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Teoria e Prática na Engenharia Civil, n.5, p.

1-10, Agosto, 2004

Processos simplificados para cálculo de flechas de vigas de


concreto armado

Simplified procedures to prediction of deflections of reinforced


concrete beams

JOSÉ MILTON DE ARAÚJO


Departamento de Materiais e Construção – FURG, Rio Grande, RS
e-mail: ed.dunas@mikrus.com.br

RESUMO

O objetivo deste trabalho é avaliar a precisão de alguns métodos simplificados para o cálculo de flechas
em vigas de concreto armado. Para isto, desenvolve-se um modelo para análise não-linear, o qual é
utilizado na aferição dos processos simplificados. Os métodos simplificados analisados são o método
bilinear do CEB, uma fórmula prática apresentada no código modelo CEB-FIP/90 e o método do ACI,
adotado na NBR-6118. Os resultados obtidos indicam que este último método não deve ser utilizado para o
cálculo das flechas de longa duração das vigas de concreto armado.

ABSTRACT

The subject of this work is to analyze some simplified methods to prediction of deflections of reinforced
concrete beams. A nonlinear model is developed and it is employed to verify simplified procedures.
Simplified methods considered are the bilinear method of CEB, an approximate equation presented in the
CEB-FIP/90 model code and the ACI method, which is adopted by Brazilian norm NBR-6118. Obtained
results indicate that this last method is not recommended to calculate long-term deflections of reinforced
concrete beams.

1 - INTRODUÇÃO consideram-se as resistências médias dos


materiais, no lugar das resistências de cálculo
O projeto das estruturas de concreto armado empregadas no dimensionamento.
envolve duas etapas distintas, porém de igual De acordo com as normas de projeto, em
importância para a obtenção de uma estrutura bem particular a NBR-6118(6), as flechas das vigas
projetada. Numa primeira etapa, avaliam-se as devem ser calculadas para as combinações quase
cargas e os esforços solicitantes e realiza-se o permanentes do carregamento, incluindo-se os
dimensionamento dos diversos elementos efeitos da fissuração e das deformações diferidas
estruturais, introduzindo-se os coeficientes de do concreto.
segurança. Esta é a etapa correspondente à análise As combinações quase permanentes são
dos estados limites últimos, onde a preocupação combinações de ações que podem atuar durante
fundamental é com a segurança da estrutura. grande parte do período de vida da estrutura, da
Numa segunda etapa, deve-se verificar os ordem da metade deste período. Em cada
estados limites de utilização: estado limite de combinação, as ações permanentes são
abertura das fissuras e estado limite de consideradas com os seus valores integrais e as
deformações excessivas. Para essas verificações, ações variáveis são consideradas com os seus
consideram-se as combinações de serviço das valores reduzidos por meio de um coeficiente
ações, ou seja, os esforços são obtidos para o ψ 2 < 1 , estabelecidos na NBR-8681(7).
carregamento de serviço, sem a introdução de No caso particular dos edifícios, quando se
coeficientes de majoração. Da mesma forma, consideram apenas as cargas permanentes e as
2 Teoria e Prática na Engenharia Civil, n.5, p.1-10, Agosto, 2004 .

