Você está na página 1de 32

Projeto de Capa e Contra Capa

Federação Anarquista do Rio de Janeiro

Impressão
Federação Anarquista do Rio de Janeiro

Edição
Federação Anarquista do Rio de Janeiro

Sobre a Publicação
O material aqui editado, é uma coletânea de textos sobre questões importantes para a mili-
tância anarquista/socialista e que foram produzidos coletivamente em diferentes momentos
por grandes referências na tradição anarquista. Esperamos que esse material seja útil para a
reflexão e ação coletiva em movimentos populares e instâncias da classe trabalhadora.

Copyleft - Material Livre para Copiar e Distribuir

Desde que informa a Origem e Autor do Trabalho

FARJ - RJ
farj.org

Impresso em 2018. 1a Edição


Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Apresentação FARJ.........................................................4
Necessidade da Organização - Mikhail Baku-
nin................................................................................ 5
A Organização I - Errico Malates-
ta............................................................................... 16
A Organização II - Errico Malates-
ta............................................................................... 19
Tática e disciplina do partido revolucionário - Mikhail Baku-
nin.............................................................................. 31
O problema da organização e a noção de sín-
tese - Dielo Trouda............................ 41
Nossa Organização - Nes-
tor Makhno..................................48
Consciência de Partido - Camillo Berneri.............................51
Críticas e proposições organizacionistas - José Oiticica....54
Apresentação - Federação Anarquista do Rio de Janeiro à ação operária.[6]
Desde que o anarquismo é anarquismo, não tem pregado
outra coisa senão a ação direta das massas contra os burgueses,
Este material é uma coletânea de textos anarquistas clássicos que visam
debater temas que são caros a nossa tradição socialista e libertária. Visamos
pela associação, pela colaboração dos sindicatos, pelas greves,
à partir do conjunto destes textos, instrumentalizar e formar a militância anar- pela sabotagem, por todos os processos imagináveis. Espero que
quista para sua atuação nos movimentos populares. Há em muitos casos, um os bolchevistas não nos virão negar isso e considerar a ação dire-
desconhecimento grande sobre a proposta organizativa do anarquismo. Pala- ta invenção bolchevista, ou idéia do “mestre” Marx ou do “mes-
vras como disciplina, partido, socialismo e organização, longe de serem es- tre” Engels.[7]
tranhas a nossa tradição fazem parte de nossa ideologia política, anti-estatal,
libertária, socialista e anti-capitalista. Aqueles, entretanto, que aceitarem a idéia dos grupos se-
lecionados, à maneira exposta, não devem perder tempo. Cada
O material busca formar politicamente as/os interessadas/os no anarquis-
mo, resolvendo confusões e aproximando historicamente os clássicos do mo- agrupamento, para ser mais eficaz, deve ser muito reduzido em
mento em que vivemos. número, de doze companheiros no máximo. É melhor formar
muitos grupos pequenos federados numa localidade, com princí-
pios por todos assentados e observados, mas livres na execução
Boa leitura. das medidas tomadas, que num só grupo numeroso com assem-
bléias infindáveis, discussões ociosas e as respectivas comissões
FARJ - Integrante da Coordenação Anarquista Brasileira - CAB nomeadas.[8]

Notas (datas dos artigos):

1. 19 de junho de 1923.
2. 22 de junho de 1923.
3. 19 de junho de 1923.
4. 22 de junho de 1923.
5. 26 de junho de 1923.
6. 26 de junho de 1923.
7. 26 de outubro de 1923.
8. 26 de junho de 1923.
caracterizada.
Falar também das federações com grupos inteiramente au-
NECESSIDADE DA ORGANIZAÇAO
tônomos é absurdo. Federar-se é comprometer-se a um “pacto” Mikhail Bakunin
escrito ou não, submeter-se voluntariamente a uma vontade co-
letiva, a princípios pré-assentados, discutidos e aceitos. Portanto,
os grupos federados são “autônomos dentro do acordo”, segun- É verdade que há [no povo] uma grande força elementar,
do a fórmula de Malatesta. uma força sem dúvida nenhuma superior à do governo e à das
Assim, quando no grupo o indivíduo quebra o acordo, ele classes dirigentes tomadas em conjunto; mas sem organização
por si mesmo se “desliga” moralmente e pode (melhor, “deve”) uma força elementar não é uma força real. É nesta incontestável
ser excluído intransigentemente do grupo. Do mesmo modo, se vantagem da força organizada sobre a força elementar do povo
o grupo quebra o acordo, se desliga da federação e como tal que se baseia a força do Estado.
pode e deve ser declarado dissolvido ou estranho à federação. Por isso o problema não é saber se o povo pode se suble-
Exemplo: um grupo que vai votar ou “apóia” uma candidatura. É var, mas se é capaz de construir uma organização que lhe dê
o único meio de cortar as “águas turvas” e solidificar a “frente” os meios de se chegar a um fim vitorioso – não por uma vitória
anárquica.[4] fortuita, mas por um triunfo prolongado e derradeiro. (Maximoff,
Penso que devemos separar inteiramente a organização do 367, 70).
sindicato da organização dos anarquistas. A organização destes Diga-se o que se disser, o sistema atualmente dominante é
visa, naturalmente, orientar a classe trabalhadora por meio do forte, não por suas idéias e pela sua força moral intrínseca, que
sindicato, instrumento de ação direta nas reivindicações, mas a são nulas, mas por toda a organização mecânica, burocrática,
arregimentação dos militantes para a propaganda nos sindicatos militar e policial do Estado, pela ciência e pela riqueza das clas-
e fora dele é coisa a parte, requer métodos, processos diferen- ses que têm interesse em mantê-lo. (Obras, VI. 352-353, 71).
tes.(...)
******
Por isso querer os “grupos fechados”, só de militantes, com
ingresso por seleção e compromissos rigorosos; as “secções ope- A sublevação do proletariado das cidades não é suficiente;
rárias anárquicas”, isto é, centros operários fundados pelos “gru- com ele teríamos somente uma revolução política, que teria ne-
pos” para propaganda fora dos sindicatos.[5] cessariamente contra e1a a reação natural e legítima do povo
Não basta, pois, ter vontade de ser anarquista e propagan- dos campos, e esta reação, ou unicamente a indiferença dos
dista. Importa estudar muito, enfronhar-se na teoria, embeber-se camponeses, esmagaria a revolução das cidades, como aconte-
no ideal. Se esse tirocínio é insubstituível para alcançar a “teoria”, ceu ultimamente na França(1). Só a revolução universal é sufi-
muito mais reclama a luta real. É indispensável experiência lon- cientemente forte para inverter e quebrar o poder organizado do
ga, estudo dos sindicatos, contato constante com o trabalhador, Estado, sustentado pelos recursos das classes ricas. Mas a re-
conhecimento dos truques políticos e policiais, toda uma ciência volução universal é a revolução social, é a revolução simultânea
prática difícil. dos povos dos campos e das cidades. É isso que é preciso orga-
nizar, – porque sem uma organização preparatória, os elementos
Assim reputo evidente a necessidade de levar em conta, na mais fortes são impotentes e nulos. (Obras, VI, 403, 71 ).
organização, a distinção entre agrupamento de militantes e for-
mação de anarquistas fora dos agrupamentos. (...) Demais, no Nos momentos de grandes crises políticas ou econômicas,
sindicato não podemos dar uma feição exclusivamente anárquica em que o instinto da massa, posto em brasa, se abre em todas as
inspirações felizes, em que estes rebanhos de homens escravos, mais que queiramos, ninguém tem nada com isso.(...)
vergados, esmagados, mas nunca resignados, revoltam-se enfim Demais, os anarquistas confundem lamentavelmente des-
contra o seu jugo, mas sentem-se desorientados e impotentes centralismo da organização anárquica com centralização de for-
porque estão completamente desorganizados; dez, vinte ou trin- ças anárquicas na luta contra a burguesia fortemente centraliza-
ta homens, entendendo-se bem e estando bem organizados, e da.[1]
que saibam para onde vão e o que querem, arrastarão facilmente Como dar unidade e união às federações? Como conseguir
cem, duzentos ou até mais. Vimos isso recentemente na Comuna um corpo de militantes verdadeiramente de vanguarda, a prova
de Paris. A organização séria, apenas iniciada durante o cerco, de fogo e bons guias?(...)
não foi muito perfeita e nem muito forte; e contudo foi suficiente O segundo Congresso Operário proclamou o federalismo,
para criar uma resistência formidável. mas não soubemos efetivar as federações anárquicas fora dos
O que acontecerá então quando a Associação Internacional sindicatos.
estiver melhor organizada; quando ela tiver muitas seções agrí- Tudo isso porque somos fanáticos das “autonomias”, isto é,
colas e, em cada seção, o dobro e o triplo do número de membros “não-compromisso”. Da “licença individual”, coisa antianárquica
que tem presentemente? O que acontecerá sobretudo quando acima de tudo, como demonstrou Malatesta e como acentuou o
cada um de seus membros souber, melhor que presentemente, o Congresso de Bolonha. Com tais idéias vamos cair no anarquis-
objetivo final e os verdadeiros princípios da Internacional, assim mo individualista, a pior espécie de quietismo e dispersionismo
como os meios para realizar o seu triunfo? A Internacional tor- existente.[2]
nar-se-á uma forca irresistível .
Mas para que a Internacional possas adquirir realmente este PROPOSIÇÕES PARA UM MODELO DE ORGANIZAÇÃO
poder, para que a décima parte do proletariado, organizado por
esta associação, possa arrastar os outros nove décimos, é preci- Duas medidas são urgentemente necessárias para intensifi-
so que cada membro, em cada seção, esteja muito mais pene- car a ação anárquica: seleção dos militantes e concentração de
trado pelos princípios da Internacional do que está hoje. Só com forças. Só isso nos dará unidade de ação.[3]
esta condição é que nos tempos de, paz e de calma ele poderá
executar eficazmente a missão de propagandista e de apóstolo, Somos combatentes de uma grande guerra. Todos os com-
e, nos tempos de luta, a de um chefe revolucionário (Obras, VI, batentes, se “entendem” mutuamente para combater, assumem
90 a 92, 71 ). “compromissos”, sem os quais não pode haver unidade de ação.
Quem se “entende” com outros já não é senhor da sua vontade
Este programa [da Internacional] traz com ele uma ciência integralmente, prendeu-a por alguns fios ao acordo firmado. Se
nova, uma nova filosofia social, que deve substituir todas as an- desfaz os fios, rompe o acordo, se “desentende, desiste do com-
tigas religiões, e uma política totalmente nova… Para que todos bate comum”, foge à luta, se furta aos companheiros.
os membros da Internacional possam executar, de uma maneira Logo o indivíduo “autônomo” é impossível num “grupo” de
consciente, seu duplo dever de propagandistas e de chefes na- combate. Se ele firma um acordo com outros grupos, ele alienou
turais das massas na Revolução, é preciso que cada um deles de si, em benefício da comunhão, uma parcela de sua vontade.
esteja também penetrado, tanto quanto possível, por esta ciên- Se ele tem algum motivo de desacordo, cumpre-lhe expor esse
cia, por esta filosofia e por esta política. Não lhes basta saber e motivo à comunidade e promover a revisão do acordo. Romper
dizer que querem a emancipação econômica dos trabalhadores, o acordo por sua livre e espontânea vontade é uma traição bem
4. Guerra Social, RJ, 14/08/1911. o usufruto integral do seu produto por cada um, a abolição das
5. Depoimento do anarquista Manuel Peres no Ação Direta de classes e servilismo político, a realização da totalidade dos di-
julho de 1957. reitos humanos e a equivalência dos deveres e dos direitos para
6. Ver artigo Bem Feito na coletânea Ação Direta da Germinal. cada um, – a realização da fraternidade humana, numa palavra.
7. Ver Roberto das Neves, prefácio à coletânea Ação Direta da Tudo isto é sem dúvida muito bom e muito justo, mas, se os ope-
Germinal. rários da Internacional pararem nesta verdade, sem aprofundar
8. Ver relato sobre os acontecimentos no Sindicato dos Gráficos as condições, as conseqüências e o espírito, e se se contentarem
em 1928 por Renato Ramos no informativo Libera número 81, em repeti-las sempre nesta forma geral, correm o risco de fazer
de fevereiro de 1998. delas dentro em pouco, palavras ocas e estéreis, lugares comuns
incompreendidos.

por Milton Lopes Mas, dir-se-á, todos os operários, só pelo fato de serem
membros da Internacional não podem tornar-se sábios; e não
bastará que no seio desta associação se encontre um grupo de
homens que possuam, tão completamente quanto possível nos
nossos dias, a ciência, a filosofia e a política do socialismo, para
que a maioria, para que o povo da Internacional, obedecendo
CRÍTICA A ALGUMAS com fé a sua direção e ao seu comando fraternal (no estilo de Sr
POSIÇÕES ANARQUISTAS Gambetta, o ditador jacobino por excelência), possa estar certo
de não se desviar da via que o deve conduzir à emancipação de-
José Oiticica finitiva do proletariado?
