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Li SÉRIE CRESCER: PROGRAMA DE CAPACITAÇÃO BÍBLICA-TEOLÓGICA-PRÁTICA

Copyright © 2009 José


Roberto de Oliveira Chagas

CHAGAS, José Roberto de Ourara


Noções de Hermenêutica - Análise Crítica, Histórica e Teologia da Interpretação
Bíblica (Série CRESCER; Programa de Capacitarão Bíblka-Teológjca-Prárica - VoL
5)/José Roberto de Oliveira Chagas. Campo Grande (MS): Génesis, 2009
índices para catálogo sistemático:
2. Bíblia: Hermenêutica - Metodologia - CDD 230
___________________________________________________

Responsável pelo projeto editorial/gráfico/capa:


Egnaldo Martins dos Santos
egna78@hotmail.com Revisão de Arquivos: Mota
Júnior
motajunior7@gmail. com Editor: Márcio Alves Figueiredo 1»
impressão: Fevereiro de 2009 - Quantidade: 1.000 exemplares 2*
impressão: Maio 2009 - Quantidade: 1.000 exemplares 31
impressão: Agosto 2009 - Quantidade: 1.000 exemplares

IDEALIZAÇÃO E REALIZAÇÃO DO PROJETO:


EDITORAS MUNDIAL, KENOSIS E GÊNESIS
Contato: Gênesis Editora -Rua: Albert Sabin,
721, Taveirópolis - Campo Grande/MS -FONE:
67 3331-8493/3027-2797
www.genesisedttora.com.br

DEDICATÓRIA:
A cada profissional/consultor de venda da Mundial Editora e Gênesis Editora, que faz seu
trabalho com empenho, prazer e dedicação, que está ciente de que não apenas vende livro, mas,
sim, espalha saber, fomenta a educação, ajuda o povo brasileiro a realizar sonhos:

"Oh! Bendito o que semeia Livros... livros


à mão-cheia... E manda o povo pensar! O
livro caindo nalma E gérmen - que faz a
palma, E chuva - que faz o mar" (Castro
Alves)

Contato com o LBAC: Fone: (67) 3028.1788/9982.3881: IBAC - Instituto


Bíblico-Teológico Aliança Cristã (A.B.K. Associação Beneficente Kenosis)
Rua: Praça Cuiabá, n" 111, Bairro: Amambaí -Campo Grande - Mato
Grosso do Sul - CEP: 79.008-281 E-mail: chagas.ihac@gmail.com
Li SÉRIE CRESCER: PROGRAMA DE CAPACITAÇÃO BÍBLICA-TEOLÓGICA-PRÁTICA

PREFÁCIO À SÉRIE CRESCER

O IBAC-Instituto Bíblico-Teológico Aliança Cristã,


órgão vinculado a Associação Beneficente Kenosis - A.B.K. - está de
parabéns. A iniciativa de oferecer aos interessados em conhecer melhor a
Teologia Cristã através da Série CRESCER - Programa de Capacitação
Bíblica e Teológica - é brilhante, fantástica, oportuna, louvável,
exemplar! Esta proposta relevante e inovadora trará entre outros
benefícios a quem tiver a oportunidade de conhecê-la:
1. Direção - quem estuda a Bíblia com motivação correta jamais
perderá o senso de direção e de propósito; a Bíblia é o mapa que mostra o
caminho de Deus para conduzir o seu povo na rota certa.
2. Proteção - o embasamento bíblico-teológico capacita o cristão a
identificar e a refutar com veemência as "doutrinas" pseudo-cristãs
propagadas por hereges, embusteiros, religiosos profissionais que tentam
ludibriar as pessoas para lograr lucros pessoais.
3. Provisão - a Bíblia proporciona a seus leitores e praticantes uma
consciência iluminada e crítica, como também supre a sua fome
espiritual, alimenta sua alma, cristaliza saudavelmente sua fé.
Este programa foi elaborado com a finalidade de reciclar quem já
teve a oportunidade de cursar Teologia como auxiliar quem procura
desenvolver o espírito auto-investigativo, ampliar a capacidade de
entender/expor/praticar a Bíblia, desenvolver o espírito de servir a Deus e
ao próximo, conhecer mais a ciência teológica e, porém, não sabia como
atingir tais objetivos - outras vezes, apesar de interesse em crescer no
conhecimento, não dispunha de tempo e recursos.
Li SÉRIE CRESCER: PROGRAMA DE CAPACITAÇÃO BÍBLICA-TEOLÓGICA-PRÁTICA

A Série CRESCER não pretende fazer apologia a uma Teologia


meramente intelectual, academicista, técnica, inacessível, complexa. Sua
proposta é, sobretudo, uma Teologia popular. Esta iniciativa, aliás, levou
em consideração o fato de que a maioria das pessoas a ser contemplada
pelo projeto seria, com todo respeito, provenientes de classes mais
simples. Isso não significa, porém, que uma pessoa mais dotada de
acuidade intelectual ou recursos econômicos está proibida de ter acesso à
série. Pelo contrário. Todos são bem-vindos. Quanto a Teologia erudita,
no sentido positivo do termo, ficou para outros compêndios teológicos e
autores mais capacitados e está à disposição dos interessados em editoras
especializadas no segmento ou nas ótimas instituições de capacitação
teológica credenciadas pelo M.E.C.
O autor procurou comentar cada disciplina deste programa com
clareza, simplicidade, objetividade. Alguns termos teológicos não podem
ser simplificados facilmente, mas, em tais caos, o professor empenhou-se
em esclarecê-los em seguida. A ideia de simplificação considerou o fato:
a Igreja Evangélica no Brasil carece de estudos bíblicos-teológicos
contextuais, relevantes, coerentes, práticos, mas também diretos,
concisos, objetivos.
A Série CRESCER não foi projetada para fornecer muitas
informações e detalhes. Logo, seus temas precisam de comentários,
discussão, reflexão, ampliação enfim. Desde que o M.E.C, reconheceu
Teologia como curso de nível superior as exigências se intensificaram; o
mesmo, para ser aceito, deve preencher vários requisitos. Informe-se. O
que o IBAC pode oferecer é um curso livre com ênfase em
aperfeiçoamento; não há caráter formativo, mas, sim, informativo. Esta
observação deve evitar críticas injustas quanto à validade deste curso.
O IBAC não aprova a nociva índole atual que preconiza a graça
barata, o êxito sem preço, a vitória sem batalha. Não há expansão
significativa em área alguma da vida que se adquira imediata, rápida,
fácil e instantaneamente! As leis do crescimento são radicais, exigentes,
árduas, íngremes, ásperas! Não há como mudá-las! Para CRESCER na
graça e no SABER deve-se pagar o preço do zelo, da dedicação, da
exaustão, da autodisciplina, afinal, não há vitória expressiva que valha a
pena a preço de pechincha!

Pr. José Roberto de Oliveira Chagas


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INFORMAÇÕES GERAIS:

Diretrizes do IBAC - Instituto Bíblico-Teológico Aliança Cristã -, entidade


vinculada a Associação Beneficente Kenosis, concernente a Série CRESCER -
Programa de Capacitação Bíblica-Teológica-Prática:
•Caráter (Objetivo e Reconhecimento do Curso).
•Matriz Disciplinar (Durabilidade do Curso).
•Metodologia (Ensino à Distância).
•Avaliação (Critérios Teóricos e Avaliativos).
• Conclusão e Certificação (Regras Gerais).

1. Caráter (Objetivo e Reconhecimento do Curso).


A Série CRESCER - Programa de Capacitação Bíblica- Teológica-Prática
-,
oferecida em parceria com instituições sérias que interessam pela construção e
socialização da Teologia, é de caráter informativo, não formativo. Desde que a
Teologia tornou-se curso superior o M.E.C, formulou regras para reconhecê-lo. A
entidade que oferece o curso Bacharel em Teologia deve ser credenciada pelo
M.E.C., ter carga curricular e horária de acordo com a portaria definida, cumprir
periodização e créditos, exigir escolaridade mínima dos interessados (ensino
médio completo), corpo docente especializado, etc. Também não há mais Curso
Básico ou Médio em Teologia. Nossa instituição, cristã e idônea, não tem a
intenção de ludibriar o povo de Deus. Ratificamos, assim, que o nosso programa
não oferece vantagens acadêmicas. Nosso alvo é auxiliar a Igreja Brasileira a se
aperfeiçoar para servir a Deus e ao próximo. Tão-somente.

2. Matriz Disciplinar (Durabilidade do Curso).


A matriz disciplinar da Série CRESCER, que visa aprimorar a comunidade de
fé no âmbito bíblico-teológico-prático, é composta de 10 (dez) opúsculos, cada
um com disciplina específica. 0/a aluno/a deverá estudar sistematicamente as
disciplinas conforme a proposta pedagógica da Direção do IBAC - Instituto
Bíblico-Teológico Aliança Cristã. O corpo discente terá até 12 (doze) meses após
a aquisição do curso para finalizá-lo e, se quiser, solicitar seu certificado.
*Veja no final das diretrizes a matriz disciplinar.

