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2003
Rui F. Cordeiro Bergantim / Miguel Guerra / JM Soares-Fortunato
SONO REM E ONTOGÉNESE
Revista Portuguesa de Psicossomática, Julho-Dezembro, año/vol. 5, número 002
Sociedade Portuguesa de Psicossomática
Porto, Portugal
pp. 127-139
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/PS) e o de onda lenta (Slow Wave Sleep – SWS/ (potenciais de acção muito lentos e largos; "sleep
/nREM)2. Originalmente assim chamado devido spindles" (explosões rápidas cuja frequência os-
à ostensiva contradição do movimento rápido cila entre 12 a 14 Hz); e PGO (30 a 50 Hz). O
dos olhos associado à dessincronização do EEG, Electrooculograma (EOG) regista o movimento dos
taquicardia e taquipneia, o sono REM deve o iní- olhos através de eléctrodos colocados junto aos
cio do seu estudo a Asenrisky e Kleitman que olhos, enquanto o Electromiograma (EMG) é usa-
em 1953 alertaram para as características men- do para monitorizar os músculos posturais atra-
cionadas. Mas só em 1960 o consideraram como vés de eléctrodos colocados nas regiões mento-
um tipo de sono independente e radicalmente niana e submentoniana, p.e3.
diferente do sono nREM e do estado de alerta,
tornando-se desde então num terreno excitante
de investigação em neurofisiologia1. Esta tem-se 2. SONO REM, O QUE É?
tornado cada vez mais aliciante devido às fun-
ções atribuídas ao sono REM que vão da sua par- 2.1. Integração do sono REM no ciclo
ticipação activa na plasticidade neuronal19 ao Sono/Vigília
possível envolvimento na memória e aprendi-
zagem11, passando pelo controlo motor e de fun- O sono não é um processo linear; o indiví-
ções básicas do organismo humano1,3,4. duo começa por adormecer no estado nREM-I
No útero e imediatamente após o seu nasci- no início da noite e progressivamente atinge o
mento, dorme-se incessantemente. Os recém- estado nREM-IV, entrando no estado REM. Es-
-nascidos dormem duas a três vezes mais que os tes estados de nREM e REM alternam
adultos. Os idosos dormem muito menos que os ciclicamente durante a noite. No Homem, o
jovens. O sono não é um fenómeno estanque e sono começa com cerca de 80 min. de sono
homogéneo. Daqui surge a motivação para a nREM seguindo-se do REM por um período de
realização deste trabalho no qual, após descre- 2 a 10 min (Fig. 1). Este ciclo de 90 minutos de
ver o sono REM e as suas principais característi- nREm-REM é, depois, repetido cerca de três a
cas, pretende mostrar de que modo exerce a sua seis vezes por noite2,3,5.
influência no desenvolvimento humano desde O sono REM ocupa cerca de 20% do tempo
o estado embrionário até ao idoso. total de sono e enquanto os outros estados de
sono diminuem, ele aumenta. Este estado de
sono também é chamado de sono dessincroni-
1. MEDIÇÃO DO SONO
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zado, rápido, de onda rápida, activo, paradoxal O EOG – vertical, horizontal e oblíquo – per-
ou sono D (dreaming)2. Cada um destes nomes mite inferir acerca dos movimentos dos olhos
advém das características fisiológicas do mesmo. que são, geralmente, conjugados e cuja veloci-
