Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar,
impetrado pela Associação dos Servidores do Tribunal Regional do
Trabalho da 3ª Região - ASTTTER, contra decisões proferidas pelo Tribunal de Contas da União, nos autos do TC 008.658/2006-9, cujas ementas transcrevo a seguir:
“RELATÓRIO DE AUDITORIA. PAGAMENTOS
INDEVIDOS DE GRATIFICAÇÕES EXTRAORDINÁRIA E JUDICIÁRIA APÓS A EDIÇÃO DA LEI N. 9.030/1995. APLICAÇÃO DA SÚMULA/TCU N. 249. NÃO-SUJEIÇÃO DE SERVIDORES QUE EXERCEM FUNÇÕES DE CONFIANÇA OU CARGOS EM COMISSÃO AO CUMPRIMENTO DA JORNADA DE 40 HORAS SEMANAIS. DETERMINAÇÃO PARA DEVOLUÇÃO DE VALORES IRREGULARMENTE RECEBIDOS. 1. É ilegal o pagamento das gratificações judiciária e extraordinária a servidores ocupantes de cargos em comissão dos grupos DAS 4, 5 e 6, não-optantes pela remuneração do cargo efetivo, após o advento da Lei n. 9.030/1995. 2. Os servidores que exercem funções de confiança ou cargos em comissão estão sujeitos ao cumprimento de jornada de 40 horas semanais, por estarem submetidos a regime de integral dedicação ao serviço, nos termos do disposto no § 1º do art. 19 da Lei n. 8.112/1990”.
“PEDIDO DE REEXAME EM RELATÓRIO DE
AUDITORIA. PESSOAL. PERCEPÇÃO DE REMUNERAÇÃO, POR ANALISTAS E TÉCNICOS JUDICIÁRIOS – MÉDICOS E ODONTÓLOGOS, CORRESPONDENTE A 20 HORAS SEMANAIS. AUSÊNCIA DE EFETIVO TRABALHO. DETERMINAÇÃO DE REEMBOLSO AO ERÁRIO. CONHECIMENTO DO RECURSO. PROVIMENTO PARCIAL. CIÊNCIA AOS RECORRENTES E AO TRT/MG”.
Afirma a associação impetrante que, após a realização de inspeção
no Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região – TRT/MG, em 2006, a Corte de Contas apontou diversas ilegalidades naquele Tribunal, entre as quais a jornada de trabalho a que estavam submetidos os analistas judiciários das especialidades medicina e odontologia.
Narra, assim, que o TCU, em grau de reexame, muito embora tenha
afastado a devolução dos valores percebidos de boa-fé pelos referidos servidores, manteve a determinação de que os analistas judiciários daquelas especialidades cumprissem, independentemente do exercício de função comissionada, a jornada de 8 (oito) horas diárias, equiparando-a à dos demais ocupantes do mesmo cargo de analista.
Alega, inicialmente, que, por não se tratar de ato complexo, sujeito a
registro, seria aplicável à espécie o art. 54 da Lei 9.784/1999, que fixa o prazo decadencial de 5 (cinco) anos para o direito de a Administração anular os atos que impliquem em efeitos favoráveis aos seus destinatários.
Isso porque, no seu entender, reconheceu-se no acórdão impugnado
que, em alguns casos, o cumprimento de jornada de 4 (quatro) e 6 (seis) horas diárias para médicos e odontólogos, respectivamente, com a percepção da função comissionada, ocorre há mais de 15 (quinze) anos.
Sustenta a impetrante, nessa linha, a existência de diversos
pronunciamentos desta Corte, bem como do Conselho Nacional de Justiça, que já reconheceram o direito à jornada diferenciada para analista e técnicos judiciários - especialidade medicina e odontologia.
Ressalta estarem presentes os requisitos que ensejam a concessão da
medida liminar, haja vista não se cuidar de acréscimo de vencimento de servidores, mas de manutenção de status quo, pugnando pela sua concessão para que se mantenha a “jornada de 4 horas para os médicos e 6 horas para os odontólogos, provisoriamente, sem a percepção de função comissionada”.
No mérito, requer a concessão da segurança a fim de que:
i) “seja declarada a decadência do direito de rever os atos que fixaram a
jornada dos médicos e odontólogos respectivamente em 4 e 6 horas com a percepção de função comissionada”, ou;
ii) “subsidiariamente a concessão da segurança para que se reconheça o
direito dos médicos e odontólogos substituídos à jornada de 4 e 6 horas sem a percepção de função comissionada”. Requisitadas previamente, foram prestadas informações pelo Tribunal de Contas da União.
É o relatório necessário.
Decido o pedido liminar.
Em uma análise perfunctória, própria deste momento processual,
entendo que a medida liminar pleiteada deve ser deferida apenas parcialmente.