3. Metodologia (Ensino a Distância).


A metodologia didática empregada neste programa está fundamentada no
modelo de ensino à distância, doravante, a Diretoria do IBAC - Instituto Bíblico-
Teológico Aliança Cristã - recomenda ao corpo discente que estude cada
disciplina regular e sistematicamente, com zelo e dedicação, tendo em vista que a
sua capacitação bíblica-teológica-prática dependerá única e exclusivamente do
seu próprio esforço. Cabe, então, a cada aluno/a comprometer-se rigorosamente
com o próprio crescimento e esmerar-se nos estudos das disciplinas.
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4. Avaliação (Critérios Teóricos e Avaliativos).


O/a aluno/a deverá estudar o livro, conforme o conteúdo programático, res-
ponder as questões teóricas e avaliativas impressas no final de cada opúsculo (ou,
se preferir, tirar xerox ou fazer download no site da Gênesis Editora), guardá-las
em local seguro e, no final, se desejar receber o certificado, enviá-las ao IBAC
-Instituto Bíblico-Teológico Aliança Cristã -, para correção, atribuição de notas
e, estando de acordo com as normas da entidade, autorizar sua confecção e
postagem. A Gênesis Editora, parceira exclusiva neste projeto, fará contato com
os/as alunos/ as para averiguar o interesse pelo certificado e as normas para
recebê-lo.

5. Conclusão e Certificação (Regras Gerais).


O/a aluno/a que concluir as 10 disciplinas do módulo e atingir pelo menos a
nota média (6.0) poderá, se desejar, receber seu certificado de conclusão. O
mesmo não /obrigatório. Mas, caso queira-o, é mister efetuar o pagamento de R$
50,00 (taxa única); tal valor será aplicado para sanar gastos com assessoria de
contato, corpo docente (acompanhamento e revisão de provas), confecção e
postagem do certificado e despesas afins. O prazo para solicitá-lo é de até 12
(doze) meses após a compra do kit. A liberação em tempo menor ocorrerá se o/a
aluno/a tiver quitado o produto junto à editora e enviado as provas ao IBAC.

*Matriz Disciplinar do Programa de Capacitação BMica-Teológica-Prática


1. Noções de Prolegômenos - Análise Introdutória à Relevância, Natureza e
Tarefa da Teologia.
2. Noções de Teologia - Análise Bíblica e Teológica da Pessoa e Obra do
Deus Único e Verdadeiro.
3. Noções de Cristologia - Análise Bíblica e Teológica da Pessoa e Obra de
Jesus Cristo.
4. Noções de Paracletologia - Análise Bíblica e Teológica da Pessoa e Obra
do Espírito Santo.
5. Noções de Hermenêutica - Análise Crítica, Histórica e Teológica da
Interpretação Bíblica.
6. Noções de liderança Cristã - Análise Bíblica da Filosofia Ministerial de
Liderança Cristã.
7. Noções de Homüéúca - Análise Crítica, Histórica e Teológica da Pregação
Cristã.
8. Noções de Gestão Ministerial - Como Fazer Projeto Eficiente e Eficaz
Para Gerar Receita.
9. Noções de História da Igreja Cristã - Análise Histórica, Bíblica e Te-
ológica da Eklesia (Primitiva e Medieval).
10. Noções de Teologia Econômica: Mordomia Cristã - Análise Bíblica e
Teológica dos Princípios da Contribuição Cristã (1).

*A Diretoria do IBAC pode, se julgar necessário, alterar a grade curricular em kits futuros.
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PRIMEIRA PARTE: DESAFIOS ATUAIS À


INTERPRETAÇÃO BÍBLICA
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

religião judaico-cristã está sendo bombardeada


veementemente nesta era pós-moderna. E verdade que as adversidades
sempre fizeram parte da história da Igreja Cristã. Hoje, porém, elas
parecem mais sutis. De um lado, o externo, estão os movimentos
filosófico-teológicos questionando a validade de doutrinas até então
aceitas como verdadeiras; as áreas ética, religiosa e teológica, para citar
exemplos, sentem tais efeitos. Do outro lado, o interno, a situação
também é grave: a Igreja Evangélica Brasileira, apesar de sua expansão
numérica, tem demonstrado, através do ensino e prática, suas deficiências
bíblicas e teológicas. Urge, portanto, incentivá-la a ter um coração
aquecido e uma mente iluminada pela Palavra.

IA DESAFIO À HERMENÊUTICA: PLURALISMO

Uma análise detalhada dos movimentos filosófico-teológicos que


surgiram nas últimas décadas revelará que a Igreja Evangélica Brasileira
corre perigo. Por quê? As respostas são várias. Apontarei pelo menos
uma: fundamentação bíblica e teológica deficiente, o que inviabiliza a
construção e propagação de respostas à altura. A expansão numérica da
Igreja Evangélica não significa que a mesma está bem estruturada na
Palavra de Deus. Alguns pesquisadores, aliás, afirmam categoricamente
que o numericismo megalomaníaco evangélico é decorrente também do
péssimo ensino e prática das Escrituras, frutos de uma hermenêutica
bíblica equivocada.

Citarei sucintamente, apesar da existência de outros movimentos


igualmente importantes, apenas o Pluralismo que está presente nos
âmbitos intelectual, religiosa, ética e teológica. Afirmo, de antemão, que
o mesmo constitui-se um notável desafio à Igreja porque sua tônica é
essencialmente discursiva. E, como parte notável da Igreja Evangélica
Brasileira tem dificuldades significativas na interpretação, assimilação e
instrução das doutrinas cristãs fundamentais, será que terá respostas
coerentes e convincentes para dar a tais movimentos? Sem uma mente
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PRÁTICA

iluminada pela Bíblia como poderá opor-se a tal movimento? Sem saber a
contento as "sagradas letras" (2 Tm 3.15) como defenderá as verdades da
fé cristã?
Mas, afinal, o que é o Pluralismo?

1. Pluralismo Intelectual - O Dr. Heber Carlos Campos explica


que nesta área o perigo é o desenvolvimento da "hermenêutica da
suspeição", isto é, através do método crítico do texto denominado
"Desconstrucionismo", alega-se que todas as interpretações são
igualmente válidas ou igualmente destituídas de significado, dependendo
do ponto-de-vista de quem o analisa. Todas as pessoas podem ter as suas
próprias ideias com respeito ao texto lido e ninguém pode reivindicar
exclusividade de verdade na sua interpretação. Dá para imaginar o terrível
caos teológico quando se aplica este método desconstrucionista aos textos
da Escritura, afirma.
2. Pluralismo Religioso - Os pluralistas têm empregado uma
parábola bem conhecida (aquela dos seis cegos) para ilustrar a relação que
tem havido entre o Cristianismo e as outras religiões não-cristãs. Todas
elas têm abordagens diferentes a respeito de Deus, mas sob perspectivas
diferentes, todas elas estão falando da mesma coisa. Todas têm óticas
diferentes, mas estão falando do mesmo Deus. O que estão propondo, em
outras palavras, é que nós, cristãos, podemos afirmar que Jesus Cristo é
Salvador, mas não podemos afirmar (como temos feito durante milênios),
que Ele é a única forma de o homem alcançar salvação. Como no
pluralismo não existe a verdade absoluta, nem existe uma religião
verdadeira, o pluralismo religioso cristão vigente em nossos dias
manifesta-se de várias maneiras práticas com relação às religiões não-
cristãs.

3. Pluralismo Teológico - A Teologia também está em perigo com


o advento e consolidação do pluralismo. Os pressupostos da teologia
cristã, apostólica e reformada devem dar lugar a novas propostas. Deus,
na Soteriologia (doutrina da salvação) pluralista pós-moderna, não pode
excluir da salvação os não-cristãos pelo simples fato de eles não serem
cristãos, afinal é um Deus de amor. E a Cristologia? Ora, Cristo torna-se
apenas mais um caminho no processo da salvação da humanidade, mas há
outras revelações de Deus que são igualmente soteriológicas. Há outras
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

formas de salvação que não são encontradas em Jesus Cristo, segundo o


ensino da cristologia pluralista.1

2e DESAFIO À HERMENÊUTICA: SEDUÇÃO NUMÉRICA

O Secularismo, o relativismo, o pós-modernismo e o pluralismo


representam perigos tanto à propagação quanto à vivência autêntica da
Palavra de Deus nesses dias turbulentos. Minha preocupação, entretanto,
é bem maior com as questões internas das próprias igrejas evangélicas. Ê
muito fácil relacionar vasta quantidade de ameaças internas que rondam a
Igreja no Brasil. Os pressupostos dos referidos movimentos podem ser
vistos em livros cristãos, jornais, revistas, programas radiofônicos e
televisivos, etc, e o que é pior, no padrão de vida dos fiéis. A própria
Igreja em vários aspectos tem seguido os pressupostos da sociedade pós-
modernista. A pluralização, isto é, a expressão da liberdade de opção das
pessoas frente à ilimitada oferta de produtos e ideias, faz cada vez mais
adeptos entre o povo de Deus. A privatização também tem galgado seu
espaço haja vista que preconiza que a criatura humana é livre para fazer o
que quiser.
Outro perigo envolvendo a interpretação e aplicação da Bíblia é a
sedução das cifras. E a mesma, de alguma forma, está ligada ao
Pluralismo. O numericismo megalomaníaco parece ter se tornado uma
prova cabal para legitimar o êxito da liderança e da igreja. Vale tudo para
ter cifras: transformar culto em show, igreja em empresa, crente em
cliente, sacerdócio em negócio, vocação em profissão, VERBO em verba,
caráter em carisma... Não é sem motivo que Eugene Peterson compara
muitos pastores a meros gerentes de lojas!2