cargas acidentais, a carga de serviço na No caso das vigas de concreto armado,


combinação quase permanente, po , é dada por submetidas às cargas de serviço, a colaboração do
concreto tracionado entre fissuras é de extrema
po = g + 0,3q (1) importância. Esse comportamento pode ser
modelado através de um diagrama tensão-
deformação enrijecido para a armadura, ou através
onde g e q representam os valores característicos de um diagrama tensão-deformação para o
das cargas permanentes e da carga acidental, concreto tracionado(3).
respectivamente. Por outro lado, deve-se levar em conta os
Uma vez que a análise é feita para as cargas de efeitos da fluência e da retração do concreto, o
serviço, admite-se que as tensões de compressão que pode ser feito através de modelos reológicos
na estrutura são pequenas o bastante para que se com diferentes níveis de sofisticação(8). O
possa considerar um comportamento elástico emprego dos modelos reológicos, baseados na
linear para o concreto. Dessa forma, podem ser cadeia de Maxwell ou na cadeia de Kelvin, requer
elaborados processos simplificados de análise, nos uma integração no tempo, na qual as deformações
quais a única fonte de não-linearidade é da estrutura são obtidas passo a passo. Esse
decorrente da fissuração do concreto. Com isso, procedimento é oneroso e desnecessário em nível
consegue-se uma razoável simplificação, o que de projeto, especialmente no projeto dos edifícios,
facilita o projeto das estruturas de concreto pelas seguintes razões:
armado. - a integração no tempo leva a resultados que
No cálculo das flechas das vigas, deve-se levar são dependentes da função de fluência utilizada;
em conta a fissuração, a fluência e a retração do - os resultados experimentais indicam uma
concreto. Para a intensidade do carregamento enorme variabilidade na lei de evolução das
quase permanente, a colaboração do concreto deformações diferidas do concreto, de modo que
tracionado entre fissuras pode ser muito qualquer função de fluência que for adota
importante, devendo ser incluída na análise. representa apenas uma estimativa grosseira do
A análise pode ser feita com diferentes níveis comportamento do concreto;
de sofisticação, desde a análise não-linear até o - o carregamento quase permanente empregado
emprego de fórmulas simplificadas que procuram na análise representa apenas um valor
representar uma rigidez equivalente da viga convencional das reais cargas de longa duração
fissurada. que atuam na estrutura;
O objetivo deste trabalho é avaliar a precisão - a história do carregamento real na estrutura é
de alguns desses métodos simplificados para o desconhecida, podendo variar bastante de uma
cálculo de flechas em vigas de concreto armado. estrutura para outra.
Para isto, considera-se como referência o modelo Em vista disto, as análises numéricas através de
não-linear apresentado na seção 2. Os métodos cadeias reológicas, apesar de representarem com
simplificados analisados são os seguintes: método maior fidelidade o comportamento do concreto,
bilinear do CEB(9), fórmula prática do CEB/90(10) perdem sentido quando aplicadas ao projeto das
e fórmula do ACI(1), adotada na atual NBR- estruturas reais dos edifícios. Nesses casos,
6118(6). interessa estimar a resposta final da estrutura, a
partir de parâmetros de entrada também estimados
2 - MODELO NÃO-LINEAR PARA para as cargas e para as propriedades dos
CÁLCULO DE FLECHAS EM VIGAS DE materiais, particularmente as propriedades
CONCRETO ARMADO mecânicas do concreto. Dessa forma, o modelo
não-linear deve ter o equilíbrio entre a precisão
Para se efetuar um cálculo rigoroso das numérica e a simplicidade, compatível com a
deformações em vigas de concreto armado, deve- realidade.
se levar em conta a não-linearidade física O modelo não-linear utilizado neste trabalho
decorrente do comportamento mecânico dos tem sua precisão demonstrada em diversos
materiais. Para isto, é necessário adotar diagramas trabalhos anteriores(2,5) e permite obter as flechas
tensão-deformação compatíveis com os resultados prováveis das vigas de concreto armado.
obtidos experimentalmente.
Teoria e Prática na Engenharia Civil, n.5, p.1-10, Agosto, 2004 3 .

Na fig. 1, representa-se o diagrama tensão- Para levar em conta a fluência do concreto,


deformação do concreto, obtido em um ensaio de considera-se o módulo de deformação efetivo
compressão simples. Ece , dado por
E
σc E ce = c (5)
1+ ϕ
fc
Para o concreto tracionado, adota-se o
diagrama tensão-deformação indicado na fig. 2.
σct
Ece
fct
1

