante toda sua história,
através da "Coroa portuguesa". É válido lembrar que a Independência do Brasil
(1822) teve o aval dos capitalistas ingleses e que a abertura de nossos portos às
nações amigas, ainda sob a égide da administração portuguesa, proporcionou aos
ingleses atraentes tributos de importação.
O Brasil, a cada década, vem mostrado o seu potencial para crescer e
fortalecer suas alianças comerciais e políticas, o que não foi diferente nas últimas
décadas do século XX e, vem se perpetuando nessas duas primeiras do presente
século.
Porém, precisamos deixar evidenciado que apesar de nosso crescimento
bélico25, em 1982, não podíamos fazer frente às potências unidas (então
hegemônicas), e eventualmente um conflito da mesma natureza travado em nosso
território poderia expor nossa fragilidade.
Neste ponto, merecem cuidado as palavras de Jaguaribe (1985, p. 14-16),
que assim expõe:

[...] o segundo conjunto de reações que me parece merecer destaque,


também por sua relevância e adequação, são as suscitadas pela crise das
Malvinas entre altos escalões de nossas Forças Armadas, inclusive os
então ministros da Aeronáutica e da Marinha, que ressaltaram [...] a alta
vulnerabilidade a que ora se encontra sujeito o país.
A crise das Malvinas [...] deixou evidenciado o estado de impotência em que
presentemente se encontra o Brasil. Impotência de caráter instrumental,
pela falta de apropriado equipamento moderno (como submarinos e mísseis
auto-dirigíveis) de defesa. Impotência, em sentido profundo, pela alta
dependência do país de suprimentos externos de petróleo que, por sua vez,
dadas as nossas condições, dependem do sistema financeiro ocidental.
Impotência, também em sentido profundo, pela atual incapacidade da
sociedade brasileira, em virtude de seus baixíssimos índices de integração

25
“[...] se concordássemos com um ato de força para resolver uma questão territorial, estaríamos
abrindo o flanco para que, amanhã, nossas conquistas diplomáticas fossem contestadas pela força
[...] todas as nossas conquistas, notadamente com o Tratado de Madri (1750), que estabeleceu
nossos limites no rio da Prata, das Missões, do Oiapoque, bem como a questão com a Guiana
Inglesa, em que fomos vencidos, foram diplomáticas. O Brasil definiu sua extensão sem nenhuma
resistência bélica, mas sempre com tratados. Ou seja, no campo do direito.” (ARINOS FILHO,
2001).
44

social, de assumir sacrifícios coletivos e enfrentar consistentemente uma


séria contingência nacional. Mas impotência, finalmente, também de caráter
militar, pelo despreparo de nossas Forças Armadas, que há vários anos
foram conduzidas a se concentrarem em funções policiais e de contra-
insurgência, com sacrifícios de suas verdadeiras funções na defesa
nacional [...].