O Dr. Luís Wésley de Souza denuncia que o mercado religioso do


sensacionalismo, do imediatismo e do consumo da fé tem ditado nossos
conteúdos, redesenhado nossas motivações e metodologias e adulterado
nossa pregação afastando-a da Palavra. 3 O clima de
competição/concorrência nas instituições eclesiásticas, diz o Dr.
Zabatiero, favorece a mudança de motivação religiosa do povo.4
Mais: o Dr. Wander de Lara Proença reitera que a tentação dos
números também torna superficial o ensino da Palavra: cada vez mais
pessoas se convertem ouvindo um tipo de mensagem que não implica
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PRÁTICA

necessariamente transformação de vida; têm-se pregado um evangelho


sem cruz, que não requer renúncia ao pecado e nem exige compromisso;
ao contrário, oferece-se o evangelho que só fala de sucesso e vida de
prosperidade a quem crer. 5
Hoje, esclarece o Dr. Hernandes Dias Lopes, muitas pessoas estão
famintas de outras coisas e não famintas de Deus. Estão atrás das bênçãos
de Deus e não do Deus das bênçãos. Querem as bênçãos e não o
abençoador. Querem as dádivas e não o doador. Querem agradar a si
mesmas, e não a Deus. Querem a promoção pessoal, e não a glória de
Deus. Buscam saúde e prosperidade, e não santidade. Correm atrás de
sucesso, e não de piedade. Tem fome de mamom, e não de maná. 6

COMO EVITAR O CAOS VINDOURO: 1. VOLTANDO À


INTERPRETAÇÃO FIEL DA PALAVRA!

Muitos desafios externos e internos estão diante da Igreja


Evangélica no Brasil. E para superá-los é mister uma volta urgente à
Palavra de Deus. Sem sólida fundamentação bíblica e teológica a Igreja
dificilmente conseguirá confrontar e vencer os vários e perniciosos
pressupostos dos movimentos filosófico-teológicos, ou suas crises e
distorções internas, também caracterizadas pela corrupção na motivação
pessoal e ministerial de determinados líderes evangélicos que, em nome
da expansão numérica, deturpa os textos sagrados para ancorar suas
pregações e práxis espúrias, atrair o povo, mantê-lo cativo e se apropriar
de seus recursos. Não há dúvida de que a Igreja precisa de urgente retorno
ao conhecimento e prática do Livro de Deus!

Tais desafios jamais serão superados se a Igreja não se voltar à


reflexão bíblica-teológica-prática. Enquanto a mesma não estiver
totalmente vinculada à Bíblia sofrerá as influências danosas de seu eixo
contextual. Evidentemente o retorno proposto vai além de se ter uma
Bíblia em casa; ter a Bíblia e não lê-la, embora erro grave, constitui-se
prática corriqueira entre os evangélicos brasileiros!
Charles H. Spurgeon declarou num sermão certo domingo de
manhã: "Não sois leitores da Bíblia. Vocês afirmam que têm uma Bíblia
em casa(...). Porém, quando foi a última vez que a leram? Como sabem
que os óculos que perderam há três anos atrás, não estão na mesma gaveta
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

da Bíblia?"7 Não basta apenas ter a Bíblia em casa, no carro, no trabalho...


é mister conhecê-la e praticá-la fielmente!
A Bíblia ainda é o livro mais vendido no mundo. Isto não significa,
porém, que a civilização pós-moderna conhece-a o bastante. Pesquisas
confiáveis, para nossa vergonha, relevam o contrário. Apesar de não
existir no Brasil uma pesquisa recente para averiguar o nível de nosso
conhecimento bíblico afirmo que não somos leitores - e praticantes -
exemplares da Bíblia!
Há cerca de dez anos a Sociedade Bíblica (SBB), num
levantamento feito, revelou: 60% dos evangélicos nunca leram o Novo
Testamento integralmente!8
George Barna, célebre pesquisador, mostrou que a situação dos
evangélicos nos EUA não é diferente; numa pesquisa realizada em 2005
descobriu-se:
♦93% das residências pesquisadas possuem um ou mais
exemplares da Bíblia.
♦ 12% dos entrevistados garantiram ler as Escrituras todos os
dias.
♦ 57% confessaram que passaram mais de uma semana sem ler a
Bíblia.
♦31% acreditam que o dito popular " Deus ajuda a quem cedo
madruga" está nas páginas da Bíblia.
♦48% acreditam que o livro de Tomé - um texto apócrifo - é um
dos 66 livros que compõe a Bíblia cristã.
♦52% não sabiam que existe o livro de Jonas.
♦58% desconhecem quem pregou o Sermão do Monte.

David L. Larsen acrescenta: uma surpreendente estimativa afirma


que 61% da população norte-americana não conseguem ler com
aproveitamento um livro texto-usado no ensino médio. Cita ainda uma
afirmativa de Allan Bloom: "Nos Estados Unidos, falando de maneira
prática, a Bíblia era a última cultura comum, aquela que unia o simples e
o sofisticado, o pobre e o rico, o jovem e o velho e (...) que deu o caráter
de seriedade aos livros". Larsen menciona ainda George Steiner atônito
diante do desaparecimento do conhecimento da Bíblia em nosso tempo ao
escrever seu lamento à revista New Yorker. Depois, Larsen, arremata:
SÉRIE CRESCER: PROGRAMA DE CAPACITAÇÃO BÍBUCA-TEOLÓGICA-
PRÁTICA

♦Apenas metade dos protestantes entrevistados foi capaz de citar


até quatro dos dez mandamentos.
♦40% dos protestantes "nunca ou quase nunca" leem a Bíblia,
apesar de ter cerca de 500 milhões delas em circulação.
♦Um estudo descobriu que, entre os protestantes entrevistados que
frequentam a igreja, 63% não conseguiam saber a diferença entre o
Antigo e o Novo Testamento.
— ♦Poucos sabiam pelo menos alguma coisa sobre os profetas e menos
ainda conseguiam aplicar a história do bom samaritano à vida diária.
♦Assuntos bíblicos como esse foram "apenas parcialmente
compreendidos".9
Não intenciono pegar a Igreja norte-americana para ser bode
expiatório. Uma coisa, contudo, é certa: se a nação mais evoluída do
planeta, singular celeiro de grandes teólogos, reveladora de pregadores de
renome internacional, enfrenta dificuldades para meditar no Livro de
Deus, imagina um país emergente como o nosso, onde a população não
ocupa posição privilegiada nos índices educacionais; onde boa parte de
nossa gente pobre e modesta sequer foi alfabetizada; onde crianças,
aterrorizadas pela fome devastadora, se veem forçadas a deixar a escola e
procurar trabalho ou morrem desnutridas com os demais membros da
família; onde líderes de igrejas evangélicas visivelmente despreparados
combatem categoricamente à capacitação bíblica e teológica; onde
embusteiros, motivados pelo lucro fácil, abrem igrejas nas quais oferecem
em troca de dinheiro os favores que o sagrado pode propiciar - saúde,
felicidade e prosperidade econômica!

Que a Palavra de Deus e de Cristo, como orientou Paulo, habite


em nossos corações abundantemente (Cl 3.16), alegrando o nosso coração
(SI 19.8), sendo lâmpadas para os nossos pés (SI 119.105), dando
entendimento aos simples (SI 119.130), sendo nossa fonte de meditação
diária (SI 119.97), de nutrição (Jr 15.16), purificando nossos pensamentos
e intenções (Hb 4.12), renovando nossa mente (Rm 12.2) impedindo-a de
se conformar com o presente século.

