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Resumo: Este trabalho traz uma reflexão da pesquisa intitulada Memórias das
manifestações culturais no sertão alagoano. Essa investigação tem uma abordagem, a
partir da disciplina Seminário Integrador, na qual analisamos as manifestações culturais:
danças, cordéis, reisado, procissão e pega de boi no mato dos povoados e cidades
situadas no sertão alagoano. O nosso objetivo foi perceber o diálogo envolto entre
tradição e modernidade tendo a memória como demarcador da continuidade das
tradições. Traremos as falas de algumas entrevistas nas quais revelam os motivos de
prepararem as danças, cordéis, reisado, procissão e pega de boi no mato e como se dá a
preservação de tais tradições. Utilizaremos da história oral como procedimento
metodológico para apropriarmos das narrativas de cada manifestação de forma a
traçarmos a trajetória de surgimento, modificação e permanência de tais manifestações
culturais. Realizo esta pesquisa por dois motivos: primeiramente por acreditar que a
construção do modo de vida aqui pensado como uma construção coletiva que perpassa o
reconhecimento das formas de existir das pessoas, em especial aquelas que têm como
meta sustentar a união do grupo que vai além das questões individuais e em segundo
lugar visibilizar essas manifestações culturais e relevantes, pois, as mesmas, permitem
outro olhar sobre a região nordeste, e em especial, o sertão alagoano.
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Profª Drª Maria Aparecida Silva da Universidade Federal de Alagoas- Campus do Sertão
Introdução
Mas é bem verdade que as culturas apresentam suas singularidades que serão tecidas
muitas vezes através da oralidade para a constituição de uma memória e por isso, o
empenho em resistência diante desta universalização cultural proposta pela
globalização que traz mudanças no entendimento de pertencimento identitários e
cultural.
Para Delgado (2006), a importância da história oral está no fato desta ser um
procedimento integrado a uma metodologia que privilegia a realização de entrevistas e
depoimentos com pessoas que participaram de processos históricos ou testemunharam
acontecimentos no âmbito da vida privada e coletiva. Dessa forma, inscreve-se entre os
diferentes procedimentos do método qualitativo.
Ao discutir sobre história oral, Alberti (2004) afirma que se trata de um estudo de
acontecimentos históricos, instituições, grupos sociais, categorias profissionais,
movimentos, conjunturas entre outros, à luz de depoimentos de pessoas que deles
participaram ou os testemunharam.
E vale ressaltar o trabalho de Bosi (1994) que entende a memória como o refazer,
reconstruir as experiências do passado. Para Bosi (1994, p. 55):
O Cordel são poemas em forma de rima e ilustrado que traduz a vida cotidiana,
divulgando o modo de viver, a arte e a tradição cultual de uma localidade, afirma a
identidade e o pertencimento local. O Cordel é parte da vida do sertanejo presente nas
diferentes classes sociais e hoje é visto em outras regiões do Brasil. Em Delmiro
Gouveia/AL, localizamos dois cordelistas conhecidos o Senhor José Terto de Araújo e o
Senhor Joel Hipólito de Oliveira da Silva, do Povoado Salgado. Não identificamos
nenhuma mulher cordelista.
Segundo o Senhor Joel Hipólito, os homens mais velos viajavam muito e traziam o
cordel, porque gostavam de suas rimas, não havia tema específico, que gostassem:
Podemos analisar que mudanças vem acorrendo com esta tradição e que precisa ser
resgatada e preservada para continuar sendo referencia do lugar e reconhecimento de
seus criadores.
A Dança de São Gonçalo, tal como a tradição é seguida pelo povo da Serra do Oricuri,
zona rural do município de Água Branca/AL. Trata-se de uma manifestação religiosa
que durante algumas décadas vem sendo realizada por trabalhadores rurais e conta com
presença de várias pessoas que gostam e ou tem fé. A dança foi introduzida por
portugueses no Brasil, período colonial. A dança ocorria na igreja, esta associada as
moças que desejavam casar e utilizada por São Gonçalo para resgatar as moças da
prostituição.
