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II.
RESUMO – A dermatoscopia constitui uma técnica de diagnóstico não-invasiva, in vivo, que permite complementar a
observação clínica de lesões cutâneas não-pigmentadas de etiologia diversa. Nos tumores cutâneos não-pigmentados, a
dermatoscopia facilita a observação de estruturas vasculares, aumentando a acuidade no seu diagnóstico, distinguindo
tumores melanocíticos e não-melanocíticos, benignos e malignos. Na parte II descreve-se a variabilidade da aplicação
clínica da dermatoscopia em lesões cutâneas não-pigmentadas tumorais.
ABSTRACT – Dermoscopy is a noninvasive, in vivo technique that increases the diagnostic accuracy in both melanocytic
and nonmelanocytic skin tumors. In nonpigmented tumors it allows the visualization of vascular structures not visible to
the naked eye. Part II of this article discusses clinical applications of dermoscopy in non-pigmented tumoral skin lesions.
KEY-WORDS – , actinic; Carcinoma, basal cell; Nevus, intradermal; Dermoscopy; Melanoma; Skin neoplasms; Kerato-
sis, seborrheic; Carcinoma, squamous cell; Nevus, Epithelioid and spindle cell.
Por decisão dos autores, este artigo não foi redigido de acordo com os termos do novo Acordo Ortográfico.
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Revista da SPDV 72(3) 2014; André Laureano, Cândida Fernandes, Jorge Cardoso; Morfologia e padrões vasculares em dermatoscopia - Parte II.
Correspondência:
Dr. André Laureano
Serviço de Dermatologia e Venereologia
Hospital de Curry Cabral – Centro Hospitalar de Lisboa Central
Rua da Beneficência, nº 8
1069-166 Lisboa, Portugal
E-mail: andre.oliveira@sapo.pt
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Nestas estruturas residuais, destacam-se os glóbulos Como referido, o melanoma amelanótico ou hipo-
castanhos, pontos pretos e padrão em “explosão de melanótico pode simular outros tumores não-pigmen-
estrelas” remanescente, pela presença de áreas com tados benignos melanocíticos (nevos de Clark e nevos
estrias periféricas regulares associadas a rede pigmen- de Spitz) e não-melanocíticos (queratose seborreica,
tada central. Nos tumores de Spitz nodulares e atípi- granuloma piogénico), e ainda tumores não-pigmen-
cos não-pigmentados é possível observar polimorfismo tados malignos não-melanocíticos. Nestes últimos, é
vascular e vasos atípicos, destacando-se a associação particularmente importante considerar os tumores posi-
de vasos lineares-irregulares, vasos “enrolados” (coi- tivos para a regra EFG, ou seja, com história de nódulo
led) e áreas e glóbulos-vermelho leitoso1,10-12. Deste (habitualmente rosado), firme e de crescimento rápido.
modo, pela partilha de características clínicas e derma- Deste modo, apesar de não ser específica para o diag-
toscópicas entre o nevo de Spitz e o melanoma ame- nóstico de melanoma, esta regra tem elevada sensibili-
lanótico/hipomelanótico, recomenda-se nos adultos a dade para o diagnóstico de tumores malignos, incluindo
excisão de todas as lesões “spitzóides” não-pigmenta- melanoma, carcinoma espinocelular (CEC) invasivo e
das. Nas crianças até aos 12 anos poderá optar-se por carcinoma de células de Merkel (CCM). A dermatosco-
uma abordagem conservadora em lesões spitzóides “tí- pia poderá ser um importante auxiliar no diagnóstico e
picas” (Fig. 2). abordagem subsequente destas lesões.
No melanoma amelanótico, as estruturas dermatos-
cópicas vasculares dominantes e o seu arranjo parecem
depender da espessura e velocidade de crescimento do
tumor, o que reforça a importância de uma adequada
correlação clínica. A dermatoscopia poderá não só con-
tribuir para um diagnóstico precoce deste tumor, mas
também estimar a sua espessura1.
Na fase inicial do crescimento do tumor, o suprimen-
to vascular depende sobretudo do alongamento vertical
dos capilares dos plexos vasculares da derme, o que re-
flecte a presença na dermatoscopia de vasos punctifor-
mes sem halo esbranquiçado, inicialmente com arranjo
regular. Estes melanomas apresentam habitualmente
uma espessura inferior a 1mm e correspondem clinica-
mente a pápulas ou placas.