Eis um raciocínio que ouvimos freqüentemente, não aber-
Somos dispersivos, não temos nenhum método, nada fa- tamente exprimido, – não se é tão sincero e tão corajoso para
zemos nem podemos fazer por desunião de vastas e sucessivas isso, mas que se desenvolve secretamente, com toda espécie de
incoerências práticas. Vivemos num deixa andar incrível, por in- reticências mais ou menos hábeis e com elogios demagógicos
compreensão das coisas e, pesa-nos dizer, por fanatismo. Ain- dirigidos à sabedoria suprema e à onipotência do povo sobera-
da aqui, os bolchevistas nos argúem com razão. Exemplo: Um no, pelo partido autoritário, hoje triunfante na Internacional de
camarada de São Paulo incrimina Edgard Leuenroth por haver Genebra. Nós sempre os combatemos apaixonadamente, porque
constituído com outros camaradas um grupo fechado, isto é, se- estamos convencidos – e também o estão sem dúvida conosco,
lecionado com programa de ação, compromissos assumidos e companheiros – que, desde o momento em que a Associação In-
exclusão forçada dos que não cumprirem o acordo feito. O acu- ternacional se dividir em dois grupos: um deles, compreendendo
sador afirma ser tal agrupamento antianarquista! Essa é admi- a grande maioria e sendo composto por membros cuja a única
rável! Admirável também a atitude de alguns anarquistas que se ciência seria a fé cega na sabedoria teórica e prática de seus
arregimentam contra a violência no combate à burguesia! chefes, e o outro, composto unicamente por algumas dezenas
Anarquia é o regime do acordo livre. Eu tenho o direito de de indivíduos dirigentes, esta instituição que deve emancipar a
combinar com os outros o que bem nos parecer, desde que nos- humanidade se transformaria ela própria numa espécie de Es-
sa combinação não lese a terceiro. Logo, se combino com outros tado oligárquico, o pior de todos os Estados; e ainda mais, esta
um grupo fechado, com programa, compromisso, punições e o minoria clarividente, sábia e hábil… se tornaria dentro de pouco
tempo cada vez mais despótica, maléfica e reacionária. (Obras, Em 1922, uma grave cisão é provocada no movimento ope-
VI, 93 a 96, 71). rário pela fundação do PCB. Na década de 1920 os próprios mi-
litares e as classes médias passam ao descontentamento para
… Acreditamos que o povo pode enganar-se muitas vezes, mas com o domínio das oligarquias da velha república. É em 1922 a
não há ninguém no mundo que possa corrigir seus erros e repa- revolta do Forte de Copacabana e a 5 de julho de 1924 explode
rar o mal que sempre resulta deles, a não ser ele próprio; todos em São Paulo a revolta das tropas comandadas pelo General Isi-
os outros reparadores e retificadores… nunca fazem nem podem doro Dias Lopes. O governo de Artur Bernardes decreta o estado
senão aumentar os erros e o mal. (Lehning, I- 1, 242, 71). de sítio e Oiticica é preso na sala de aula do Pedro II, passando
durante sete meses a peregrinar por diversas prisões, ou seja,
pela central de polícia, ilha Rasa e ilha das Flores. Ao sair da pri-
Educação militante. Relação entre as organizações socia- são, Oiticica edita com Antonio Bernardo Canellas o jornal clan-
listas e os sindicatos: Necessidade e papel do partido. destino 5 de Julho.[7]
Eu gosto muito desses socialistas burgueses que nos gritam A polêmica entre anarquistas e comunistas recrudesce e ad-
sempre: “Instruamos primeiro o povo e depois o emancipemos”. quire maior dramaticidade ao ser morto o sapateiro anarquista
Pelo contrário nós dizemos: Ele que se emancipe primeiro e se Antonino Dominguez no Sindicato dos Gráficos na rua Frei Ca-
instruirá ele próprio… Deixam-no maçar-se com o seu trabalho neca em 1928, por tiros disparado por militantes do PCB. Os
quotidiano e com sua miséria, e dizem-lhe: “instruam-se!”. integrantes da “tcheka” do PC visaram especificamente Oiticica
Não, senhores, apesar do nosso respeito pela questão da e outros anarquistas.[8] Em 1937 Oiticica é novamente preso,
instrução integral, declaramos que hoje esta já não é a maior desta vez pela polícia do chamado “Estado Novo”. Em 1946 rei-
questão para o povo. A primeira questão é a da sua emancipa- nicia com outros companheiros a edição do jornal Ação Direta
ção econômica que engendra imediatamente e ao mesmo tempo no Rio (houve uma primeira fase em 1928-1929). Tendo falecido
a sua emancipação política, e muito em breve sua emancipação em 1957, seu nome foi dado no ano seguinte pelos anarquistas
intelectual e moral. (Obras, V, 42, 69). do Rio a um Centro de Estudos, fechado pela ditadura militar em
1969.
Mas como chegar, do abismo da ignorância, de miséria e
Da vida intensa do sábio e rebelde Oiticica, nos fica o en-
de escravatura, no qual os proletários dos campos e das cidades
sinamento que ele formulou ao declarar que “só a ação direta
estão mergulhados, a este paraíso, a esta realização da justiça
abala tronos, ameaça tiranias, convulsiona mundos. Só ela prin-
e da humanidade na terra? – Para isso, os trabalhadores só têm
cipalmente, educa e fortifica o povo espoliado na sua luta mile-
um único meio: a associação. (Obras, V, 42, 69).
nar contra as forças escravizadoras.”
Pois só resta uma única via, é a da [sua] emancipação pela
prática. (Obras, V, 182, 69).
Notas:
****** 1. Ação Direta no 119, Ano 11, 1ª página, julho de 1957. O jornal
A seção central, já dissemos, foi o primeiro germe, o primei- circulou no RJ de 1946 a 1959.
ro corpo constituinte da Associação Internacional em Genebra; 2. Ver o prefácio de Roberto das Neves para a coletânea de arti-
ela deveria continuar a ser sua alma, a sua inspiradora e a sua gos de Oiticica Ação Direta, Editora Germinal, RJ, 1970.
propagandista permanente. É neste sentido, sem dúvida, que 3. Artigo de José Oiticica m A Rua, citado por Francisco de Assis
muitas vezes se lhe chamou a “seção da iniciativa”. Ela criou a Barbosa A Vida de Lima Barreto, José Olímpio, RJ, 1952.
Fato importante na biografia de Oiticica ainda nesta fase foi sua Internacional em Genebra, devia conservar e desenvolver seu
participação na revista anarquista A Vida, editada no período de espírito. Sendo todas as outras seções corporativas(2), os ope-
1914-1915 no Rio. Nomeado professor de português do colégio rários estão aí reunidos e organizados não pela idéia, mas pelo
Pedro II depois de árduo concurso em que expôs os erros dos fato e pelas próprias necessidades de seu trabalho idêntico. Este
componentes da banca que o examinava, Oiticica não deixou fato econômico, o de uma indústria especial e de condições par-
decrescer seu espírito rebelde em função do cargo. Em 1918 ticulares de exploração desta indústria pelo capital, a solidarie-
Rui Barbosa pronuncia conferência em teatro do Rio com fins dade íntima e particularmente os interesses, as necessidades, os
eleitorais, prometendo pequenas vantagens aos operários, en- sofrimentos, a situação e as aspirações que existem entre todos
tre os quais descanso de 8 dias para a mulher depois do parto. os operários que fazem parte da mesma seção corporativa, tudo
Oiticica escreve artigo “que causou emoção em todos os setores isso forma a base real da sua associação. A idéia vem depois,
políticos e sociais, pois demonstrava de forma, eloqüente que o como explicação ou como expressão equivalente do desenvolvi-
famoso tribuno baiano desconhecia em absoluto a vida trágica mento e da consciência coletiva e refletida deste fato. (Obras, VI,
dos trabalhadores e a verdadeira solução para os seus graves 55-56, 71)
problemas.”[5] Ainda a 19 de abril daquele mesmo ano a audácia
de Oiticica iria ainda mais longe ao publicar no jornal A Rua uma As seções centrais não representam nenhuma indústria em
carta aberta ao todo poderoso chefe de polícia do Distrito Federal especial, visto que os operários mais avançados de todas as in-
que havia fechado a Federação Operária. Oiticica argumentava dústrias possíveis encontram-se aí reunidos. Então o que é que
que os militantes anarquistas presos ou perseguidos eram pes- elas representam? A própria idéia da Internacional. Qual é a sua
soas de elevada condição ética, ao contrário do rebotalho de que missão? O desenvolvimento e a propaganda desta idéia. E esta
era constituído o quadro de agentes policiais, especialmente os idéia o que é? É a emancipação dos trabalhadores de tal indústria
“secretas” e informantes encarregados da repressão política. e de tal país, mas também de todas as indústrias possíveis e de
A 18 de novembro de 1918 declara-se no Rio e em cidades todos os países do mundo… Tal é a força negativa, belicosa ou
vizinhas uma greve geral insurrecional. Operários entram em cho- revolucionária da idéia. E a força positiva? É a fundação de um
que com o exército e a polícia. Oiticica e outros são presos acu- novo mundo social (Obras, VI, 65, 66, 71).
sados por um oficial do exército de serem os promotores de uma As seções centrais são os Centros ativos e vivos onde se
tentativa insurrecional. Desterrado para Alagoas, Oiticica ali faz conserva, se desenvolve, e se explica a nova fé. Lá ninguém
propaganda entre os pescadores, falando-lhes à luz de velas[6]. entra como operário especial desta ou daquela profissão; lá en-
Ali também trava conhecimento com um jovem, Otávio Brandão, tram todos unicamente como trabalhadores em geral, com o fim
então anarquista, para quem escreve prefácio para o livro Canais da emancipação e da organização geral do trabalho e do novo
e Lagoas, em que pela primeira vez é afirmada a existência de mundo social baseado no trabalho, em todos os países. Os ope-
petróleo no Brasil. Anos depois, já no PCB, Brandão mandará rários que fazem parte dela, deixando à entrada a sua qualidade
retirar o prefácio de Oiticica de uma segunda edição. De volta de operários especiais ou “reais”, no sentido da especialidade,
ao Rio, Oiticica se verá envolvido no projeto do jornal anarquista apresentam-se lá como trabalhadores “em geral”. Trabalhadores
Spartacus, juntamente com Astrojildo Pereira, dentro de alguns de que? Trabalhadores da idéia, da propaganda e da organização
anos também seu adversário ideológico. No ano seguinte tocaria do poder tanto econômico como militante da Internacional: Tra-
a vez de contribuir para o diário Voz do Povo, órgão da Federação balhadores da Revolução Social.
dos Trabalhadores do Rio de Janeiro, de orientação anarco-sindi-
Vê-se que as seções centrais têm um caráter totalmente di-
calista.
ferente das seções de profissão e até diametralmente oposto. cica, um dos maiores militantes do movimento no Rio e talento
invulgar em diversas áreas do conhecimento humano, a começar
Enquanto que as últimas, seguindo a via de desenvolvimen- pelo da língua portuguesa de que era catedrático no Colégio Pe-
to natural, começam pelo fato para chegar à idéia, as seções dro II desde que ali ingressara por concurso em 1916, apesar de
centrais, pelo contrário, seguindo a do desenvolvimento ideal ou prestar prova demonstrando os erros de seus argüidores.
abstrato, começam pela idéia para chegar ao fato. É evidente José Rodrigues Leite e Oiticica havia falecido subitamente
que em oposição ao método tão completamente realista ou posi- de um enfarte a 30 de junho de 1957. Seu nascimento havia
tivo das seções de profissão, o método das seções centrais apre- ocorrido a 22 de julho de 1882 em Oliveira, Minas Gerais, quar-
senta-se como artificial e abstrato. Esta maneira de proceder da to filho de antigo constituinte e senador da república. Aos seis
idéia ao fato é precisamente a de que se têm servido eternamen- anos foi expulso do Seminário Arquidiocesano de São José em
te os idealistas de todas as escolas, teólogos metafísicos e cuja Petrópolis por ter se rebelado contra os “bolos” aplicados por um
importância final foi constatada pela história… padre mestre.[2] A seguir foi matriculado no Colégio Paula Frei-
Se só tivesse havido na Associação Internacional dos Traba- tas na Tijuca onde travou conhecimento com o futuro escritor e
lhadores seções centrais, não há dúvida de que ela não teria atin- também anarquista Lima Barreto (1881-1922)[3]. Aos 15 anos,
gido nem a centésima parte da força considerável de que agora Oiticica ingressou na Escola Politécnica para seguir curso de De-
se glorifica. As seções centrais teriam sido igualmente academias senho. A leitura de livros de sociologia, porém, leva-o ao curso
operarias onde seriam sempre debatidas todas as questões, in- de Direito em Recife e no Rio. Formado, desilude-se logo com os
cluindo naturalmente a da organização do trabalho, mas sem a meios jurídicos para resolver as grandes e pequenas questões
mínima tentativa séria nem mesmo sem aláuma possibilidade de sociais. Suas atividades voltam-se então para a educação. Em
realização: e isto por uma razão muito simples: o trabalho “em 1905, ano de seu casamento com sua prima Francisca Bulhões,
geral” não é senão uma idéia abstrata que não encontra a sua funda com esta o Colégio Latino-Americano no Rio, a experiên-
“realidade” senão numa imensa diversidade de indústrias espe- cia fracassa, pois o casal admitia numerosos alunos carentes de
ciais, em que cada uma tem sua natureza própria, as suas pró- recurso financeiros. Depois de dirigir por dois anos uma escola
prias condições, as quais não se pode adivinhar e muito menos municipal em Santa Catarina, Oiticica volta ao Rio. Em 1911 es-
determinar pelo pensamento abstrato, mas que, só se manifes- tréia na literatura, e já era jornalista desde 1901.
tando pelo fato do seu desenvolvimento real, podem determinar É em 1911, depois de tantas desilusões com a religião, o
sozinhos o seu equilíbrio particular, as suas relações e o seu lugar direito, a educação e o Estado que José Oiticica irá dar um passo
na organização geral do trabalho, – organização , que, como to- decisivo em sua vida. Após ouvir de um parente seu que suas
das as coisas gerais, tem de ser a resultante sempre reproduzida idéias de transformação social eram “anarquismo puro”, Oitici-
de novo pela combinação viva e real de todas as indústrias parti- ca descobre-se ideologicamente anarquista. O jornal anarquista
culares e não o seu princípio abstrato, imposto violenta e doutri- Guerra Social, editado no Rio, chama a atenção em seu número
nariamente, como o queriam os comunistas alemães, partidários de 14 de agosto de 1912[4] para um curso de sociologia na Liga
do Estado popular. Anticlerical do Rio de Janeiro, ministrado por Oiticica. E é ainda
Se só tivesse havido, na Internacional, seções centrais, pro- em um jornal anticlerical, A Lanterna, de SP, que Oiticica publica
vavelmente elas já teriam conseguido formar conspirações po- um artigo sobre o fuzilamento de Ferrer em outubro de 1912.
pulares para a inversão da ordem atual das coisas, conspirações Esse ano o vê também engajar-se ativamente no movimento sin-
de intenção, mas muito fracas para atingir seus fins, porque elas dicalista revolucionário.
nunca poderiam arrastar e receber no seu seio senão um pe-
CRÍTICAS E PROPOSIÇÕES queníssimo número de operários, os mais inteligentes, os mais
enérgicos, os mais convencidos e os mais dedicados. A imensa
ORGANIZACIONISTAS maioria, os milhões de proletários ficaria de fora, e, para inverter
e destruir a ordem política e social que hoje nos esmaga, é pre-
José Oiticica ciso a concorrência destes milhões.
