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RESUMO
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Capitão do quadro QOPM, subcomandante do 9º Batalhão de Polícia Militar. Possui o curso de
Formação de Oficiais – APMB, pós-graduado em direito público – Faculdade Processus. Aluno do
curso de Aperfeiçoamento de Oficiais – 2017. E-mail: anderayne.nobre@iscp.edu.br
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Coronel da PMDF da Reserva Remunerada, advogado, doutor em ciência jurídica e social –
Universidad del Museo Social Argentino-UMSA, mestre em ciência política (Unieuro). E-mail:
marcosdearaujo@marcosdearaujo.com.br
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INTRODUÇÃO
desigualdades entre os gêneros, partindo do princípio de que não é o sexo que torna
os gêneros diferentes, mas as construções sociais vigentes.
Seguindo esta tendência em diminuir pré-conceitos e preconceitos dentro de
nossa sociedade, a pesquisa abraçará esta teoria de gênero, a fim de encontrar nela
as possíveis respostas e soluções às mudanças sociais e jurídicas que necessitam
ocorrer no Distrito Federal, principalmente dentro da estrutura organizacional da
PMDF.
O principal objetivo é analisar, a partir da ótica de gênero e com fulcro no
princípio da igualdade, a inconstitucionalidade ou constitucionalidade da regra de
recrutamento e seleção de novos policiais militares, prevista na Lei Federal nº 9.713,
no que tange à determinação de vagas para os diferentes sexos, conforme princípio
expresso na Constituição da República de 1988 em seu artigo 5ª, inciso I. Visando
alcançar este objetivo geral, o trabalho buscará alcançar os seguintes objetivos
específicos:
a) Investigar se o fenômeno “Teto de Cristal” ocorre no processo seletivo do
corpo feminino na PMDF, a partir da concepção de gênero;
b) Descrever as atribuições históricas e constitucionais das Polícias Militares
Brasileiras, frente a um Estado Democrático de Direito;
c) Analisar o papel desempenhado pelas mulheres no contexto da segurança
pública brasileira, especialmente na PMDF;
Este intento será alcançado, do ponto de vista epistemológico, a partir de
pesquisa bibliográfica, buscando no campo de estudos uma resposta capaz de
confirmar ou rejeitar a hipótese, sendo, portanto, de natureza exploratória, por meio
de uma pesquisa bibliográfica. Os instrumentos metodológicos utilizados para se
alcançar os objetivos da pesquisa serão a análise documental de dados, normas
legais e registros da Corporação PMDF.
O tema a ser discorrido ao longo da pesquisa não é inédito, tampouco o
problema abordado é novo, e embora haja ampla discussão acadêmica, política e
social acerca do tema ‘gênero’ e igualdade de direitos entre homens e mulheres,
subsiste na forma de tratamento dispensada às mulheres, discriminação,
segregação e preconceito. Conforme Araújo (2016, p. 17): “Estudos da literatura
nacional e estrangeira acusam a existência de discriminação contra as mulheres,
embora haja destaques do aumento da luta das mulheres por seus direitos.”.
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Porém a pesquisa confirmara que não, e que não é o sexo quem determina o
temperamento, mas a maneira como o indivíduo é socializado. A partir do estudo de
três tribos – os Arapesh, os Mudugumor e os Tchambuli – a autora diferencia os
conceitos de sexo e temperamento: um não é mais o determinante do outro. Chegou
a esta conclusão devido ao fato de que, nas três tribos, homens e mulheres
apresentavam um comportamento distinto do apresentado pelos homens e mulheres
de nossa própria cultura, onde nas duas primeiras tribos não há diferenciação no
comportamento de ambos os sexos e na última há uma inversão dos mesmos de
acordo com os padrões ocidentais. Sexo é agora apenas o conjunto de
características que determinam se um indivíduo é “macho” ou “fêmea”,
biologicamente falando. Temperamento, não mais determinado pelas genitálias, é
definido como sendo o comportamento dos indivíduos fruto do condicionamento
social.