Fig 2 - Nevo de Spitz não-pigmentado: placa rosada de Com a progressão do crescimento e invasão tumoral
crescimento rápido na face anterior da coxa de uma criança
e aumento da espessura, o alongamento dos capilares
do sexo feminino de 8 anos; a dermatoscopia evidenciou
múltiplos vasos punctiformes de arranjo denso e regular so-
torna-se tortuoso, pelo que alguns vasos adquirem uma
bre fundo rosado, notando-se ainda áreas de despigmen- disposição horizontal, justificando a observação der-
tação reticular e crisálidas; este diagnóstico foi confirmado matoscópica de vasos lineares. Deste modo, em mela-
após estudo histopatológico. nomas amelanóticos ou hipomelanóticos de espessura
intermédia (1-2 mm), a dermatoscopia poderá eviden-
ciar a combinação de vasos punctiformes e vasos linea-
Melanoma amelanótico / hipomelanótico res-irregulares. Estas últimas estruturas também não
O melanoma amelanótico representa cerca de 2 a apresentam halo esbranquiçado, o seu arranjo é irre-
3% das formas de apresentação de melanoma, sendo gular e apresentam um valor predictivo positivo de 68%
particularmente expressivo nos melanomas nodulares. para o diagnóstico de melanoma2.
Um estudo recente de Menzies et al16 demonstrou que Nos tumores mais espessos (>2mm, nodulares) o
cerca de 37% dos melanomas nodulares são amelanó- alongamento dos capilares torna-se insuficiente, pelo
ticos. Enquanto que os melanomas amelanóticos se ca- que ocorrem fenómenos de neoangiogénese a partir
racterizam pela ausência clínica e dermatoscópica de do plexo vascular da derme adjacente. Estes são funda-
pigmentação, os melanomas hipomelanóticos distin- mentais para manter o crescimento e invasão do tumor
guem-se pela presença de estruturas pigmentadas re- e traduzem-se na dermatoscopia em polimorfismo vas-
siduais que ocupam até 30% da área de superfície do cular e vasos atípicos, com predomínio de vasos-linea-
tumor16. res irregulares alongados, bizarros, com distribuição
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No padrão vascular, tal como descrito para o me- vasos punctiformes, sendo constituídos por capilares
lanoma primário amelanótico, nas lesões de menor tortuosos com agrupamento e distribuição em clusters
espessura há um predomínio de vasos punctiformes, e habitualmente envolvidos por um halo esbranqui-
enquanto que nas lesões de maior espessura predo- çado. Neste tumor, a sua presença pode associar-se
mina o polimorfismo vascular. Neste caso, é possível a vasos punctiformes, eritema, escamas, e na forma
a observação de vasos “em saca-rolhas”, lineares- pigmentada também a glóbulos castanhos. A observa-
-irregulares e vasos em gancho (Fig. 5). Os critérios ção de área homogénea acastanhada residual pode-
dermatoscópicos adicionais incluem crisálidas, eritema rá ser uma pista adicional para o seu diagnóstico22,23.
perilesional e telangiectasias estreladas periféricas18. Nas lesões localizadas na face, as estruturas vascula-
res têm uma distribuição preferencialmente periférica,
envolvendo uma área central preenchida por escamas
2. TUMORES CUTÂNEOS NÃO-PIGMENTADOS amarelas-esbranquiçadas e algumas erosões puncti-
NÃO-MELANOCÍTICOS formes4 (Fig. 6).
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Queratose seborreica
As queratoses seborreicas constituem um grupo de
tumores epiteliais benignos prevalentes, de apresenta-
ção clínica (e dermatoscópica) variável. O diagnóstico
diferencial em queratoses seborreicas escassamente
pigmentadas poderá incluir o CEC, verruga vulgar e
ainda o melanoma amelanótico ou hipomelanótico. A
dermatoscopia poderá ser decisiva na sua abordagem
diagnóstica, permitindo a observação de vasos em gan-
cho rodeados por halo esbranquiçado e de distribuição
regular. O valor predictivo positivo destes vasos para
este diagnóstico é de 70%2. Os critérios dermatoscópi-
Fig 7 - (A) (B) Queratoacantoma: nódulo de crescimen- cos adicionais incluem a presença de um bordo bem
to rápido com depressão central crateriforme localizado delimitado, fissuras e sulcos (conferindo um aspecto ce-
na face; a dermatoscopia evidenciou arranjo radial pe-
rebriforme), quistos milia e aberturas tipo-comedão4.