dade de movimento os assemelha aos movimen-
2.2. Características mensuráveis do sono tos dos olhos em sacada, no estado de alerta2,9.
REM através do EEG, EOG e EMG Os actuais parâmetros associados às caracte-
rísticas do sono REM permitem dividi-lo em dois
O EEG torna-se dessincronizado. Durante o estados: o REM tónico e o REM fásico. No primeiro
registo verifica-se que as ondas de baixa fre- caso são incluídas características que duram todo
quência (delta, teta e alfa) são mínimas enquan- o sono REM, como a atonia muscular e dessin-
to que as de rápida frequência (gama e beta) cronização do EEG2, e relacionadas com o tem-
apresentam-se com valores máximos. Durante po e duração do mesmo, como a percentagem
a noite este padrão sofre ligeiras alterações que de REM no sono total, latência de REM, a dura-
mostram existir um aumento na correlação en- ção de cada episódio de REM9. No segundo caso
tre as ondas de baixa e alta frequência no sono são incluídas características que ocorrem perio-
REM quando comparadas com as que surgem dicamente, como o número de movimentos dos
no sono nREM. Isto significa que as actividades olhos (actividade) e incidência dos mesmos
de baixa-alta frequência estão desactivadas du- (densidade)2,9.
rante o nREM e activadas durante o REM. Este A percentagem de sono REM, tal como já se
comportamento deve-se ao trajecto recíproco da referiu, ronda os 20% do sono total em que a
actividade de ondas de baixa frequência no lobo duração do primeiro episódio de REM é relati-
temporal durante o sono REM em oposição a vamente mais curta do que o segundo e este
um trajecto paralelo durante o sono nREM6. menor do que o terceiro e assim sucessivamente
Deste modo, o registo no EEG do sono REM as- (Fig. 1)3,9. A latência do sono REM caracteriza-
semelhando-se ao registo de um indivíduo acor- -se por ser o tempo que vai desde o começo do
dado e a dificuldade em acordá-lo levam os in- sono ao início de um episódio de sono REM, os-
vestigadores a chamá-lo de sono paradoxal1,2,3,5. cilando entre os 70 a 100 min. Este período de
Precedendo cada episódio de sono REM e mes- latência é, geralmente, alterado em situações
mo depois deste começar registam-se ondas que patológicas8,9. A relação entre a duração de um
atinge os 50 Hz. São as ondas PGO que foram episódio de REM e a densidade do mesmo per-
descritas primeiro em gatos2 e muito mais tarde mitem inferir acerca da intensidade do sono
no homem9. As ondas PGO apresentam dura- REM que aumenta ao longo da noite, apresen-
ções de 1 a 2 seg e ocorrem como resultado de tando valores máximos durante a madrugada9.
potenciais de acção gerados no tegmento dorso-
lateral mesopontino e transmitidos aos núcleos 2.3. Alterações nas funções fisiológicas
talâmicos9. Um estudo16 revelou que as descar- durante o sono REM
gas relacionadas com as PGO se localizavam
quer no núcleo geniculado dorsolateral (LG) Como já foi referido, durante o sono REM,
quer no perigeniculado (PG), sendo essas ondas múltiplas alterações ocorrem a nível das funções
relacionadas com as contracções espontâneas básicas do organismo humano:
dos músculos extraoculares9, sonho19 e promo- 1. Sistema nervoso autónomo: a actividade pa-
toras da plasticidade neuronal16. rassimpática aumenta durante as fases de REM
O EMG mantem-se em silêncio excepto por tónico e fásico enquanto que a actividade sim-
momentos periódicos de explosões rápidas de pática apresenta uma ligeira redução durante o
actividade muscular entre os quais nos movi- REM tónico. Como resultado há predomínio da
mentos dos músculos extraoculares, permane- actividade parassimpática. Durante o REM
cendo a atonia muscular durante todo o sono fásico, a actividade simpática aumenta dramati-
REM2,3,5,9. camente e predomina, apesar do aumento da ac-
tividade parasimpática também ocorrer2,3,7.