COMO EVITAR O CAOS VINDOURO: 2. VOLTANDO À


PRÁTICA DA PALAVRA DE DEUS!
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

Uma parte considerável da Igreja Evangélica, no Brasil, peca


simplesmente porque negligencia a leitura da Bíblia. Outra parte, por sua
vez, repete erro similar por não praticá-la assiduamente. E pecado ter a
Bíblia e não conhecê-la mesmo tendo condições para estudá-la. Mas
também é pecado crasso ter suficiente conhecimento bíblico/teológico e
não viver de acordo com o mesmo. É evidente que há um peso no
comportamento escandaloso de quem ainda não conhece a Palavra de
Deus. Há, todavia, outro maior ainda quando se trata de alguém que já
teve a oportunidade de conhecer as "sagradas letras" e vive como se elas
não tivessem importância alguma!
Por isso esta disciplina a respeito de Hermenêutica Bíblica visa
conceituá-la/definí-la e, principalmente, mostrar que a interpretação
correta da Palavra de Deus deve desembocar na ação, não apenas na
erudição! Terá pouco proveito o/a leitor/a conhecer as doutrinas bíblicas e
ignorá-las! Será praticamente inútil estar a par da pessoa e obra de Deus e
não amá-lo e nem servi-lo! Não basta conhecer a pessoa e obra de Jesus
Cristo e não confessá-lo como Senhor e Salvador! Terá valor ínfimo saber
quem é o Espírito Santo e não permitir que ele transforme-o num
adorador, num proclamador, num edificador, num agente de
transformação social! Espero, então, que esta disciplina leve-o à fonte...
mas não o deixe morrer... sedento!
Deus, diz Tiago, não está interessado em meros ouvintes; os tais
enganam-se a si mesmos; deseja, sim, que cada crente tenha o cuidado de
atentar à lei perfeita e executar a obra, pois, doravante, será bem
aventurado no que realizar (Tg 1.22-25).

A Bíblia é a mensagem de Deus à humanidade. E meditar nela


frequente e corretamente é um privilégio. O mau uso da mesma (ensino e
prática), por outro lado, pode trazer consequências trágicas. A Igreja
Cristã não pode se afastar do Livro de Deus, pois em certa fase histórica
foi rotulada de a religião do livro! A Biblia era sua fonte de 1) direção, 2)
segurança e 3) provisão. Enquanto a Igreja era considerada a religião do
Livro de Deus tinha, entre outras coisas, identidade, senso de destino e
propósito, proteção diante dos numerosos e nocivos ataques à fé cristã,
alimentação às vidas que careciam de Deus. Tudo passava por seu crivo:
sua crença, sua prédica, seu padrão de vida, suas (re)formas...
SÉRIE CRESCER: PROGRAMA DE CAPACITAÇÃO BÍBUCA-TEOLÓGICA-
PRÁTICA

Hoje, porém, em algumas igrejas ditas evangélicas, o Livro de


Deus, se tornou apenas um ícone, um capital simbólico, mera fonte de
legitimação do conteúdo do sermão triunfalista que só sabe prometer
prosperidade financeira, sucesso pessoal/profissional/empresarial,
felicidade, imunidade às doenças e demais desgraças da vida.
A finalidade deste prefácio à Teologia Exegética, com ênfase em
Hermenêutica, é levar o/a aluno/a a ter algum contato, embora sucinto, ou
a rever (caso já tenha estudado tal disciplina) alguns conceitos
importantes da arte/ciência de interpretar os textos sacros - sua história,
sua definição e conceituação, sua relevância, seus métodos...
Infelizmente, devido o limite de espaço, não será possível compartilhar
muitas informações a respeito de cada fase da historificação interpretativa
da Bíblia.
Outro benefício desta disciplina ao discente é a valorização da
prática correta das Escrituras. A interpretação é imprescindível à
aplicação. A maneira, correta ou incorreta, de interpretar a Bíblia afeta
diretamente seu jeito de pensar, seu comportamento, suas próprias
atitudes e, por conseguinte, a vida de pessoas próximas e/ou distante com
as quais tem algum contato ou influência. Por essa razão a Hermenêutica
Bíblica preconizada neste curso de aperfeiçoamento não visa apenas
apurar o que o Livro de Deus diz sobre determinadas doutrinas; antes,
sim, inclui aplicação à vida do/a aluno/a. Afinal, de que adianta
capacidade de interpretar a Bíblia e não se comprometer com as suas
verdades? Portanto, prepare-se para crescer na graça, no conhecimento
e... na prática da Palavra de Deus!

SEGUNDA PARTE:
CONHECENDO A
HERMENÊUTCA

Não há mais tempo para a Igreja Evangélica Brasileira ficar


displicente quanto à sua capacitação bíblica-teológica-prática. Os
desafios, externos e internos, conforme alguns exemplos expostos, são
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

cada vez maiores e mais frequentes. São, na verdade, ameaças sutis que
num futuro próximo podem comprometer ainda mais a relevância das
comunidades de fé. É necessário, portanto, um retorno contundente do
Corpo de Cristo à Palavra de Deus. E é exatamente neste ponto que tanto
a Hermenêutica quanto a Exegese Bíblica tornam-se ferramentas
verdadeiramente indispensáveis.
Evidentemente não basta estudar a Bíblia de qualquer forma,
desrespeitando as regras legítimas que regem a prática interpretativa.
Muitas heresias que infelizmente grassam em denominações também
rotuladas de "evangélicas" procedem exatamente de interpretações
equivocadas da própria Bíblia. Tenho dito que a Bíblia, embora seja a
verdadeira Palavra de Deus, pode ser comparada ao veneno de uma
víbora: na dose exata é remédio, entretanto, quando aplicada fora da
medida definida pelo Eterno, pode se tornar veneno letal.
A mesma Bíblia que levanta alguns tem sido empregada
erroneamente e tem derrubado outros; a mesma Luz que arrancou
milhares de vidas das trevas, quando empregada indevidamente, é capaz
de lançar no lago de fogo outro tanto ainda mais expressivo. Por quê?
Devido seu mau uso! É preciso, então, que este retorno à Palavra de Deus
seja seguido de cuidado especial com a interpretação e aplicação da
Bíblia, pois assim ela será fonte de bênção na vida de milhões de seres
humanos.

As SAGRADAS ESCRITURAS SÃO INERRANTES! MAS SEUS


INTÉRPRETES, MESMO OS CRISTÃOS, NÃO SÃO!

Há uma descrença da sociedade na Igreja enquanto instituição que


representa Deus. Parte da falta de credibilidade tem a ver com a
deficiência bíblica-teológica-prática. Para reverter o quadro é mister
corrigir tais distorções. Ler mais a Bíblia e praticá-la. Mas não basta
somente ler. A leitura bíblica mal conduzida pode ser prejudicial. Mas a
Palavra não está imune a erros? Sim! A doutrina da infalibilidade bíblica
é coerente e duradoura. Então onde está o problema? Nos seus
intérpretes! Os absurdos que são pregados nos púlpitos, difundidos em
algumas literaturas evangélicas, nos programas radiofônicos e televisivos,
etc, embora apresentem certos vestígios de textos bíblicos (não raro
arrancados de seus contextos) provam que nem todos os pregadores estão
interpretando a Bíblia com precisão.
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PRÁTICA

O Dr. Archer já disse que é certo que por toda a história da Igreja
tem ficado claríssimo e bem entendido que Bíblia, como Deus no-la
concedeu, está livre de erro. A exceção dos grupos heréticos que
romperam com a Igreja, presumia-se que as Escrituras eram dotadas de
total autoridade e dignas de confiança em tudo quanto afirmavam ser
factual, quer se tratasse de teologia, quer de história, quer de ciência. Nos
dias da Reforma Protestante, assim afirmou Lutero: "Quando as
Escrituras falam, Deus fala". Até mesmo os oponentes católicos romanos
tinham essa convicção, embora tendessem a colocar a tradição eclesiástica
quase no mesmo nível de autoridade da Bíblia. Desde os dias dos
primeiros gnósticos, com quem Paulo contendeu, até o advento do
deísmo, no século XVIII, não se manifestavam dúvidas com respeito à
inerrância das Escrituras. 10
Nas últimas décadas, porém, apesar da vasta difusão da Bíblia,
muitas heresias (re)surgiram dentro da própria Igreja, deturpando ou
invalidando doutrinas bíblicas e teológicas que até então eram
consideradas irrefutáveis. E nem sempre as mesmas vieram de fora:
algumas delas, às vezes, floresceram ironicamente dentro das próprias
comunidades de fé, frequentemente por causa da má interpretação e
aplicação da Palavra de Deus. Uma interpretação errada e nociva
naturalmente degenera em prática também errada.