riférico de vasos em gancho e massa central amarela-
-acastanhada de queratina com pontos hemorrágicos. As queratoses seborreicas irritadas ou traumatizadas
(C) (D) Carcinoma espinocelular invasivo: nódulo erite- podem representar dificuldades diagnósticas adicionais,
matoso maleolar de crescimento rápido; a dermatosco- particularmente nos casos em que não é possível apurar
pia evidenciou vasos polimórficos. Nos dois casos, a pre- a história de traumatismo recente19. Nestes casos, que
sença de áreas esbranquiçadas constitui uma pista para podem simular melanoma ou CEC, a observação der-
a natureza queratinocítica destes tumores. matoscópica de eritema e crostas hemáticas, associada
a vasos em gancho, por vezes alongados, e outras es-
truturas específicas, constituem pistas para o diagnósti-
diferencial entre queratoacantoma e outros tumores, in- co correcto27-29.
cluindo queratose seborreica, queratose actínica hiper-
trófica, CBC e melanoma amelanótico (Fig. 7A-B). Acantoma de células claras
O acantoma de células claras ou acantoma de
Carcinoma espinocelular invasivo Degos representa um tumor cutâneo epitelial benigno
Verifica-se uma possível correlação entre as estru- raro, caracterizado por nódulo ou placa arredondados,
turas dermatoscópicas frequentemente observadas no de limites bem definidos, com cerca de 1 a 2cm de diâ-
CEC e o seu grau de diferenciação, traduzindo um pro- metro, indolor, e de localização frequente na face an-
cesso dinâmico evolutivo continuo, que poderá ter o terior das pernas. O aparecimento de múltiplas lesões
seu início na queratose actínica, uma fase transitória no é muito raro. A dermatoscopia permite a observação
CEC in situ, culminando na sua forma invasiva19,20,26. de vasos punctiformes (ou glomerulares) rodeados por
Nos CECs invasivos e indiferenciados, a derma- halo esbranquiçado, dispostos em linhas, com cruza-
toscopia revela estruturas vasculares com marcado mentos entre si, semelhantes a um “colar de pérolas”30.
polimorfismo e atipia, com predomínio de vasos linea- Adicionalmente poderá ser possível observar fundo es-
res-irregulares, vasos em gancho e vasos punctiformes, branquiçado, escamas superficiais e colarette descama-
de forma e arranjo irregulares e distribuição difusa na tiva19 (Fig. 8).
superfície do tumor. São visíveis sinais de queratinização,
importantes pistas para o diagnóstico deste tumor, dos Carcinoma basocelular
quais se destaca a presença de halo esbranquiçado em A dermatoscopia constitui uma técnica de diagnós-
redor dos vasos, escamas brancas-amareladas, material tico não-invasiva que permite a observação in vivo de
amorfo correspondendo a queratina com pontos hemor- estruturas com reprodutibilidade para o diagnóstico de
rágicos no seu interior, fundo esbranquiçado (incluindo CBC e a distinção dos seus diversos subtipos4.
áreas redondas designadas por “pérolas de queratina”), O diagnóstico diferencial clínico do CBC nodular inclui
crostas sero-hemáticas alaranjadas, áreas de ulceração o nevo intradérmico, hiperplasia sebácea, CEC, tumores
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única, habitualmente localizada na região lombossa- crateras centrais amareladas ou umbilicação (bonbon
grada. O seu diagnóstico diferencial inclui queratose toffee sign) correspondentes à dilatação do óstio infun-
seborreica, nevo intradérmico e fibroma. A observação dibular das glândulas sebáceas35,36 (Fig. 12 A-B).
dermatoscópica permite a visualização de vasos arbori-
formes finos, pouco ramificados associados a crisálidas
(com luz polarizada). Menos frequentemente, é ainda
possível observar vasos punctiformes, ulceração e al-
guns quistos milia32,33.
O CBC infundíbulo quístico é também um subtipo
raro, também com escassas descrições da sua apre-
sentação dermatoscópica. Tem sido evidenciado o
predomínio de vasos arboriformes finos e alongados,
ninhos ovóides e glóbulos azuis-cinzentos, assim como
a ausência de estruturas em folha, estruturas em roda Fig 12 - (A) Esquema ilustrativo da disposição dos va-
de carro ou ulceração4,31. sos em coroa em redor de área multilobulada e óstios
No raro carcinoma basoescamoso (metatípico), tal centrais, representativos dos achados dermatoscópicos
como na observação histopatológica, é possível identi- na hiperplasia sebácea (B) Pápula cor de pele localiza-
ficar estruturas dermatoscópicas comuns ao CBC e ao da na fronte de doente do sexo masculino de 70 anos;
CEC, destacando-se a presença de vasos não-focados4 achados dermatoscópicos característicos de hiperplasia
(Fig. 11 A-B). sebácea, sublinhando-se que os vasos não ultrapassam
a área central.