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2. Controlo motor: o sono REM caracteriza-se obstrução intermitente das mesmas. Estes even-
por dois fenómenos únicos a nível do controlo tos estão na base do Síndrome da Apneia no
motor – a supressão do tónus dos músculos pos- adulto e Síndrome de Morte Súbita, nas crian-
turais e eventos fásicos de aumento do tónus ças3. Contrastando com esta situação temos o di-
manifestado nos músculos extraoculares, dia- afragma e músculos intercostais que são muito
fragma e intercostais2,3,16. Esta alteração a nível menos afectados pelo sono REM, uma vez que
do tónus muscular deve-se a mudanças no po- os seus motoneurónios são quase exclusivamen-
tencial de acção dos motoneurónios que te controlados por impulsos respiratórios14,15. A
enervam os músculos. Ele varia durante o sono resposta à hipercapnia e hipóxia estão claramen-
nREM e REM devido às variações dos graus de te reduzidas durante o sono, em especial do sono
excitação e/ou inibição das células cerebrais. No REM, comparativamente com o estado de alerta
REM, as aferências excitatórias (por exemplo, uma vez que a magnitudade da diminuição da
serotonina e noradrenalina) diminuem drasti- saturação de O2 do estado de alerta para o sono
camente levando a uma depressão dos moto- REM depende da P(O2) inicial3,7.
neurónios3,7. Estudos em que há lesão do locus 4. Controlo da temperatura corporal: durante o
coeruleus, onde a concentração de noradrenalina sono REM, a regulação da temperatura está au-
é elevada, mostram existir um síndrome em que sente levando ao cessar da transpiração e do tre-
há sono REM sem atonia muscular. Por outro mor característico da adaptação corporal ao frio
lado, as aferências inibitórias sofrem um recru- assim como da taquipneia e vasodilatação2. Se o
tamento intensivo, provocando uma hiperpola- sono REM persistir sem a regulação da tempera-
rização dos motoneurónios, diminuição da re- tura esta ajustar-se-á à temperatura ambiente7.
sistência membranar e o aparecimento de po- 5. Controlo endócrino: o sono REM é um dos
tenciais pós-sinápticos. Esta inibição deve-se ao principais moduladores da função endócrina – a
aumento da permeabilidade da membrana dos secreção de prolactina aumenta perto do acor-
motoneurónios a iões de Cl-, levando a concluir dar, as gonadotropinas aumentam no sono du-
que a glicina e o GABA (ácido gama-aminobutí- rante a adolescência1,2,5,8, a secreção da hormo-
rico) sejam os neurotransmissores libertados3,14. na de crescimento (GH) é estimulada contras-
Assim, no sono REM, verificamos que tanto os tando com a diminuição da actividade do eixo
extensores como flexores estão átonos e os re- Hipotálamo-Hipófise-Suprarrenal e como tal do
flexos homónimos monossináptico e flexor es- cortisol34.
tão diminuídos. 6. Outras alterações: volume de ejecção cardía-
3. Sistema respiratório: é sobre a respiração que co diminuído, hipotensão, bradicardia no REM
o sono REM apresenta uma das suas influências tónico e taquicardia no REM fásico, vasoconstri-
mais enigmáticas. As alterações de controlo mo- ção, aumento do fluxo sanguíneo cerebral, ex-
tor não só ocorrem a nível dos músculos postu- creção de urina muito concentrada, erecção
rais mas também afectam os músculos respirató- peniana e do clitóris, aumento da actividade do
rios. A nível dos motoneurónios respiratórios po- lobo frontal e límbico, entre muitas1,2,5,7,8,16.