Só os indivíduos, e somente um pequeno número de indi-
víduos se deixa definir pela “idéia” abstrata e pura. Os milhões,
O artigo abaixo foi composto por três partes. A primeira as massas , não só no proletariado, mas também nas classes
delas é uma breve biografia do organizacionista José Oititicica, esclarecidas e privilegiadas, só se deixam arrastar pela força e
escrita por Milton Lopes. A segunda e a terceira são uma compi- pela lógica dos “fatos”, só compreendendo e encarando, a maior
lação composta por artigos de José Oiticica, publicados na “Sec- parte do tempo, os seus interesses imediatos e as suas paixões
ção Trabalhista” do jornal A Pátria, do Rio de Janeiro, a partir de de momento, sempre mais ou menos cegas. Portanto, para in-
junho de 1923, “secção” esta que também tinha como redator o teressar e para arrastar todo o proletariado na obra da Interna-
anarquista Marques da Costa. Com esta compilação, pretende- cional, era preciso e é preciso aproximar-se dele não com idéias
mos tornar públicas as críticas e proposições de Oiticica em rela- gerais e abstratas, mas com a compreensão real e viva dos seus
ção a diversos temas ainda muito atuais: organização anarquista, males reais; e os seus males do dia a dia, ainda que apresentem
organização do movimento popular, compromisso militante, mi- um caráter geral para o pensador, e ainda que sejam na reali-
noria ativa, separação dos níveis político e social, individualismo, dade efeitos particulares das causas gerais e permanentes, são
unidade de ação, autonomia, ação direta, entre outros. Apesar infinitamente diversos, tomando uma multiplicidade de aspectos
de breves, os trechos selecionados são extremamente relevantes diferentes, produzidos por uma variedade de causas passageiras
por dois motivos. Primeiro, por retratar parte das posições do e reais. Tal é a realidade quotidiana destes males. Mas a massa
“organizacionismo” brasileiro, que poderíamos considerar “em- do proletariado, que é forçada a viver sem pensar no dia de ama-
brionárias” do especifismo que hoje defendemos, posições estas nhã, agarra-se aos males de que sofre e dos quais é eternamen-
que nos permitem avaliar a própria história do anarquismo no te a vítima, precisa e exclusivamente nesta realidade, e nunca ou
Brasil, seu apogeu e subseqüente queda, constatada pela perda quase nunca na sua generalidade.
do vetor social representado na época pelo sindicalismo. Segun- Então, para tomar o coração e conquistar a confiança,o con-
do, por trazer a tona contribuições importantes para o anarquis- sentimento, a adesão, a afluência do proletariado…, é preciso
mo social de hoje. começar por lhe falar, não dos males gerais de todo o proletaria-
Felipe Corrêa, fevereiro de 2009. do internacional, nem das causas gerais que lhe dão nascença,
mas dos seus males particulares, quotidianos, privados. É preciso
JOSÉ OITICICA: UMA EXISTÊNCIA PELA AÇÃO DIRETA lhe falar de sua profissão e das condições do seu trabalho preci-
samente na localidade em que habita; da duração e da grande
extensão do seu trabalho quotidiano, da insuficiência do seu sa-
“Ele se foi” dizia título de texto na primeira página do jornal lário, da maldade do seu patrão, da carestia dos víveres e da sua
anarquista Ação Direta[1] há cinco décadas atrás, em julho de impossibilidade de nutrir e de instruir convenientemente a sua
1957. O “ele” a que se fazia referencia era o professor José Oiti- família. E lhe propondo meios para combater os seus males e
para melhorar a sua posição, não é preciso lhe falar logo dos ob- nunca podemos nos retirar dos pavilhões quando recrudesce a
jetivos gerais e revolucionários que constituem neste momento o batalha.
programa de ação da Associação Internacional dos Trabalhado-
res, tais como a abolição da propriedade individual hereditária e Pagine Libertarie
a instituição da propriedade coletiva; a abolição do direito jurídico
e do Estado, e a sua substituição pela organização e federação Milão, 20 de novembro de 1922
livre das associações produtivas; provavelmente ele não compre-
enderia nada destes objetivos, e poderia mesmo acontecer que,
estando influenciado pelas idéias religiosas, políticas e sociais
que os governos e os padres procuraram inculcar-lhe, repelisse
com desconfiança e cólera o propagandista imprudente que qui-
sesse convertê-lo com esses argumentos. Não, primeiramente só
é preciso propor-lhe objetivos que o seu bom senso natural e a
sua experiência quotidiana não possam ignorar a utilidade, nem
repeli-los. (Obras, 68 a 72, 71).
Logo que entre para a seção, o operário neófito vai aprender
lá muitas coisas. Explica-se-lhe que a mesma solidariedade que
existe entre todos os membros da mesma seção estabelece-se
igualmente entre todas as diferentes seções ou entre todas as
corporações de profissões da mesma localidade; que a organiza-
ção desta solidariedade mais larga, abraçando indiferentemente
os operários de todas as profissões, tornou-se necessária porque
os patrões de todas as profissões entendem-se entre eles [etc…]
…melhor do que pelas explicações verbais que recebe de seus
camaradas, depressa reconhece todas as coisas pela sua própria
experiência pessoal doravante inseparável e solidária com a dos
outros membros da seção. (Obras, VI, 73, 71).
Numa palavra, a única solidariedade que lhe é oferecida
como um benefício e ao mesmo tempo como um dever é, em
toda a acepção da palavra, a solidariedade econômica, mas uma
vez que esta solidariedade é seriamente aceita e estabelecida,
produz todo o resto – , os princípios mais sublimes e subversivos
da Internacional… não sendo senão os desenvolvimentos natu-
rais e necessários desta solidariedade econômica. E a grande
vantagem prática das seções de profissão sobre as seções cen-
trais consiste precisamente nisto, que estes desenvolvimentos e
falsa, o anarquismo deve conservar aquele conjunto de princípios estes princípios demonstram-se aos operários não com argumen-
gerais que constituem a base de seu pensamento e o alimento tos teóricos, mas pela experiência viva e trágica de uma luta que
passional de sua ação, mas deve saber afrontar o complicado se torna cada vez maior, mais profunda, mais terrível: de modo
mecanismo da sociedade atual sem óculos doutrinais e sem ex- que o operário menos instruído, menos preparado , mais brando,
cessivos apegos a integridade de sua fé (…) Chegou a hora de constantemente arrastado mais para a frente pelas próprias con-
acabar com os farmacêuticos das fórmulinhas complicadas que seqüências desta luta, acaba por se reconhecer revolucionário,
não vêem mais além de seus tarros cheios de fumo; chegou anarquista e ateu, muitas vezes sem saber como o conseguiu ser.
a hora de acabar com os charlatães que embriagam o público
com belas frases altissonantes; chegou a hora de acabar com os É claro que só seções de profissão podem dar esta educação
simplórios que tem três ou quatro idéias cravadas na cabeça e prática aos seus membros, e conseqüentemente, só elas podem
exercem como vestais do fogo sagrado do Ideal distribuindo ex- arrastar para a organização da Internacional a massa do prole-
comunhões (…) tariado, esta massa, já dissemos, sem a forte ajuda da qual o
O que tenha um grão de inteligência e de boa vontade que triunfo da revolução nunca será possível.
se esforce com seu próprio pensamento, que trate de ler na re- Se só houver na Internacional seções centrais, estas não se-
alidade algo a mais do que lê nos livros e periódicos. Estudar os riam senão almas sem corpos, sonhos magníficos sem realização
problemas de hoje quer dizer erradicar as idéias não pensadas, possível.
quer dizer ampliar a esfera da própria influência como propagan-
Felizmente, as seções centrais, emanações do fogo principal
dista, quer dizer fazer dar um passo adiante, inclusive um bom
que se formou em Londres, foram fundadas não por burgueses,
salto de longitude, nosso movimento.
não por sábios de profissão, nem por homens políticos, mas por
É preciso buscar as soluções se enfrentando com os proble- operários socialistas. Os operários, é essa a sua grande vanta-
mas. É preciso que adotemos novos hábitos mentais. Igual que o gem sobre os burgueses, graças à sua situação econômica e
naturalismo superou a escolástica medieval lendo o grande livro também graças ao que a educação doutrinaria, clássica, idealista
da natureza em vez dos textos aristotélicos, o anarquismo su- e metafísica, que envenena a juventude burguesa, os poupou até
perará o pedante socialismo científico, o comunismo doutrinário aqui, têm o espírito eminentemente prático e positivo. Eles não
fechado em suas casinhas apriorísticas e todas as demais ideolo- se contentam com ideais, eles precisam de fatos, e só acreditam
gias cristalizadas. nas idéias quando elas se apóiam em fatos. Esta inclinação feliz
Eu entendo por anarquismo crítico um anarquismo que, sem lhes permitiu evitar dois obstáculos contra os quais encalham
ser cético, não se contente com as verdades adquiridas, com as todas as tentativas burguesas: a academia e a conspiração pla-
fórmulas simplistas; um anarquismo idealista e ao mesmo tempo tônica. Aliás o programa da Associação Internacional dos Traba-
realista; um anarquismo, em definitivo, que enxerte verdades lhadores… indicou-lhes claramente a única via que eles podiam e
novas no tronco de suas verdades fundamentais, que saiba po- deviam seguir.
dar os ramos velhos.
Em primeiro lugar, eles deviam se dirigir às massas em nome
Não é um trabalho de fácil demolição, de niilismo hipercríti- da sua emancipação econômica, não da revolução política: pri-
co, senão de renovação que enriqueça o patrimônio original e lhe meiro, em nome dos seus interesses materiais, para chegar mais
agregue forças e belezas novas. Este trabalho temos de fazê-lo tarde aos seus interesses morais, sendo os segundos, enquanto
agora, porque amanhã deveremos empreender a luta, que não interesses coletivos, unicamente a expressão e a conseqüência
encaixa bem com o pensamento, especialmente para nós que lógica dos primeiros. Eles não podiam esperar que as massas
os viessem procurar, tinham de ir procurá-las onde elas estão, CONSCIÊNCIA DE PARTIDO
na sua realidade quotidiana, e esta realidade é o trabalho quoti-
diano, especializado e dividido em corporações de profissões, já Camillo Berneri
mais ou menos organizado pelo trabalho coletivo em cada indús-
tria particular, para que eles aderissem ao objetivo econômico, à
ação comum da grande Associação dos Trabalhadores de todos Somos imaturos. Demonstra o que tenha discutido a União
os países, numa palavra, para os filiar à Internacional, deixando- Anarquista fazendo sutilezas sobre as palavras partido, movi-
-lhes a sua autonomia e a sua organização particulares. O que mento, sem entender que a questão não é de forma senão de
quer dizer que a primeira coisa que eles deviam fazer e que efe- substância, e que o que nos falta não é a exterioridade do par-
tivamente fizeram, foi organizar, em volta de cada organização tido mas a consciência de partido. Que entendo por consciência
central, tantas seções de profissão quantas indústrias diferentes de partido? Entendo algo mais que o fermento passional de uma
existissem. idéia, que a genérica exaltação de ideais. Entendo o conteúdo
Foi assim que as seções centrais, que, em todos os países, específico de um programa partidário. Estamos desprovidos de
representam a alma ou o espírito da Internacional, formaram consciência política no sentido que não temos consciência dos
uma corporação, tornando-se organizações reais e fortes. Uma problemas atuais e continuamos difundindo soluções adquiridas
vez realizada esta missão, as seções centrais deviam dissolver- em nossa literatura de propaganda. Somos utópicos e basta. Que
-se, só permitindo a existência de seções de profissão. Parece- tenha editores nossos que sigam reeditando os escritos dos mes-
-nos que isso é um grande erro. Pois… tres sem agregar nunca uma nota crítica demonstra que nossa
cultura e nossa propaganda estão em mãos de gente que tenta
…A grande tarefa que se impôs a Associação Internacional dos manter em pé o próprio palanque em vez de empurrar o movi-
Trabalhadores… não é unicamente uma obra econômica ou sim- mento a sair do já pensado para se esforçar na crítica, no que
plesmente material, é ao mesmo tempo uma obra social, filosó- está por se pensar.
fica e moral; também é, se se quiser, uma obra eminentemente Que haja polemistas que tentem engarrafar o adversário em
política. (Obras, VI, 75 a 79, 71 ). vez de buscar a verdade, demonstra que entre nós há maçons,
****** em sentido intelectual. Agregamos os grafômanos para quem o
a quem nos perguntar para que serve a existência da Alian- artigo é um desafogo ou uma vaidade e teremos um conjunto de
ça quando existe a Internacional, nós responderemos: a Interna- elementos que estorvam o trabalho de renovação iniciado por um
cional é, evidentemente, uma magnífica instituição, é incontesta- punhado de independentes que prometem. O anarquismo deve
velmente a mais bela, a mais útil, a mais benéfica criação deste ser amplo em suas concepções, audaz, insaciável. Sequer viver e
século. Ela criou a base da solidariedade dos trabalhadores de cumprir sua missão de vanguarda deve se diferenciar e conser-
todo o mundo. Ela deu-lhe um começo de organização através var alta sua bandeira ainda que isto possa lhe isolar no restrito
da fronteira de todos os Estados e fora do mundo dos explorado- círculo dos seus. Mas esta especificidade de seu caráter e de sua
res e dos privilegiados. Ela fez mais, já contém hoje os primeiros missão não exclui uma maior incrustração de sua ação nas fratu-
germes da organização da unidade que há de existir e ao mesmo ras da sociedade que morre e não nas construções apriorísticas
tempo deu ao proletariado de todo o mundo o sentimento de sua dos arquitetos do futuro.
própria força. Estamos certos também do grande serviço que ela Igual que nas investigações científicas a hipótese pode ilumi-
prestou à grande causa da revolução universal e social. Mas ela nar o caminho da indagação mas apaga essa luz quando resulta
humanos em luta é mais do que evidente. Para que esta influên-
não é de modo nenhum uma instituição suficiente para organizar
cia seja assimilada de modo consciente, ele deve doravante se
e dirigir esta revolução.
munir de novos meios e iniciar desde já o caminho das práticas
sociais. Todos os revolucionários sérios que tiveram uma parte ativa
nos trabalhos da Internacional, seja em que país fosse, desde
1864, ano de sua fundação, devem estar convencidos disso. A
Dielo Trouda n.º 4, setembro de 1925.
internacional prepara os elementos da organização revolucioná-
ria, mas não a realiza. Ela os prepara organizando a luta pública
Original Source: Biblioteca Virtual Rivolucionaria e legal dos trabalhadores solidários de todos os países contra os
Fonte: The Nestor Makhno Archive exploradores do trabalho, capitalistas, proprietários e empreitei-
Return to The Nestor Makhno Archive ros das indústrias, mas nunca vai além disso. A única coisa que
ela faz fora desta obra já tão útil, é a propaganda teórica das
idéias socialistas nas massas operárias, obra igualmente muito
útil, muito necessária à preparação da revolução das massas.
