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LISBOA
2007
INSTITUTO SUPERIOR DE AGRONOMIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA FLORESTAL
Índice
Índice de Figuras
A região eurosiberiana abrange grande parte da Europa (com excepção dos países
mediterrâneos, da zona árctica e de parte dos países mais orientais) e da Ásia
setentrional. Está representada na Península Ibérica pela chamada (pelos fitogeógrafos e
fitossociólogos) província atlântica, que se caracteriza por um clima húmido ou
subhúmido, suavizado pela influência oceânica, com invernos suaves (isto é, pouco
frios) e com o período seco estival pouco acentuado ou mesmo inexistente. Estende-se
pelo noroeste de Portugal, a maior parte da Galiza, Astúrias, Cantábria, País Basco,
noroeste de Navarra e Pirinéus ocidentais. Entre a Galiza e o País Basco ocupa apenas
uma faixa estreita entre a Cordilheira Cantábrica, que lhe forma o limite sul, e o mar.
Contudo, a sua influência estende-se em muitos pontos mais para o interior da
Península, sob a forma de presença de espécies e comunidades vegetais, especialmente
nas partes norte e ocidental. A Cordilheira Cantábrica pode também ser incluída nesta
região, consoante os critérios de reconhecimento e classificação que se utilizem.
1
Este capitulo é largamente baseado, com adaptações e complementos, em:
López González, G. 2004. Guía de los Árboles y Arbustos de la Península Ibérica e Baleares. 2.ª
Edicíon corregida. Mundi-Prensa. Madrid.
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Regiões Biogeográficas
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Blanco Castro, E., M. A. Casado González, M. Costa Tenório, R. Escribano Bombín, M. Garcia Antón,
M, Génova Fuster, Á. Gómez Manzaneque, J. C. Moreno Saiz, C. Morla Juaristi, P. Regato Pajares e H.
Sainz Ollero. 1997. Los Bosques Ibéricos: una Interpretación Geobotánica. Editorial Planeta. Barcelona.
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presença de faiais (povoamentos de faia, Fagus sylvatica) e, por vezes, sobretudo nos
Pirinéus, por abietais de abeto-branco (Abies alba); estas formações ocupam geralmente
as encostas mais frescas e com solos profundos, em montanhas não muito elevadas.
Faz-se por vezes sentir alguma influência mediterrânea, traduzida na presença de
azinhais com loureiros, nos cumes e encostas mais quentes, especialmente em solos de
origem calcária.
Em muitos casos, estas formações foram substituídas por pinhais instalados pelo
homem (principalmente de pinheiro-bravo, Pinus pinaster, pinheiro-silvestre, Pinus
sylvestris, ambos autóctones, e pinheiro-insigne, P. radiata, este oriundo da Península
de Monterey, na Califórnia), eucaliptais (Eucalyptus spp., mais frequentemente o E.
globulus), povoamentos de larício (Larix spp.), acaciais (Acacia spp.) e povoamentos de
outras espécies, autóctones ou exóticas, que acabaram por se integrar profundamente na
paisagem actual.
3
Espécie frequente e fácil de observar também na Tapada da Ajuda (C. monogyna subsp. brevispina).
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It = (t+m+M) × 10,
• Sub-húmido, se 900>P>500;
• Húmido, se 1400>P>900;
• Superhúmido, se P>1400.
4
Rivas-Martinez, S. 1987. Memória del Mapa de Séries de Vegetacion de España. ICONA. Madrid.
5
Alcazar Ariza, F. e outros. 1987. La Vegetación de España. Universidad de Alcalá de Henares. Madrid.
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Na classificação bioclimática referente a esta região, com mais de dois meses secos,
os andares bioclimáticos definidos pelo índice de termicidade (It) referido na página
anterior são os seguintes:
As variantes ombroclimáticas definidas pela precipitação média anual (P) são neste
caso mais abundantes do que na região eurosiberiana, distinguindo-se os seguintes
tipos:
6
Como termo de comparação recorde-se que Lisboa tem uma precipitação média anual de cerca de 700
mm.