demos extrapolar as conclusões tiradas a partir
dos motoneurónios posturais, excepto o facto dos 2.4. Factores que influenciam o sono REM
respiratórios receberem um impulso rítmico rela-
cionado com a respiração14,15. Os músculos das O sono REM é regulado activamente por vá-
vias respiratórias superiores tais como os rios factores que assentam em três grandes pro-
constrictores da faringe e genioglosso, que tam- cessos: homeostasia, pelo controlo da quantidade
bém desempenham papéis importantes na de sono e estado de alerta7,18,29,30; circadianismo,
fonação e ingestão, sofrem uma redução na sua pelo controlo da alternância entre os estados de
actividade que atinge a atonia completa. Esta re- sono REM, nREM e alerta7,8,17,29,30; e ultradia-
dução de tónus leva à estenose das vias respira- nismo que controla a passagem do nREM a
tórias ou até o seu colapso total, produzindo um REM7. Além destes processos o sono REM tam-
som grave e arrastado – ressonar, e a apneia ou bém é influenciado por factores externos tais
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ros três meses de vida, devendo-se este desen- latências muito curtas (< 8 min.), as crianças
volvimento às alterações nas vias tálamo-corti- com 3 meses apresentam uma distribuição de-
cais, maturação do sistema fisiológico capaz de sequilibrada de latências curtas (por volta de 4 a
provocar o aparecimento de ondas21,23, aumen- 8 horas) e latências longas (por volta de 12 a 16
to das conexões rostrocaudais entre tálamo e horas). Nestas crianças a latência depende da
protuberância22. São estes três meses que pare- duração do estado de alerta anterior numa rela-
cem marcar uma mudança nos processos de ção directa em que longas latências são precedi-
maturação pelo facto de reflectirem alterações das por longos episódios de alerta23. A alimenta-
no sistema nervoso central e comportamento21. ção apenas provoca alterações pontuais na la-
Outros parâmetros completam estas conclu- tência do sono REM23,24.
sões tais como o aumento da latência do sono As crianças acordam preferencialmente do
REM, o aumento da estabilidade do sono com a estado de sono REM e tal como na latência, a
diminuição de despertar súbito e movimentos alimentação tem pouca importância no seu des-
corporais. Paralelamente à maturação pós-si- pertar. Este envolve respostas quer corticais quer
náptica assiste-se, como resultado de um sono subcorticais, sendo estas últimas mais comuns
REM abundante, às alterações nas propriedades embora ambas possuam a mesma sequência de
químicas dos neurónios piramidais da camada actuação: um ritmo respiratório aumentado se-
cortical III (piramidal externa) que para além de guido de um sobressalto subjacente ao "desper-
receber fibras de associação, recebe fibras tar" cortical/subcortical. Esta tendência é mais
comissurais do hemisfério contralateral10. Estas pronunciada em crianças com menos de 3 me-
descobertas correspodem a uma maturação pro- ses do que nas crianças com mais de 4. Assim,
longada dos movimentos relacionados com os verifica-se que há um ritmo endógeno espontâ-
macropotenciais, assim como os potenciais rela- neo envolvendo processos excitatórios a nível do
cionados com a cognição, cujas mudanças se tronco cerebral, precedendo a excitação corti-
acentuam até cerca dos 10 anos de idade22. cal24. As características do sono REM propiciam
um despertar mais frequente neste estado do
Como já se referiu, durante o sono REM a que no de nREM25. Curiosamente, as crianças
actividade do locus coeruleus está diminuída, en- têm tendência a dormir, principalmente no sono
quanto que no estado de alerta tem uma activi- REM e nREM IV, em pronação e apoian-do o seu
dade constante ou fásica. Recentes estudos mos- corpo sobre o lado esquerdo26.
tram que os baixos níveis de noradrenalina du- Vários estudos em crianças têm procurado
rante o sono REM estão ligados a uma redução mostrar a relação entre a elevada percentagem
na expressão do P-CREB (phosphorylated cAMP- de sono REM que as caracteriza e funções cog-
-responsive element-binding protein), Arc (activity- nitivas como a memória e a aprendizagem. Es-
-regulated cytoskeleton-associated protein) e BDNF tas funções cognitivas podem ser estimuladas
(brain-derived neurotrophic factor). A fosforilação durante o sono REM devido à interacção de três
do CREB através da activação das cascadas factores: (i) mudança na neuromodulação que
cAMP e fosfocínase A (PKA) e/ou da activação passa de aminérgica a colinérgica, (ii) diminui-
da proteína dependente do Ca2+, tal como a "up- ção da actividade no lobo frontal com aumento
-regulation" do Arc e BDNF estão intimamente da actividade na circunvolução anterior do
ligadas à plasticidade sináptica16,33. A serotonina cíngulo e amígdala, (iii) diminuição das
e a histamina não mostram participar de qual- eferências do hipocampo para o neocortéx16,19.