σct,lim
εo εu εc Ec
Ece
Fig. 1 – Diagrama tensão-deformação do concreto
comprimido εct
εcr
De acordo com o CEB/90(10), a tensão de Fig. 2 – Diagrama tensão-deformação para o
compressão no concreto, σ c , é dada por concreto tracionado

 kη − η 2  A tensão de tração no concreto, σ ct , é dada por


σ c = − fc   (2)
1 + (k − 2)η 
σ ct = E ceε ct ≤ σ ct ,lim (6)
onde k = − Eceε o f c , η = ε c ε o e ε c é a
deformação de compressão. onde ε ct é a deformação de tração e σ ct ,lim é a
Para a deformação ε o , correspondente à máxima tensão de tração para o concreto
máxima tensão de compressão, adota-se o valor fissurado, dada por
ε o = −0,0022(1 + ϕ ) , onde ϕ é o coeficiente de
0, 6
fluência do concreto. A deformação de ruptura é ε 
σ ct ,lim = f ct  cr  (7)
ε u = −0,0035(1 + ϕ ) .  ε ct 
O módulo de deformação longitudinal inicial,
Ec , é obtido a partir da resistência média à onde ε cr = f ct Ec é a deformação de fissuração.
compressão, f c , através da expressão A equação (7) leva em conta a colaboração do
concreto tracionado entre fissuras e reproduz
satisfatoriamente os resultados experimentais,
E c = 21500 ( f c 10)1 3 (3)
conforme pode ser verificado na referência [2].
De acordo com o CEB/90, a resistência à
com f c e Ec em MPa. tração do concreto, f ct , pode ser estimada, a
De acordo com as recomendações do CEB/90, partir da resistência característica à compressão,
a resistência média à compressão pode ser através da expressão
estimada como
23
f c = f ck + 8 MPa f 
(4) f ct = 1,40 ck  (8)
 10 
onde f ck é a resistência característica à
com f ck e f ct em MPa.
compressão do concreto, em MPa.
4 Teoria e Prática na Engenharia Civil, n.5, p.1-10, Agosto, 2004 .

Conforme se observa, o modelo constitutivo é de Gauss-Legendre, para a determinação das


uma extensão do método do módulo efetivo, para ações nodais não-lineares.
o caso não-linear. Esse modelo é satisfatório Na fig. 4, indica-se a seção transversal
quando as variações de tensão no concreto, que analisada e a discretização da mesma em n faixas,
ocorrem durante o seu envelhecimento, são para as integrações numéricas ao longo da altura
pequenas. Se o concreto sofrer grandes variações da seção.
de tensão ao longo do tempo, o modelo pode ser n
melhorado adotando-se o módulo de deformação d'
ajustado. Isto é equivalente a considerar um h/2
A's
coeficiente de fluência ajustado ϕ a = ζϕ , onde ζ h d
A zi
é o coeficiente de envelhecimento(3). Em geral, s
pode-se considerar ζ = 0,8 .
1
Na presente análise, como considera-se que a b
carga quase permanente po não sofre variação ao
longo do tempo, pode-se adotar ζ = 1 com uma Fig. 4 – Seção transversal e discretização
em faixas
boa aproximação.
A deformação total no concreto, ε c,tot , é dada
Empregando o método dos elementos finitos, a
por deformação axial ε x em uma fibra genérica da
ε c,tot = ε cσ + ε cs (9) seção, situada a uma distância z do eixo da barra,
é dada por
onde ε cσ é a parcela da deformação dependente
da tensão aplicada e ε cs é a deformação de ε x = ε o + zχ (10)
retração.
Desse modo, as tensões no concreto são obtidas onde ε o e χ representam a deformação axial e a
com o modelo anterior, considerando a parcela da curvatura, obtidas a partir dos deslocamentos
deformação ε cσ = ε c,tot − ε cs . nodais do elemento.
Para o aço, adota-se o diagrama tensão- A expressão (10) é empregada para calcular a
deformação representado na fig. 3, para tração e deformação nas camadas de aço, bastando usar
para compressão. para z a distância da camada até o eixo da barra.
Entrando com essa deformação no diagrama
σs
tensão-deformação da fig. 3, obtém-se a tensão
fy σ s nas armaduras.
A expressão (10) fornece as deformações totais
no concreto, incluindo a fluência e a retração. A
Para tração e
deformação mecânica ε cσ é dada por
compressão
Es
ε cσ = ε o + zχ − ε cs (11)
εy εs
onde z = z i , com i = 1,..., n , representa a distância
Fig. 3 – Diagrama tensão-deformação
do centro da faixa de concreto até o eixo da barra.
para o aço
Com a deformação ε cσ , emprega-se o modelo
A análise estrutural é feita com o método dos constitutivo para o concreto, obtendo-se a tensão
elementos finitos, conforme descrito no capítulo 9 no centro de cada faixa.
da referência [4]. O elemento empregado é o A partir daí, segue-se o procedimento descrito
tradicional elemento de pórtico plano, com dois em [4] para obter os deslocamentos da estrutura
nós e três graus de liberdade por nó. Em cada correspondentes a um determinado nível de carga.
elemento, consideram-se três pontos de integração Empregando um processo incremental no
carregamento, pode-se obter uma resposta
Teoria e Prática na Engenharia Civil, n.5, p.1-10, Agosto, 2004 5 .