A Guerra das Malvinas, mais que uma busca territorial da Argentina, para o
que ainda existe um apoio velado da nossa força de persuasão, traz um grande
interesse pela manutenção da soberania, de nossos parceiros, dos usos do Atlântico
Sul, que comporta as principais vias marítimas comerciais do Brasil, Argentina e
demais países do subcontinente.
Contudo, àquela época, já vislumbrávamos no conflito uma oportunidade
ímpar de nos aproximarmos da Argentina. Além dos acordos já mencionados, havia
a negativa americana de apoiar Buenos Aires, mesmo cientes de que anteriormente
a apoiavam e tinham uma aliança com a ditadura argentina, inclusive com
treinamento militar e formação de uma composição antiguerrilha auxiliar, que era
inclusive imune as leis dos Estados Unidos da América. Isto aumentava o nosso
espaço e oportunidades de integração geopolítica.
A recusa fez com que o general Galtieri, então presidente da Argentina,
apostasse, no mínimo, na quase certa neutralidade americana, mas o vínculo que
une os Estados Unidos e o Reino Unido se mostrou mais consistente. O apoio
logístico prestado incluiu armas, armamento, informações e até mesmo a função
logística de apoio de base na Ilha de Ascensão (base militar).
É inegável que o descobrimento de novos poços petróleos na região das
Malvinas pode fortalecer uma parceria científico-econômica entre Brasil e Argentina,
quiçá o Mercosul, que pode se destacar dentro do cenário econômico internacional.
Ao mesmo tempo, alianças comerciais com o Brasil, Rússia, Índia, China e África do
Sul (BRICS), e a União Europeia uma forma de resistir e reestruturar esses acordos,
até mesmo por parte do governo argentino, com os demais centros de comércio.
Hoje o Brasil com sua crescente importância internacional, como por exemplo
com a presença de tropas de paz no Haiti, e destaque comercial sendo um dos
destinos para investimentos estrangeiros, bem como o crescimento de suas divisas
externas e confiança na sua economia potencializa a força de sua voz em prol de
uma convicção, na qual, mesmo que de forma tímida atenda os interesses
comerciais de seus parceiros. Lembrando que é da essência brasileira, defender
45

antes de quaisquer conflitos armados a mediação através de uma negociação


pacífica, tradição esta consolidada em nosso Itamaraty.
Como exemplo de ações que reforçam esse apoio ao governo argentino, é o
caso da determinação do Presidente da União de Nações Sul-Americanas
(UNASUL) que proibiu a atracação de navios com bandeira das Ilhas Malvinas em
portos de países do bloco (BLOCO, 2011).
Porém em decorrência da dependência da economia argentina em relação ao
mercado global, seu sucesso no feito depende de outros fatores, e o mundo assiste
a um misto de ceticismo e desilusão com essa relação que mais nos remonta a
época da independência, agora já não mais da Espanha, mais sim de uma Grã-
Bretanha forte que parece não almejar negociar a soberania e nem ao menos sentar
para conversar, a mesas de negociações, para pontuar condições ou mesmo
cláusulas e prazo para devolução.
É sob o prisma do dinamismo atual da Argentina, em especial na economia e
na política, que a soberania das Malvinas é usada por alguns presidentes argentinos
para disfarçar o fracasso de planos econômicos e há um nacionalismo “camuflado”,
difundida entre a mídia nacional argentina.
Entretanto, essa força tem sido infrutífera no sentido de estabelecer uma
consciência na população, tornando-se uma válvula de escape para fugir da
realidade, a fim de proporcionar a troca de atenção do povo do insucesso político e
econômico como condições pré-estabelecidas e desejadas pelos governantes e criar
uma "massa de manobra" antiimperialista, com viés nacionalista.
Enquanto o Estado argentino tenta através de uma negociação por intermédio
das Nações Unidas em retomar definitivamente o arquipélago, o Reino Unido se
recusa em participar de negociações para um possível acordo entre os dois países,
reflexo do que se deu no plebiscito, ocorrido em março de 2013, no qual 98,8% dos
kelpers optaram por permanecer como súditos do governo inglês (MALVINAS,
2013).
46