Isso porque, conforme observado na impetração, o Plenário desta
Corte, ao julgar o MS 25.027/DF, Rel. Min. Carlos Velloso, assentou o entendimento de que o servidor público médico possui o direito de cumprir jornada diferenciada de trabalho de 4 (quatro) horas diárias, em conformidade com as disposições previstas na Lei 9.436/1997 e no Decreto-Lei 1.445/1976. Transcrevo, a seguir, a ementa desse julgado:
“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MÉDICOS:
JORNADA DIÁRIA DE TRABALHO. D.L. 1.445/76, art. 14. Lei 9.436, de 05.02.97, art. 1º. Lei 8.112, de 11.12.90, art. 19, § 2º. I. - A jornada diária de trabalho do médico servidor público é de 4 (quatro) horas. Decreto Lei 1.445/76, art. 14. Lei 9.436/97, art. 1º. II. - Normas gerais que hajam disposto a respeito da remuneração dos servidores públicos, sem especificar a respeito da jornada de trabalho dos médicos, não revogam a norma especial, por isso que a norma especial afasta a norma geral, ou a norma geral não revoga nem modifica a norma especial. III. - Mandado de segurança deferido” (grifos meus).
Importante frisar, contudo, a ressalva constante do voto proferido
pelo Min. Marco Aurélio naquela assentada:
“Senhora Presidenta, a profissão é regulamentada a partir das
peculiaridades da atividade desenvolvida. Em relação aos médicos, a Lei nº 3.999/61 prevê a duração normal do trabalho - salvo acordo escrito que não fira, de modo algum, o disposto no artigo 12 - de, no mínimo, duas horas e, no máximo, quatro horas. Dir-se-á que a lei que criou os cargos não fixou uma jornada especial para os profissionais da saúde, mais especificamente para os médicos. Como ressaltado pelo relator, pouco importa, porque, no caso, tem-se remessa à legislação geral quanto aos servidores, tomados como a comporem quadro funcional da Administração Pública, do Tribunal Regional do Trabalho, e à legislação especial. No campo da Administração Pública, está em pleno vigor a Lei nº 9.436/97, categórica ao revelar que a jornada, em si, é de quatro horas, podendo haver a opção - feita à luz da Carta da República, e somente uma jornada reduzida a viabiliza - por duas jornadas, chegando-se, aí, às quarenta horas. O Tribunal, como salientado pelo relator, tem regulamento a respeito, segundo o qual a duração do expediente dos servidores que exerçam profissão regulamentada e não estejam investidos em função comissionada subordina-se à jornada estabelecida na respectiva legislação, ou seja, na legislação que regulamenta a profissão. O Tribunal Superior Eleitoral, ao enfrentar a matéria no Processo nº 13.752, sob a presidência do ministro Sepúlveda Pertence - lá estávamos o ministro Ilmar Galvão e eu, e creio que Vossa Excelência não integrava ainda a Corte -, concluiu, sem discrepância de votos, que se há de observar a jornada fixada para a categoria. Disse bem o relator que a norma constitucional, viabilizadora da acumulação, pressupõe jornada reduzida. E há referência na alínea 'c' do inciso XVI do artigo 37 da Carta, que versa sobre a acumulação, a profissões regulamentadas - caso dos médicos” (grifos meus).
Assim, como se percebe, embora se tenha firmado o entendimento
quanto à jornada diária dos servidores públicos médicos, a possibilidade de jornada diferenciada para aqueles que ocupem função de confiança ou cargo em comissão ainda não foi objeto de deliberação definitiva por esta Corte.
De outro lado, verifico, ainda, que os precedentes citados pelo
sindicato impetrante referem-se tão somente à especialidade medicina, não abrangendo, pois, os analistas judiciários da especialidade odontologia. Tampouco indicou-se, por ocasião da impetração, qualquer suporte legal a ensejar o entendimento de que tais analistas judiciários fariam jus à mesma distinção conferida àqueles que exerçam a especialidade medicina.
Por essas circunstâncias, não vislumbro, de plano, plausibilidade
jurídica nas alegações expostas neste writ, relativas aos analistas judiciários que tenham por especialidade a odontologia.
Nessa linha, recordo, ainda, que o Decreto-Lei 1.445/1976, em seu
art. 15, assim dispõe:
“Art 15 - Os ocupantes de cargos ou empregos integrantes das
Categorias Funcionais de Odontólogo, Técnico em Comunicação Social e Técnico de Laboratório ficam sujeitos à jornada de 8 (oito) horas de trabalho, não se lhes aplicando disposições de leis especiais referentes ao regime de trabalho estabelecido para as correspondentes profissões”.
Dessa forma, entendo ser prudente, neste exame de delibação,
apenas admitir, nos termos da impetração, que os Analistas Judiciários – Especialidade Medicina do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região mantenham o direito de cumprir jornada de 4 (quatro) horas diárias, desde que não exerçam função de confiança ou cargo em comissão.
Isso posto, defiro parcialmente o pedido liminar formulado tão
somente para que se mantenha a jornada diária de 4 (quatro) horas para os Analistas Judiciários – Médicos do TRT da 3ª Região – TRT/MG que não ocupem função de confiança ou cargo em comissão.
Comunique-se com urgência.
Dê-se ciência, ainda, à Advocacia-Geral da União para que,
querendo, ingresse no feito, nos termos do art. 7º, II, da Lei 12.016/2009.