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Dentro da região mediterrânea, os vales dos rios e ribeiras e os solos com o lençol
freático próximo da superfície compensam pela humidade do solo o período de secura
estival, permitindo a ocorrência de formações florestais ribeirinhas dominadas por
espécies caducifólias. Incluem ulmeirais (Ulmus spp.), choupais (Populus spp.),
7
Aqui referido no sentido da Carta Ecológica de Portugal de J. de Pina Manique e Albuquerque, que
considera o nível basal como aquele que se estende dos 0 aos 400 m de altitude. A maior parte do
território continental de Portugal pertence a este nível, subindo para os níveis submontano (400-700 m),
montano (700-1000 m), altimontano (1000-1300 m), erminiano (1300-1600 m) e subalpino e alpino
(1600-1900 e mais de 1900 m) apenas em áreas mais restritas situadas sobretudo nas serras do centro e
norte do País.
8
Não é claro se a área de distribuição natural desta espécie, que é mediterrânea e ibérica, terá incluído no
passado território de Portugal, mas é pouco provável que assim fosse. Os pinhais actuais de pinheiro de
Alepo foram instalados pelo homem e este pinheiro é o mais comum na Tapada da Ajuda, por exemplo.
9
O pinheiro-manso estaria originariamente associado às dunas e outros solos de textura grosseira da
região meridional da Península, de características mediterrâneas, embora a acção do homem o tenha
levado a ocorrer actualmente em quase todo o País. O pinheiro-bravo, Pinus pinaster, pelo contrário, é
um pinheiro claramente atlântico, povoando as dunas situadas mais a norte. Está mesmo representado em
Portugal, Galiza e região de Bordéus (França) pela subespécie P. pinaster subsp. atlantica, designação
muito esclarecedora. A sua presença para sul do cabo de Sines deve-se provavelmente à acção humana
(no Holocénico antigo, há cerca de 8 mil anos, parece ter chegado até aos areais um pouco a sul do Sado,
segundo os resultados dos estudos do Quaternário Ibérico).
10
O palmito, palmeira-anã, ou palmeira-das-vassouras (Chamaerops humilis) é a única palmeira com
distribuição natural na Península Ibérica. Em Portugal ocorre naturalmente no Algarve.
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Figura 2. Galeria ribeirinha com loendro, ou cevadilha (Nerium oleander), numa ribeira
de caudal intermitente do Perímetro Florestal da Contenda, no interior do Alentejo.
11
Esta espécie, um endemismo ibero-norte-africano, substitui na região mediterrânea o freixo-europeu
(F. excelsior), do qual difere essencialmente por ter folíolos (a folha dos freixos é composta) mais
estreitos, justificando o qualificativo específico de angustifolia.
12
Este tipo de formações pode ser facilmente observado em ribeiras do Alentejo e Algarve, sobretudo
nas que reduzem fortemente ou perdem de todo o caudal durante a época estival.
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Regiões Biogeográficas
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observar, na maioria das montanhas do Globo, uma transição em altitude entre pisos, ou
cinturas, de vegetação. Na maioria das montanhas mediterrâneas da Península, é
característica a passagem, à medida que aumenta a altitude, de florestas de perenifólias
para outras de caducifólias e destas para florestas de coníferas e/ou matagais de
montanha, com ocorrência de variações em torno deste padrão comum, que emula as
transições entre tipos de coberto que se podem encontrar a nível basal quando se avança
de sul para norte.
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Muitas plantas são indiferentes à natureza do substrato, mas muitas outras requerem,
para terem um desenvolvimento normal, apenas um dos tipos acima descritos. Podem
nesse caso ocorrer apenas num deles ou, pelo contrário, manifestar apenas uma
preferência mais ou menos marcada por um dos tipos em relação ao outro, embora
desenvolvendo-se em ambos, o que pode estar relacionado com diferenças na sua
capacidade para resistirem com sucesso à concorrência movida por outras espécies em
cada um dos dois tipos de solos. Para além desta dicotomia entre solos de natureza
siliciosa e calcária, que é um tanto simplista, são conhecidos na Península substratos
siliciosos capazes de originarem solos quase neutros, como alguns arenitos do Triássico,
e substratos constituídos por rochas ultrabásicas (pteridotites e serpentinas, por
exemplo), sobre os quais se podem desenvolver solos básicos ricos em metais pesados
tóxicos, com forte acção selectiva sobre as plantas.