7. CONCLUSÃO
O conflito ocorrido em 1982 trouxe algumas lições das quais podemos tirar
diversos ensinamentos. O primeiro, se analisarmos pelo lado argentino,
verificaremos um relativo “amadorismo” pela forma equivocada na qual se lançou na
guerra, pois, ao proceder a análise de diversas obras e estudos, vimos a adoção de
um procedimento estritamente militar, com informações desencontradas e ainda sem
contar com uma estrutura profissional; como por exemplo: sem que um "Gabinete de
Crise"26 tivesse sido criado pela Argentina.
Não podemos concordar, tendo em vista o lado argentino, com a ausência de
um plano estratégico e sua conseqüente aceitação das FA, meio político do país e
da opinião pública, pois em um conflito, mister o apoio de todos estas forças citadas,
com o objetivo de dar o suporte moral às tropas no prosseguimento da campanha
militar.
Porém, percebemos que a Argentina não possuía os mesmos meios militares
do Reino Unido, e nem o respaldo internacional, visto, por exemplo, a falta de apoio
norte-americano apesar da existência e dos compromissos mútuos gravados nas
páginas do TIAR, o que demonstra uma falha na diplomacia, pois a ausência de uma
concertação diplomática dificultou a obtenção do auxílio para as tropas argentinas,
pois como é cediço, uma atuação firme e ágil da chancelaria argentina poderia ter
garantido apoio institucional e suprimentos bélicos no decorrer do conflito, além da
possibilidade de serem obtidos empréstimos e auxílios oriundos do exterior.
Com a invasão de Porto Stanley, houve uma imediata reação por parte do
Reino Unido de congelar os valores pertencentes à Argentina em solo britânico,
porém, já se sabia que o país portenho teria transferido para outro país uma soma
vultosa dias antes do início das operações, o que já demonstrava fortes indícios de
que alguma operação militar poderia se concretizar.
Outrossim, e em solidariedade a um membro do bloco europeu, a então
Comunidade Econômica Europeia (CEE), hoje União Europeia, impôs sanções
econômicas, datadas de 5 de maio de 1982, o que refletiu na circulação monetária e

26
Gabinete de Crise deve reunir todos que desempenham papel preponderante na adoção de
providências para impedir a crise ou administrar suas consequências. Inclui membros permanentes,
a critério da organização, e integrantes eventuais, de acordo com a situação. Às vezes, o gabinete é
ativado antes da crise para que aja de forma proativa. Disponível em:
<www.cnmp.mp.br/.../GERENCIAMENTO__DE__CRISES.__artigo_Nov...>. Acesso em: 15 ago.
2014.
47

restringiu fortemente o aumento do aparato militar argentino, pela aquisição de


suprimentos, equipamentos e de material bélico.
Já pelo lado do Reino Unido, que passava por uma crise econômica e política,
viu na atuação de suas FA, o fortalecimento do governo da então primeira-ministra
Margaret Thatcher, que contou com o "não apoio" americano a Buenos Aires, o que
minou uma eventual possibilidade de resistência argentina.
Os EUA, digno de nota, auxiliaram sua pátria-mãe, com informações de seu
serviço de informações, bem como a cessão para utilizar a ilha de Ascensão, no
meio do Atlântico Sul, que apesar de ser britânica, está arrendada aos EUA.
Destarte estes acontecimentos, o Reino Unido optou pela via do bloqueio
naval, visto a superioridade sobre a Argentina, mesmo com os constantes cortes das
verbas da Royal Navy feitas em governos anteriores, obteve no momento da entrada
no conflito uma mobilização da opinião pública, principalmente após a divulgação de
fotos de soldados sob a custódia dos militares argentinos.
Não podemos nos olvidar de dois fatos de grande importância para
elucidarmos este imbróglio, na qual houve uma vantagem considerável por parte do
Reino Unido, senão vejamos: no dia 8 de maio de 1982, reunidos os membros da
OTAN, decidiu por apoiar os ingleses, e assim contarem a seu favor com o aparato
desta instituição, que inclusive tem como um dos membros fundadores os EUA, que
ao seguirem esta direção praticamente põe em letra morta o TIAR, na qual contava
a Argentina para o auxílio de sua defesa.
Para acrescentar a este fato soma-se a Resolução nº 502, de 3 de abril de
1982, do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas que, sobre a
invasão das Ilhas Malvinas (Falklands) pela Argentina, dispõe: “1. Demanda uma
imediata cessação das hostilidades; 2. Demanda a retirada imediata de todas as
forças argentinas das Ilhas Falklands (Ilhas Malvinas);”27 (ORGANIZAÇÃO, 1982b,
não paginado).
Estes dois fatos dão um ânimo maior as pretensões inglesas, em detrimento
das argentinas. Do conflito, o Brasil, deu apoio logístico velado à Argentina, que
anos depois veio a ser recompensado pela superação de diferenças entre os dois
países.