A Internacional, numa palavra, é um meio imenso favorável
e necessário a esta organização, mas ainda não é esta organi-
zação. A Internacional aceita no seu seio, abstraindo-se comple-
tamente de todas as diferenças de crenças políticas e religiosas,
todos os trabalhadores honestos, com todas as suas conseqüên-
cias a solidariedade da luta dos trabalhadores contra o capital
burguês explorador do trabalho. Esta é uma condição positiva,
suficiente para separar o mundo dos trabalhadores do mundo
dos privilegiados, mas insuficiente para dar ao primeiro uma di-
reção revolucionária. (Nettlau, 287-288, 72).
… os fundadores da Associação Internacional agiram com grande
sabedoria eliminando primeiramente do programa desta Asso-
ciação todas as questões políticas e religiosas. Sem dúvida, de
modo nenhum lhes faltou opiniões políticas, nem opiniões anti-
-religiosa bem marcadas; mas abstiveram-se de as emitir neste
programa , porque o seu principal objetivo, em primeiro lugar,
era unir as massas operárias de todo o mundo civilizado numa
ação comum. Necessariamente que tiveram de procurar uma
base comum, uma série de princípios simples sobre os quais os
operários, sejam quais forem as suas aberrações políticas e re-
ligiosas, por pouco que sejam sérios, isto é, homens duramente
explorados e sofredores, estão e têm de estar de acordo.
Se tivessem içado a bandeira de um sistema político ou an-
ti-religioso, longe de unir os operários da Europa os teriam divi- indispensáveis.
dido mais ainda. (Obras, V, 172-173, 69). Neste momento, os acontecimentos se precipitam em toda
Europa, inclusive na Rússia, prisioneira dos bolcheviques. Está
…acreditam que se se escrevesse esta simples palavra “ateísmo”, próximo o dia em que será necessário participarmos ativamente
no estandarte da Internacional, esta associação teria podido reu- dos acontecimentos. Se nos apresentarmos outra vez sem estar-
nir no seu seio centenas de milhares de aderentes? Todos sabem mos organizados, previamente e de maneira adequada, seremos
que não, não por o povo ser verdadeiramente religioso, mas por novamente incapazes de impedir que os acontecimentos evolu-
ele acreditar sê-lo; e ele acreditará sê-lo enquanto uma revolu- am no turbilhão dos sistemas estatais.
ção social não lhe facultar os meios para realizar todas as suas
aspirações neste mundo. É certo que se a Internacional pusesse O anarquismo se insere e vive concretamente por toda a
o ateísmo, como um princípio obrigatório, no seu programa, te- parte onde há vida humana. Em contrapartida, ele não se torna
ria excluído do seu seio a flor do proletariado, – e por esta pa- compreensível para todos, a não ser onde e quando existem os
lavra eu não quero dizer, como o fazem os marxistas, a camada propagandistas e os militantes que romperam sincera e inteira-
superior, a mais civilizada e a mais desembaraçada do mundo mente com a psicologia de submissão desta época, eis por que
operário, essa camada de operários quase burgueses de que eles são ferozmente perseguidos. Esses militantes agem de acordo
querem precisamente servir-se para construir a sua quarta classe com suas convicções, desinteressadamente, sem medo de des-
governamental, e que é verdadeiramente capaz de formar uma, cobrir, em seu processo de desenvolvimento, aspectos desconhe-
se não os pusermos na ordem dos interesses da massa do pro- cidos, para assimilar, ao fim e ao cabo, o que se fizer necessário
letariado, porque, com o seu bem estar relativa quase burguês, para a vitória contra o espírito de submissão.
não está infelizmente senão profundamente penetrada por todos Duas teses decorrem do que acima foi dito:
os preconceitos políticos e sociais e pelas estreitas aspirações e
pretensões dos burgueses. Pode-se dizer que esta camada é a a primeira, é que o anarquismo conhece expressões e ma-
menos socialista e a mais individualista de todo o proletariado. nifestações diversas, mas conserva uma perfeita integridade em
Pela flor do proletariado, eu entendo sobretudo esta grande sua essência.
massa, estes milhões de não-civilizados, de deserdados, de mi- a segunda, é que o anarquismo é naturalmente revolucio-
seráveis e de analfabetos que o Sr Engels e o Sr Marx pretendem nário e, na luta contra seus inimigos, só pode adotar métodos
submeter ao regime paternal de um governo muito forte… Por revolucionários.
flor do proletariado, eu entendo esta carne para governo, esta No decorrer de seu combate revolucionário, o anarquismo
grande canalha popular que, estando quase virgem de toda civili- não somente derruba os governos e suprime suas leis, mas se
zação burguesa, traz no seu seio, nas suas paixões, nos seus ins- ocupa também da sociedade em que nasceu, de seus valores,
tintos, nas suas aspirações, em todas as necessidades e misérias seus costumes e sua “moral”, o que lhe vale ser cada vez mais
da sua posição coletiva, todos os germes do socialismo futuro, compreendido e assimilado pela maioria oprimida da humanida-
e que só ela é suficientemente forte para inaugurar e para fazer de.
triunfar a Revolução Social. (Obras, IV, 413-414, 72). Tudo isso nos convence de que o anarquismo não pode con-
A Aliança é o complemento necessário da Internacional… tinuar aprisionado nos limites de um pensamento marginal e rei-
-Mas a Internacional e a Aliança, tendendo para o mesmo ob- vindicado unicamente por uns poucos grupelhos, em suas ações
jetivo final, perseguem ao mesmo tempo objetivos diferentes. isoladas. Sua influência natural sobre a mentalidade dos grupos
– Uma tem por missão reunir as massas operárias, os milhões
NOSSA ORGANIZAÇÃO de trabalhadores, através das diferenças das nações e dos paí-
ses, através das fronteiras de todos os Estados, em um só corpo
Nestor Makhno imenso e compacto; a outra, a Aliança, tem por missão dar às
massas uma direção verdadeiramente revolucionária. Os progra-
mas de uma e de outra, sem serem opostos em nada, são dife-
rentes pelo próprio grau do seu desenvolvimento respectivo. 0
A atual situação enfrentada pelo proletariado mundial exige da Internacional, se o tomarmos a sério, também é em germe,
uma tensão máxima do pensamento e da energia dos anarquis- mas só em germe, todo o programa da Aliança. 0 programa da
tas revolucionários, para esclarecer as questões mais importan- Aliança é a explicação última do da Internacional. (Nettlau, 286,
tes. 72).
Nossos camaradas, que desempenharam um papel ativo na Reconheço com alegria que, em todos os países, as classes
revolução russa e continuam fiéis às suas convicções, sabem de privilegiadas perderam muito da sua força passada. Perderam
que maneira funesta se fez sentir, em nosso movimento, a au- totalmente a sua força moral; já não têm fé nos seus direitos,
sência de uma sólida organização. Esses camaradas estão bem sabem que são iníquas e odiosas, desprezam-se a si próprias.
situados para ser particularmente úteis na tarefa de unificação
atualmente empreendida. Suponho que não lhes passou desper- É bastante. Tendo perdido sua força moral, elas perdem os-
cebido que o anarquismo foi um fator de insurreição nas massas tensiva e necessariamente também a força inteligente. Elas são
trabalhadoras revolucionárias, na Rússia e na Ucrânia, incitan- muito mais sábias que o proletariado, mas isso não as impede de
do-as à luta por toda parte. Contudo, a ausência de uma grande se tornarem cada vez mais brutas. Elas perderam toda a cora-
organização específica, que contraponha suas forças vivas aos gem intelectual e moral… O proletariado, cuja vivacidade herdou
inimigos da revolução, tornou os anarquistas incapazes de assu- da sua anterior capacidade intelectual e moral, prepara-se hoje
mir uma função organizativa. A tarefa libertária na revolução so- para as forçar nos seus últimos refúgios políticos e econômicos.
freu as pesadas conseqüências dessa incapacidade. Conscientes Tudo isto é verdade. Mas não se pode ter ilusões. Esses re-
dessa limitação, os anarquistas russos e ucranianos não devem fúgios são ainda muito fortes: são o Estado, a Igreja, a Bolsa, a
permitir que tal fato se repita. A lição do passado é demasiado polícia, o exército e também esta grande conspiração internacio-
penosa e, por não a terem esquecido, eles devem ser os primei- nal e pública , legal, armada, a que se chama diplomacia.
ros a dar o exemplo de coesão de suas forças. Como? Criando
uma organização que possa cumprir as tarefas do anarquismo, Tudo isto é organizado sabiamente e é forte pela organiza-
não somente no momento de preparar a revolução social, mas ção. E em presença desta organização formidável, o proletaria-
igualmente depois. Uma tal organização deve unir todas as for- do ainda que unido, agrupado e solidarizado pela Internacional,
ças revolucionárias do anarquismo, e se ocupar imediatamente continua desorganizado. Que faz o seu número? O povo mesmo
da preparação das massas para a revolução social e para a luta que seja um milhão, vários milhões, será posto em xeque por
pela realização da sociedade anarquista. algumas dezenas de milhares de soldados, sustentados e dis-
ciplinados às suas custas, contra ele, pelos escudos burgueses
Se bem que a maioria dos anarquistas reconhece a neces- produzidos pelo seu trabalho.
sidade de uma tal organização, é lamentável constatar que são
poucos os que se preocupam com a seriedade e a constância Por exemplo, a seção mais numerosa, mais avançada e me-
lhor organizada da Internacional – o está para o combate? Sabem
[2] Refere-se às escolas anarquistas individualistas que trocam o
que não. Em mil trabalhadores, seria muito se reunissem uma ou ideal de emancipação social por um código de comportamento ético, por
no máximo duas centenas no dia do combate. É que para orga- um estilo de vida, que vai desde o rechaço individual de todo código de
nizar uma força, não basta unir os interesses, os sentimentos, o comportamento considerado “burguês” até o ilegalismo, ou seja, a teo-
pensamento. É preciso unir as vontades e o caráter. Os nossos ria de transformar a atividade delinqüente comum em uma atividade de
inimigos organizam as suas forças com a força do dinheiro e com emancipação individual. Seu principal órgão de difusão foi o periódico
a autoridade do Estado. Nós só podemos organizar as nossas L’Anarchie, de París (1905-1914), e os principais animadores do ilegalismo
com a convicção, com a paixão foram Albert Libertad, Mauricius, Emile Armand e Le Rétif (Victor Serge).
Estas teorias conduziram a um desastre político, organizativo e humano
Nós não podemos e não queremos unir outro exército senão para o anarquismo francês anterior a Primeira Guerra Mundial, graças ao
o povo. Mas para que esta massa se erga em conjunto simulta- qual um sem número de delinqüentes comuns encontrou um “álibi políti-
neamente – e só com esta condição que ela pode vencer – o que co” para as mais execráveis ações anti-sociais (já que em seu rechaço a
fazer? Sobretudo como fazer para que as massas mesmo eletri- luta de classes e a aceitação do indivíduo como o único ponto de referên-
zadas, quando sublevadas, não se contradigam e não se parali- cia teórica, dava ao mesmo setor social de que provinham as vítimas). As
ações dos ilegalistas nada tem a ver com as justas ações de expropriação
sem pelos seus movimentos opostos?
dos Alexander Jacob, dos Arcángel Roscigna, de um Buenaventura Dur-
Só há um único meio: é assegurar-se da participação de to- ruti ou de um Vittorio Pinni, que se dedicaram a financiar o movimento
dos os chefes populares. Eu chamo chefes populares a indivíduos operário e anarquista com ações de expropriação a Bancos e importantes
saídos do povo: vivendo com ele, da sua vida, e que, graças à capitalistas. Os ilegalistas só perseguiam o bem estar pessoal, individual,
sua superioridade intelectual e moral, exercem nele uma grande egoísticamente, sem pensar as conseqüências de suas atividades. Suas
ações de expropriação só beneficiavam a eles, e muitas vezes, prejudica-
influência. Há muitos entre eles que abusam desta superioridade vam os demais.
e a fazem servir os seus interesses pessoais. São homens mui-
to perigosos e que é preciso evitar como a peste, que é preciso [3] Menção a Bejamin Tucker, individualista “anarquista” estaduni-
dense do final do século XIX, fundador do periódico Liberty. Suas doutri-
combater e aniquilar sempre que possível. É preciso procurar os nas têm mais relação com uma versão radical do liberalismo burguês que
bons chefes, os que só defendem os seus interesses nos interes- com o anarquismo revolucionário, popular e classista. Inclusive, levando
ses de todos. Mas como encontra-1os e reconhece-los, e qual é seu liberalismo radical ao seu extremo lógico, chega a dizer, em seus
o indivíduo tão inteligente, tão perspicaz e tão forte, para não se escritos, que os capitalistas tinham o direito de recorrer ao Estado para
enganar em absolutamente nada, primeiro na sua escolha e em reprimir as greves operárias, em defesa de seus interesses “individuais”.