Independente do motivo pelo qual as mulheres foram as selecionadas, em
nossa sociedade, para serem o “segundo sexo”, ou “sexo frágil”, a grande
contribuição de Mead (1988) foi a de fazer essa diferenciação, escandalizando a
comunidade científica ao negar o determinismo biológico, que representava toda a
justificativa para as divisões sexuais dos papéis e permitia a imutabilidade da
estrutura social. Com sua contribuição, a posição da mulher dentro da organização
social torna-se passível de mudança. Apesar de todas as contestações e críticas das
quais o trabalho de Mead (1988) foi alvo, é inegável que ele foi capaz de despertar a
atenção de diversos estudiosos, que a partir de suas conclusões desenvolveram o
conceito de gênero e trouxeram mais argumentos em favor do condicionamento
social e cultural em contraposição ao determinismo biológico.
Para dar continuidade ao referencial teórico, e para que seja clara a
exposição de que o fato da lei federal nº 9.713 delimitar um número de vagas menor
para mulheres em relação aos homens, advém de um conjunto de ideologias e de
determinismos sociais, é necessário que se esclareça o conceito de gênero nos
estudos científicos.
Segundo conceitua Segato (1997), existem duas concepções de gênero. De
um lado, o ‘gênero’ foi desenvolvido e é sempre usado como oposição a ‘sexo’.
Assim, gênero é tipicamente pensado como referência à personalidade e
comportamento, não ao corpo. De outro lado, ‘gênero’ tem sido cada vez mais usado
como referência a qualquer construção social que tenha a ver com a distinção
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indiretamente, se está fazendo uma seleção para que somente as mulheres mais
preparadas intelectualmente, fisicamente e psicologicamente entrem, enquanto abre
uma margem para que homens não tão preparados ingressem na corporação, visto
que as vagas são maiores, e a concorrência é bem menor, Yannoulas, (2002, p. 17):
[...]consiste em idéias e práticas admitidas informalmente, influenciando um
comportamento ‘usual’ e ‘válido’ para cada grupo social. Estas práticas, que
parecem neutras, criam desigualdades entre pessoas com condições
idênticas por sua raça/etnia, sexo/gênero, idade, religião, nacionalidade,
entre outros aspectos.
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‘Apelido’ dado à Constituição Federal, ou Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
visto que entre várias contribuições no campo dos Direitos Humanos, trouxe, nas palavras de
Resende (2017) amplos direitos sociais, individuais e assistenciais, com fortalecimento do judiciário,
acesso amplo ao voto e ampla garantia de direitos fundamentais.
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Entende-se aqui o conceito de discriminação, como algo pernicioso, segregador, separatista e
impróprio para a sociedade, e não diz respeito à chamada “‘discriminação positiva’ (ou “reverse
discrimination” em terminología (sic) anglo-saxónica (sic).” (ARAÚJO, 2016, p. 21).
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ideal buscado pela igualdade formal, a fim de garantir que através da diferença, se
busque a igualdade (material).
As polícias em geral (Federal, Ferroviária Federal, Rodoviária Federal, Civil e
Militar), enquanto mantenedoras do respeito ao contrato social – firmado pelos
membros de determinada sociedade – zelam, fiscalizam e atuam para que os
desvios não ocorram, através da orientação, advertência, ação de presença, e
reprimem, imediata ou mediatamente os casos de desrespeito a este contrato,
agindo no estrito cumprimento das leis, estatutos, decretos, normas administrativas,
que lhes conferem parte do poder estatal para, dentro destas mesmas normas,
garantir o bem estar coletivo.
O surgimento do poder de polícia e das polícias em si, na concepção de Floro
(2013. p, 57), é “[...] tão antiga quanto o aparecimento das civilizações. Típica dos
povos, variou no tempo e no espaço, à medida que as sociedades humanas se
organizaram em Estado, cidade ou não, segundo os padrões culturais de cada uma."
Segundo Floro (2013) a formação dos grupos humanos sociais mistos,
diferente dos clãs, em que o poder decisório, punitivo e político residiam sobre o
patriarca, demandou o estabelecimento de leis para que a convivência entre os
homens pudesse ser viabilizada, afastando a selvageria, ou o exercício arbitrário das
próprias razões, garantindo, assim, segurança social entre seus membros. Assim
surge o poder de polícia, a fim de garantir o cumprimento das leis entre os membros
daquele determinado grupo.