completa até a ruína da estrutura, ou até um nível onde rcs1 e rcs 2 são coeficientes dependentes das
de carga desejado. taxas de armadura, ε cs é a deformação específica
Considera-se a ocorrência da ruína, quando a
deformação de compressão no concreto for menor de retração, l é o vão da viga, d é a altura útil da
ou igual a ε u = −0,0035(1 + ϕ ) , ou quando a seção transversal, α e f r são coeficientes que
dependem da vinculação da viga.
deformação de tração na armadura alcançar o
valor limite de 0,010 . Para uma viga biapoiada, α = 8 e f r = 1 .
Os coeficientes rcc1 , rcc 2 , rcs1 e rcs 2 podem
3 – MÉTODO BILINEAR DO CEB ser obtidos das tabelas apresentadas na referência
[3].
De acordo com o método bilinear do CEB(9), Assim, a flecha W , levando em conta a
descrito em detalhes na referência[3], a flecha W colaboração do concreto tracionado entre fissuras,
da viga é obtida por interpolação da flecha W1 , é interpolada na forma
calculada no estádio I, e da flecha W2 , calculada
W = (1 − η )W1 + ηW2 (18)
no estádio II puro. Essas flechas são dadas por
onde
W1 = W1 (t o ) + (∆W1 )cc + (∆W1 )cs (12) η = 0 , se M < M r (19)

η = 1 − 0,5 M r M , se M ≥ M r (20)
W2 = W2 (t o ) + (∆W2 )cc + (∆W2 )cs (13)
Nas equações (19) e (20), M é o momento
onde fletor solicitante e M r é o momento de
W1 (t o ) e W2 (t o ) = flechas no instante inicial t o ,
fissuração.
calculadas no estádio I e no estádio II puro; Deve-se observar que o coeficiente η varia ao
(∆W1 )cc e (∆W2 )cc = incrementos de flecha longo do eixo da viga pois, tanto M , quanto M r ,
devidos à fluência do concreto, calculados no variam de seção para seção transversal. Na
estádio I e no estádio II puro; prática, é necessário adotar um valor constante
(∆W1 )cs e (∆W2 )cs = incrementos de flecha para η , calculado para uma seção crítica. Do
devidos à retração do concreto, calculados no mesmo modo, as flechas W1 e W2 devem ser
estádio I e no estádio II puro. calculadas considerando a rigidez da seção crítica.
Os incrementos de flecha devidos à fluência do Assim, a rigidez no estádio I, K I , e a rigidez no
concreto são dados por
estádio II puro, K II , são obtidas com as
(∆W1 )cc = rcc1ϕW1 (t o ) (14) armaduras existentes na seção crítica.
No caso de uma viga biapoiada ou de uma viga
contínua, a seção crítica é considerada no meio do
(∆W2 )cc = rcc 2ϕW2 (t o ) (15) vão. Para os balanços, a seção crítica corresponde
ao extremo engastado.
onde rcc1 e rcc 2 são coeficientes que dependem Observa-se que a flecha é calculada em uma
das taxas de armadura na seção transversal. seção de referência, que pode não coincidir com a
Os incrementos de flecha devidos à retração do seção crítica.
concreto são dados por O momento de fissuração é dado por