seguida para os convencer e para os organizar sozinho. Flor de “anarquia”! Nele se podem encontrar as raízes do “anarco”-capi-
talismo, nome político do neoliberalismo radical, formulado na Escola de
É evidente que esse não pode ser o trabalho de um só ho-
Chicago. É um bom exemplo dessa classe de gente que, sem ter nada
mem, que só muitos homens associados podem empreender e
em comum com o anarquismo, chegou a dizer-se “anarquista”, e por este
conduzir a bom termo uma empresa tão difícil. Mas para isso, é
simples fato, foram considerados dentro da “família” pelos Sintetistas. Foi
necessário primeiro que se entendam entre eles e que dêem as
esta classe de excessos que criticaram mais duramente os companheiros
mãos para esta obra comum. Mas tendo esta obra um objetivo
do Grupo de Anarquistas Russos no Estrangeiro, em seu rechaço a deno-
prático, revolucionário, o entendimento mútuo que é a condição
minação fácil e indiscriminada, vazia de conteúdo e muitas vezes abusiva,
necessária não pode se fazer publicamente; se se fizesse em
do termo “anarquista”.
público, atrairia sobre os iniciadores as perseguições de todo o
mundo oficial e oficioso, e se veriam esmagados antes mesmo de Traduzido do inglês para o espanhol por Jose Antonio Gutierrez Danton.
terem podido fazer a mínima coisa. Traduzido do espanhol para o português por LMFÀ
ticas específicas, sem requerer síntese e de fato, evitando-la. No Pois este entendimento e esta associação que tem de sair
entanto, cremos que na medida em que os anarquistas clareiam dele, só podem ser feitos em segredo. Quer dizer que é preciso
mais suas posturas básicas – a essência do comunismo libertá- estabelecer uma conspiração, uma sociedade secreta a sério.
rio – mais se encontram de acordo em questões de princípios e
irão erigir, sob essa base, uma organização ampla que forneça Também é assim o pensamento e o objetivo da Aliança. É
um guia nas questões sócio-políticas, assim como nas questões uma sociedade secreta formada no seio da própria Internacional,
sindicais e gremiais. para dar a esta última uma organização revolucionária, para a
Portanto, não vemos nenhuma classe de vínculo entre o transformar, a ela e a todas as massas populares que estão fora
problema organizativo e a noção de síntese. Se quiser resolver dela, numa força suficientemente organizada para aniquilar a re-
este problema, não há necessidade de ver-se arrastado por teo- ação político-clérico burguesa, para destruir todas as instituições
rizações vagas e esperar delas obter resultados. A bagagem que econômicas, jurídicas, religiosas e políticas dos Estados. (Nettlau.
o anarquismo tem acumulado em seus anos de existência e de 289 a 291, 72).
luta social é mais que suficiente. Necessitamos somente tomar a ******
devida conta disso, aplicá-la as condições e exigências da vida,
… mesmo que conseguissem, à custa de uma luta enérgica e
para assim construir uma organização que seja referência.
hábil, salvaguardar a existência dos vossas seções públicas, eu
(Dielo Trouda nº 10, março de 1926) acho que acabariam mais tarde ou mais cedo por compreen-
der a necessidade de formar entre elas núcleos compostos por
Notas do tradutor espanhol: membros mais seguros, mais dedicados, mais inteligentes e mais
enérgicos, numa palavra, pelos mais íntimos. Estes núcleos in-
[1] Pseudônimo de Vsevolod M. Eichenbaum (1882-1945), anarquis-
timamente ligados entre sí e com núcleos semelhantes que se
ta russo de origem privilegiada. Até 1911 militou nas fileiras do Partido
Social-Revolucionário russo, depois do qual se aproximou aos círculos exi-
organizam ou se organizarão nas outras regiões da Itália ou do
lados russos na França e nos EUA, onde se interessou pelo anarco-sindica- estrangeiro, terão uma dupla missão: primeiro, a formação da
lismo. Voltou a Rússia durante a revolução em 1917, onde dirigiu o perió- alma inspiradora e vivificante deste grande corpo a que chama-
dico Golos Truda (“A Voz Operária”), primeiro em São Petersburgo, e logo mos Associação Internacional dos Trabalhadores tanto na Itália
em Moscou. Ao final de 1918 e começos de 1919, se muda para Ucrânia como em qualquer outro lado; e em seguida se ocuparão dos
(Khárkov) onde toma parte na confederação anarquista Nabat. Durante problemas que são impossíveis de se tratar publicamente. Eles
um brevíssimo lapso de tempo, em 1919, toma parte na comissão de cul- formarão a ponte necessária entre a propaganda das teorias so-
tura e educação do Exército de Campesinos Insurgentes (Makhnovista). cialistas e a prática revolucionária.
Neste período desenvolve pela primeira vez suas teorias “Síntetistas” aos
quais chamou Edinyi Anarjizm (Anarquismo Único), em alguns artigos do … Naturalmente, esta aliança secreta só aceitaria no seu seio
periódico Nabat. Os primeiros a criticá-las foram os anarco-sindicalistas um pequeníssimo número de indivíduos…; pois neste tipo de or-
russos. Logo é levado a prisão pelos bolcheviques de onde sai em direção ganização, não é a quantidade, mas a qualidade que é preciso
ao exílio em Berlin em janeiro de 1922. Posteriormente chegará a Fran- procurar… Vocês só querem uma revolução popular; por isso não
ça, onde terá grandes discrepâncias com o Grupo de Anarquistas Russos vão recrutar um exército, pois o vosso exército é o povo. O que
no Estrangeiro, sobre as causas da derrota dos libertários na Revolução
Russa de 1917-1921, sobre as lições a extrair dessa experiência e sobre
devem formar, são os estados-maiores, a rede bem organizada e
o problema da organização revolucionária anarquista. Este artigo é parte bem inspirada dos chefes do movimento popular. (Cerretti, 194-
do debate entre “plataformistas” e “sintetistas” a respeito do problema da 195, 72).
organização.
notas: Porém, o que há em tudo isso que se possa ser definido
como anarquista? Onde estão os elementos necessários para
(1) Aqui Bakunin se refere à Comuna de Paris, ocorrida em 1871 uma síntese com o comunismo? Toda essa filosofia nada tem a
(2) Aqui é preciso que se entenda a diferença de papéis entre as ver com a teoria ou a prática anarquista e é improvável que um
duas instâncias, a seção central tem um papel organizador e po- operário anarquista se sinta inclinado conforme essa “filosofia”.
lítico, enquanto as seções corporativas desempenham um papel Como temos visto, então, a análise das tarefas teóricas im-
social. como um sindicato. postas a Síntese nos leva a um beco sem saída. E nos encon-
tramos na mesma situação quando examinamos os aspectos
Socialismo e Liberdade
práticos deste problema. Devemos, então, escolher entre duas
Mikhail Bakunin opções.
Organização: Coletivo Luta Libertária Que as tendências nomeadas persistam como tendências
independentes, em cujo caso, como vão continuar com suas ati-
vidades em uma organização comum, se o propósito desta é
precisamente afinar as atividades anarquistas segundo acordos
específicos?
Ou estas tendências podem perder suas características e,
fundindo-se, dar origem a uma nova tendência que não será nem
comunista, nem sindicalista, nem individualista… Porém, em todo
caso, quais seriam suas características e posições fundamentais?
Parece-nos que a noção de Síntese se funda sobre uma com-
pleta aberração, uma coleta superficial de aspectos básicos das
três tendências que os partidários da Síntese pretendem fundir
em uma só.
A tendência central, a coluna vertebral do anarquismo se
encontra representada pelo comunismo anarquista. O anarquis-
mo individualista é, no melhor dos casos, só um fenômeno fi-
losófico e literário, porém não um movimento social. E ocorre
freqüentemente que os últimos, ao ver-se envolvidos em política,
terminam como caprichosos burgueses (tal qual Tucker e outros
individualistas). [3]
O anterior não significa, em absoluto, que estamos contra
os esforços concentrados entre anarquistas de múltiplas opini-
ões. Ao contrário: não podemos senão saudar todo o esforço que
aproximem aos anarquistas revolucionários na prática.
Todavia, esse pode ser obtido na prática, em concreto, por
meio do estabelecimento de vínculos entre organizações já esta-
belecidas e fortes, em cujo caso, trataremos só com tarefas prá-
que é a “individualidade”? É a individualidade em geral, ou a “in-
dividualidade” oprimida dos explorados? A ORGANIZAÇÃO I
Não há tal coisa de “individualidade em geral” porque de Errico Malatesta
uma ou outra maneira, todo indivíduo se encontra a si mesmo,
objetiva ou subjetivamente, nas fileiras do Trabalho ou nas fi-
leiras do Capital. Porém, esta idéia não está implícita no comu- Agitazione de Ancone, 04/07/1897.
nismo libertário? Poderíamos inclusive dizer que a liberdade do
indivíduo, enquanto explorado, só é realizável no contexto de
uma sociedade comunista libertária que tenha um interesse es- Há anos que muito se discute entre os anarquistas esta ques-
crupuloso, tanto na solidariedade social, como no respeito aos tão. E como freqüentemente acontece quando se discute com
direitos do indivíduo. ardor à procura da verdade, acredita-se, em seguida, ter razão.
Quando as discussões teóricas são apenas tentativas para justi-
A Comuna anarquista é o modelo de relações sociais e eco- ficar uma conduta inspirada por outros motivos, produz-se uma
nômicas melhor adaptado para realizar o desenvolvimento da grande confusão de idéias e de palavras.
liberdade do indivíduo. O comunismo anarquista não é um es-
quema social rígido, inflexível, o qual uma vez alcançado está Lembraremos, de passagem, sobretudo para nos livrarmos
completo e ponha termo ao desenvolvimento do indivíduo. Ao delas, as simples questões de frases empregadas, que, às ve-
contrário, sua organização social fluída e elástica, se desenrola- zes, atingiram o cúmulo do ridículo, como por exemplo: “Não
rá, aumentando em complexidade e sempre buscando melhoras queremos a organização, mas a harmonização”, “Opomo-nos à
para que a liberdade dos indivíduos se expanda sem obstáculos. associação, mas a admitimos”, “Não queremos secretário ou cai-
Da mesma maneira, o anti-estatismo é um dos princípios xa, porque é um sinal de autoritarismo, mas encarregamos um
fundamentais do comunismo anarquista. Ademais, este tem um camarada para se ocupar do correio e outro do dinheiro”; passe-
conteúdo social e uma expressão real. O comunismo anarquista mos a discussão séria.
rechaça o estatismo em nome da independência social e da au- Se não pudermos concordar, tratemos pelo menos de nos
togestão das classes trabalhadoras. Porém, o individualismo, sob compreender. Antes de mais nada, distingamos, visto que a ques-
que base rechaça o Estado? Assumindo que o rechaça! Certos tão é tripla: a organização em geral, como princípio e condição
teóricos do individualismo são partidários do direito a proprieda- da vida social, hoje, e na sociedade futura; a organização das
de privada nas relações pessoais e econômicas, indistintivamen- forças populares, e, em particular, a das massas operárias, para
te. Porém, aonde os princípios de propriedade privada e fortuna resistir ao governo e ao capitalismo.
pessoal existam, existirá inevitavelmente uma luta de interesses
A necessidade de organização na vida social – direi que orga-
econômicos e surgirá uma estrutura estatal criada pelos mais po-
nização e sociedade são quase sinônimos – é coisa tão evidente
derosos economicamente. Então, o que nos permanece do indi-
que mal se pode acreditar que pudesse ter sido negada.
vidualismo anarquista? A negação da luta de classes, a negação
do princípio de organização anarquista cuja finalidade seja a so- Para nos darmos conta disso, é preciso lembrar que ela é
ciedade livre dos trabalhadores iguais. E mais ainda, a tagarelice a função específica, característica do movimento anarquista, e
vazia, estimulando aos trabalhadores infelizes com sua existên- como homens e partidos estão sujeitos a se deixarem absor-
cia, a tomar sua parte recorrendo a soluções pessoais, suposta- ver pela questão que os interessa mais diretamente, esquecendo
mente abertas a eles enquanto indivíduos liberados. [2] tudo o que a ela se relaciona, dando mais importância à forma
que ao conteúdo e, enfim, vendo as coisas somente de um lado,
não distinguindo mais a justa noção da realidade. publicados no Anarjichéskii Véstnik (“Mensageiro Anarquista”) e
no Dielo Trouda (números 8 e 9). Nós estamos de total desacor-
O movimento anarquista começou como uma reação contra do com esta idéia. Sua inadequação é notoriamente óbvia. Para
o autoritarismo dominante na sociedade, assim como todos os começar, por que esta divisão arbitrária do anarquismo em três
partidos e organizações operárias, e se acentuou com os adven- ramos? Há outros também. Podemos mencionar, por exemplo, o
tos de todas as revoltas contra as tendências autoritárias e cen- Anarquismo cristão, o Associacionismo, o qual seja dito de pas-
tralistas. sagem, é mais próximo ao comunismo anarquista que ao indivi-
Era natural, em conseqüência, que inúmeros anarquistas es- dualismo anarquista. Então, qual é, precisamente, a consistência
tivessem como que hipnotizados por esta luta contra a autorida- das discrepâncias “teóricas e filosóficas” entre as já mencionadas
de e que eles combatem, para resistir à influência da educação três tendências, sem querer aperceber uma síntese entre elas?
autoritária, tanto a autoridade quanto a organização, da qual ela Antes de falar entre uma síntese teórica entre o comunismo,
é a alma. o sindicalismo e o individualismo, necessitamos analisar estas
correntes. A análise teórica mostra rapidamente o grau em que
Na verdade, esta fixação chegou ao ponto de fazer sustentar
o desejo de sintetizar essas correntes é descabido e absurdo.
coisas realmente incríveis. Combateu todo o tipo de cooperação
De fato, falar de uma “síntese entre comunismo e sindicalismo”
e de acordo porque a associação é a antítese da anarquia. Afir-
não significa resistência entre eles? Muitos anarquistas têm visto
ma-se que sem acordos, sem obrigações recíprocas, cada um
o sindicalismo como uma das expressões do movimento revolu-
fazendo o que lhe passar pela cabeça, sem mesmo se informar
cionário proletário, com um dos métodos de luta expostos pela
sobre o que fazem os outros, tudo estaria espontaneamente em
classe operária em sua luta pela emancipação.
harmonia: que a anarquia significa que cada um deve bastar-
-se a si mesmo e fazer tudo que tem vontade, sem troca e sem Nós entendemos o Comunismo como o objetivo de liberta-
trabalho em associação. Assim, as ferrovias poderiam funcionar ção da classe produtora. Então, pode o fim estar em contradição
muito bem sem organização, como acontecia na Inglaterra (!). com seus meios? Só um raciocínio débil de um intelectual dile-
O correio não seria necessário: alguém de Paris, que quisesse tante, ignorante da história do pensamento comunista libertário
escrever uma carta a Petersburgo… Podia ele próprio levá-la (!!) pode pôr-los a parte, em paralelo, para tratar de fazê-los chegar
etc. a uma síntese. Por nossa parte, estamos bem conscientes que o
comunismo libertário sempre tem sido sindicalista na medida em
Dir-se-á que são besteiras, que não vale a pena discuti-las. que contempla a existência e expansão de organizações de ofício
Sim, mas estas besteiras foram ditas, propagadas: foram autên- independentes como uma necessidade para a vitória social dos
tica das idéias anarquistas. Servem sempre como armas de com- explorados.
bate aos adversários, burgueses ou não, que querem conseguir
Então, só pode ser e na realidade não é senão um assunto,
uma fácil vitória sobre nós. E, também, estas “besteiras” não são
não de síntese teórica do comunismo e do sindicalismo, mas do
sem valor, visto que são a conseqüência lógica de certas premis-
papel que deve ser atribuído ao sindicalismo nas táticas do co-
sas e que podem servir como prova experimental da verdade, ou
munismo anarquista e na Revolução Social dos explorados.
pelo menos dessas premissas.