Para a dança são formados os pares, instrumentos são tocados por mestres, as músicas
remetem a história de São Gonçalo e a vestimenta é simples com o emblema D.S.G-
Dança de São Gonçalo, que no passado era um requisito mas, hoje não mais, segundo
os participantes está perdendo o significado. Assim as únicas exigências é que os
homens devem trajar calça e as mulheres saia longos. Os organizadores da Dança de
São Gonçalo sentem a falta de incentivo da comunidade local e do órgão responsável
pela cultura na cidade, já que poderiam resgatar a cultura local e a tradição do povo da
Serra do Ouricuri. Aos olhos dos organizadores os Mestres Zé Filho e Rico comentam:
No Povoado Tabuleiro, município de Água Branca em entrevista com a líder, ela diz: “a
dança é um meio de reunir jovens para discutirem sobre o papel social, visto que a
cultura da Dança do Coco anda se enfraquecendo na localidade, que advém da falta de
valorização e apoio”. Os líderes enfrentam as dificuldades, mas não desistem por
acreditarem que as crianças e jovens por meio da cultura podem fazer a diferença e
melhorar o lugar em que vivem.
É importante ressaltar que essa manifestação cultural faz parte da identidade da cidade
de Água Branca/AL e memória de duas comunidades e dois estados, mas, tem sofrido
como o desinteresse das pessoas pela mesma.
Santa Ana, é considerada a protetora das lagoas e padroeira do povoado Sítio Estreito. A
Procissão de velas de Santa Ana é uma manifestação religiosa que ocorre no mês de
outubro no Povoado Sítio Estreito, município de Água Branca. Esta é uma tradição
contada e recriada por seus moradores. Surgiu através dos bisavós de Dona Decília a de
Dona Antonia, primeiros moradores do Povoado Sítio Estreito e hoje são elas as
responsáveis pelo evento. Inicialmente, a festa era realizada no mês de junho, porém,
devido ao clima frio predominante neste período mudou para o mês de outubro. O
novenário começou a existir a partir do momento que a imagem da Santa Ana apareceu
no povoado. A festa acontece durante 9 (nove) noites e cada noite uma família fica
encarregada dos preparativos.
Desde ainda moça Dona Antônia ficou responsável por cada noite e de zelar pelas
“noiteiras” – meninas que realizam o andar das velas- em volta da igreja e do cruzeiro.
São três voltas na igreja e três voltas no cruzeiro. As organizadoras contam com a
presença de crianças como forma de continuidade da tradição e também porque as
moças não querem usar as roupas da festividade. As “noiteiras” vestem roupa branca
estilo vestido de noiva para simbolizar a religião católica, usam coroas e carregam as
velas, acessórios usados para abrilhantar a festa e iluminar a igreja. Atualmente não há
idade para ser uma “noiteiras”, são cerca de 60 (sessenta) crianças e 80 (oitenta )
“noiteiras”. No final de cada noite as “noiteiras” fazem uso de fogos de artifício.
Nesta manifestação cultural não é permitido à participação de homens, pois para esta
comunidade as mulheres são símbolo de pureza e embora de cunho religioso não são os
padres que dão continuidade a procissão e sim as famílias que vem passando de geração
a geração.
Não se sabe ao certo o inicio do reisado em São Jose da Tapera. Mas o primeiro a trazer
e formar um grupo na cidade foi o Mestre André da Costa, como o nome de Reisado de
São Vicente marcado pela fé.
O Reisado teve inicio na região no sítio Bananeiras, comandado pelo mestre André da
Costa e após a sua morte o seu filho Edson Costa Nunes, mais conhecido como “Edson
som” que assume o grupo e torna-se mestre. Com o passar dos anos o mestre Edson, sai
do sítio Bananeiras e vai morar na cidade, onde cria um grupo e começa fazer
apresentações no bairro dez, localização da igreja de São Vicente.
Após a morte do mestre Edson, um de seus alunos o Oscar José Vieira assume o grupo.
Hoje o senhor Oscar tem um grupo composto por 20(vinte ) pessoas dentre essas 12
(doze) são crianças que representam as figuras, 1(um) mestre, 3(três) tocadores, 1(um)
embaixador, 1(um) rei e 2(dois) mateus. Os instrumentos tocados são: sanfona,
pandeiro e zabumba. Segundo o senhor Oscar, o grupo tem enfrentado dificuldades pela
falta de apoio do município, pois o grupo ainda não tem as roupas apenas os chapéus e
sapatos, comprados como o dinheiro da venda de uma casa dele.
Considerações finais
Estas manifestações culturais em sua maioria acorrem nas comunidades de zona rural
mais que estabelecem uma relação também com a zona urbana, possibilitando assim
uma relação de vizinhança entre pessoas e lugares elemento relevante para o mundo
rural.
ALBERTI, Verena. Manual de história oral. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2004.
QUEIROZ, Maria Isaura. Relatos orais: do “indizível” ao “dizível” In: SIMSON, Olga
de Morais von (Org.). Experimentos com histórias de vida: Itália-Brasil. São Paulo:
Vérice, Editora Revista dos Tribunais, 1988.