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão – votada pela
Assembleia Constituinte Francesa, em 26.08.1789, e incluída na
Constituição de 1791, diz no seu art. 12 ser necessária uma força pública
para garantir os direitos do homem e do cidadão..., e esclarece no art. 2º
que esses direitos são a liberdade, a propriedade, a segurança e a
resistência contra a opressão. (FLORO, 2013, p. 63).
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Promulgada no Brasil por meio do decreto no. 31.643, de 23 de outubro de 1952.
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A convenção foi aprovada pelo Brasil em 20 de novembro de 1955, por meio do decreto legislativo no. 123. Sua
promulgação ocorreu em 12 de setembro de 1963, pelo decreto no. 52.476.
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Dispõe sobre a discriminação em matéria de Emprego e Profissão. Ratificada pelo Brasil em 1965. Promulgada
em 19/01/1968, por meio do Decreto no. 62150.
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Dispunha aos países participantes o compromisso do combate a todas as formas de discriminação para com as
mulheres. No Brasil, o Congresso Nacional ratificou a assinatura, com algumas reservas, em 1984. Tais reservas
foram suspensas em 1994 pelo decreto legislativo no. 26. Promulgada por meio do decreto no. 4.377, de 13 de
setembro de 2002. Em 06 de outubro de 1999, foi adotado, em Nova York, o Protocolo Facultativo à Convenção
sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher. O protocolo determina a atuação e
define as competências do Comitê sobre a Eliminação da Discriminação Contra a Mulher na recepção e análise
das comunicações recebidas dos Estados Partes. O protocolo foi aprovado pelo Brasil em 06 de junho de 2002,
por meio do decreto legislativo no. 107. Sua promulgação se deu em 30 de julho de 2002, por meio do decreto
no. 4.316.
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Termo retirado da biologia, que visa identificar o membro mais importante do grupo ou da
comunidade, como o líder da matilha, o chefe do bando, podendo na natureza ser exercido por um
membro do sexo masculino ou feminino, como no caso da abelha rainha. O conceito foi introduzido
pela sociologia, nos estudos de gênero, para abordar apropriadamente a ‘preferência’ do sexo
masculino sobre o feminino na sociedade, relegando à mulher, ou o gênero feminino, um papel
secundário.
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Batalhão de Operações Especiais.
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Grupamento Tático Operacional.
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Embora a regra seja esta, na atualidade, com o avanço das teorias de gênero,
o empoderamento feminino e a qualificação cada vez maior das policiais femininas,
o espaço antes ocupado apenas por homens, dentro da corporação, vem sendo
paulatinamente alcançado por mulheres, tendo, inclusive, no ano de 2012 12, uma
mulher alcançado o segundo nível de comando da corporação, de Subcomandante
Geral, sendo a primeira mulher na PMDF a alcançar tal feito, e a única, até o
presente momento.
Conforme estudo realizado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública
(SENASP), este processo de mudança de paradigma na segurança pública, de uma
força militar violenta e de repressão, para uma força de resolução de conflitos
através de ações proativas, de prevenção, com menor enfrentamento físico e
utilização de técnicas menos letais, começou, coincidentemente ou não, com os
movimentos feministas que lutaram pelo ingresso das mulheres nos nichos antes
ocupados apenas por homens, como é o caso das Polícias Militares.
A entrada de mulheres nas Instituições de Segurança Pública no Brasil é
recente, somando pouco mais de 50 anos de história. De acordo com
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CORONEL RR VANUZA NAARA DE OLIVEIRA ALMEIDA.
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TO 1986
Fonte: Banco de Dados Polícia Militar e Gênero, CESeC/UCAM e
SENASP/MJ. In Soares, Bárbara Musumeci e Musumeci,
Leonarda. 2005. Mulheres Policiais. Presença feminina na Polícia
Militar do Rio de Janeiro, p. 173.
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Qualquer equipamento que possa ser utilizado pelo policial no cumprimento do dever, seja ele a
algema, tonfa, uso de gás de pimenta/CS, espuma de pimenta/CS, Armamento de Lançamento de
Eletrodos Energizados (ALEE), Bastão retrátil etc.