A incoerência teórica de quem apóia a Síntese é ainda mais
Alguns indivíduos, de espírito limitado, mas providos de espí- chocante quando tratam de chegar a uma síntese entre comunis-
rito lógico poderoso, quando aceitam premissas, extraem delas mo e individualismo. De fato, em que consiste o anarquismo dos
todas as conseqüências até que, por fim, e se a lógica assim o individualistas? Na noção de liberdade dos indivíduos? Porém, o
quer, chegam, sem se desconcertar, aos maiores absurdos, à ne-
etc. gação dos fatos mais evidentes. Mas há outros indivíduos mais
Nossa próxima tarefa será chegar a uma clara formulação cultos e de espírito mais amplo que encontram sempre um meio
de todas essas posições e princípios para logo expô-los em uma de chegar a conclusões mais ou menos razoáveis, mesmo ao
plataforma organizativa mais ou menos acabada, a qual servirá preço da violentação da lógica. Para eles, os erros teóricos têm
de base para unir certo número de militantes e grupos em uma pouca ou nenhuma influência na conduta prática. Mas, em suma,
mesma organização. Esta última, por sua vez, servirá de tram- desde que não se haja renunciado a certos erros fundamentais,
polim para uma fusão mais completa das forças do movimento estamos sempre ameaçados por silogismos exagerados, e volta-
anarquista. mos sempre ao começo.
Esta é, então, o caminho que temos escolhido para a reso- O erro fundamental dos anarquistas adversários da organi-
lução do problema organizativo. Não é nossa intenção proceder, zação é crer que não há possibilidade de organização sem auto-
nesta ocasião, com um re-exame total de valores ou a elabora- ridade. E uma vez admitida esta hipótese, preferem renunciar a
ção de novas posições. Nossa visão é que qualquer coisa neces- toda organização, ao invés de aceitar o mínimo de autoridade.
sária para a construção de uma organização anarquista, fundada
sob uma plataforma dada, pode ser encontrada no Comunismo Agora que a organização, quer dizer, a associação com um
Libertário que expõe a luta de classes, a liberdade e a igualdade objetivo determinado e com as formas e os meios necessários
de todos os trabalhadores, e que encontra sua realização na Co- para atingir este objetivo, é necessária à vida social, é uma evi-
muna anarquista. dência para nós. O homem isolado não pode sequer viver como
Aqueles companheiros que são partidários da noção de “Sín- um animal: ele é impotente salvo em regiões tropicais, e quando
tese” teórica entre as variadas correntes do anarquismo têm uma a população é muito dispersa) e não pode obter sua alimenta-
noção muito distinta da questão organizativa. É lastimável que ção; ele é incapaz, sem exceção, de ter uma vida superior àquela
sua visão esteja tão debilmente exposta e elaborada, e que seja, dos animais. Conseqüentemente, é obrigado a se unir a outros
então, muito difícil fazer uma crítica cabal dela. Essencialmente, homens, como a evolução anterior das espécies o mostra, e deve
sua noção é como segue. O anarquismo se divide em três ramos: suportar a vontade dos outros (escravidão), impor sua vontade
anarquismo comunista, anarco-sindicalismo e anarquismo indivi- aos outros (autoritarismo), ou viver com os outros em fraternal
dualista. Pese a que cada um destes ramos tem de particulares, acordo para o maior bem de todos (associação). Ninguém pode
os três se parecem tanto e são tão próximos um ao outro, que é escapar dessa necessidade. Os antiorganizadores mais imodera-
só graças a mal entendidos superficiais que tem existência como dos suportam não apenas a organização geral da sociedade em
ramos separados. que vivem, mas também em seus atos, em sua revolta contra a
organização, eles se unem, dividem a tarefa, organizam-se com
A fim de dar surgimento a um movimento anarquista forte aqueles que compartilham suas idéias, utilizando os meios que a
e poderoso, é necessário que ele se funda completamente. Essa sociedade coloca à sua disposição; com a condição de que estes
fusão, por sua vez, implica em uma síntese teórica e filosófica sejam fatos reais e não vagas aspirações platônicas.
dos ensinamentos sobre as quais cada um desses ramos se fun-
de. Só depois da síntese teórica desses ensinamentos, podemos Anarquia significa sociedade organizada sem autoridade,
abordar a estrutura e o formato de uma organização que repre- compreendendo-se autoridade como a faculdade de impor sua
sente as três tendências. Tal é o conteúdo da Síntese assim con- vontade. Todavia, também significa o fato inevitável e benéfico
cebida, como tem sido exposta na “Declaração dos anarquistas que aquele que compreende melhor e sabe fazer uma coisa,
trabalhando conjuntamente”, e uns quantos artigos de Volin [1], consegue fazer aceitar mais facilmente sua opinião. Ele serve de
guia, quanto a esta coisa, aos menos capazes que ele.
Segundo nossa opinião, a autoridade não é necessária à orga- O PROBLEMA DA ORGANIZAÇÃO E A
nização social, mais ainda, longe de ajudá-la, vive como parasita, NOÇÃO DE SÍNTESE
incomoda a evolução e favorece uma dada classe que explora e
oprime as outras. Enquanto há harmonia de interesses em uma
coletividade, enquanto ninguém pode frustrar outras pessoas, Grupo de Anarquistas Russos no Estrangeiro
não há sinal de autoridade. Ela aparece com a luta intestina, a Comitê Editorial de Dielo Trouda
divisão em vencedores e vencidos, os mais fortes confirmando a
sua vitória.
Muitos companheiros têm dado sua opinião nas colunas do
Temos esta opinião e é por isso que somos anarquistas, caso Dielo Trouda (“A Causa Operária”), a respeito da questão dos
contrário, afirmando que não pode existir organização sem auto- princípios anarquistas e do formato organizativo. Nem todos sem
ridade, seremos autoritários. Mas ainda preferimos a autoridade aproximam do problema desde o mesmo ângulo. A essência des-
que incomoda e desola a vida, à desorganização que a torna te problema, segundo entende o comitê editorial do Dielo Trou-
impossível. da, consiste no seguinte.
De resto, o que seremos nos interessa muito pouco. Se é ver- Os anarquistas que agitam e lutam pela emancipação do
dade que o maquinista e o chefe de serviço devem forçosamente proletariado devem, a todo custo, pôr fim a dispersão e a desor-
ter autoridade, assim como os camaradas que fazem para todos ganização que abundam em nossas fileiras já que estas destroem
um trabalho determinado, as pessoas sempre preferirão supor- nossas fortalezas e nossos esforços libertários. A forma de supe-
tar sua autoridade a viajar a pé. Se o correio fosse apenas esta rar isto é criar uma organização que talvez não agrupe a todos
autoridade, todo homem são de espírito a aceitaria para não ter os militantes ativos do anarquismo, porém, certamente a maioria
de levar, ele próprio, suas cartas. Se se recusa isto, a anarquia deles sob a base de posições táticas e teóricas específicas, e nos
permanecerá o sonho de alguns e nunca se realizará leve a um firme entendimento de como estas se devem aplicar
na prática.
Não é necessário dizer que, para tratar esta questão, deve-
-se lançar mão para a elaboração de posições teóricas e táticas
que forneça a base, a plataforma, para esta organização. Pois,
se não associarmos a idéia de tal organização com posições teó-
ricas e táticas bem definidas, podemos desperdiçar nosso tempo
falando da necessidade de organizar nossas forças sem ganhar
nada com ela.
O Grupo de Anarquistas Russos no Estrangeiro nunca tem
perdido de vista essa última questão. Em uma série de artigos
publicados no Dielo Trouda, seu ponto de vista tem sido parcial-
mente exposto em assuntos de particular importância para um
programa: a relação do anarquismo com a luta das classes dos
explorados, sindicalismo revolucionário, o período de transição,
um trampolim para sua glória ou elevação pessoal – por causa
disso, impusemos a nós próprios a lei de nunca receber nosso A ORGANIZAÇÃO II
sanctum sanctorum, na nossa intimidade e fraternidade coletiva,
nenhum ambicioso e nenhum vaidoso, por muito parecidas que
Errico Malatesta
sejam as suas idéias e as suas tendências apaixonadas com as
nossas, por muito inteligentes e sábios que sejam e por muito
grande que pudesse ser a utilidade que as suas relações e a sua
influência no mundo nos trouxesse. Preferimos nos resignar do Estando admitida a existência de uma coletividade organizada
que recebê-los entre nós, pela certeza que temos de que a sua sem autoridade, isto é, sem coerção, caso contrário, a anarquia
ambição e a sua vaidade não deixariam de trazer para o nosso não teria sentido, falemos da organização do partido anarquista.
meio, mais tarde ou mais cedo, os germes da divisão e da de- Mesmo nesses casos, a organização nos parece útil e neces-
sorganização. – Eles vão querer ser chefes, dirigentes, mestres, sária. Se o partido, ou seja, o conjunto dos indivíduos que têm
e não os reconhecemos de modo nenhum entre nós e como so- um objetivo em comum e se esforçam para alcançá-lo, é natural
cialistas revolucionários não os devemos reconhecer. Não pode que se entendam, unam suas forças, compartilhem o trabalho
e não deve ser dos nossos senão o que é capaz de, individual- e tomem todas as medidas adequadas para desempenhar esta
mente, imergir completamente na solidariedade fraternal e na tarefa. Permanecer isolado, agindo ou querendo agir cada um
ação coletiva dos aliados – não para se tornar um escravo, mas por sua conta, sem se entender com os outros, sem preparar-se,
pelo contrário, para se retemperar nela e para se reencontrar for- sem enfeixar as fracas forças dos isolados, significa condenar-se
te, livre, inteligente, pela força, pela liberdade, pela inteligência à fraqueza, desperdiçar sua energia em pequenos atos ineficazes,
e pela assistência, sempre ativa e sempre presente, de todos. perder rapidamente a fé no objetivo e cair na completa inação.
(Nettlau, 283-284, 72)
Mas isto parece de tal forma evidente que, ao invés de fazer
[O candidato] – à Aliança – deve compreender que uma as- sua demonstração, responderemos aos argumentos dos adver-
sociação com um objetivo revolucionário tem de se transformar sários da organização.
necessariamente em sociedade secreta, e qualquer sociedade
Antes de mais nada, há uma objeção, por assim dizer, formal.
secreta, no interesse da causa a que serve e da eficácia de sua
“Mas de que partido nos falais? Dizem-nos, nem sequer somos
ação, assim como no da segurança de cada um dos seus mem-
um, não temos um programa”. Este paradoxo significa que as
bros, tem de ser submetida a uma forte disciplina, que aliás não
idéias progridem, evoluem continuamente, e que eles não po-
é senão o resumo e o resultado puro do compromisso recíproco
dem aceitar um programa fixo, talvez válido hoje, mas que esta-
que todos os membros uns em relação aos outros. (Nettlau, 213,
rá com certeza ultrapassado amanhã.
64-67).
Seria perfeitamente justo se se tratasse de estudantes que
procuram a verdade, sem se preocuparem com as aplicações
Socialismo e Liberdade práticas. Um matemático, um químico, um psicólogo, um sociólo-
Mikhail Bakunin go podem dizer que não há outro programa senão o de procurar
a verdade: eles querem conhecer, mas sem fazer alguma coisa.
Organização: Coletivo Luta Libertária Mas a anarquia e o socialismo não são ciências: são proposições,
projetos que os anarquistas e os socialistas querem por em prá-
tica e que, conseqüentemente, precisam ser formulados como
programas determinados. A ciência e a arte das construções pro- mum. No momento da ação, no meio da luta, os papéis dividem-
gridem a cada dia. Mas um engenheiro, que quer construir ou -se naturalmente, segundo as aptidões de cada um, apreciados
mesmo demolir, deve fazer seu plano, reunir seus meios de ação e julgados por toda coletividade: uns dirigem e ordenam, outros
e agir como se a ciência e a arte tivessem parado no ponto em executam as ordens. Mas nenhuma função se petrifica, se fixa
que as encontrou no início de seu trabalho. Pode acontecer, fe- e fica irrevogavelmente ligada a nenhuma entidade ou pessoa.
lizmente, que ele possa utilizar novas aquisições feitas durante A ordem e a promoção hierárquica não existem, de modo que
seu trabalho sem renunciar à parte essencial de seu plano. Pode o comandante de ontem pode tornar-se o subalterno de hoje.
acontecer do mesmo modo que as novas descobertas e os no- Ninguém se eleva acima dos outros, ou se se eleva, não é senão
vos meios industriais sejam tais que ele se veja na obrigação de para cair logo a seguir, como as ondas do mar, voltando sempre
abandonar tudo e recomeçar do zero. Mas ao recomeçar, preci- ao nível salutar da igualdade.
sará fazer novo plano, com base no conhecimento e na experi- Neste sistema já não há propriamente poder. O poder baseia-
ência; não poderá conceber e por-se a executar uma construção -se na coletividade, e torna-se a expressão sincera da liberdade
amorfa, com materiais não produzidos, a pretexto que amanhã de cada um, a realização fiel e séria da vontade de todos; só obe-
a ciência poderia sugerir melhores formas e a indústria fornecer decendo cada um de per si, ao chefe do dia, este só ordenara o
materiais de melhor composição. que ele próprio quer.