O Dr. Cherles C. Ryrie lembra que a doutrina/teologia serve de


alicerce para a vida cristã e de motivação para a atividade cristã. O
chamado para a consagração total de nossa vida tem como base a doutrina
segundo a qual fomos crucificados com Cristo (Rm 6.1-13). Sabendo que
Deus não é parcial, não devemos dar tratamento preferencial nem a ricos
nem a pobres na igreja (Tg 2.1-4). A esperança na volta do Senhor deve
purificar nossa vida (1 Jo 3.3). E pelo amor de Cristo (o amor dele por
nós e o nosso por ele) que o deixamos controlar nossa vida (2 Co 5.14).
Ao conhecer a doutrina do julgamento futuro somos motivados a
persuadir as pessoas a aceitarem Cristo (2 Co 5.10). Todas essas
responsabilidades cristãs importantes são baseadas em verdades
doutrinárias. Ademais, só pela verdade podemos detectar os ensinamentos
falsos e os estilos de vida incorretos e nos opor a eles.
O teólogo supracitado, outrossim, lembra que cada pessoa tem um
sistema doutrinário, mesmo que não se dê conta desse fato ou não o
admita. Por ser algo sistemático, desorganizado ou até mesmo desleixado,
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

mas todos nós operamos com base em algum esquema doutrinário. É


evidente que tanto o ateu liberal e o agnóstico quanto os calvinistas e os
arminianos mais estruturados têm seus sistemas. 11
Partindo da afirmativa do Dr. Ryrie ratifico que a Igreja tem um
desafio crucial no que tange à Bíblia: precisa estudá-la, entendê-la e
praticá-la corretamente. Quando a crença é improcedente a prática torna-
se incoerente. Corrigindo a reflexão há maior probabilidade de acertar a
praxis. È óbvio que uma pessoa pode ter informação e crença certas e agir
em desarmonia. Há pessoa que conhece a Palavra de Deus e não a coloca
em prática; há descompasso entre saber e fazer. O desafio, portanto, é
agregar reflexão bíblica-teológica adequada no afã de ter um estilo de
vida que promova a glória de Deus e atraia outras pessoas a Jesus Cristo.
E, como a nossa teologia vai determinar nossa prática, é mister conhecer a
Bíblia corretamente; aqui entra o emprego apropriado da ciência de
interpretação.
E o que é essa ciência de interpretação? Qual é o significado de
Hermenêutica? A mesma é usada somente no âmbito bíblico-teológico?
Há registro de seu uso na história da religião judaico-cristã? Em qual
periodização e por quais escolas?

DEFINIÇÃO PANORÂMICA DE HERMENÊUTICA

Não basta simplesmente ler a Bíblia; é preciso lê-la bem, de torma


disciplinada, atenta e criativa,12 diz o Dr. Júlio Zabatiero. E aqui entra a
hermenêutica bíblica e séria. E o que ela é?
A palavra Hermenêutica deriva do termo grego hermeneutikós
(interprete), do verbo hermeneuo e significa: arte de interpretar.
Teologicamente é a "disciplina que estuda os princípios e as teorias de
como os textos devem ser interpretados. (...) se preocupa com. o
entendimento dos papéis e dos relacionamentos singulares entre o autor,
o texto, o público-leitor original e posterior".13
O uso comum da palavra exposta também alude à interpretação de
textos escritos como os de natureza bíblica, filosófica, jurídica, etc. Além
disso, as ciências sociais são consideradas por especialistas mais
aparentadas à hermenêutica do que às ciências exatas, as quais usam
métodos de laboratório em suas pesquisas.
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E de onde originou-se o termo "Hermenêutica"? .


O termo Hermenêutica, de acordo com a opinião de alguns
estudiosos, possivelmente originou-se na mitologia grega clássica. O
mesmo teria se derivado de Hermes, filho de Zeus e Maia, cujo ofício era
mensageiro dos deuses. Ele tinha sandálias com asas, um chapéu de abas
largas, e segurava uma vara (caduceu) na qual duas serpentes estavam
enroladas.
Para saber mais sobre Hermes basta pesquisar Mercúrio, seu
simulacro em Roma, uma divindade que tinha a incumbência de levar as
mensagens de Júpiter (em latim, Iuppiter, o deus romano do dia,
equivalente ao deus grego Zeus).
Mercúrio difere pouco de Hermes, haja vista que também possuía
uma bolsa, sandálias e um capacete com asas, uma varinha de condão e o
caduceu; também o deus da eloquência e da inteligência, do comércio,
dos viajantes e dos ladrões. Há, inclusive, um episódio em Atos no qual
aparecem Júpiter e Mercúrio:14 Barnabé foi chamado de Júpiter - o deus
pai - e Paulo, de Mercúrio - o mensageiro (At 14.12). Esta palavra bíblica
nos primeiros séculos do Cristianismo corroboram a probabilidade de
Hermenêutica ser proveniente do deus grego/romano.

A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA INDISPENSÁVEL


CIÊNCIA DA INTERPRETAÇÃO BÍBLICA

A ciência/arte de interpretar textos bíblicos não é novidade nem


invenção de teólogos pós-modernos. Ela sempre esteve presente na
história do povo de Deus. Poderia, por exemplo, citar várias provas de
que a ciência da interpretação já existia em Israel desde os seus alvores.
Entretanto, tendo em vista o restrito espaço disponível, presumo ser mais
apropriado iniciar a historificação da ciência interpretativa a partir da era
neotestamentária, mencionando-a laconicamente em algumas
periodizações específicas.
1 . Judeus Palestinos - Os famosos escribas devotavam o mais
profundo respeito à Bíblia da sua época (o Antigo Testamento) como a
infalível Palavra de Deus. Consideravam sagradas até mesmos as letras, e
é sabido que os seus copistas tinham inclusive o hábito de contá-las, a fim
de evitar qualquer omissão no ato da transcrição. O ponto de vista
negativo da Hermenêutica dos judeus palestinos, é que exaltava a Lei
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

Oral, consistindo de milhares de tradições verbais acumuladas ao longo


dos séculos, e desprezava a Lei Escrita, por isso Jesus os condena em
Marcos 7.13.
2. Judeus Alexandrinos - A interpretação bíblica dos judeus
alexandrinos era, de certa forma, determinada pela filosofia predominante
na grande cidade de Alexandria, no Egito. Eles adotavam o princípio
fundamental de Platão, segundo o qual ninguém deve acreditar em algo
que seja indigno de Deus. Desse modo, quando encontravam alguma
coisa no Antigo Testamento que discordava da sua filosofia e ofendia a
sua lógica, recorria às interpretações alegóricas.
3. Judeus Caraítas - A seita dos judeus caraítas foi fundada por
Anan ben David, cerca de 760 da nossa era. Historicamente eles são
descendentes espirituais dos saduceus. Representam um protesto contra o
rabinismo, parcialmente influenciado pelo maometismo. Os caraítas
(filhos da leitura), eram assim chamados porque seu princípio
fundamental era considerar a Escritura como a única autoridade em
matéria de fé. Sua exegese, como um todo, era mais correta do que a dos
judeus palestinos e alexandrinos.

4. Judeus Espanhóis - No período que vai do século


doze ao quinze, desenvolveu-se um método mais sadio de
interpretação das Escrituras entre os judeus da Espanha.
Quando a Exegese da Igreja Cristã estava em situação
periclitante, e o conhecimento do hebraico estava quase nulo,
alguns judeus instruídos da Península Perenaica restauraram o
interesse por uma Hermenêutica Bíblica sadia. Algumas de
suas interpretações ainda hoje são citadas como fonte de
referência.
4. Período Patrístico - No período dos Pais da Igreja o
desenvolvimento dos princípios hermenêuticos dependiam dos
três principais centro de atividades da Igreja: Alexandria-Egito;
Antioquia-Síria e Ocidente. Nessa periodização, apesar das
numerosas limitações no que tange a construção e socialização
do conhecimento bíblico-teológico, é indiscutível a
contribuição interpretativa dos Pais da Igreja. Cada escola, de
alguma forma, contribuiu nessa área.
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5.1. A Escola de Alexandria - no começo do século III


d. C, a interpretação bíblica foi influenciada especialmente
pela escola catequética de Alexandria, centro cultural e
religioso do Egito; a religião judaica e a filosofia grega se
encontraram e mutuamente se influenciaram. Os principais
representantes dessa escola foram, Clemente e seu discípulo
Orígenes. Clemente, um dos renomados pensadores da época,
foi o primeiro a aplicar de forma efetiva o método alegórico na
interpretação do Antigo Testamento.
5.2. Escola de Antioquia - Supõe-se que a escola
catequética de Antioquia tenha sido fundada por Doroteu e
Lúcio, no final do terceiro século (para outros foi Diodoro).
Diodoro escreveu um tratado sobre princípios de interpretação
bíblica. O seu maior feito, porém, é constituído de dois
discípulos seus - Teodoro de Mopsuéstia (o Exegeta) e João
Crisóstomo (conhecido como Boca de Ouro).
5.3. Escola Ocidental - A Igreja do Ocidente
desenvolveu uma exegese que era um misto do que esposavam
a escola de Alexandria e a de Antioquia. Seu aspecto mais
característico encontra-se no fato de haver acrescentado outro
elemento que até então ainda não havia sido considerado, a
saber, a autoridade da tradição e da Igreja na interpretação da
Bíblia. Além disso, atribuiu valor normativo ao ensino da
Igreja no campo da exegese.