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Quadro 2: Efetivo na ativa das Polícias Militares e percentual por sexo, 2013
UF Masculino % Feminino % Total % em rela-
ção ao efe-
tivo total
informado
AC 2.471 91,1 241 8,9 2.712 100,0
AM 7.970 86,1 1.080 11,7 9.050 97,8
AP 2.946 79,6 754 20,4 3.700 100,0
BA 26.714 86,1 4.325 13,9 31.039 100,0
DF 14.102 91,4 1.328 8,6 15.430 100,0
ES 7.518 88,5 973 11,5 8.491 100,0
MA 8.856 93,9 576 6,1 9.432 100,0
MG 38.519 91,5 3.596 8,5 42.115 100,0
MS 4.833 92,5 422 8,1 5.255 100,6
MT 5.994 91,1 585 8,9 6.579 100,0
PA 14.286 89,7 1.634 10,3 15.920 100,0
PB 8.563 92,4 700 7,6 9.263 100,0
PE 18.003 90,3 1.723 8,6 19.726 99,0
PI 4.975 91,9 360 6,7 5.335 98,6
PR 19.314 91,3 1.833 8,7 21.147 100,0
RJ 42.147 91,4 3.988 8,6 46.135 100,0
RO 4.902 91,8 435 8,2 5.337 100,0
RR 1.426 85,4 243 14,6 1.669 100,0
RS 20.392 88,0 2.777 12,0 23.169 100,0
SC 10.656 92,4 877 7,6 11.533 100,0
SP 78.441 89,3 9.428 10,7 87.869 100,0
TO 3.364 87,7 471 12,3 3.835 100,0
Total 346.392 90,0 38.349 10,0 384.741 99,8
Fonte: SENASP (2017, p. 50)
Em suma, embora os períodos de ingresso das mulheres nas polícias
militares tenham ocorrido em anos aproximadamente semelhantes, fruto de um
esforço dos movimentos sociais pela emancipação da mulher, e embora o padrão de
delimitação de vagas nos concursos seja igualmente semelhante, a discussão
acerca da necessidade de se limitar as vagas, considerando o gênero
exclusivamente para delimita-las, carece de fundamentação estatística,
probabilística, numérica, que mostre que esta delimitação não é fruto de
discriminação, mas se reveste de qualificação necessária.
Para se provar que a delimitação não se traduz em discriminação, seria
necessário que se comprovasse, primeiramente, que o serviço policial é impróprio
para mulheres, visto que se não há essa comprovação, não se justifica a limitação.
No campo prático, nos concursos de admissão, verifica-se a materialização
da discriminação, em relação à oportunização de condições iguais de concorrência
entre os gêneros. No concurso para oficiais da PMDF de 2017, segundo dados do
Instituto Americano de Desenvolvimento (IADES, 2017), instituição promotora do
concurso, em comunicado emitido em 03 de mar. 2015 o número de inscritos foi de
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4 METODOLOGIA
CONSIDERAÇÕES FINAIS
This paper discusses the entry of women into the Military Police of the Federal
District (PMDF) from the point of view of the constitutional principle of gender
equality. Such an approach is of considerable importance for the exercise of law
within the Military Police Institution, and for society itself, analyzing the delimitation of
only 10% of vacancies in women's competitions, deriving from infraconstitutional law,
based on the principle of equality envisaged in the Constitution of the Republic of
1988, having as the supporting scope of this analysis, legal, and gender issues. The
objective of this study is to analyze the gender problem, and with the principle of
equality, the (in)constitutionality of Federal Law No. 9.713, of 1998, regarding the
determination of vacancies for the different sexes, as expressed in the Constitution of
the Republic of 1988, in its article 5, item I. From the epistemological point of view,
the research will seek a response capable of confirming or rejecting the assumptions,
following the conception of Viegas (1999, 131), being therefore of a nature
Exploratory and grounded in bibliographic research. The methodological tools used
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to achieve the objectives of the research will be the documentary analysis of data,
legal norms and records of the PMDF Corporation. The research showed that Law
9.713, which delimits 10% of the vacancies for women in the competitions for
admission to the military police career, is the result of discrimination, since it does not
find grounds for differentiating between genders. The result is also confirmed by the
(ARAÚJO, 2016, page 128) research that "[...] points out that women are victims of
discrimination in the Brazilian Police Forces [...], since these environments are
Archetypes of man, ".
REFERÊNCIAS
ANEXO B – PL 3408-2012
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