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TRIBUNAL MARÍTIMO

IF/GAP PROCESSO Nº 30.416/16


ACÓRDÃO

Bote “HAPPY X”. Colisão de bote com pedras submersas arremessando seus
dois ocupantes na direção da proa e provocando a morte do ocupante Ivan
Raymundo Lobosco. Erro de navegação. Imprudência. Condenação.

Vistos, discutidos e relatados os presentes autos.


Trata-se de analisar o acidente da navegação envolvendo o bote “HAPPY X”,
propriedade de Felix Cunha, quando, cerca das 15h30min do dia 09/05/2014, nas águas
costeiras do braço de mar que margeia o bairro Piçarro, Cananéia, SP, veio a colidir com
pedras próximo da margem, provocando o óbito do ocupante Ivan Raymundo Lobosco,
sem ocorrência de danos ambientais.
Dos depoimentos colhidos e documentos acostados extrai-se que o bote
“HAPPY X”, inscrito, com 5,00 metros de comprimento, motorizado, atividade de
esporte e recreio, casco em alumínio, sob a condução do Arrais Amador Valdemar
Tsukamoto, quando por volta das 15h30min procuravam um local para pescar, porém não
notaram que estavam navegando próximos à margem e que havia pedras no local,
chegando então a colidir com uma delas. Os dois ocupantes foram lançados na direção da
proa da embarcação, e o Ivan, em razão de estar localizado mais a vante que o Valdemar,
acabou sendo lançado na direção da proa e veio a bater com a cabeça em algo não
identificado, talvez em alguma pedra ou até mesmo na própria embarcação.
A vítima ficou desacordada, e o Valdemar logo percebeu que havia uma
embarcação a cerca de 200m de distância, e ela veio prestar socorro, o condutor de tal
embarcação era Rosalino Cunha. Assim que foi feito o resgate o Rosalino acionou o
socorro via rádio. Ao atracarem no Trapiche do Ferry Boat já havia uma ambulância
aguardando, e lá mesmo foi constatado que o Ivan já tinha vindo a óbito. A vítima foi
levada para o IML de Registro/SP.
Que o tempo estava nublado, mas com boas condições de navegar, maré de
vazante e mar calmo.
Amilcar Rubio Lobosco, em seu depoimento declarou, em resumo, que a

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vítima era seu filho; que na sexta-feira dia 09/05/2014 recebeu um telefonema do
Condutor Waldemar mas quem falou com ele foi o Antonio e explicou que o seu pai tinha
sofrido um acidente com o barco e não teria resistido aos ferimentos.
Valdemar Tsukamoto, em seu depoimento declarou, em resumo, que era o
condutor; que há mais de 10 anos era pescador não só na região do acidente, mas também
em Mato Grosso; que por volta das 15h30min não percebeu que estava navegando
próximo à margem e não observou a existência de pedras no local, vindo a colidir com
uma delas. Apesar de estar numa velocidade reduzida ainda assim ele e outro ocupante
foram lançados para a proa da embarcação. Sendo que o Ivan não sabe exatamente onde
ele bateu com a cabeça, se foi na pedra ou na própria embarcação.
Laudo de Exame Pericial, ilustrado com fotos, concluiu que a causa
determinante foi o fato de o condutor não conhecer a área navegada, e desta forma
acabou colidindo com uma pedra existente no local.
No Relatório, o Encarregado do Inquérito, após resumir o depoimento de
duas testemunhas, descrever a sequência dos acontecimentos, analisar os dados obtidos
do Laudo e dos depoimentos, concluiu que o condutor informou que, como condutor da
embarcação, era a primeira vez que ia pescar na parte de cima do canal, e ao informar que
não havia conduzido embarcação naquela região, e que, por não achar condutor e resolver
conduzir o bote “HAPPY X”, o ARA Valdemar agiu de maneira precipitada colocando
em risco a si mesmo e a vítima, ao conduzir a embarcação próxima da margem, local que
além de pedras, como é o caso destes autos, costumeiramente encontram-se outros
obstáculos que representam risco à navegação.
A falta de aptidão para conduzir uma embarcação na região ficou
demonstrada. Navegou próximo da margem, em região com pedras, não manteve
vigilância, aguardando aviso de qualquer perigo do passageiro que sequer sabia se estava
acordado.
Por conduzir o bote com a habilitação vencida, incorreu na infração do art. 11
do Decreto nº 2596/98(RLESTA).
Apontou como possível responsável pelo Acidente da Navegação o ARA
Valdemar Tsukamoto. Por conduzir o bote com a habilitação vencida incorreu na infração
do art. 11 do Decreto nº 2596/98(RLESTA).