quer forma a nível da plasticidade neuronal33 A nível do EEG, as ondas teta suportam informa-
enquanto que a acetilcolina pela expressão do ção que circula do neocortéx para o hipocampo,
gene c-fos possui um papel activo neste proces- marcando um aumento dos fenómenos de LTP
so16,33. (Long Term Potentiation)19 que são fundamentais
Como já foi referido, a latência do sono REM para a formação da memória a nível do hipo-
aumenta com a idade. Enquanto os recém-nas- campo10.
cidos e crianças até aos 3 meses apresentam Um estudo de meta-análise conclui que o
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sono REM desempenha um papel fundamental sono REM por longos períodos. Por outro lado, as
na consolidação da memória prática em oposi- benzodiazepinas ao aumentarem a afinidade do
ção à declarativa32. O sono REM também está GABA ao seu receptor que se encontra associado
associado ao processamento de memórias emo- aos canais de Cl- induzem o sono REM; daí serem
cionais uma vez que após um despertar em REM utilizados como tranquilizantes16,36. Os barbitúri-
há a rememoração de emoções e acontecimen- cos, também depressores do SNC, são utilizados
tos conflituais16. A síntese proteica e a fosfocínase especialmente como antiepiléticos e indutores de
A (PKA) são requisitos fundamentais para a con- anestesia geral provocam, durante a terapêutica,
solidação da memória, sendo a sua inibição se- diminuição do sono REM e irregularidade na al-
melhante à privação do sono REM. Adicional- ternância das fases do ciclo sono/vigília. Após ter-
mente, a exposição a um ambiente estimulador minar a terapêutica, verifica-se um aumento do
induz de imediato a acção do gene zif-268 du- sono REM e posterior recuperação dos valores
rante o episódio de REM subsequente. A expres- normais, associando este aumento a pesadelos re-
são deste gene normalmente coincide com mo- correntes e a senasção de mal-estar durante o
dificações sinápticas que, presumidamente, re- sono. Num uso terapêutico mais longo, a recupe-
flectem a consolidação da memória. Estes novos ração do sono REM ocorre durante o uso do
conhecimentos apontam para a via de sinaliza- barbitúrico36.
ção PKA nos processos de aprendizagem e me- A frequência dos despertares durante o sono
mória dependentes do sono REM16. REM nos adultos aumenta significativamente
em comparação com as crianças e jovens, po-
4.3. Adulto dendo este aumento dever-se à maior fragmen-
tação do sono. O índice de despertar (número
A percentagem de sono REM ronda os 20%, de despertares numa hora) num jovem adulto
valor que se mantém relativamente constante ronda os 13,3 e num adulto de meia idade os
desde a infância e atravessa a adolescência. Re- 14,7, sendo que o tempo médio de despertar é
lativamente à latência do sono REM esta é mai- de 16 segundos25. O mesmo se verificou em ra-
or em oposição à actividade e densidade do sono tos embora estes apresentem uma curva de di-
REM2,27. Estes níveis de latência e densidade têm minuição do sono REM (em valores absolutos)
sido relacionados com depressões graves, luto, menos acentuada27.