Entendemos por partido anarquista o conjunto daqueles que Eis a disciplina verdadeiramente humana, a disciplina neces-
querem contribuir para realizar a anarquia, e que, por conse- sária à organização da liberdade. (Obras, II, 297-298. 70-71).
qüência, precisam fixar um objetivo a alcançar e um caminho a
percorrer. Deixamos de bom grado às suas elucubrações trans- ******
cendentais os amadores da verdade absoluta e de progresso Doravante, que cada grupo, cada seção de grupo, não rece-
contínuo, que, jamais colocando suas idéias à prova, acabam por ba no seu seio um novo membro senão por unanimidade, nunca
nada fazer ou descobrir. unicamente pela maioria das vozes, isto é, de todos os membros
A outra objeção é que a organização cria chefes, uma autori- que fazem parte desta seção de grupo. – Se só são dois, não
dade. Se isto é verdade, se é verdade que os anarquistas são in- devem admitir um terceiro senão quando estiverem os dois per-
capazes de se reunirem e de entrarem em acordo entre si sem se feitamente de acordo e igualmente convencidos da utilidade, da
submeter a um autoridade, isto quer dizer que ainda são muito inteligência, da dedicação, da energia e da descrição que ele vos
pouco anarquistas. Antes de pensar em estabelecer a anarquia trará. E nesta escolha nunca devem se deixar conduzir por ne-
no mundo, devem pensar em se tornar capazes de viver como nhuma outra consideração senão o programa da Aliança, a con-
anarquistas. O remédio não está na organização, mas na consci- corrência perfeita dos seus sentimentos e das suas idéias com
ência perfectível dos membros. esse programa, e a sua capacidade real de os seguir com ener-
gia, com discrição e com perseverança e prudência, e sobretudo
Evidentemente, se em uma organização, deixa-se a alguns a sua capacidade de renunciar para sempre qualquer iniciativa
todo o trabalho e todas as responsabilidades, se nos submete- pessoal isolada, e de subordinar sempre a sua ação à vontade
mos ao que fazem alguns indivíduos, sem por a mão na massa coletiva – capacidade que os vaidosos e ambiciosos nunca têm,
e procurar fazer melhor, esses “alguns” acabarão, mesmo que pois o que eles procuram, muitas vezes – sem eles próprios repa-
não queiram, substituindo a vontade da coletividade pela sua. rarem nisso, – o que procuram em todas as coletividades, tanto
Se em uma organização todos os membros não se interessam públicas como secretas. que encontram, é um pedestal para si,
não compartilho completamente da tua opinião neste ponto. É em pensar, em querer compreender, em pedir explicações sobre
detestável uma regulamentação excessiva, e julgo, como tu, que o que não compreendem, em exercer sobre tudo e sobre todos
“as pessoas sérias devem traçar uma linha da conduta e não se as suas faculdades críticas, deixando a alguns a responsabilidade
desviar dela”. Portanto tentemos nos compreender um ao outro. de pensar por todos, esses “alguns” serão os chefes, as cabeças
pensantes e dirigentes.
A fim de estabelecer uma certa coordenação na ação, coor-
denação necessária, creio eu, entre as pessoas que tendem para Todavia, repitamos, o remédio não está na ausência de or-
o mesmo objetivo, impõe-se determinadas condições: um certo ganização. Ao contrário, nas pequenas como nas grandes so-
número de regras ligando cada um a todos, determinados pactos ciedades, excetuando a força brutal, a qual não nos diz respeito
e acordos renovados freqüentemente – se falta tudo isto, se cada no caso em questão, a origem e a justificativa da autoridade
um trabalha como lhe apetece, as pessoas mais sérias se encon- residem na desorganização social. Quando uma coletividade tem
trarão elas próprias numa situação em que os esforços de um se- uma necessidade e seus membros não estão espontaneamen-
rão neutralizados pelos de outros. Disto resultará a desarmonia e te organizados para satisfazê-la, surge alguém, uma autoridade
não a harmonia e a confiança serena para a qual nos tendemos. que satisfaz esta necessidade servindo-se das forças de todos
e dirigindo-as à sua maneira. Se as ruas são pouco seguras e o
…Eu quero que no nosso trabalho haja ordem e uma con-
povo não sabe se defender, surge uma polícia que, por uns pou-
fiança serena, e que nem uma nem outra sejam os resultados de
cos serviços que presta, faz com que a sustentem e a paguem,
ordens de uma única vontade, mas da vontade coletiva, da von-
impõe-se a tirania. Se há necessidade de um produto e a coleti-
tade bem organizada de numerosos companheiros disseminados
vidade não sabe se entender com os produtores longínquos para
em numerosos países… Mas para que uma tal descentralização
que eles enviem esse produto em troca por produtos da região,
seja possível, é preciso ter uma autêntica organização, e uma tal
vem de fora o negociante que se aproveita da necessidade que
organização não é possível sem um certo grau de regulamenta-
possuem uns de vender e outros de comprar e impõe os preços
ção, que ao fim e ao cabo são o resultado de um acordo mútuo
que quer a produtores e consumidores.
ou de um contrato. (Maximoff. 379-380, 68-70).
Como vedes, tudo vem sempre de nós: quanto menos está-
******
vamos organizados, mais nos encontrávamos sob a dependência
Trata-se da disciplina e da confiança, assim como da união. de certos indivíduos. E é normal que tivesse sido assim.
São coisas excelentes quando são bem aplicadas. Funestas quan-
Precisamos estar relacionados com os camaradas das outras
do se dirigem a quem não as merece. Amante apaixonado da li-
localidades, receber e dar notícias, mas não podemos todos nos
berdade, confesso que desconfio muito dos que têm sempre na
correspondermos com todos os camaradas. Se estamos organi-
boca a palavra disciplina. (obras, II, 296, 70-71).
zados, encarregamos alguns camaradas de manter a correspon-
Por muito inimigo que seja daquilo que na França chama de dência por nossa conta; trocamo-os se eles não nos satisfazem,
disciplina, no entanto reconheço que uma certa disciplina, não e podemos estar informados sem depender da boa vontade de
automática, mas voluntária e refletida, e estando perfeitamente alguns para obter uma informação. Se, ao contrário, estamos de-
de acordo com a liberdade dos indivíduos, continua a ser e sem- sorganizados, haverá alguém que terá os meios e a vontade de
pre será necessária, todas as vezes que vários indivíduos, livre- corresponder; ele concentrará em suas mãos todos os contatos,
mente unidos, empreenderem um trabalho ou uma ação coletiva comunicará as notícias como bem quiser, a quem quiser. E se
qualquer. Esta disciplina não é senão a concordância voluntária tiver atividade e inteligência suficientes, conseguirá, sem nosso
e refletida de todos os esforços individuais para um objetivo co- conhecimento, dar ao movimento a direção que quiser, sem que
nos reste a nós, a massa do partido, nenhum meio de controle, dura sem capa, sem título, sem direito oficial, e tanto mais forte
sem que ninguém tenha o direito de se queixar, visto que este quanto menos aparências do poder ela tiver. Eis a única ditadura
indivíduo age por sua conta, sem mandato de ninguém e sem ter que admito. Mas para que ela possa agir é preciso que exista, e
que prestar contas a ninguém de sua conduta. para isso, é necessário primeiro prepará-la e organizá-la; poi ela
Precisamos de um jornal. Se estamos organizados, podemos não se fará sozinha, nem com discussões, nem por exposições e
reunir os meios para fundá-lo e fazê-lo viver, encarregar alguns debates de princípios, nem por assembléias populares. (Richard,
camaradas de redigi-lo e controlar sua direção. Os redatores do 130-131, 70).
jornal lhe darão, sem dúvida, de modo mais ou menos claro, a ******
marca de sua personalidade, mas serão sempre pessoas que te- O nosso objetivo é criar uma coletividade revolucionária for-
remos escolhido e que poderemos substituir. Se, ao contrário, es- te mas sempre invisível, uma coletividade que deve preparar a
tamos desorganizados, alguém que tenha suficiente espírito de revolução e dirigi-la…, deixando ao movimento revolucionário de
empreendimento fará o jornal por sua própria conta: encontrará massas o seu desenvolvimento total a à sua organização so-
entre nós os correspondentes, os distribuidores, os assinantes, cial… a mais completa liberdade, mas vigiando sempre para que
e fará com que sirvamos seus desígnios, sem que saibamos ou este movimento e esta organização nunca possam reconstituir
queiramos. E nós, como muitas vezes aconteceu, aceitaremos ou autoridades, governos, Estados, e combatendo todas as ambi-
apoiaremos este jornal, mesmo que não nos agrade, mesmo que ções, tanto coletivas (no gênero da de Marx) como individuais
tenhamos a opinião de que é nocivo à Causa, porque seremos pôr influência natural, nunca oficial, de todos os membros de
incapazes de fazer um que melhor represente nossas idéias. nossa Aliança, disseminados em todos países, e cuja força vem
Desta forma, a organização, longe de criar a autoridade, é unicamente de sua ação solidária e da unidade de programa e de
o único remédio contra ela e o único meio para que cada um de objetivos que deve existir sempre entre eles. (Nettlau, 284, 72).
nós se habitue a tomar parte ativa e consciente no trabalho co- Assim centralizada pela idéia e pela identidade de um progra-
letivo, e deixe de ser instrumento passivo nas mãos dos chefes. ma comum a todos os países, centralizada por uma organização
Se não fizer nada e houver inação, então, certamente, não secreta, que reunirá não só todos os partidos de um país, mas
haverá nem chefe, nem rebanho; nem comandante, nem coman- também muitos senão todos os países num mesmo plano de
dados, mas, neste caso, a propaganda, o partido, e até mesmo a ação; centralizada também pela simultaneidade dos movimentos
discussão sobre a organização, cessarão, o que, esperamos, não revolucionários no campo e na cidade, doravante, a revolução
é o ideal de ninguém… deverá tomar e manter um caráter local no sentido em que não
Contudo, uma organização, diz-se supõe a obrigação de co- deverá começar de modo nenhum por uma grande concentração
ordenar sua própria ação e a dos outros, portanto, violar a li- de todas as forças revolucionárias de um , país num único ponto,
berdade, suprimir a iniciativa. Parece-nos que o que realmente nem nunca tomar o caráter romanesco e burguês de uma expe-
suprime a liberdade e torna impossível a iniciativa é o isolamento dição quase revolucionária, mas inflamando-se ao mesmo tempo
que produz a impotência. A liberdade não é direito abstrato, mas em todos os pontos de um país, deverá tomar o caráter de uma
a possibilidade de fazer algo. Isto é verdade para nós como para verdadeira revolução popular. (Nettlau, 218, 64-67).
a sociedade em geral. É na cooperação dos outros que o homem ******
encontra o meio de exercer sua atividade, seu poder de iniciativa. Tu me escreves, caro amigo, que és “inimigo de qualquer
Evidentemente, organização significa coordenação de forças espécie de estatus” e afirmas que “só são jogos de crianças”. Eu
ção revolucionária de todos os quarteirões, a comuna diretiva. E com um objetivo comum, e obrigação de não promover ações
esta comuna terá o dever de declarar que não se arroga o direito contrárias a este objetivo. Mas quando se trata de organização
de governar e de organizar a França, mas que chama o povo de voluntária, quando aqueles que dela fazem parte têm de fato o
todas as comunas, tanto da França como do que se chamava até mesmo objetivo e são partidários dos mesmos meios, a obriga-
agora o estrangeiro, a seguir o seu exemplo, a fazer, cada uma ção recíproca que a todos engaja obtém êxito em proveito de
na sua região, uma revolução tão radical, tão destrutiva para o todos. Se alguém renuncia a uma de suas idéias pessoais por
Estado, para o direito jurídico e para a propriedade privilegiada. consideração à união, isto significa que acha mais vantajoso re-
nunciar a uma idéia, que, por sinal, não poderia realizar sozinho,
Ela derivará estas comunas, francesas ou estrangeiras, de-
do que se privar da cooperação dos outros no que acredita ser
pois de ter feito esta revolução, a virem federar-se com ela, quer
de maior importância.
em Paris quer em qualquer outro ponto que se quiser, para onde
enviarão seus delegados para fazer uma organização comum dos Se, em seguida, um indivíduo vê que ninguém, nas organiza-
serviços e das relações de produção e de troca, organização ne- ções existentes, aceita suas idéias e seus métodos naquilo que
cessária para estabelecer a carta de igualdade, base de toda a têm de essencial, e que em nenhuma organização pode desen-
liberdade, carta totalmente negativa por seu caráter, separando volver sua personalidade como deseja, então estará certo em
bem o que deve ser abolido presentemente do que são as formas permanecer de fora. Mas, se não quiser permanecer inativo e
positivas da vida local, que só podem ser criadas pela prática impotente, deverá procurar outros indivíduos que pensem como
viva de cada localidade. Ao mesmo tempo organizar-se-á uma ele, e tornar-se iniciador de uma nova organização.
defesa comum contra os inimigos da Revolução, assim como a Uma outra objeção, a última que abordaremos, é que, es-
propaganda ativa da Revolução e da solidariedade prática revo- tando organizados, estamos mais expostos à repressão governa-
lucionária, com os amigos de todos os países contra os inimigos mental.
de todos os países.