27
Texto original: "1. Demands an immediate cessation of hostilities; 2. Demands an immediate
withdrawal of all Argentine forces from the Falkland Islands (Islas Malvinas);" (ORGANIZAÇÃO,
1982, não paginado) (Tradução nossa).
48

Desse modo, cabe perguntar por que o potencial nacional não era o suficiente
forte para intervir no conflito. Se o país tivesse consciência de seu papel dentro da
geopolítica do Atlântico Sul Ocidental, este conflito ganharia outros entornos.
Temos como séria ameaça a cobiça estrangeira pelas riquezas do Atlântico
Sul, bem como o crescente investimento chinês, inclusive na Argentina.
Há, outrossim, tendo em vista as riquezas descobertas anteriormente
mencionadas, uma possibilidade de um novo conflito bélico, visto que temos a
presença de atores extrarregionais (no caso o Reino Unido, mas com apoio norte-
americano).
Devemos aproveitar os laços que temos em comum com a Argentina e
aprofundar nossa integração, dificultando a ação de Estados estrangeiros em nosso
berço.
Organismos como o Mercosul devem servir para unir seus países-membros e,
de maneira uníssona, proteger interesses comuns da região, para o bem de todos,
de modo a não se tornar palco de políticas degradantes e retóricas lastimáveis, visto
que as demais potências já preparam um teatro de operações belicoso para a área
de nosso entorno estratégico sob a desculpa de proteger os recursos naturais para o
mundo.
Considera o autor que, resta comprovar o dado acima, se olharmos com
atenção a movimentação das grandes potências. Os EUA criaram em 2007 o Africa
Command (AFRICACOM) e anunciou a reativação da 4ª. Frota no Atlântico Sul, bem
como a China já conta com a presença de conselheiros militares na região do
Atlântico Sul.
Apesar de Brasil e Argentina possuírem hoje democracias revigoradas recém
saídas de ditaduras militares, a estabilidade institucional também deve ser precedida
de uma paz social e econômica, no entanto, a Argentina, nos dias atuais, sofre uma
grande crise econômica, e estas crises levam os governos a tomarem posições
desfavoráveis, impensadas.
O conflito de 1982 foi gerado em um momento de crise onde o governo
argentino pressupôs que, com a vitória no conflito, iria obter vantagens na política
interna. Situação semelhante vivia o Reino Unido, onde o governo trabalhista de
Margareth Thatcher não encontrava grande apoio popular, porém, com a vitória em
49

um conflito distante, garantiu sua reeleição em 1983 e imprimiu naquele país uma
guinada liberal, com apoio dos EUA e de seu presidente Ronald Reagan.
Para tanto, algumas conclusões se fazem sentir, porém a mais importante
reside no fato de que devemos nos conscientizar acerca da importância em
nacionalizarmos nosso material bélico, em especial os que dizem respeito a:
munição; e sobressalentes para equipamentos das forças armadas, i.e. os meios
aéreos, terrestres e navais.
Não só nos dias atuais, mas como na época do conflito em estudo (1982),
nosso material bélico carecia de padronização, e num país de dimensões
continentais como o Brasil é necessário possuirmos tecnologia de ponta para a
construção de portos móveis para prover o devido apoio logístico, caso novamente
ocorra um conflito similar novamente envolvendo nosso país ou nossos vizinhos com
potências estrangeiras.
Por fim, temos que admitir que possuímos uma relativa inoperabilidade no
que tange as nossas defesas, sejam elas terrestres, marítimas ou aéreas, o que
restringe nossa capacidade de defender nossos potenciais energéticos. Mister a
integração regional, visando o fortalecimento de políticas sérias, sem partidarismo,
pois o viés é o de defender os Estados e as riquezas da região, visando o bem
comum de argentinos, brasileiros e demais vizinhos.
Investir em defesa é consagrar o futuro e perpetuar as nossas gerações um
legado de paz e harmonia, a oportunidade nos é dada, somos jovens como nação,
porém podemos perder todo nosso arcabouço, se dele não prosperarmos e não
garantirmos o sucesso de nossa jornada.
Temos que ter em mente, se levarmos em consideração o nosso papel de
estarmos comprometidos com nossos irmãos da América Latina de preservar a paz,
porém não podemos nos olvidar de que qualquer que seja a natureza de um
determinado conflito armado, este não pode estar circunscrito tão somente em
aspirações locais e regionais, se deste lhe restar inconsistência.
50