13
As formações calcárias ocorrem em Portugal sobretudo na Região Centro – serras calcárias da
Estremadura e Serra da Arrábida – e numa faixa do Algarve (zona Calco-mediterrânea da Carta Ecológica
de Portugal de J. de Pina Manique e Albuquerque).
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Regiões Biogeográficas
A repartição das diversas espécies na Península Ibérica está de acordo com as suas
preferências de solo e de clima. As espécies mediterrâneas termófilas, que exigem uma
temperatura elevada e ausência de geadas, ocorrem geralmente nas regiões costeiras do
sul, estendendo-se desde a Catalunha ao Algarve; muitas delas sobem ainda pela costa
atlântica até perto de Lisboa o penetram no interior através dos vales do Ebro e do
Guadalquivir. Também se encontram representadas na flora das ilhas Baleares. Algumas
delas, frequentemente relacionadas com a flora do Norte de África, adaptaram-se a
condições de secura mais elevada e têm uma área de distribuição natural mais
circunscrita ao sudeste árido (províncias de Murcia e de Almería). Outras espécies
mediterrâneas, igualmente adaptadas a climas quentes, resistem melhor às geadas e têm
áreas de distribuição que se estendem mais para o interior da Península, mas geralmente
não sobem acima dos 700 a 800 m de altitude. As espécies mais generalistas quanto à
natureza do substrato estenderam-se por quase toda a Península, faltando eventualmente
nos cumes mais elevados e frios, opondo-se às que são mais especializadas numa
natureza determinada do substrato.
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Regiões Biogeográficas
Nas condições actuais, a erosão e degradação dos solos pela actividade humana
tornaram irrecuperáveis a curto prazo algumas das formações arbóreas naturais da
Península, sobretudo em situações em que foram já completamente destruídas. Estão
nesta situação, como principal exemplo, as formações mais mesofíticas, como os faiais
que se haviam mantido na região mediterrânea como relíquia (em todo o caso
relativamente recente, já que a expansão da faia ocorreu há apenas cerca de 3 a 4
milhares de anos) de tempos com clima mais ameno.
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Atlântica
Os principais tipos de coberto florestal natural desta região são, de facto, dominados
por folhosas caducifólias. As coníferas, melhor adaptadas a solos pobres e erosionados,
têm sido muitas vezes apontadas como sendo de expansão recente pela mão do homem,
em detrimento de espaços mais “nobres” presumivelmente ocupados por quercíneas,
salvo em situações de montanha e altiplano com clima mais agreste. Os estudos mais
recentes da flora do passado indicam, contudo, que os pinhais adquiriram uma
importância florestal considerável muito antes de terem sido favorecidos pelo homem.
De qualquer forma, o coberto florestal dominante inclui actualmente espaços florestais
de ambos os tipos – folhosas e resinosas – sendo geralmente as florestas de folhosas
caracteristicamente muito estratificadas, como se ilustra na figura 3.
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Esta conclusão não é contudo suportada pelos poucos estudos feitos em Portugal em pinhais de
pinheiro-bravo, que apontam para uma densidade de aves muito baixa, em geral.
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Atlântica
Faiais
Os faiais são florestas atlânticas típicas, características do andar montano (ou acima
deste) da região eurosiberiana Ibérica, não tendo actualmente representação natural no
território de Portugal16. As principais áreas de distribuição sitiam-se entre os 800 e os
1500 m de altitude, em solos frescos e de relativa riqueza em nutrientes. Embora
possam ocorrer em solos tanto de origem siliciosa como calcária, estão quase sempre
15
Rodriguez de la Fuente, F. 1971. A Fauna: Vida e Costumes dos Animais Selvagens. Volume V:
Eurásia e América do Norte (Região Holárctica). Publicações Alfa / Publicações Europa-América. Mem
Martins.