6. Período Medieval - Durante a inesquecível Idade Média muitos


cristãos (e clérigos) ironicamente viviam na mais profunda ignorância
quanto à Bíblia. Naquele período o quádruplo sentido da Escritura (literal,
tropológico, alegórico e analógico) era, geralmente, aceito e foi então
estabelecido que a interpretação bíblica tinha de adaptar-se à tradição e à
vontade da Igreja. Interpretavam a Bíblia partindo dos escritos dos pais da
Igreja. Apesar da Teologia constituir-se o arcabouço ordenador de todo o
saber humano, por outro lado, imperava a falta de conhecimento quanto
as Escrituras Sagradas.
7. Período da Reforma Protestante - O período renascentista que
preparou a Europa e o mundo para a Reforma Protestante chamou a
atenção para a necessidade de se estudar a Escritura, recorrendo aos
originais como forma se achar o seu verdadeiro significado. Era a posição
dos reformadores, que não é a igreja que determina o que as Escrituras
ensinam; antes, são elas que determinam o que a Igreja deve ensinar.
Martinho Lutero defendeu, com intrepidez, o direito do juízo privado;
salientou rigorosamente a necessidade de se considerar o contexto e as
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

circunstâncias históricas de cada livro, etc. Já Melanchton, seu


companheiro, seguiu preferencialmente o princípio de que as Escrituras
devem ser entendidas gramaticalmente antes de serem entendidas
teologicamente. E John Calvino, na opinião de muitos estudiosos o maior
exegeta da Reforma, considerava como "primeiro dever de um intérprete,
permitir que o autor diga o que realmente diz, ao invés de lhe atribuir o
que pensamos que devia dizer".
8. Período Histórico-Crítico - Divergentes pontos de vista foram
expressos a respeito do texto sagrado, negando a inspiração verbal e a
infalibilidade da Escritura. Dentre as teorias expostas nesse período,
destacam-se: 1) Teoria da Inspiração Natural Humana, 2) Teoria da
Inspiração Divina Comum, 3) A Teoria da Inspiração Parcial, 4) Teoria do
Ditado Verbal, 5) Teoria da Inspiração das Idéias. 15
A Palavra de Deus, como se pode perceber, jamais esteve fora das
discussões. Várias escolas de interpretação, em fases distintas da história
da Igreja, surgiram com a finalidade de propor uma análise mais correta
da Bíblia. Naturalmente algumas escolas foram mais coerentes, outras
desembocaram em erros grotescos.

A IMPORTÂNCIA DA HERMENÊUTICA NA IGREJA


EVANGÉLICA BRASILEIRA PÓS-MODERNA

A Hermenêutica Bíblica requer um bom conhecimento das línguas


originais usadas na Bíblia (hebraico, aramaico e grego), além dos
significados originais dos escritos vistos dos ângulos dos seus escritores
originais, do pano de fundo histórico, de meio ambiente literário, da
história do pensamento religioso e dos pontos de vista científicos dos
tempos antigos. 16 Isso não deve servir para inibir as pessoas mais
simples no que tange à pesquisa. Pelo contrário. Logo, no próximo
capítulo, tendo em vista que já analisamos resumidamente parte da
história da interpretação da Bíblia, tentarei responder algumas
indagações, dentre elas:
•Qual é a importância do estudo da Hermenêutica Bíblica,
principalmente em nossos dias?
•Aliás, o que significa realmente a Hermenêutica Bíblica?
• Se ela é uma ciência quais são suas principais atribuições?
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•E quais os métodos de interpretações das Escrituras mais


confiáveis e coerentes atualmente?
•Há algum princípio de interpretação mais aceito que outros -
qual?
Cada disciplina teológica, por certo, tem sua importância. Quando
se trata da Hermenêutica não é diferente. A mesma sempre desempenhou
uma papel crucial na religião cristã; hoje, porém, devido numerosos
fatores, ela tornou-se indispensável. O Cristianismo tem sido pressionado
de todos os lados e a única maneira de preservar sua crença e prática em
harmonia com os ensinamentos de Jesus Cristo, dos apóstolos, dos
reformadores protestantes, dentre outros líderes influentes na Igreja
Cristã, é conhecendo corretamente a Bíblia; a denominação que fracassar
na interpretação da Bíblia fracassará em sua práxis! Portanto, apesar de
ser uma tarefa árdua, é hora da Igreja entender o que lê (At 8.30,31). Boa
parte da mesma dificilmente dominará temas como delimitação de
perícope, genêro/estilo literário, estrutura, narrador, personagem, espaço,
tempo, figuras e temas, argumentação, polissemia, articulação e
coerência, vozes discursivas, etc, porém, é dever de todos esmerar-se no
estudo bíblico.

TERCEIRA PARTE: ANÁLISE DE


PRINCÍPIOS HERMENÊUTICOS

Ler a Bíblia não é suficiente para o desenvolvimento de


uma compreensão saudável e de uma espiritualidade autêntica. E
necessário ainda estudá-la, conhecê-la, ensiná-la e praticá-la de maneira
correta. Este é um grande desafio. Desde os judeus palestinos (deixando
de fora os intérpretes e instrutores das leis de Deus no AT) até os dias da
Reforma Protestante (e nos séculos mais recentes) vários métodos
interpretativos foram utilizados no afã de se entender a Bíblia com mais
exatidão. E há, também, altercações calorosas quanto à metodologia
interpretativa bíblica. Mas as mesmas foram úteis porque, entre outras
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

vantagens, possibilitaram a construção de várias propostas acadêmicas


para facilitar o estudo, o entendimento e a prática da Palavra de Deus.
Hoje, graças ao trabalho de vários estudiosos, durante séculos, finalmente
há à disposição dos cristãos vastos materiais de pesquisas na área
interpretativa para auxiliar a Igreja na nobre e prazerosa tarefa: meditar
no Livro de Deus! Quanto à importância da Hermenêutica Bíblica no
estudo da Bíblia sintetizarei a justificativa de dois estudiosos cristãos
conceituados.

A HERMENÊUTICA É IMPRESCINDÍVEL!

O Dr. E. Lund e P.C. Nelson fizeram um estudo relevante a fim de


justificar a importância do estudo hermenêutico. Eles afirmam:
1. Uma das primeiras ciências que os pregadores devem conhecer é
a hermenêutica, parte da Teologia Exegética, pois trata da reta inteligência
e interpretação das Escrituras.

2. Pedro disse que nas cartas de Paulo há coisas difíceis de


entender as quais os ignorantes e instáveis deturpam, como fazem com as
demais Escrituras, para a própria perdição (2 Pe 3.16); a seguir
recomenda à igreja a crescer na graça e no saber (v.18) a fim de evitar ser
enganada pelos homens perversos e perder a firmeza (v.17); estes
ignorantes nos conhecimentos hermenêuticos se apresentam como doutos,
torcem as Escrituras e arrastam multidões à perdição.
3. Os pretensos doutos sempre se têm constituído em heresiarcas
ou falsos profetas da antiguidade e até papistas da era cristã; a arma
principal do soldado de Cristo é a Escritura, e se desconhece seu valor e
ignora seu uso correto, que soldado será?
2. A Bíblia é o livro mais perseguido pelos inimigos e mais
torturado pelos amigos devido à ignorância da sadia regra de
interpretação; quem a usa a seu próprio gosto, mutilando-a, tergiversando
ou torcendo-a o faz para a própria perdição.
4. Como as circunstâncias que concorreram para a sua produção
foram variadas cabe ao expositor estudá-la demorada e pacientemente, de
acordo com os relevantes e úteis princípios da hermenêutica.
5.1. Escritores: Entre eles estão sacerdotes (como Esdras), poetas
(como Salomão), profetas (como Isaías), pastores (como Amós),
estadistas (como Daniel), eruditos (como Paulo), etc.
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5.2. Tempo: Moisés, o primeiro escritor, viveu 400 anos do cerco


de Tróia e pelo menos 300 anos antes de aparecerem os mais antigos
sábios da Grécia e Ásia: Tales, Pitágoras, Confúcio, etc.; já João, o último
escritor bíblico, viveu pelo menos 1500 anos depois de Moisés.
5.1. Lugar: Os escritores estavam nos desertos, outros nos
pórticos do Templo, outros nas escolas dos profetas (em Betei e Jericó),
outros nos palácios da Babilônia, etc.; cada lugar tinha figuras, costumes
e culturas peculiares que influenciou na linguagem bíblica. 17
Há mais elementos que justificam o estudo da Hermenêutica
Bíblica que não foram citados pelos notáveis teólogos. E certo que
estudar a Bíblia corretamente não é mais tarefa impossível; sobram
ferramentas sobre o assunto ora em foco. A Hermenêutica/Exegese
Bíblica está ao alcance de todos praticamente; ela até pode ser um pouco
exaustiva, mas não impraticável; outrossim, depois de tantas altercações,
apareceram vastas ferramentas sobre o assunto.

A diversidade literária, social, cultural e religiosa da Bíblia gerou,


em meios acadêmicos, amplas e detalhadas pesquisas, e constituiu um
campo de estudos composto por várias disciplinas acadêmicas: geografia
e arqueologia bíblicas, introdução aos escritos bíblicos, história dos
tempos bíblicos, estudo dos idiomas bíblicos, teologia bíblica, exegese e
hermenêutica bíblica. As riquezas a pesquisa acadêmica da Bíblia não
podem ser desperdiçadas, mesmo quando não seguimos seus métodos,
não concordamos com seus resultados ou simplesmente quando nossos
interesses na leitura das Escrituras são distintos dos interesses
acadêmicos.18
E o que é Hermenêutica Bíblica? E Exegese Bíblica? Quais são os
princípios importantes quanto se trata de interpretar a Palavra?