Histiocitofibroma
Os histiocitofibromas ou dermatofibromas são tumo-
res benignos cutâneos não-melanocíticos comuns asso-
ciados a uma variedade de padrões dermatoscópicos.
A combinação de mancha ou área homogénea esbran-
quiçada central com uma rede pigmentada periférica
constitui o padrão mais frequente. O reconhecimento
Fig 11 - (A) (B) Carcinoma basoescamoso do pavilhão
destes padrões diversos poderá permitir a sua distinção,
auricular: a dermatoscopia evidenciou características
comuns ao carcinoma basocelular (vasos arboriformes) nem sempre possível, de outros tumores melanocíticos.
e ao carcinoma espinocelular (crostas amarelas e cas- Destaca-se aqui a possível presença de vasos punctifor-
tanhas, áreas esbranquiçadas, polimorfismo vascular, mes na área homogénea central evidenciada pela ob-
erosões); as estruturas vasculares eram pouco focadas. servação dermatoscópica37,40 (Fig. 13 A-B).
Hiperplasia sebácea
A hiperplasia sebácea é um neoplasia benigna fre-
quente, cujo diagnóstico diferencial, apesar da sua
apresentação clínica característica, inclui tumores cutâ-
neos prevalentes (CBC, nevo intradérmico) e raros (tri-
coepitelioma desmoplásico). A dermatoscopia evidencia
a presença de vasos “em coroa” resultantes da dispo-
sição periférica e regular de múltiplos vasos de cor
vermelha e escassamente ramificados. O seu valor pre-
dictivo positivo para o diagnóstico de hiperplasia sebá- Fig 13 - (A) Esquema ilustrativo da apresentação der-
cea é de 83,3%2. Estas estruturas circundam uma área matoscópica do histiocitofibroma (B) A presença de va-
homogénea central branca ou amarela (polilobulada) sos punctiformes dispersos sobre a mancha branca cen-
tral rodeada por rede pigmentada periférica poderá ser
sem a atravessar, semelhante ao observado no molusco
notada.
contagioso34. Poderá ser visível a presença de pequenas
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Angioqueratoma
A presença de lacunas pretas constitui a principal
pista diagnóstica dermatoscópica, correspondendo a
vasos dilatados trombosados da derme. Adicionalmente
poderá observar-se lacunas vermelhas, véu esbranqui-
çado (em correlação com hiperqueratose e acantose),
eritema e crostas hemáticas5 (Fig. 14 B).
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Sarcoma de Kaposi
A observação dermatoscópica no sarcoma de Ka-
posi revela áreas homogéneas caracterizadas por uma
multiplicidade de cores, conferindo à lesão uma paleta
de cores semelhante a um “arco íris”. No entanto, este
padrão não é exclusivo deste tumor vascular, podendo
também ser observado no granuloma piogénico, histio-
citofibroma, melanoma, líquen plano e dermite de es-
tase19. Adicionalmente, podem ser observadas escamas
Fig 16 - Nódulo eritemato-violáceo de crescimento e ainda pequenos glóbulos castanhos com distribuição
rápido localizado na região mandibular esquerda de irregular (Fig. 18 A-B).
mulher de 82 anos. A dermatoscopia evidenciou vasos
polimórficos, destacando-se a presença de vasos arbori-
formes de grande calibre focados e não-focados, áreas
vermelho-leitoso e crisálidas. Os estudos histopatológico
e imunohistoquímico favoreceram o diagnóstico de car-
cinoma de células de Merkel.
Angiossarcoma cutâneo
O angiossarcoma é um tumor vascular raro, multi-
cêntrico, derivado das células endoteliais, com elevado Fig 18 - (A) (B) Sarcoma de Kaposi: padrão dermatos-
grau de malignidade e mau prognóstico. As lesões são cópico multicolor tipo “arco-íris”.
nodulares ou em placa, violáceas e de ulceração fácil.
O seu diagnóstico diferencial pode incluir patologias tão
díspares como o melanoma amelanótico, outros tumores Tumores dos anexos
vasculares, rosácea, equimoses e celulite / erisipela4,45. Os tumores dos anexos podem apresentar carac-
A dermatoscopia no angiossarcoma clássico nodular terísticas clínicas e dermatoscópicas semelhantes a
permite observar áreas homogéneas vermelhas, púrpu- tumores malignos cutâneos não-pigmentados, nomea-
ra ou azuladas, separadas entre si por linhas esbranqui- damente o CBC.