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Notificado o indiciado apresentou defesa prévia.
A D. Procuradoria ofereceu representação contra Valdemar Tsukamoto,
condutor do bote “HAPPY X”, com fulcro no art. 14, alínea a, da Lei nº 2.180/54,
sustentando, em resumo, após descrever os fatos e fundamentos, e compulsados os autos,
o representado agiu de forma imprudente e imperita, faltando com seu dever de cuidado
na condução da embarcação, além de ser negligente no desempenho de sua função ao
deixar de cumprir o seu dever com relação a salvaguarda da vida humana, não mantendo
uma atenção apropriada, deixando de cumprir as normas de segurança da navegação, não
avaliando o risco iminente, risco este que acabou por configurar-se com a colisão em
análise.
Recebida a representação e citado, o representado, que não possui
antecedentes no Tribunal Marítimo, foi regularmente defendido.
Valdemar Tsukamoto, por I. advogado constituído em sua defesa técnica,
alegou que afirmar que o fato do Condutor não conhecer a área o torna imprudente, é
surrealmente inverídico. Seria o mesmo que dizer-se que por não conhecer uma estrada
ou local, as pessoas não devem por ali transitar sob pena de serem imprudentes. Que
quanto à imperícia o Representado já afirmara sua habilidade e experiência conduzindo
barco em inúmeros locais, nem sempre conhecidos como a vasta área do Pantanal.
Que a região do acidente não é tão perigosa como transparece. Quis o destino
colocar uma pedra submersa no caminho do Representeado.
Na instrução, nenhuma prova foi produzida.
Em alegações finais, falaram as partes.
Decide-se.
De tudo o que consta nos presentes autos, conclui-se que a natureza e
extensão do acidente da navegação sob análise, tipificado no art. 14, alínea a, da Lei n°
2.180/54, ficaram caracterizadas como colisão de bote com pedras submersas
arremessando seus dois ocupantes na direção da proa e provocando a morte do ocupante
Ivan Raymundo Lobosco.
A causa determinante foi erro de navegação.
Analisando-se os autos verifica-se que o Arrais Amador Valdemar
Tsukamoto, muito embora ser um experiente navegador na área, não havia navegado na

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parte de cima do canal, e realizava suas pescarias somente na parte de baixo do mesmo
canal do lado de quem vem do Porto de Cubatão. Que o tempo estava nublado, mas com
boas condições de navegar, maré de vazante e mar calmo, presumindo-se boas condições
de visibilidade.
Do conjunto probatório extrai-se que o condutor Valdemar aproximou-se
muito da margem por onde encontram-se pedras submersas que representam perigo a
navegação. Infere-se que a velocidade empreendida estava acima da velocidade daquela
de segurança permitida para o local, vez que a colisão com o objeto fez com que os dois
ocupantes fossem arremessados na direção da proa, momento em que a infeliz vítima
Ivan chocou sua cabeça provavelmente contra a própria estrutura da embarcação ou
contra objeto submerso, provocando-lhe traumatismo craniano, vindo a óbito antes de dar
entrada em unidade hospitalar para ser socorrido.
Assim, observa-se que o Representado Valdemar Tsukamoto foi imprudente
ao conduzir sua embarcação muito próximo da margem do canal, em região com pedras,
cometendo erro de navegação, além de desenvolver velocidade tal, que ao chocar-se com
um objeto não identificado, muito provavelmente uma pedra que aflorava a lâmina
d’água, arremessou os dois ocupantes na direção da proa da lancha provocando o óbito de
Ivan Raymundo Lobosco.
Pelo exposto, deve-se considerar procedente a representação da PEM,
responsabilizando pelo acidente da navegação o ARA Valdemar Tsukamoto. Na
aplicação da pena deve ser considerada a circunstância atenuante em favor do
Representado, eis que atualmente conta com mais de 71 anos, muito embora na ocasião
do acidente contava com 67 anos, mas o Ordenamento Jurídico Pátrio considera o idoso
todo aquele que completa 60 anos de idade, portanto, aplica-se o art. 139, I da LOTM.
Deve-se oficiar à Capitania dos Portos de São Paulo a infração ao RLESTA, art. 12.
Infrações relativas à documentação de habilitação: III - portar a documentação relativa à
habilitação desatualizada cometida pelo ARA Valdemar Tsukamoto.
Assim,
ACORDAM os Juízes do Tribunal Marítimo, por unanimidade: a) quanto à
natureza e extensão do acidente da navegação: colisão de bote com pedras submersas
arremessando seus dois ocupantes na direção da proa e provocando a morte do ocupante

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Ivan Raymundo Lobosco; b) quanto à causa determinante: erro de navegação; c) decisão:
julgar o acidente da navegação previstos no art. 14, alínea a, da Lei nº 2.180/54, como
decorrentes de imprudência de Valdemar Tsukamoto, condenando-o à pena de
repreensão, de acordo com o art. 121, inciso I, c/c art. 124, inciso I e IX, art. 135, inciso I
e art. 139, inciso I, da Lei nº 2.180/54, com a redação dada pela Lei nº 8.969/94.
Pagamento das custas processuais na forma da lei; e d) medidas preventivas e de
segurança: oficiar à Capitania dos Portos de São Paulo a infração ao RLESTA, art. 12,
inciso III, cometida pelo ARA Valdemar Tsukamoto.
Publique-se. Comunique-se. Registre-se.
Rio de Janeiro, RJ, em 16 de agosto de 2018.

GERALDO DE ALMEIDA PADILHA


Juiz-Relator

Cumpra-se o Acórdão, após o trânsito em julgado.


Rio de Janeiro, RJ, em 5 de outubro de 2018.

WILSON PEREIRA DE LIMA FILHO


Vice-Almirante (RM1)
Juiz-Presidente
PEDRO COSTA MENEZES JUNIOR
Primeiro-Tenente (T)
Diretor da Divisão Judiciária
AUTENTICADO DIGITALMENTE

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Assinado de forma digital por COMANDO DA MARINHA
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cn=COMANDO DA MARINHA
Dados: 2018.12.10 14:02:35 -02'00'

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