REFERÊNCIAS

ARINOS FILHO. Afonso. Diplomacia independente: um legado de Afonso Arinos.


São Paulo: Paz e Terra, 2001.

BANDEIRA, L. A. Moniz. Guerra das Malvinas: petróleo e geopolítica. Revista


Espaço Acadêmico, ano 11. n. 132, p. 157-165, maio 2012. Disponível em:
<periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/.../9113>. Acesso em: 6
jun. 2014.

BLOCO proíbe navios com bandeira das Ilhas Malvinas. Estado de São Paulo, São
Paulo, 21 dez. 2011. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/
noticias/impresso,bloco-proibe-navios-com-bandeira-das-ilhas-malvinas--
,813622,0.htm>. Acesso em: 10 mar. 2014.

BRANDÃO, L.; SOARES, M. R. L. “Navios de madeira, homens de ferro”: A


problemática das relações internacionais da Guerra das Malvinas (1982). Revista de
Relações Internacionais e Economia – RECRIE, Santo André, n. 1, dez. 2009.
Disponível em: <http://www3.fsa.br/proppex/recrie/numero1/recrietexto52009.pdf>.
Acesso em: 6 jun. 2014.

BRASIL. Ministério da Marinha. Centro de Informações da Marinha. Informe


indeterminado, nº 17.852, Secreto, Urgente: sem assunto. Brasília, 1982. Enviado
por mensagem eletrônica DE Edgar Sprezzapia ao autor do TCC, em 17 de maio de
2014.

CARDOSO, C. D; CARDOSO, O. V. As Malvinas são argentinas? Revista Tribunal


Regional Federal da 1ª Região, Rio de Janeiro, v. 22, n. 5, p. 53-56, maio 2010.
Disponível em: <http://www.jus.com.br/artigos/14478/as-malvinas-sao-argentinas>.
Acesso em: 13 jun. 2014.

CASADO, José; OLIVEIRA, Eliane. País temia um conflito de “grandes proporções”


nas ilhas Malvinas O Globo, Rio de Janeiro, 21 abr. 2012. Disponível em: <
http://oglobo.globo.com/brasil/pais-temia-um-conflito-de-grandes-proporcoes-nas-
ilhas-malvinas-4707912 >. Acesso em: 15 maio 2014.

CERVO, A. L. Relações Internacionais da América Latina: velhos e novos


paradigmas. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.

______; BUENO, C. História da Política Exterior do Brasil. 2. ed. Brasília: Editora


UnB, 2002.

COLOMBO, Sylvia. Economia anima moradores das Malvinas. Folha de S. Paulo,


Buenos Aires, 22 jan. 2012. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/21435-economia-anima-moradores-das-
malvinas.shtml>. Acesso em: 15 mar. 2014.
51

DOBSON, Wille. Antecedentes políticos-diplomáticos do conflito das Ilhas


Malvinas: palestra proferida em na Escola de Guerra Naval. Rio de Janeiro, 13 ago.
2007.

GOEBEL, J. La pugna por las islas Malvinas. Buenos Aires: Yale University Press,
1951.