K I f ct
l2 Mr = (21)
(∆W1 )cs = rcs1ε cs fr (16) Ecs (h − x I )
αd

l2 onde Ecs = 0,85E c é o módulo de deformação


(∆W2 )cs = rcs 2ε cs fr (17) longitudinal secante do concreto, h é a altura da
αd
6 Teoria e Prática na Engenharia Civil, n.5, p.1-10, Agosto, 2004 .

seção e x I é a profundidade da linha neutra no


estádio I. M 
3   M 3 
Se as armaduras forem desprezadas, x I = 0,5h I eq =  r  I c + 1 −  r   I 2 ≤ I c (24)
 M    M  
e K I = Ecs bh 3 12 , resultando a expressão
onde
2
aproximada M r = bh f ct 6 .
As expressões de x I , K I e K II podem ser I c = momento de inércia da seção de concreto
obtidas na referência [3]. simples;
I 2 = momento de inércia da seção de concreto
4 – FÓRMULA PRÁTICA DO CEB/90 armado no estádio II puro;
M = momento fletor solicitante;
O CEB/90(10) recomenda uma fórmula prática M r = momento de fissuração.
para o cálculo das flechas das vigas fissuradas sob
as cargas de serviço. Inicialmente, calcula-se a De acordo com a NBR-6118, o momento de
flecha de referência Wc , considerando a rigidez fissuração é dado por
E cs I c da seção de concreto simples, onde Ecs é o
módulo secante e I c é o momento de inércia da αI c f ct
Mr = (25)
seção de concreto simples (no estádio I e sem a yt
consideração das armaduras).
A flecha W , incluindo os efeitos da fluência e onde yt é a distância do centróide da seção à fibra
da fissuração do concreto, é dada por mais tracionada.
O coeficiente α tem os seguintes valores:
h
3 α = 1,2 para seções T ou duplo T;
W =   K t (1 − 20 ρ ′)Wc (22) α = 1,5 para seções retangulares.
d 

onde ρ = As (bd ) , ρ ′ = As′ (bd ) e o coeficiente No caso das seções retangulares, o momento de
fissuração passa a ser dado por M r = bh 2 f ct 4 .
K t é dado em uma tabela, em função da taxa de
armadura tracionada ρ . O momento de inércia I 2 é igual a K II Ecs ,
Conforme a referência [3], o coeficiente K t onde K II é a rigidez no estádio II, determinada
pode ser escritos na forma como na referência [3].
Entretanto, de acordo com a NBR-6118, o
módulo de deformação secante do concreto é dado
K t = 0,09547 ρ −0,71186 (23) por
E cs = 0,85 x5600 f ck , MPa (26)
A flecha obtida com a expressão (22) não
inclui os efeitos da retração do concreto. Esse
efeito pode ser considerado, a favor da segurança, A flecha adicional ∆W , incluindo os efeitos
das deformações diferidas do concreto, é dada por
adicionando-se ao valor de W a parcela (∆W2 )cs
dada na equação (17).  f (t ) − f (t o ) 
∆W =  W (t o ) (27)
5 – CÁLCULO DE FLECHAS EM VIGAS  1 + 50 ρ ′ 
SEGUNDO A NBR-6118
onde ρ ′ = As′ (bd ) é a taxa da armadura de
compressão na seção crítica e a função f (t ) é
(6)
A NBR-6118 adota o processo simplificado
do ACI(1) para o cálculo de flechas das vigas de dada por
concreto armado. A flecha inicial W (t o ) é obtida
f (t ) = 0,68 x0,996 t t 0,32 ≤ 2 (28)
considerando-se um momento de inércia
equivalente I eq , dado por com t em meses.
Teoria e Prática na Engenharia Civil, n.5, p.1-10, Agosto, 2004 7 .