16
Os faiais existentes actualmente em Portugal foram introduzidos e ocorrem sobretudo em Matas
Nacionais e Perímetros Florestais geridos pelos Serviços Florestais. Existem algumas áreas, por exemplo,
na Serra da Estrela.
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Atlântica
Apesar do seu carácter atlântico, os faiais penetram na Península até ao seu centro,
ocorrendo ainda na província de Madrid. É provável que estes núcleos mais interiores
representem um testemunho de “tempos melhores” para as faias, durante os quais a área
de influência atlântica na Península foi mais ampla. Refugiadas em locais frescos e
sombrios, nos quais podem encontrar condições microclimáticas excepcionalmente
favoráveis, estas faias são muito difíceis de recuperar quando ocorre a desflorestação
destas áreas, sendo nessa caso quase sempre substituídas por carvalhos-negrais
(Quercus pyrenaica).
Carvalhais caducifólios
17
Por vezes mesmo mais, na fachada atlântica das serras do noroeste de Portugal e na Serra da Estrela.
Sobre este assunto pode consultar-se, por exemplo:
Alves, J. M. S, M. D. Espírito Santo, J. C. Costa, J. H C. Gonçalves e M. F. Lousã. 1998. Habitats
Naturais e Seminaturais de Portugal Continental. Tipos de Habitats mais Significativos e
Agrupamentos Vegetais Característicos. Instituto da Conservação da Natureza. Lisboa.
Esta publicação está disponível na Biblioteca do ISA (cota P01-411).
18
Sem ocorrência natural descrita em Portugal, mas semelhante morfologicamente ao carvalho-roble
(Quercus robur), do qual se distingue principalmente por ter folhas de pecíolo mais longo, com a base do
limbo mais arredondada e com algum (pouco) indumento na página inferior, principalmente nas axilas
das nervuras (as folhas do carvalho-roble são glabras).
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Atlântica
porém, nas zonas mais interiores e com menos influência atlântica o carvalho-roble dá
lugar ao carvalho-negral, ou carvalho-pardo das Beiras (Quercus pyrenaica), transição
que se faz notar de forma evidente em Portugal.
O andar do carvalho-roble é o mais alterado de toda a região atlântica, por ser
actualmente e ter sido no passado histórico o mais adequado ao desenvolvimento e à
expansão da agricultura e da pecuária. Em muitas áreas da Península, como por
exemplo no País Basco, as formações de carvalho-roble desapareceram quase por
completo. As suas espécies companheiras mais comuns, o castanheiro (Castanea sativa)
e o vidoeiro (Betula pubescens), também nem sempre permanecem, não obstante o
interesse económico da primeira, explorada para produção de fruto e/ou da madeira. A
degradação dos carvalhais atlânticos dá lugar a formações arbustivas com dominância
de urzes (Erica spp. e espécies de características semelhantes) e tojos (Ulex spp.).
A área potencial de distribuição natural do carvalho-roble está hoje ocupada
florestalmente, tanto em Portugal como em Espanha, sobretudo por pinhais de pinheiro-
bravo ou pinheiro-silvestre (a maior altitude) e por eucaliptais de Eucalyptus globulus,
instalados principalmente após a ocorrência das fases degradativas do carvalhal, ou seja,
nos urzais atlânticos que se encontravam incultos. Contudo, Alves et al. (1998)19
reconhecem ainda a existência em Portugal de núcleos e pequenas manchas de
carvalhais naturais e semi-naturais de carvalho-roble.
O carvalho-negral (Quercus pyrenaica) é, de entre os carvalhos caducifólios da
região atlântica, um dos mais resistentes à secura e ao carácter continental/interior do
clima. As suas formações, mais subatlânticas do que atlânticas, representam muitas
vezes um coberto arbóreo de transição entre as regiões atlântica e mediterrânea,
constituindo como que o último indício da primeira. A área de ocorrência na Península
Ibérica é extensa, adquirindo uma importância considerável sobretudo nas montanhas da
região central: estende-se desde o interior da Galiza e da vertente sul da cordilheira
Cantábrica até aos sistemas Oretano e Mariânico, alcançando a sul, já de forma muito
localizada, a serra Nevada e as montanhas de Cádiz20.