Parece-nos, ao contrário, que quanto mais unidos estamos,
Numa palavra, a revolução deve estar e deve surgir por toda mais eficazmente nos podemos defender. Na realidade, cada vez
parte. independentemente do ponto central, que deve ser sua que a repressão nos surpreendeu enquanto estávamos desorga-
expressão, o seu produto, e não a sua fonte, a sua direção e a nizados, colocou-nos em debandada total e aniquilou nosso tra-
sua causa. balho precedente. Quando estávamos organizados, ela nos fez
É preciso que a anarquia, o despertar da vida espontânea, mais bem do que mal. Assim também no que concerne ao inte-
de todas as paixões locais, e sobre todos os pontos, sejam tão resse pessoal dos indivíduos: por exemplo, nas últimas repres-
grandes quanto possível, para que a Revolução seja e continue sões, os isolados foram tanto e talvez mais gravemente atingidos
viva, real, forte. Os revolucionários políticos, os partidários da do que os organizados. É o caso, organizados ou não, dos indi-
ditadura ostensível, logo que a revolução tiver obtido o primeiro víduos que fazem propaganda individual. Para aqueles que nada
triunfo, ordenaram o apaziguamento das paixões, a ordem, a fazem e ocultam suas convicções, o perigo é certamente mínimo,
confiança e a submissão aos novos poderes estabelecidos. Deste mas a utilidade que oferecem à Causa também o é.
modo, eles reconstituem o Estado. Nós, pelo contrário, devemos O único resultado, do ponto de vista da repressão, que se ob-
fomentar, despertar, desprender todas as paixões, devemos pro- tém por estar desorganizado é autorizar o governo a nos recusar
duzir a anarquia, e, pilotos invisíveis no meio da tempestade po- o direito de associação e tornar possível monstruosos processos
pular, devemos dirigi-la, não com um poder ostensível, mas pela por associação delituosa. O governo não agiria dessa forma em
ditadura coletiva de todos os aliados(membros da Aliança). Dita- relação às pessoas que afirmam de modo altivo e público, o di-
reito e o fato de estarem associados e, se ousasse fazê-lo, isto se Estes revolucionários moderados censuraram à juventude
voltaria contra ele e em nosso proveito. revolucionária, como uma grande loucura, a sua confiança no
De resto, é natural que a organização assuma as formas que povo; esta confiança, nunca a partilharam e por muitas razões…,
as circunstâncias aconselham e impõem. O importante não é eles recearam, até mais do que desejavam, a insurreição polaca.
tanto a organização formal, mas o espírito de organização. Po- Mas provando a sua incontestável sabedoria por esta desconfian-
dem acontecer casos, durante o furor da reação, em que seja útil ça legítima que o povo sempre lhes inspirou, não conseguiram
suspender toda correspondência, cessar todas as reuniões: será evitar outra loucura – não posso qualificar de outro modo a sua
sempre um mal, mas se a vontade de estar organizado subsiste, confiança infantil no auxílio da diplomacia. Aliás, eles são suas
se o espírito de associação permanece vivo, se o período prece- vítimas – um amigo muito perigoso e muito equívoco da causa
dente de atividade coordenada multiplicou as relações pessoais, polaca, chefe de um Estado, que desde que esta causa existe,
produziu sólidas amizades e criou um real acordo de idéias de não deixou escapar uma ocasião para lhe prestar maus serviços,
conduta entre os camaradas, então o trabalho dos indivíduos, – o Imperador Napoleão III, numa palavra, tendo-lhe sugerido
mesmo isolados, participará do objetivo comum. E encontrar-se- que deviam apoderar-se do movimento nacional, – primeiro para
-á rapidamente o meio de nos reunirmos de novo e repararmos paralisar tudo o que havia de verdadeiramente revolucionário
os danos sofridos. e que, acrescentava, seria necessariamente antipática a todos
os governos regulares da Europa; mas ao mesmo tempo para
Somos como um exército em guerra e podemos, segundo o o fazer prolongar em duração continuando-o como um protesto
terreno e as medidas tomadas pelo inimigo, combater em mas- exclusivamente nacional, a fim de dar à diplomacia o pretexto
sa ou em ordem dispersa: o essencial é que nos consideremos de intervir á favor da Polônia – esses homens sensatos, que se
sempre membros do mesmo exército, que obedeçamos todos às apoderaram efetivamente de governo nacional, só seguiram mui-
mesmas idéias diretrizes e que estejamos sempre prontos a nos to fielmente os conselhos de Paris. Eles puseram todas as suas
reunirmos em colunas compactas quando for necessário e quan- esperanças na intervenção diplomática da França; para agradar a
do se puder fazer algo. esta, para agradar também a Áustria, que durante alguns meses
Tudo o que dissemos se dirige aos camaradas que são de fato tinha fingido querer associar-se à política da França, fizeram to-
adversários do princípio da organização. Àqueles que combatem dos os esforços para acalmar, para despopularizar e para abafar
a organização, somente porque não querem nela entrar, ou não a insurreição nacional. – Eles só o conseguiram imperfeitamente,
são aceitos, ou não simpatizam com os indivíduos que dela fa- graças à sua impotência. (Nettlau. 157-l58, 68?).
zem parte, dizemos: façam com aqueles que estão de acordo ******
com vocês outra organização. É verdade, gostaríamos de poder
estar, todos nós, de acordo, e reunir em um único feixe poderoso Se Paris se subleva e triunfa, terá o direito e o dever de procla-
todas as forças do anarquismo. Mas não acreditamos na solidez mar a liquidação completa de Estado político, jurídico: financeiro
das organizações feitas à força de concessões e de restrições, e administrativo, a bancarrota pública e privada, a destruição de
onde não há entre os membros simpatia e concordância real. É todas as funções, de todos os serviços, de todas as forças do Es-
melhor estarmos desunidos que mal unidos. Mas gostaríamos tado, o incêndio ou o fogo da alegria de todos os papéis e atos
que cada um se unisse com seus amigos e que não houvessem públicos e privados, a fim de que os trabalhadores reunidos em
forças isoladas, forças perdidas. associações, e que terão expropriado todos os instrumentos de
trabalho, capitais de qualquer espécie e edifícios, fiquem arma-
dos e organizados por ruas e por quarteirões. Formarão a federa-
fortes é que, produtos de uma grande paixão unânime, seduzem
a todos, tanto os fracos como os fortes, as mulheres, as crianças, TÁTICA E DISCIPLINA DO PARTIDO
os velhos, assim como os jovens e os homens maduros, pois a REVOLUCIONÁRIO
própria ausência de qualquer ordem formal e de qualquer re-
gra artificial, imposta por uma autoridade superior, torna possível
esta participação ao movimento geral, de todas as idades e de Mikhail Bakunin
todos os sexos; enquanto que a repressão definitiva das forças
populares; constantemente a desaparecer e a renascer, torna-se
por isso mesmo impossível. Imitemos um pouco a sabedoria dos nossos adversários. Ve-
jam, todos os governos têm na boca a palavra liberdade, en-
Vimos uma prova surpreendente disso na última insurreição quanto os seus atos são reacionários. Que as autoridades revo-
polaca. Foi um movimento anárquico, o governo nacional de Var- lucionárias não façam mais frases, mas usando uma linguagem
sóvia era muito fraco para o conter e para o dirigir, o que foi mais mais moderada, a mais pacífica possível, façam a revolução.
uma vantagem do que um inconveniente, pois este governo, –
que é preciso não confundir com o comitê central de Varsóvia, É totalmente o inverso do que as autoridades revolucioná-
que organizou muito bem a conspiração nacional, mas que se rias, em todos os países fizeram até hoje: elas foram a maior
dissolveu de fato nos primeiros dias da insurreição e foi substitu- parte das vezes excessivamente enérgicas e revolucionárias em
ído pelo governo nacional – este governo tinha um temperamen- sua linguagem e muito moderadas, para não dizer muito reacio-
to tão pouco revolucionário, que era muito mais capaz de matar nárias, nos seus atos. Pode-se mesmo dizer que a energia da lin-
do que manter viva a insurreição polaca. Todos os membros do guagem, a maior parte das vezes, serviu-lhes de máscaras para
Comitê Central, do sistema de concessões e de meias medidas e enganar o povo, para lhe esconder a fraqueza e a incoerência
não talvez menos um ou dois, eram sinceramente revolucioná- de seus atos. Há homens, muitos homens na burguesia supos-
rios – senão totalmente pelo seu programa, ao qual voltarei mais tamente revolucionária, que ao pronunciarem algumas palavras
a frente – pelo menos pela energia da sua fé e da sua vontade. revolucionárias, julgam fazer a revolução, e que, depois de as
Eram jovens impacientes por começar a luta e que só contavam terem pronunciado, se julgam com o direito de cometer atos
com a sublevação popular. Eram inimigos, naturalmente, sem de fraqueza. inconseqüências fatais, atos de pura reação. Nós
nenhuma confiança na diplomacia. Podemos ter certeza, pois, somos revolucionários para valer, fazemos absolutamente o con-
que se eles tivessem se mantido à cabeça do movimento insurre- trário. Falamos pouco de revolução, mas fazemo-la. Deixemos
cional. este último teria tomado um caminho mais decisivo. Mas por agora a outros o cuidado de desenvolver teoricamente os
deixando-se se arrastar por um sentimento de impaciência, de princípios da revolução social, e contentemo-nos em aplicá-los,
vaidade juvenil e de heroísmo e em parte impelidos pelas pró- em encarná-los nos fatos.
prias necessidades de sua dificílima posição, deixaram Varsóvia Entre os nossos amigos e aliados, os que me conhecem bem,
para se porem à cabeça dos bandos revoltados. Morreram quase talvez fiquem espantados por eu sustentar agora esta linguagem,
todos e o seu lugar vago foi ocupado por outros. Estes outros eu, que fiz tanta teoria, e que me mostrei sempre um guardião
eram revolucionários de futuro, não dá véspera, aliás, patriotas zeloso e feroz dos princípios. Ah! É que os tempos mudaram. –
decididos, mas moderados, hesitantes e ponderados, que nunca Então, ainda há um ano, nos preparávamos para a revolução,
teriam começado uma revolução como a da véspera, que eles que esperávamos, uns mais tarde, outros mais cedo, – e agora,
diziam impossível, e que, conseqüentemente, não tinham nenhu- digam os que disserem os cegos, estamos em plena revolução.
ma das qualidades requeridas para a conduzir a bom termo. – Então era absolutamente necessário sustentar alto a bandeira
dos princípios teóricos, expor bem alto estes princípios em toda sobre os indivíduos mais inteligentes e mais influentes de cada
sua pureza, a fim de formar um partido por pouco numeroso que localidade, para que esta organização esteja o mais próxima pos-
fosse, mas composto unicamente por homens que estivessem sível de nossos princípios. – Todo e segredo do nosso triunfo está
sinceramente, plenamente, apaixonadamente ligados a estes aí.
princípios, de modo que cada um, em tempo de crise, pudesse Que este trabalho vá encontrar dificuldades, quem pode du-
contar com todos os outros. Agora já não se trata de recrutar. vidar disso? Mas quem pensa que a revolução é um jogo de
Nós conseguimos formar, bem ou mal, um pequeno partido – pe- crianças e que se pode faze-la sem vencer inumeráveis dificul-
queno em relação ao número de homens que aderem a ele com dades? Os revolucionários socialistas dos nossos dias não têm
conhecimento de causa, imenso relativamente aos seus ade- nada ou quase nada a imitar nos processes revolucionários dos
rentes instintivos, relativamente às massas populares das quais jacobinos de 1793. A rotina revolucionária os poria a perder. Eles
ele representa as necessidades melhor do que qualquer outro devem trabalhar no vivo, eles devem criar tudo. (Obras, II. 225
partido. – Agora devemos embarcar em conjunto no oceano re- a 228, 70).
volucionário, e doravante não devemos propagar mais nossos
princípios por palavras, mas com fatos, – pois é a mais popular, ******
a mais poderosa e a mais irresistível das propagandas. Calemos Não se pense que eu quero impor a causa da anarquia abso-
de vez em quando a política, isto é, quando a nossa impotência luta nos movimentos populares. Uma tal anarquia não seria outra
momentânea em relação a uma grande força contrária o exija, coisa senão uma ausência completa de pensamento, de objetivo
mas sejamos sempre implacavelmente conseqüentes nos fatos. e de conduta comum. Tudo que é viável ou não se produz numa
A salvação da revolução está toda neles. determinada ordem, que lhe é inerente se manifesta conforme
A razão principal porque todas as autoridades revolucionárias é. Qualquer revolução popular, que não morra ao nascer, confor-
de todo o mundo fizeram sempre tão pouca revolução, é porque mar-se-á a uma ordem que lhe será particular, e sempre reco-
elas sempre quiseram faze-la elas próprias, com a sua autorida- nhecida pelo instinto popular, será determinada pela combinação
de, e com a sua força, o que nunca deixou… de estreitar exces- natural de todas as circunstâncias locais com o objetivo comum
sivamente a ação revolucionária, pois é impossível mesmo para que apaixona as massas. Para que esta ordem possa brotar e
a autoridade revolucionária mais inteligente, mais enérgica, mais para que se estabeleça no meio da anarquia de uma sublevação
franca, abraçar ao mesmo tempo muitas questões e interesses, popular. é preciso que abrace os povos numa única e grande pai-
sendo qualquer ditadura, tanto individual como coletiva, enquan- xão e que o seu objeto esteja bem determinado.
to composta por vários personagens oficiais, necessariamente O ideal de tal insurreição, segundo a minha opinião, reali-
muito limitada, muito cega, e incapaz tanto de penetrar nas pro- zou-se em uma sublevação de massa dos insurretos da Vendéia;
fundezas como de abraçar toda a amplidão da vida popular… não, sem dúvida, no seu programa, que foi excessivamente rea-
Então o que devem fazer as autoridades revolucionárias – e cionário. As tropas aguerridas da República, comandadas pelos
trabalhemos para que estas existam o menos possível – o que é melhores generais foram postas em xeque, durante alguns anos,
que elas devem fazer para desenvolver e organizar a revolução? pela desordem dos camponeses.
Elas nem devem faze-la por decretos, nem impô-la às massas, A sublevação popular na Espanha contra Napoleão nos dá
mas provocá-la nas massas. Elas não lhes devem impor uma or- outro exemplo. Poder-se-ia ainda citar a do povo russo contra a
ganização qualquer, mas suscitando a sua organização autôno- invasão de Napoleão em 1812. (Nettlau. 198, 68).
ma, trabalhar secretamente, com a ajuda da influência individual
O que torna os movimentos verdadeiramente populares tão

Você também pode gostar