Considerando t o ≅ 1 mês e t ≥ 70 meses, compressão. Para a armadura tracionada, respeita-


resulta se a área mínima de 1,50cm2.
 1,32  Na tabela 1, apresentam-se os resultados do
∆W =  W (t o ) (29) dimensionamento das vigas.
1 + 50 ρ ′ 
Tabela 1 – Armaduras das vigas
que é a expressão adotada nos exemplos Viga Cargas (kN/m) Armaduras (cm2)
apresentados a seguir. pk po As As′
A flecha final da viga é dada por
V1 5 4,5 1,50 0,62
V2 10 9,0 2,29 0,62
W = W (t o ) + ∆W (30)
V3 15 13,5 3,52 0,62
V4 20 18,0 4,83 0,62
6 - RESULTADOS V5 25 22,5 6,22 0,62
V6 30 27,0 7,72 0,62
Os resultados apresentados neste trabalho
V7 35 31,5 9,36 0,62
referem-se à viga biapoiada representada na fig. 5.
V8 40 36,0 11,18 0,62
V9 45 40,5 13,00 0,62
4
V10 50 45,0 14,20 1,52
A's
p h=50 46
l=500 cm As Na análise não-linear, considera-se o módulo
de deformação longitudinal tangente do concreto,
dado pelas expressões (3) e (4), conforme o
b=20 CEB/90. Para um concreto com f ck = 20 MPa,
resulta E c = 30303 MPa. No método bilinear e na
Fig. 5 – Carregamento e geometria da viga
fórmula prática do CEB, emprega-se o módulo
A viga é submetida a uma carga secante, cujo valor é Ecs = 25757 MPa, conforme
uniformemente distribuída, composta pela parcela o CEB/90.
permanente, g , e pela parcela acidental, q . No método da NBR-6118, adota-se o módulo
Admitindo que q ≅ 0,15 g e considerando a secante Ecs = 21287 MPa, conforme a equação
equação (1), resulta po = 0,90 p k , onde (26).
p k = g + q é a carga total de serviço atuante na Em todos os casos, adota-se E s = 200 GPa
viga. como sendo o módulo de elasticidade do aço.
Em todos os exemplos, considera-se um Na fig. 6, apresentam-se as respostas da viga
V3, obtidas com o modelo não-linear. Nessa
concreto com f ck = 20 MPa e o aço CA-50
figura, Wo representa a flecha inicial, Wo,c é a
( f yk = 50 kN/cm2). O coeficiente de fluência do
flecha inicial acrescida dos efeitos da fluência e
concreto é ϕ = 2,5 e a deformação de retração é Wo,c + s é a flecha total, incluindo a fluência e a
considerada igual a ε cs = −50 x10 −5 . retração. A análise é feita até a carga de 20kN/m,
Para um dado valor da carga de serviço, inferior à carga de ruptura da viga.
realiza-se o dimensionamento da seção retangular Pela fig. 6, observa-se que a carga quase
indicada na fig. 5, considerando os coeficientes permanente é maior que a carga de fissuração.
parciais de segurança γ f = 1,4 (para majorar as Logo, a viga V3 está no estádio II, quando
cargas), γ c = 1,4 (para minorar a resistência à submetida ao carregamento quase permanente.
Isto ocorre para todas as vigas analisadas, exceto
compressão do concreto) e γ s = 1,15 (para para a viga V1, que se encontra no estádio I
minorar a tensão de escoamento do aço). Quando quando submetida à carga quase permanente.
o dimensionamento indicar a solução com Logo, para a viga V1, não se aplica a fórmula
armadura simples, adota-se a área As′ = 0,62 cm2 prática indicada na seção 4.
(área de 2 barras de 6,3mm) como armadura de
8 Teoria e Prática na Engenharia Civil, n.5, p.1-10, Agosto, 2004 .