No interior da península o carvalho-negral ocorre principalmente a partir do andar
montano, onde encontra níveis de pluviosidade adequados às suas necessidades, e nas
19
Obra citada (nota 17).
20
Em Portugal este carvalho ocorre principalmente no interior norte e centro, mas estende-se para oeste
até quase ao mar (já com ocorrência rara na Serra de Sintra, eventualmente introduzido) pelas serras
calcárias da Estremadura e para sul até ao Alto Alentejo interior (ocorrendo então especialmente na Serra
de S. Mamede e regiões limítrofes de maior altitude).
16
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Vidoais
21
Sinonímia para o taxon que ocorre em Portugal: Betula pubescens Ehrh. = Betula alba L. = Betula
celtiberica Rothm. & Vasc. = Betula pubescens ssp. celtiberica (Rothm. & Vasc.) Rivas Mart.
17
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Pinhais
A posição natural dos pinhais ibéricos está hoje muito alterada pela cultura e pela
reflorestação de terrenos incultos e abandonados, já que as características de
pioneirismo de algumas das espécies do género Pinus e a sua boa aptidão florestal têm
encorajado, desde há muito, a sua cultura e expansão. A tradição que, em Portugal,
atribui ao rei D. Diniz um papel de relevo no encorajamento da expansão do pinhal é
disso um bom exemplo, em todo o caso com pouco fundamento documental.
Os pinhais naturais mais característicos da região atlântica são talvez os de pinheiro-
montanhês (Pinus uncinata), sem representação natural em Portugal, e de pinheiro-
silvestre (P. sylvestris), o primeiro associado sobretudo ao piso subalpino dos Pirinéus22
e acompanhado frequentemente, nas suas formações naturais, por rododendros,
salgueiros de espécies típicas de altitude, arandos (Vaccinium spp.) e outras espécies
arbustivas. Estende-se até ao limite altitudinal do crescimento arbóreo, atingindo a cota
de cerca de 2400 m e, em exemplares isolados, até 2700 m.
O pinheiro-silvestre desempenha um papel semelhante ao do pinheiro-montanhês
noutras altas montanhas peninsulares, tanto calcárias como siliciosas. É acompanhado
por espécies lenhosas arbustivas de montanha, que podem formar comunidades próprias
acima do nível altitudinal em que ocorre este pinheiro. A sua cota inferior de ocorrência
actual tem sido influenciada pelo homem, que o expandiu para áreas mais baixas,
anteriormente ocupadas, presumivelmente, por florestas de folhosas caducifólias ou
pelas suas fases de degradação.
A altitudes mais baixas e em substratos geralmente siliciosos ocorre o pinheiro-
bravo (Pinus pinaster), que na Galiza e no noroeste de Portugal desce até ao nível do
mar e no interior da Península confronta por vezes com carvalhais de carvalho-negral. O
pinheiro-negro (P. nigra ssp. salzmannii), sem representação natural em Portugal, é já
22
Esta espécie não tem ocorrência natural em Portugal, tendo sido ensaiada pelos Serviços Florestais na
Serra da Estrela, em conjunto com outras espécies semelhantes das montanhas da Europa, devido à sua
resistência à neve.
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Atlântica
uma espécie de níveis mais altos, ocorrendo não só nos Pirinéus, como também em
outras montanhas do centro, leste e sul da Península, mas em algumas zonas calcárias
desce em altitude, substituindo aí o pinheiro-bravo. Ambos podem ocupar, consoante as
regiões, o nível abaixo do dos pinhais de pinheiro-silvestre.
Em Portugal consideram-se de ocorrência natural ou semi-natural (devido à
intervenção do homem na sua cultura e expansão), na região atlântica, os pinhais de
pinheiro-bravo (figura 4) e de pinheiro-silvestre (este em altitude). Em arborizações
mais recentes foram introduzidas várias subespécies e formas do pinheiro-negro (Pinus
nigra), em plantações para arborização de incultos e terrenos agrícolas abandonados,
bem como de pinheiro-insigne (Pinus radiata), este originário da Califórnia (Península
de Monterey), com grande expansão em todas as regiões temperadas húmidas do Globo
e, em particular, na Península Ibérica.