DEFINIÇÃO DA HERMENÊUTICA BÍBLICA

A Hermenêutica, diz o Dr. Ryrie, é o estudo dos princípios de


interpretação.19 Para Raimundo F. de Oliveira é "a arte de interpretar os
livros sagrados e os textos antigos". 20 Esdras Costa Bentho a definiu: "É a
disciplina da Teologia Exegética que ensina as regras para interpretar as
Escrituras e a maneira de aplicá-las corretamente". Seu objetivo é
estabelecer regras gerais e específicas de interpretação no afã de entender
o sentido do autor ao redigir a Bíblia; ela, enfim, é "a ciência da
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

compreensão de textos bíblicos" - e como ciência é: 1) objetiva, 2)


racional, 3) analítica. 4) explicativa.21
A Bíblia demanda estudo minucioso, pois trata de temas que
abrangem céu e terra, tempo e eternidade, visível e invisível, material e
espiritual, foi escrita: 1) por pessoas de variadas naturezas, 2) em épocas
remotas, 3) em países distantes entre si, 4) em meio a pessoas e costumes
diferentes, 5) e em linguagem tão simbólica que para a reta inteligência é
crucial o conselho e auxílio da Hermenêutica. 22
A Hermenêutica Bíblica engloba vários motes cruciais: a
inspiração da Bíblia, análise do texto bíblico (recursos literários-figuras,
parábolas, tipos, etc), métodos de estudos bíblicos (analítico, sintético,
temático, biográfico), princípios de interpretação (princípios gramaticais,
históricos, teológicos...). Recebe, assim, auxílio da filologia, linguística,
gramática normativa, histórica e comparada... 23

CONHECENDO MELHOR A EXEGESE

A Hermenêutica Bíblica, como aborda os papéis e


relacionamentos entre o autor, o texto, o público-leitor original e o
posterior,24 precisa de ciências afins. Uma delas é a Exegese.
Exegese expressa a ideia literal de "arrancar do texto". Ela,
mediante os princípios, regras e métodos hermenêuticos, auxilia no
entendimento correto do sentido literal do texto em foco, sem inserir nele
as próprias ideias do pesquisador. Pode-se dizer que, em síntese, enquanto
a Hermenêutica é a teoria, a Exegese é a prática. Porém, teologicamente
falando, a Exegese é o capítulo da Teologia que estuda a interpretação,
utilizando-se de modos formais de explicação, que podem ser aplicados a
alguma passagem das Escrituras a fim de compreender o seu sentido. 25
Alguns dizem que a Exegese pode ser distribuída em, pelo menos, cinco
categorias basilares:
1. Exegese Estrutural - Doutrina que sustenta que o significado
do texto bíblico está além do processo de composição e das intenções do
autor.
2. Exegese Gramático-histórica - Princípio de interpretação
bíblica que leva em conta apenas a sintaxe e o contexto histórico no qual
foi composta a Palavra de Deus. Tal método, apesar de seus elevados
méritos, acaba por tirar da Bíblia o seu significado espiritual.
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3. Exegese Teológica - Princípio de interpretação bíblica que


toma por parâmetro as doutrinas sistematizadas pelos doutores da Igreja.
Neste caso, a Bíblia é submetida à doutrina; corre-se o risco de valorizar
mais a forma que o conteúdo. 26
Destaca-se ainda a Exegese Protestante e Exegese Católica. A
última tinha como alicerce os escritos dos renomados Pais da Igreja, e
usava-os como ponto de partida reflexiva para a Bíblia, principalmente
durante a Idade Média. A Exegese Protestante, por outro lado, ganhou
realce a partir da Reforma Protestante, quando Martinho Lutero ratificou
os princípios da "sola scriptura" (só a Escritura) e o sacerdócio universal
de todos os crentes.26 John Calvino, teólogo espetacular, é outro nome que
merece destaque quando se trata de sistematização bíblica e teológica.

A IMPORTÂNCIA DE METODOLOGIA NA
INTERPRETAÇÃO BÍBLICA

A ciência interpretativa, mesmo aplicada à Bíblia, depende de


metodologias. A própria teologia da Igreja Cristã, aliás, foi elaborada a
partir de métodos específicos. Os teólogos Franklin Ferreira e Alan Myatt
explicam que a questão da metodologia, em especial na área teológica, é
tema sério. Através dos séculos houve um desenvolvimento de métodos e
estilos de se fazer teologia. E, sintetizando, as divisões entre o
protestantismo e o catolicismo têm muito a ver com os diversos métodos
empregados na construção da teologia. 28
W. A. Henrichsen mostra o perigo do mau uso da Bíblia quando se
rejeita a sistemática e a metódica:
•A Escritura pode ser mal aplicada quando você ignora o que ela
diz sobre determinado assunto.
•A Escritura pode ser mal aplicada quando você toma um
versículo fora do seu contexto.
•A Escritura pode ser mal aplicada quando você lê uma passagem
e a impele a dizer o que ela não diz.
•A Escritura pode ser mal aplicada quando você dá ênfase indevida
a coisas menos importantes.
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

•A Escritura pode ser mal aplicada quando você a usa para tentar
levar Deus fazer o que você quer, em vez daquilo que Ele quer que seja
feito.29
O método, está claro, é importante. Mas o que é método? Método é "todo
processo racional usado para se chegar a determinadas conclusões
válidas; refere-se às regras ou técnicas usadas para chegar ao
conhecimento do significado original do texto; maneira de proceder. 30 E a
maneira ordenada de fazer alguma coisa, um procedimento seguindo
passo-a-passo, destinado a levar o estudante a uma conclusão. 31 Ê uma
palavra de origem grega que significa "caminho certo para chegar a um
determinado objetivo".32
Mas há fatores que influenciam os métodos?
Os métodos de interpretação da Bíblia, conforme exposto, são
vários.33 A quantidade, porém, não significa que as normas e práxis
interpretativas sejam todas corretas. E quais são os certos?

A eficácia do método, diz o Dr. Júlio Zabatiero, depende da pessoa


que o utiliza. No caso da interpretação da Bíblia, mais importante que o
método que usamos são: os conhecimentos que temos da própria Bíblia e
do mundo no qual foi escrita; os conhecimentos que temos da história da
interpretação da Bíblia e seu uso nas igrejas e academias; os
conhecimentos que temos de nosso mundo e de nós mesmos nesse
mundo; os hábitos que já desenvolvemos e as certezas que já temos. Além
desses conhecimentos, os sentimentos e as ações interferem na leitura da
Bíblia. A disposição ética, a espiritualidade e os relacionamentos também
afetam a maneira como usamos os métodos. Isso sem mencionar a
imaginação e a criatividade, pois ler é criar um novo texto a partir do
antigo, é imaginar uma nova realidade a partir das palavras que nos
desafiam. Tudo isso influencia muito mais a leitura do que o próprio
método. 34

COMO INTERPRETAR A BÍBLIA CORRETAMENTE?

Parte da Igreja Evangélica não estuda a Bíblia como deveria. Por


quê? As razões são várias. Rick Warren aponta três: 1) as pessoas não
sabem como estudar, 2) elas não são motivadas, 3) elas são preguiçosas -
estudar a Bíblia é trabalho árduo, e não há atalhos; é como qualquer outra
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coisa na vida que valha a pena; custa tempo, esforço, concentração e


persistência!35
Quais são os princípios confiáveis para guiar o súdito de Cristo à
interpretação fiel da Bíblia? Raimundo F. Oliveira ratifica alguns
princípios universalmente aceitos. Procurarei sintetizá-los. Os mesmos
podem ser encontrados nas obras expostas em NOTAS.
1 - Estude a Bíblia partindo do pressuposto de que ela é a
autoridade suprema em questão de religião, fé e doutrina. Em assunto
de religião, fé e doutrina, o indivíduo se submete à tradição, à razão, ou as
Escrituras. A autoridade a que ele se submeter, há de determinar o tipo de
crença que possa esposar.
2—Não esqueça que a Bíblia éa melhor intérprete de si mesma.
A Bíblia interpreta a própria Bíblia. Esta norma é universalmente
conhecida. Mas não poucos leitores que a desprezam. A Bíblia possui o
melhor e mais profundo comentário sobre si mesma.