20.0 deformações diferidas do concreto, pois ela é

Wo
independente do carregamento. Essa expressão

,c

+s
Wo

o,c
subestima os efeitos das deformações diferidas

W
15.0
po = 13,5 kN/m
para vigas com uma carga pequena, com M < M r
(no estádio I), ou com M pouco maior que M r
Carga (kN/m)

Estádio II (no início do estádio II). Por outro lado, a


10.0
expressão (27) superestima as deformações
diferidas para vigas em avançado estado de
Início da fissuração
fissuração, quando M >> M r .
5.0
Estádio I
3.5
0.0
0.0 5.0 10.0 15.0 20.0 25.0 3.0
Flecha no centro (mm)

Coeficientes Rcc e Rcs


2.5
Fig. 6 – Respostas para a viga V3, obtidas com o
modelo não-linear 2.0

Por analogia com a equação (29), pode-se 1.5


NBR-6118
escrever
1.0
Rcs
Wo,c − Wo = RccWo (31)
0.5 Rcc

Wo,c + s − Wo = RcsWo (32) 0.0


10.0 12.0 14.0 16.0 18.0 20.0
Carga (kN/m)
onde os coeficientes globais Rcc e Rcs permitem
Fig. 7 – Coeficientes globais para cálculo da
obter os acréscimos de flecha decorrentes da flecha diferida – para a viga V3
fluência e decorrentes da fluência mais a retração,
respectivamente. Na fig. 8, apresenta-se a flecha inicial no meio
Na fig. 7, apresentam-se as variações dos do vão das 10 vigas analisadas, quando as mesmas
coeficientes Rcc e Rcs obtidos para a viga V3 estão submetidas às respectivas cargas quase
com o modelo não-linear. Na mesma figura, permanentes, conforme a tabela 1. Observa-se que
indica-se a relação proposta na NBR-6118, por a fig. 8 não representa uma relação carga-
meio da expressão (29). deslocamento, pois cada ponto corresponde a uma
Observa-se pela fig. 7 que os coeficientes Rcc e viga com armadura diferente.
Rcs são fortemente dependentes do nível do Conforme se verifica na fig. 8, tanto o método
bilinear, quanto o método da NBR-6118 (equação
carregamento. Esses coeficientes são maiores no
24), se aproximam bastante do modelo não-linear.
estádio I, quando as cargas são pequenas e o
As pequenas diferenças verificadas entre os
concreto não está fissurado. À medida que a
diversos métodos são devidas às diferentes
fissuração se propaga, em decorrência do aumento
definições para o momento de fissuração e para o
do carregamento, os coeficientes vão diminuindo.
módulo de deformação longitudinal do concreto.
Conclui-se, portanto, que os acréscimos de flecha
Entretanto, as variações são da ordem de 10% na
devidos às deformações diferidas do concreto
maioria dos casos. Assim, conclui-se que as
dependem do grau de fissuração da viga, o qual
flechas iniciais das vigas podem ser avaliadas por
pode ser medido pela relação entre o momento
qualquer um desses métodos simplificados.
fletor solicitante M e o momento de fissuração
Mr .
Desse modo, a relação (27), indicada na NBR-
6118, não representa adequadamente as
Teoria e Prática na Engenharia Civil, n.5, p.1-10, Agosto, 2004 9 .

Na fig. 10, apresentam-se as flechas Wo,c + s


incluindo os efeitos da fluência e da retração.
Observa-se que, mesmo considerando a retração, a
flecha final é menor ou igual à flecha admissível
para todas as vigas, quando o cálculo é feito com
o modelo não-linear, com o método bilinear ou
através da fórmula prática. Apenas a formulação
da NBR-6118 indica que 6 vigas apresentam
flecha maior que a flecha admissível. Isto ocorre
porque a equação (27) superestima os efeitos das
deformações diferidas do concreto.

Fig. 8 – Flecha inicial para as cargas quase


permanentes pelos diferentes métodos

Na fig. 9, apresentam-se as flechas Wo,c


incluindo os efeitos da fluência (mas sem
considerar a retração) para as vigas analisadas.