Florestas mistas
As formações lenhosas arbóreas em que predomina uma única espécie são as mais
comuns na Península Ibérica. Contudo, ocorrem também, em menor escala, situações
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Atlântica
em que se misturam duas ou mais espécies arbóreas, embora sem que se encontrem por
regra situações de grande complexidade, como as das florestas mistas das regiões
tropicais e subtropicais. Podem encontrar-se, por exemplo, formações mistas de faia e
abeto-branco (Abies alba) nos Pirinéus e galerias ribeirinhas de composição mista. As
formações deste tipo podem ser formas de transição entre cobertos dominados por cada
uma das espécies que se encontram presentes, com ou sem intervenção e
condicionamento humanos, mas algumas situações escapam a esta tipologia, pelo
menos no presente, parecendo corresponder a algum tipo de partilha de nichos
ecológicos particularmente favoráveis a coexistência de mais de uma espécie.
Matagais arbustivos
20
Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Atlântica
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Cabral, M. J. (coord.), J. Almeida, P. R. Almeida, T. Dellinger, N. Ferrand de Almeida, M. E. Oliveira,
J. M. Palmeirim, A. I. Queiroz, L. Rogado & M. Santos Reis (eds.). 2006. Livro Vermelho dos
Vertebrados de Portugal. 2.ª edição. Instituto da Conservação da Natureza / Assírio & Alvim. Lisboa.
22
Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Atlântica
24
Reino, L. 2004. O Picanço-de-dorso-ruivo. João Azevedo Editor. Mirandela.
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hemorrágica viral, tem sido um dos factores de ameaça graves à sobrevivência dos
carnívoros ibéricos com estatuto de conservação mais delicado.
Contudo, o homem encontrou também nesta região, desde muito cedo na sua
história, formas de aproveitamento das comunidades vegetais que se revestem hoje de
grande importância ambiental: o montado, mais frequentemente dominado por sobreiros
e/ou azinheiras, é uma comunidade de floresta aberta, ou formação-parque, que a
presença do gado – ovino, suíno, caprino, ou mais raramente, bovino ou equino –
mantém livre de arbustos baixos, emulando o comportamento de uma fauna silvestre de
ungulados que entretanto se reduziu ou desapareceu de todo (figura 5). A diversidade
biológica da sua fauna silvestre é elevada e o aproveitamento destes espaços pelo
homem é, com frequência, um modelo de uso múltiplo das formações lenhosas naturais.
O montado de sobro é o paradigma desta articulação entre o homem e a natureza: nele
se pode produzir simultaneamente cortiça, gado, mel e caça, entre outros produtos.
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Mediterrânea
Azinhais
25
Obra citada (nota n.º 15), Volume IV: Eurásia e América do Norte (Região Holárctica).
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rotundifolia). De uma forma geral, a intervenção humana tem conduzido o azinhal para
a forma de montado de azinho, sendo as mais das vezes o sub-bosque constituído por
pastagem natural de herbáceas ou de subarbustos pouco desenvolvidos, a qual é
utilizada para a criação extensiva de ovinos, caprinos e suínos (com relevo para o porco-
preto) ou, mais raramente, de bovinos ou equinos (figura 7).
Sobreirais
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Mediterrânea
(Quercus canariensis)26, nas áreas onde este ocorra, nesse caso ocupando geralmente as
encostas frescas e sombrias.
Tal como no caso dos azinhais e ainda com maior razão de ser, dada a sua
importância económica actual para a produção de cortiça, a intervenção humana nos
sobreirais tende a conduzi-los para a forma de montado (figura 8), puro ou misto (nesse
caso geralmente com azinheiras), que pode ou não ser pastoreado sob coberto.
26
Esta espécie tem actualmente uma distribuição quase residual em Portugal, encontrando-se
essencialmente na Serra de Monchique; pode formar híbridos com o carvalho-cerquinho (Q. faginea),
geralmente designados por Q. × marianica.
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Carvalhais marcescentes
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Na terminologia utilizada para a Carta Ecológica de Portugal, de J. De Pina Manique e Albuquerque,
estes carvalhos são considerados associados ao polo de influência termoatlântico, ou macaronésico, e
típicos da Serra de Monchique e áreas limítrofes do sudoeste alentejano.