3 — Dependa da fé salvadora e do Espírito Santo para a


compreensão e interpretação da Escritura. O diabo tentou o Cristo no
deserto, no mente e no templo. No deserto, tentou a ceder à gula; no
monte, tentou a se deixar levar pela ambição; e, no templo, interpretando
mal a Palavra... A má interpretação da Bíblia ainda é uma terrível ameaça
à Igreja e à fé cristã. E o Diabo sabe disso.
4 - Interprete a experiência pessoal à luz da Escritura, e não a
Escritura à luz da experiência pessoal. A Bíblia é um livro de causas e
efeitos, assim, experiências pessoais reais positivas são inevitáveis. Mas,
por maior que seja a experiência, ela não é superior à Bíblia.
5 - Os exemplos bíblicos só têm autoridade prática quando
amparados por uma ordem que os torne mandamento universal. O fato
de Noé plantar uma vinha e depois se embriagar com o vinho do seu fruto
(Gn 9.20,21), não indica que você deva fazer o mesmo. O fato de Jesus
ter mandado dizer a Herodes: "ide dizer a essa raposa" (Lc 13.32), não
nos autoriza a afrontar às autoridades.
6- 0 principal propósito da Escritura é mudar a nossa vida, e
não multiplicar os nossos conhecimentos. Estude a Bíblia deve com
motivação correta: acentuar o seu saber bíblico-teológico e, sobretudo, o
prático; a Bíblia iluminar a mente e aquece nosso coração!
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

7- Todo cristão tem o direito e a responsabilidade de interpretar


pessoalmente a Escritura, seguindo princípios universalmente aceitos
pela ortodoxia bíblica. A Bíblia não é particularidade de uma pessoa nem
de alguma instituição. Ela é propriedade de Deus. Logo, quem desejar,
pode lê-la, conhecê-la, amá-la e, sobretudo, praticá-la!
6- Apesar da importância da história da Igreja, ela não chega a
ser decisiva na fiel interpretação da Escritura. Apesar de reconhecermos
os méritos da história da Igreja, por ela registrar o denodo e a bravura
com que os princípios sagrados foram defendidos e mantidos, devemos
afirmar que a Igreja não determina o que a Igreja ensina; antes, a Bíblia é
quem determina o que a Igreja ensina.
7- O Espírito Santo quer aplicar as promessas divinas, exaradas
na Escritura, à vista do crente, em todos os tempos. Mas, ao reclamar as
promessas, tenha a mesma cautela que tem quando procura descobrir a
sua vontade.36 Mais: a Bíblia não é mero compêndio de promessas
triunfalista; ela mais que isso; ela é a gloriosa Palavra de Deus!

NOTAS
'CAMPOS, Heber Carlos. O Pluralismo do Pós-Modcmismo. Fides Reformata (02/01/1997).
2
PETERSON, Eugene. Um Pastor Segundo o Coração de Deus. Rio de Janeiro: Textus, 2000,
p.2.
3
SOUZA, Luís Wesley. "Uma Igreja Sem o Propósito da Pureza e da Santidade". In BARRO, Jorge
H. (org.). Uma Igreja Sem Propósitos. São Paulo: Mundo Cristão, 2004, p.94.
4
ZABATIERO, Júlio P. T. "Novos Desafios da Leitura Bíblica no Pastorado Contemporâneo". In
KOHL, Manfred W & BARRO, Antônio Carlos (orgs). Ministério Pastoral Transformador. Londrina:
Descoberta, 2006, p.13.
'PROENÇA, Wander de Lara. "De Casa de Profetas a Seminários Teológicos". In KOHL, Manfred
W & BARRO, Antônio Carlos (orgs). Educação Teologia Transformadora. Londrina: Descoberta, 2004,
ps.29,30.
'PROENÇA, Wander de Lara. "Uma Igreja Sem o Propósito da Maturidade na Palavra". In
BARRO, Jorge H. (org.). Uma Igreja Sem Propósitos. São Paulo: Mundo Cristão, 2004, ps.47-50.
'LOPES, Hernandes Dias. Fome de Deus, São Paulo: Hagnos, 2004, ps.22.
7
FILHO, Moisés. "Disseminada, Mas Ainda Desconhecida,. In Revista Igreja. Atibaia/SP:
Mensagens/OL, ano II, na 11, agosto/setembro, 2007, pJT.
"FILHO, Moisés, Op. Cit, p-27.
'LARSEN, David L. Anatomia da Pregação. São Paulo: Vida, 2005, ps.34-36. '"ARCHER, Gleason L.
Enciclopédia deDihculdadesBíblicas. São Paulo: Vida, 1997,p.l9. "RYRIE, Charles C. Como Pregar Doutrinas
Bíblicas. São Paulo: Mundo Cristão, 2007, ps.13,14.
12
ZABATIERO, Júlio P. T. Manual de Exegese. São Paulo: Hagnos, 2007, p.13.
"GRENZ, Stanley J. & GURETZKI, David & NORDIUNG, Cherith Fee. Dicionário de Teologia. São
Paulo: Vida, 2002, p.66.
"YOUNGBLOOD, Ronald (org.). Dicionário Ilustrado da Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 2004, p.408.
15
OLTVEIRA, Raimundo Ferreira. Princípios de Hermenêutica. Campinas/SP: EETAD, 3a ed., 1997,
ps.5-12.
"MLANARCZYKI, Cleison. Hermenêutica e Interpretação Bíblica - Apostila de Hermenêutica (Seminário
Teológico Sul Americano, Campo Grande/MS), p.l.
SÉRIE CRESCER: PROGRAMA DE CAPACITAÇÃO BÍBUCA-TEOLÓGICA-
PRÁTICA

"LUND, E. & NELSON, P. C. Hermenêutica. São Paulo: Vida, 2002, ps.7-12. "ZABATIERO, Júlio P.
T., Manual de Exegese, p.20.
1?
RYRIE, Charles C. Teologia Básica ao Alcance de Todos. São Paulo: Mundo Cristão, 2004, p.123.
20
OLIVEIRA, Raimundo Ferreira, Op. Cit., p.l.
21
BENTHO, Esdras Costa. Hermenêutica Fácile Descomplicada. Rio de Janeiro: CPAD, 2003, ps.55,56.
22
LUND & NELSON, Op. Cit., ps.11,12.
"ANDRADE, Claudionor Corrêa. Dicionário Teológico. Rio de Janeiro: CPAD, 11» ed., 2002, p.l73.
24
GRENZ & GURETZKI & NORDILING, Op. Cit, p.66.
25
BENTHO, Esdras Costa, Op. Cit., p.66.
21
ANDRADE, Claudionor Corrêa, Op. Cit, p.150.
27
MCGRATH, Auster E. "Um Caminho Melhor: O Sacerdócio de Todo Crente". In HORTON,
Michael S. (ed.). Religião de Poder. São Paulo: Cultura Cristã, 1998, ps.252-254.
^FERREIRA, Franklin & MYATT, Alan. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2007, p.2.
2
'HENRICHSEN, W. A. Métodos de Estudos Bíblicos. São Paulo: Mundo Cristão, ps.8,9. 3°BENTHO,
idem, p.56. 31OLIVEIRA, idem, p.65.
32
MOSCONI, L. Para Uma Leitura Fiel da Bíblia. São Paulo: Loyola, 1997, ps.101-109. 33RYRIE,
Charles C, Teologia Básica ao Alcance de Todos, ps.123-128. «ZABATIERO, Manual de Exegese, ps.27,28.
"WARREN, Rick. 12 Maneiras de Estudar a Bíblia Sozinho. São Paulo: Vida, 2003, ps.12,13.
"OLIVEIRA, idem, ps.79-100.

QUESTIONÁRIO AVALIAÇÃO DE
HERMENÊUTICA
*Nome:
Sexo: ( ) DataNasc._/_/_Natural:_
*End.:
_, Bairro:.
Cidade:________________________________________UF_
CEP:________________________Fone: (____)_____________
Nome completo, sem rasuras, conforme constará no certificado. *
Endereço correto para o qual será enviado o certificado.

I. QUESTÕES TEÓRICAS:

1. Quais são as duas ameaças (internas e externas) à Igreja Evangélica


mencionadas nesta disciplina de Hermenêutica?
Resp._______________________________________________________
Pr. José Roberto de Oliveira Chagas

2. O que é, teologicamente falando, Hermenêutica?


Resp.__________________________________________

3. E com que se preocupa a Hermenêutica BMica?


Resp._________________________________________

4. Exegese, à luz da Teologia, pode ser definida como?


Resp.____________________________________________

5. Por que, segundo Warren, parte da Igreja não estuda a Bíblia?


Resp.______________________________________________________
II. QUESTÕES AVALIATIVAS:

1. Resuma sua experiência com a Bíblia - você a lê diariamente, por


que, qual é a importância da Bíblia na sua vida...
Resp._______________________________________________________

2. Qual sua opinião sobre o conteúdo desta disciplina?


Resp._____________________________________________

3. Como você avalia o seu aproveitamento deste módulo - tempo


dedicado ao estudo da disciplina, comentários importantes suscitados,
possíveis descobertas?
Resp._______________________________________________________

4. De que maneira você pretende aplicar em sua vida e ministério o que


aprendeu nesta disciplina?
Resp._______________________________________________________

5. Como você avalia a forma como as informações foram transmitidas


pelo professor-escritor: você conseguiu compreender o que ele quis
lhe passar ou teve dificuldades? O que poderia ser melhorado?
Resp._______________________________________________________

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