ansiedade e stress pós-traumático16. Curiosamente, um estudo em 1996 mostra
Três grandes classes de fármacos antidepres- que as diferenças sexuais influenciam o sono
sivos, MAOIs (Inibidores da monoamina oxída- REM no estado adulto, em que os homens têm
se), TCAs (Antidepressivos tricíclicos) e SSRIs períodos de sono REM maiores que as mulheres
(Inibidores de recaptação selectiva da serotonina), quer durante o dia quer de noite. Em mulheres
mostram ter um papel importante na supressão ovariectomizadas verificou-se que as diferenças
do sono REM16,25. Os MAOIs suprimem comple- se mantinham durante o dia, mas que de noite
tamente o sono REM pelo aumento da presença essas eram insignificantes, permitindo concluir
de monoaminas na fenda sináptica levando a que que as diferenças entre dia e noite deviam-se à
durante o período em que o sono REM está su- supressão do sono REM pelas hormonas ovári-
primido não se verifique atonia muscular, episó- cas durante a noite. Por outro lado, as diferenças
dios de movimentos fásicos dos olhos e dessin- entre sexos em relação ao sono REM durante o
cronização do EEG que são características especí- dia nada têm a ver com a circulação de hormo-
ficas do sono REM25. As ondas PGO também são nas ováricas28. O uso de contraceptivos orais, ao
inibidas pelos MAOIs16. Os TCAs e SSRIs promo- simularem as hormonas ováricas, particular-
vem uma redução de sono REM na ordem dos 30 mente os estrogénios36, promovem a diminui-
a 50% do mesmo25. O uso destes fármacos têm ção da latência do sono REM, aumento deste e
posto em causa o papel do sono REM na memó- diminuição do sono nREM, estando os contra-
ria uma vez que podem vir a ser utilizados para ceptivos orais ligados a perturbações do sono em
averiguar o efeito de uma supressão completa de mulheres saudáveis36,37.
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Assiste-se também a uma mudança na posi- total2,7,25, o mesmo acontece com o sono em ge-
ção durante o sono em que a supinação assume ral. Inicialmente pensar-se-ia que esta diminui-
maior preferência tal como o apoio do corpo do ção de 3% é irrelevante, todavia em termos ab-
lado direito pelos adultos de meia idade e do lado solutos é de grande importância uma vez que
esquerdo pelos adultos mais novos26. num idoso o tempo total de sono diminui para
À semelhança do que acontecia com as crian- as 6-8 horas diárias7.
ças cujo sono REM era estudado para inferir acer- A latência do sono REM diminui para valo-
ca do desenvolvimento da cognição, no adulto res que rondam os 82-87 min, ou seja, o tempo
tem vindo a ser estudado numa perspectiva de que vai desde o início do sono REM é menor do
atingir conhecimentos acerca do sonho. Todavia, que num adulto (90-99 min.). Por outro lado o
as conclusões a que hoje se chegou podem ser número de despertares durante o sono REM tem
extrapoladas quer para a criança, quer para o um índice de 11,3. O certo é que o número de
adulto, quer para o idoso2,8,19. Os sonhos são des- despertares por hora numa noite é menor do
critos em cerca de 70 a 80 % dos casos depois do que nos adultos, mas o número de horas por
despertar em sono REM8. Todavia, o sonho não noite também vai ser menor e o tempo de cada
se confina ao REM, estando também ligado a des- despertar num idoso chega a atingir os 20 se-
pertares durante o nREM19. gundos (mais 4 do que no adulto)25. Estes valo-
O número de sonhos, assim como a duração res ficam a dever-se a motivos quer de origem
dos mesmos, não está envolvido com a duração idiopática quer associados ao aumento de duas
ou quantidade de sono REM, mas é muito rela- perturbações típicas do sono REM nos idosos – a
cionado com ele devido à memória dos sonhos apneia do sono e os movimentos periódicos da
ser maior num despertar REM do que num des- perna7.
pertar nREM8. Estudos recentes mostram que esta diminui-
A natureza do sonho é ainda um mistério e ção também está associada a doenças neurode-
para a sua explicação apenas existem teorias. Os generativas e diminuição da actividade dos pro-
sonhos durante o REM são normalmente os pulsores do sono REM, entre os quais glutamato
mais longos e visualmente mais intensos, bizar- e acetilcolina38,39,40. Mudanças na estrutura do
ros e emocionais19. É neste estado de sono que sono, em especial do sono REM e na activação
surge a definição clássica de pesadelo8. Os inves- do EEG foram relacionadas com o défice
tigadores propuseram que seriam as característi- colinérgico característico da doença de Alzhei-
cas fisiológicas do sono REM que contribuía para mer38. A diminuição da percentagem do sono
tal. Durante o sono REM, as estruturas do pro- REM como resultado da mesma a nível de cada
sencéfalo e amígdala estão activadas, enquanto episódio REM é a alteração mais clara40. A doen-
que os lobos frontais e o locus coeruleus diminu- ça de Parkinson é outra das patologias que mais
em a sua actividade, de modo que, a capacidade afecta os idosos, manifestando-se também por
de estabelecer relações espaciais está esbatida, alterações na substância negra e locus coeruleus
razão pela qual, durante o sonho, se presta pou- que se reflectem na diminuição da qualidade do
ca atenção às bizarras alterações de espaço e sono dos idosos10,39. Deste modo, a terapia far-
tempo que ocorrem. Simultaneamente, as afe- macológica com recurso a tranquilizantes, seda-
rências ao hipocampo são inibidas prevenindo a tivos e hipnóticos devem ser consideradas.