GROUSSAC, P. Las islas Malvinas. Buenos Aires: Lugar Editorial, 1982.

GUERREIRO, R. S. Lembranças de um empregado do Itamaraty. São Paulo:


Siciliano, 1992.

IGLESIAS, F. A. La cuestión Malvinas: crítica Del nacionalismo argentino. Buenos


Aires: Aguilar, 2012.

INGLESES invadem Malvinas. Folha de S. Paulo, São Paulo, ano 62, n. 19.407 p.
1, 22 maio 1982. Disponível em: <http://acervo.folha.com.br/fsp/1982/05/22/2/>.
Acesso em: 15 maio 2014.

JAGUARIBE, H. Reflexões sobre o Atlântico Sul: América Latina e Brasil ante a


desarticulação do sistema interamericano. Rio de Janeiro: Paz e Terra: Instituto de
Estudos Políticos e Sociais - IEPES. 1985. (Coleção Debates; v. 3).

MALVINAS aprovam domínio britânico. G1, São Paulo, 11 mar. 2013. Disponível
em: <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2013/03/malvinas-aprovam-dominio-
britanico.html>. Acesso em: 10 mar. 2014.

MOREIRA, Artur L. S., 2008. apud RIBEIRO, Ana K. L et al. Conflitos das Ilhas
Malvinas: análise da disputa diplomática Argentina–Inglaterra. Âmbito Jurídico, Rio
Grande, v. 16, n. 112, maio 2013. Disponível em: <http://www.ambito-
juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13191&revist
a_caderno=16>. Acesso em: 14 maio 2014.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Assembléia Geral. Resolução 1514, de


14 de dezembro de 1960. Declaração sobre a concessão da independência aos
países e povos coloniais. Nova Iorque, 1960. Disponível em: <http://daccess-dds-
ny.un.org/doc/RESOLUTION/GEN/NR0/152/88/IMG/NR015288.pdf?OpenElement>.
Acesso em: 27 jul. 2014.

______. ______. Resolução 3160, de 14 de dezembro de 1973. Questão das Ilhas


Falklands (Malvinas). Nova Iorque, 1973. Disponível em:
<http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/3160%28XXVIII%29
&Lang=E&Area=RESOLUTION>. Acesso em: 27 jul. 2014.

______. ______. Resolução 31/19, de 24 de novembro de 1976. Respeito pelos


Direitos Humanos em Conflitos Armados. Nova Iorque, 1976. Disponível em:
<http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/31/19&Lang=E&Area
=RESOLUTION>. Acesso em: 27 jul. 2014.
52

______. ______. Resolução 37/9, de 4 de novembro de 1982. Questão das Ilhas


Falklands (Malvinas). Nova Iorque, 1982 Disponível em:
<http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/37/9&Lang=E&Area
=RESOLUTION>. Acesso em: 27 jul. 2014.

______. ______. Resolução 39/6, de 1 de novembro de 1984. Questão das Ilhas


Falklands (Malvinas). Nova Iorque, 1984. Disponível em:
<http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/39/6&Lang=E&Area
=RESOLUTION>. Acesso em: 27 jul. 2014.

______. ______. Resolução 40/21, de 27 de novembro de 1985. Questão das


Ilhas Falklands (Malvinas). Nova Iorque, 1985. Disponível em:
<http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/40/21&Lang=E&Area
=RESOLUTION>. Acesso em: 27 jul. 2014.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Assembleia Geral. Resolução 41/11, de


27 de outubro de 1986. Declaração de Zona de Paz e Cooperação no Atlântico Sul.
Nova Iorque, 1986a. Disponível em:
<http://www.un.org/documents/ga/res/41/a41r011.htm>. Acesso em: 27 jul. 2014.