28
A presença da subespécie Q. faginea ssp. faginea, pelas suas características e exigências ambientais,
pode ocorrer no nordeste do País e, de uma forma geral, em toda a zona mais interior, próxima da raia
com Espanha. Contudo, a outra subespécie (Q. faginea ssp. broteroi) pode ainda estar também presente
na maioria destas situações, pelo que seria necessário fazer a respectiva identificação em cada ocorrência.
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Mediterrânea
Pinhais
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Região Mediterrânea
exemplo nas serras do Algarve. É também comum em parques e jardins, apesar de não
ser muito interessante esteticamente, sendo muito abundante na Tapada da Ajuda, onde
a sua frutificação precoce (primavera e início do verão) é procurada pelos esquilos
(Sciurus vulgaris).
Matagais arbustivos
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como de coníferas da região mediterrânea. A sua origem na Península não é clara, dado
que o núcleo populacional mais próximo desta espécie encontra-se no Extremo Oriente.
Pode presumir-se uma separação de populações durante as glaciações do Quaternário,
com isolamento de dois núcleos distintos que teriam sobrevivido nas zonas menos
afectadas pelo frio. A outra explicação seria uma discreta importação por navegadores
portugueses e espanhóis no decurso do período épico das grandes navegações ibéricas.
Seja qual for a explicação correcta, o charneco é hoje uma das espécies de vertebrados
mais emblemática da região mediterrânea da Península: as suas cores discretamente
atractivas e alguma familiaridade com a proximidade da presença humana dão-lhe uma
visibilidade que facilmente se associa aos montados e pinhais do sul de Portugal e de
Espanha.
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Regiões Ictiogeográficas
Os rios não são meras reservas de água inertes e sem vida, mas comunidades
biológicas com características próprias, entre as quais há que contar o facto de estarem
isoladas das outras comunidades afins através das divisões que se estabeleceram
naturalmente entre as bacias hidrográficas. As formas do relevo desempenham um papel
decisivo na definição dos limites entre bacias hidrográficas vizinhas: linhas de relevo
altas e vigorosas podem representar barreiras intransponíveis para a flora e fauna
dulceaquícolas; um relevo baixo e aplanado pode permitir um contacto ocasional,
quando haja caudais elevados, nos troços inferiores das bacias.
29
Largamente baseado em:
Fabião, A. 1997. Os planos hidrológicos e a conservação dos peixes de água doce. Ingenium (2ª Sér.)
18, 73-75.
30
Este facto encontra-se muito bem ilustrado em:
Rodrigues, A., F. Magalhães, J. Alveirinho-Dias e M. Matos. 1990. A faixa costeira a Norte do Porto:
evolução pós glaciária. Actas do 1º Simpósio sobre a Protecção e Revalorização da Faixa Costeira do
Minho ao Liz. Porto. Pp. 140-154.
31
Sobre esta questão veja-se, por exemplo:
Almaça, C. 1976. Zoogeografia e Especiação dos Ciprinídeos da Península Ibérica. Col. «Natura»,
Nova Série, Vol. 4. Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais. Lisboa.
39
Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Regiões Ictiogeográficas
Figura 10. Esboço aproximado dos três sectores ictiogeográficos da Península Ibérica e
sua relação com as principais bacias hidrográficas portuguesas.
32
Sobre este assunto pode consulta-se a obra citada (nota n.º 30) de Almaça (1976) e também:
Almaça, C. 1978. Répartition Géographique des Cyprinidae ibériques et secteurs ichthyogéographiques
de la Péninsule Ibérique. Vest. Cs. Spol. Zool. 42, 241-248.
40
Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Regiões Ictiogeográficas
33
Cabral, M. J. (coord.), J. Almeida, P. R. Almeida, T. Dellinger, N. Ferrand de Almeida, M. E. Oliveira,
J. M. Palmeirim, A. I. Queiroz, L. Rogado & M. Santos Reis (eds.). 2006. Livro Vermelho dos
Vertebrados de Portugal. 2.ª edição. Instituto da Conservação da Natureza / Assírio & Alvim. Lisboa.