çadas. Nas áreas “menos elevadas” do tumor é ainda Nos tumores sebáceos a utilidade da dermatoscopia
possível identificar alguns glóbulos amarelos. é limitada à diferenciação entre a hiperplasia sebácea,
No angiossarcoma induzido pela radiação obser- tumor comum cuja apresentação dermatoscópica foi
vam-se áreas homogéneas esbranquiçadas e rosadas, descrita anteriormente, e os restantes tumores sebáceos,
com um característico aumento da intensidade da sua raros e quase exclusivamente encontrados no contex-
cor na periferia da lesão (gradiente de cor: rosa, verme- to da síndroma de Muir-Torre. No adenoma sebáceo é
lho, púrpura)46. Em todas as formas são visíveis vasos possível observar telangiectasias periféricas, área central
atípicos em número variável, incluindo vasos punctifor- esbranquiçada opaca e área homogénea amarelada.
mes, glomerulares e lineares-irregulares47 (Fig. 17 A-B). No sebaceoma encontram-se também telangiectasias
Fig 17 - (A) Angiossarcoma clássico do couro cabeludo (B) A dermatoscopia evidenciou áreas homogéneas vermelhas, azuladas
e de coloração púrpura, admitindo-se intensificação periférica da cor.
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sebáceo (em cerca de 40% dos casos), é possível obser- associação de um fundo rosado (67% dos casos) e vasos
var ainda estruturas arredondadas amarelas correspon- lineares finos (80%). Tal como no histiocitofibroma, uma
dentes ao mesmo4,36. rede pigmentada pode estar presente (é a estrutura
mais frequentemente observada, em 87% dos casos),
Outros tumores cutâneos raros mas sem o arranjo delicado periférico tão característi-
O fibroxantoma atípico e o histiocitoma fibroso ma- co desse tumor benigno. Outros critérios dermatoscópi-
ligno, apesar das suas características histopatológicas cos incluem crisálidas, áreas homogéneas castanhas e
semelhantes, têm um prognóstico distinto, excelente no áreas homogéneas hipopigmentadas61.
primeiro. Do ponto de vista clínico, o diagnóstico di- O diagnóstico dos estadios iniciais da micose fungói-
ferencial do fibroxantoma atípico inclui melanoma, de (MF) pode ser difícil, considerando que a sua apre-
CBC, CEC, CCM e dermatofibrossarcoma protuberans sentação clínica e histopatológica tem características
(DFSP). A dermatoscopia é inespecífica, incluindo vasos comuns ao eczema crónico. Um estudo recente de Lallas
polimórficos muito tortuosos e de distribuição irregular, et al62 demonstrou a utilidade da dermatoscopia na fase
áreas homogéneas esbranquiçadas, áreas vermelho- precoce da MF e as características que permitem favo-
-leitoso, massas de queratina, ulceração e crostas. De recer este diagnóstico versus eczema crónico. As estrutu-
onde se conclui que esta técnica apresenta limitações ras dermatoscópicas que suportam o diagnóstico de MF
neste diagnóstico, considerando os referidos diagnósti- incluem pontos purpúricos, vasos lineares finos curtos
cos diferenciais. O mesmo é válido para o histiocitoma e áreas homogéneas amarelas e alaranjadas com dis-
fibroso maligno, no qual se observam vasos polimórfi- tribuição focal. A presença de uma estrutura vascular
cos, ulceração e pontos hemorrágicos. No entanto, tal constituída por um componente linear e um componen-
como descrito previamente no CCM, nestes tumores a te punctiforme, semelhante a um espermatozóide, foi
presença de polimorfismo vascular permite excluir pato- identificada em cerca de 50% dos casos, representando
logia tumoral benigna, impondo uma abordagem diag- um critério dermatoscópico específico para o diagnósti-
nóstica histopatológica adicional36,60. co de MF (inicial) (Fig. 20 A-B).
No DFSP, a dermatoscopia pode constituir uma fer-
ramenta útil no seu diagnóstico precoce, bem como na
sua distinção do histiocitofibroma. É possível observar a CONCLUSÃO
A aplicação da dermatoscopia na observação de
tumores cutâneos não-pigmentados é diversa, tendo
permitido identificar estruturas vasculares especifi-
cas de grande importância na distinção entre tumores
malignos e benignos. Na prática clínica deverá com-
plementar uma adequada anamnese e observação
dermatológica completa, não substituindo a avaliação
histopatológica nos casos em que há suspeita de pato-
logia tumoral maligna.
REFERÊNCIAS
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