reactivação de episódios de memória. Apesar Relativamente à posição em que os idosos
destas associações parecerem fracas, os investi- preferencialmente dormem verifica-se que há
gadores sugerem cada vez mais que há uma es- uma diminuição da pronação sugerida pela falta
treita relação entre sonho, REM e emoção19. de flexibilidade da coluna vertebral, assim como
do esforço extra necessário para a respiração. O
4.4. Idoso mesmo acontece com o apoio no lado esquerdo
que diminui substancialmente relacionado com
Na velhice, assiste-se a uma diminuição na o défice das funções cardiovasculares26.
ordem dos 3% do sono REM durante o sono
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4.5. Sinopse
QUADRO 1 – SINOPSE DAS CARACTERÍSTICAS MAIS IMPORTANTES DO SONO REM NUMA PERSPECTIVA
ONTOGÉNICA. NREM/REM – DURAÇÃO DO SONO TOTAL; REM - % DE SONO REM; REML – LATÊNCIA DO SONO
REM EM MINUTOS; AI/REM – ÍNDICE DE DESPERTAR NO SONO REM; AIT – TEMPO EM SEGUNDOS DE UM
DESPERTAR NO SONO REM
Recém-
Nascido 16 a 18 horas 50 <8 - - Pronação e Maturação e
Apoio Esq. Plasticidade
Criança 12 a 8 horas 20 Mto variável - - Pronação Idem,
e Apoio Esq. Aprendiza-
gem e Memória
Jovem 465 min 20 81 13,3 16 Pronação Idem e Sonho
e Apoio Dto
Adulto 455 min 20 90-99 14,7 16,3 Supinação Memória
e Apoio Dto e Sonho
Idoso 406 min 17 82 -87 11,3 19,3 Supinação Degeneração
e Apoio Dto da Memória
e Sonho
16
14
12
10
8
6
4
2
0
Recém 2a3 Criança Adolesc. Jovem Adulto Meia Idoso
nascido anos Idade
nREM REM
Figura 3 – Gráfico mostrando a relação entre REM e nREM desde o recém-nascido ao idoso2.
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em muitas funções fisiológicas, estando relacio- expression before the dawn. The number of
nado com funções tão complexas como a me- awakenings has similar distribution and is more
mória, aprendizagem e sonho. Funções estas common in REM episodes. In elderly there is a
que se associam a um padrão de desenvolvimen- progressive deterioration of sleep patterns, memory
to do sono REM numa perspectiva ontogénica and dreams.
do mesmo, uma vez que a idade está proporcio- We can conclude that REM sleep has a progressive
nalmente relacionada com maior número de significance in Neurophysiology and in Medicine
mudanças na estrutura, qualidade e tempo de because, paradoxically, REM sleep is not only a quiet
sono REM. brain state.
Todavia e, apesar de tudo o que se sabe so- Key-words: REM sleep; nREM sleep; Ontogene-
bre o sono REM e das cinco décadas de pesquisa sis; Cycle sleep/awake.
intensiva neste campo, no que concerne ao seu
impacto e génese ainda existem muitas dúvidas
e especulações acerca do envolvimento de neu- BIBLIOGRAFIA
rotransmissores na sua génese11,14 ou até mesmo
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