______. ______. Resolução 41/40, de 25 de novembro de 1986. Questão das


Ilhas Falklands (Malvinas). Nova Iorque, 1986b. Disponível em:
<http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/41/40&Lang=E&Area
=RESOLUTION >. Acesso em: 27 jul. 2014.

______. ______. Resolução 42/19, de 17 de novembro de 1987. Questão das


Ilhas Falklands (Malvinas). Nova Iorque, 1987. Disponível em:
<http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/42/19&Lang=E&Area
=RESOLUTION>. Acesso em: 27 jul. 2014.

______. ______. Resolução 43/25, de 17 de novembro de 1988. Questão das


Ilhas Falklands (Malvinas). Nova Iorque, 1988. Disponível em:
<http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/43/25&Lang=E&Area
=RESOLUTION>. Acesso em: 27 jul. 2014.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Conselho de Segurança. Resolução 502,


de 3 de abril de 1982. 1982b. Disponível em:
<http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=S/RES/502%281982%29>.
Acesso em: 27 jul. 2014.

ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Declaração sobre a Questão da


Ilhas Malvinas. AG/DEC. 70 (XLII-O/12). Cochabamba, 2012. Disponível em:
<http://www.oas.org/pt/42ag/>. Acesso em: 15 ago. 2014.

ORGANIZATION OF AMERICAN STATES. Inter-American Treaty of Reciprocal


Assistance. Rio de Janeiro, 1947.

PAMPA Azul: primer plan estratégico de investigación del Mar Argentino: Cristina
Fernández de Kirchner presentó la Iniciativa Pampa Azul, un proyecto estratégico de
exploración, investigación y conservación del Mar Argentino. Buenos Aires:
53

Argentina.ar, 21 abr. 2014. Disponível em:


<http://www.argentina.ar/temas/cristina/27644-pampa-azul-primer-plan-estrategico-
de-investigacion-del-mar-argentino >. Acesso em: 15 ago. 2014.

PORRO, Alessandro et al. Cartada de última hora: A Argentina dispõe-se negociar,


propõe fórmulas de difícil aceitação por Londres ─ e os EUA jogam pesado para
obter paz nas Malvinas. Veja, São Paulo, n. 711, p. 28-33, 21 abr. 1982. Disponível
em: <http://veja.abril.com.br/acervodigital/>. Acesso em: 15 ago. 2014.

REAGAN, Ronald. The Reagan Diaries. Nova York: HarperCollins Publishers, 2007.

RIBEIRO, Ana K. L et al. Conflitos das Ilhas Malvinas: análise da disputa diplomática
Argentina–Inglaterra. Âmbito Jurídico, Rio Grande, v. 16, n. 112, maio 2013.
Disponível em: <http://www.ambito-
juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13191&revist
a_caderno=16>. Acesso em: 14 maio 2014.

ROMERO, L. A. História contemporânea da Argentina. São Paulo: Zahar, 2006.

SAKAMOTO, Y. O contexto global da democratização. Tradução de Isa Mara Lando.


Lua Nova, São Paulo, n. 23, p. 131-144, mar. 1991. Apresentado na Conferência
Aprofundando e Globalizando a Democracia - Yokohama, Japão, 17 a 22 mar. 1990.
Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ln/n23/a09n23.pdf>. Acesso em: 15 ago.
2014.

SANTOS, R. M. R. Malvinas ou Falklands? Um estudo comparado entre os


posicionamentos do Brasil e do Chile no conflito anglo-argentino de 1982 e suas
implicações para as relações interamericanas. 2010. 130f. (Mestrado em História
Comparada) - Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade Federal do Rio
de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. Disponível em:
<http://www.livrosgratis.com.br/arquivos_livros/cp152010.pdf>. Acesso em: 5 mar.
2014.

SPREZZAPIA, Edgar. Uso de aeroportos brasileiros por argentinos. Rio de


Janeiro, 17 de maio de 2014. Enviado por mensagem eletrônica para o autor do
TCC.

Você também pode gostar