30.0
Flecha inicial + fluência (mm)

25.0

Flecha admissível
20.0
Fig. 10 – Flecha total pelos diferentes métodos
15.0
7 - CONCLUSÕES
Não-linear
10.0
Método bilinear
Os resultados apresentados neste trabalho
indicam uma boa concordância entre os modelos
5.0 Fórmula prática
simplificados, no que se refere ao cálculo das
NBR-6118
flechas iniciais das vigas de concreto armado.
0.0 Neste caso, o método bilinear e o método adotado
0.0 10.0 20.0 30.0 40.0 50.0 pela NBR-6118 fornecem resultados compatíveis
Carga quase permanente (kN/m)
com a análise não-linear.
Fig. 9 – Flecha inicial acrescida da fluência pelos Quando se consideram as deformações
diferentes métodos diferidas do concreto, verifica-se uma boa
concordância do método bilinear e da fórmula
Conforme se observa na fig. 9, tanto o método prática do CEB em relação à análise não-linear.
bilinear, quanto a fórmula prática do CEB/90, Qualquer um desses dois métodos simplificados
concordam satisfatoriamente com o modelo não- pode ser utilizado para a avaliação das flechas das
linear. Entretanto, a formulação da NBR-6118 vigas sob cargas de longa duração.
fornece valores excessivos para a flecha final das Entretanto, o método da NBR-6118 não
vigas com carga superior a 15kN/m. Para 6 vigas reproduz satisfatoriamente os efeitos das
analisadas, o método da NBR-6118 indica que a deformações diferidas do concreto na resposta das
flecha final é maior que a flecha admissível, o que vigas de concreto armado. Esse método subestima
contraria todos os demais métodos. as flechas das vigas pouco solicitadas, quando elas
ainda se encontram no estádio I, ou no início do
10 Teoria e Prática na Engenharia Civil, n.5, p.1-10, Agosto, 2004 .

estádio II (na região de formação das fissuras). 9. Comité Euro-International du Béton – CEB
Por outro lado, o método da NBR-6118 Design Manual on Cracking and Deformations.
superestima as flechas das vigas mais solicitadas, Lausanne, 1985.
em um estado de fissuração mais adiantado.
Em vista dos resultados apresentados, pode-se 10. Comité Euro-International du Béton - CEB-
recomendar tanto o método bilinear, quanto a FIP Model Code 1990. Lausanne, 1993.
fórmula prática do CEB/90 para o cálculo das
flechas das vigas de concreto armado, incluindo-
se os efeitos das deformações diferidas.
Entretanto, não se recomenda o emprego do
método da NBR-6118, em virtude das imprecisões
mostradas neste trabalho.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. American Concrete Institute – Building Code


Requirements for Structural Concrete (ACI 318-
95) and Commentary (ACI 318R-95). Detroit,
1995.

2. Araújo, J. M. – Modelo para análise de vigas


de concreto armado. Revista Portuguesa de
Engenharia de Estruturas, No. 32, p.9-14, Lisboa,
Julho, 1991.

3. Araújo, J. M. – Curso de Concreto Armado.


Vol. 2. Editora Dunas, Rio Grande, 2a ed., 2003.
www.mikrus.com.br/ed.dunas

4. Araújo, J. M. – Curso de Concreto Armado.


Vol. 3, Editora Dunas, Rio Grande, 2a. ed. 2003.
www.mikrus.com.br/ed.dunas

5. Araújo, J. M. – Um modelo para análise não-


linear de lajes nervuradas de concreto armado.
Revista Engenharia, Ciência e Tecnologia, v.06,
n.2, p.3-13, UFES, Vitória, 2003.

6. Associação Brasileira de Normas Técnicas -


Projeto de Estruturas de Concreto. NBR-6118.
Rio de Janeiro, 2003.

7. Associação Brasileira de Normas Técnicas –


Ações e Segurança nas Estruturas. NBR-8681.
Rio de Janeiro, 2003.

8. Bazant, Z. P.; Prasannan, S. - Solidification


theory for concrete creep. Journal of Engineering
Mechanics, v. 115, n.8, p.1691-1725, 1989.

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