41
Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Regiões Ictiogeográficas
Figura 11. Distribuição das espécies dulciaquícolas da Península Ibérica por tipos
(dulciaquícolas ou migradoras) e origens (endémicas, autóctones não endémicas, ou
exóticas). As espécies que apenas frequentam os estuários e as espécies marinhas que
entram ocasionalmente nos rios não foram incluídas.
42
Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Regiões Ictiogeográficas
. Nos casos em que se conhece o estado populacional das espécies introduzidas este
é estável ou as populações encontram-se em expansão. Só no século XX foram
introduzidas na Península 10 a 11 novas espécies exóticas34, cuja expansão tem
constituído, em muitos casos, uma grave ameaça para a conservação da ictiofauna
autóctone. No norte do Mediterrâneo, a introdução de espécies exóticas tem ocasionado
problemas de conservação das espécies autóctones através dos seguintes factores de
ameaça: hibridação entre espécies taxonomicamente próximas, reduzindo a diversidade
biológica; predação de espécies nativas por ictiófagos introduzidos; competição
interespecífica entre endémicas e introduzidas, eventualmente conduzindo à extinção de
uma ou mais (por exclusão competitva). Está também documentado um caso que sugere
alterações do habitat em consequência da introdução de um taxon não nativo35.
34
Almaça, C. 1995. Freshwater fish and their conservation in Portugal. Biological Conservation 72, 125-
127.
35
Crivelli, A. J. 1995. Are fish introductions a threat to endemic freshwater fishes in the northern
Mediterranean region? Biological Conservation 72, 311-319.
43
Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Regiões Ictiogeográficas
36
Almaça (1995), obra citada (nota n.º 33)
37
Elvira, B. 1995. Conservation status of endemic freshwater fish in Spain. Biological Conservation 72,
129-136.
38
Veja-se, por exemplo, Crivelli (1995), obra citada (nota n.º 34).
39
Sobre este assunto pode consultar-se, por exemplo:
Begon, M., J. L. Harper & C. R Townsend. 1996. Ecology. Individuals, Populations and Communities.
3rd edition. Blackwell Science. Oxford.
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Fabião, 2007: Uma Abordagem à Fauna Ibérica Regiões Ictiogeográficas
total), das quais 13 endémicas e 7 destas ocorrendo no Sector Meridional, estão listadas
no Anexo II da Directiva Relativa à Preservação dos Habitates Naturais e da Fauna e da
Flora Selvagens, do Conselho da Europa, publicada em 1992. Aquele Anexo, intitulado
«Espécies Animais e Vegetais de Interesse Comunitário cuja Conservação Requer a
Designação de Zonas Especiais de Conservação», obriga os estados membros a incluir
as áreas de ocorrência das espécies listadas numa rede europeia coerente de zonas
especiais de conservação (rede Natura 2000).
A água vai ser provavelmente um dos recursos naturais mais valiosos para a
sobrevivência e para o desenvolvimento económico e social da humanidade no futuro
próximo. A sua adequada gestão, de forma a garantir a disponibilidade nas diversas
regiões, terá que passar certamente pela captação da que existe disponível e pelo seu
transporte da forma mais económica possível para onde escasseia. É necessário, no
entanto, ponderar cautelosamente os custos que isso pode ter em termos ambientais e
das consequências e alterações que poderá implicar nas formas de viver a que estamos
habituados. Seria adequado acautelar no planeamento a salvaguarda dos peixes
endémicos de água doce mais ameaçados. Não parece razoável projectar grandes
empreendimentos de engenharia fluvial ignorando potenciais contradições entre a sua
implementação e os compromissos assumidos para a conservação de habitats e de
espécies, tanto mais que a qualidade da água pode depender da manutenção de sistemas
ecológicos sustentáveis, incluindo portanto a conservação dos componentes da
diversidade biológica que lhes é própria.
40
Veja-se, por exemplo:
Ferreira, M. T. 1996. Gestão de recursos aquáticos − uma área subvalorizada da engenharia. Ingenium
(II Série) 9, 69-73.
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