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OS ONZE ANOS DA LIMNOLOGIA NO
ESTADO DO MARANHÃO
IBAÑEZ, M. S. R.
Universidade Federal do Maranhão, Departamento de Oceanografia e Limnologia
Praça Gonçalves Dias, 21 – Centro, 65020-240, São Luís, Maranhão, Brasil

RESUMO: Os onze anos da Limnologia no Estado do Maranhão. A sinopse da origem e


evolução da Limnologia no Estado do Maranhão é apresentada contendo comentários sobre sua
situação atual e perspectivas.

Palavras-chave: Limnologia; Maranhão; Brasil; gênese; evolução.

ABSTRACT: Eleven years of Limnology in Maranhão State. A synopsis about the origin and
evolution of Limnology in Maranhão State is presented, containing comments about its actual situation
and perspectives.

Key-words: Limnology; Maranhão; Brazil; genesis; evolution.

INTRODUÇÃO

Na busca de se traçar com fidelidade os antecedentes históricos da Limnologia no Maranhão,


depara-se com vários questionamentos que se confundem de acordo com a ótica ou ângulo de visão:
ecossistema objeto de estudo, formação acadêmica original e área de atuação dos profissionais dessa
ciência.
Tomando como ponto de partida apenas a unidade ecossistêmica, no caso, os estuários, faixas
de transição correspondentes aos cursos baixos dos rios, portanto, regiões de ecótono, e do domínio
tanto da Oceanografia quanto da Limnologia, poderia-se inferir que os primórdios dessa ciência se deu
há aproximadamente três décadas, com as investigações hidrobiológicas realizadas, de forma
sistemática, no Golfão Maranhense, tendo como primeiros trabalhos publicados os de Mattews et
al.(1977) e Pitombeira e Morais (1977).
É reconhecível que no Maranhão "o caráter francamente internacional das ciências do mar não
tem deixado de influenciar favoravelmente sobre a atitude cada vez mais interdisciplinar dos
limnólogos", conforme apontado por Margalef (1983).
Como a Limnologia é uma ciência voltada à Ecologia, conservação e manejo dos ecossistemas
aquáticos continentais – ambos de água doce e salinos (Gopal & Wetzel, 1995), sua gênese no
Maranhão é fruto de uma estreita interface com ambientes e profissionais da área oceanográfica.
Ainda dentro da ótica ecossistêmica, a visita à bacia do rio Preguiças pelo carcinólogo,
oceanógrafo e limnólogo pernambucano Petrônio Alves Coelho, entre 18 de junho a 3 de julho de
1970, com vistas à pesquisa da utilização, como adubo, de suas briófitas submersas, principalmente as
do gênero Myriophyllum, foi um primeiro registro de viagem científica a uma bacia hidrográfica em
tempos recentes. A bióloga e naturalista Ilka Maria Prazeres Paixão, da Superintendência do
Desenvolvimento do Maranhão (SUDEMA), responsável por essa visita, anos mais tarde, foi a pioneira
dessa geração em defender uma dissertação de mestrado sob a orientação do limnólogo Dr. Wolfang
Johannes Junk (Paixão, 1980).

Pompêo, M. L. M. (Ed.) Perspectivas na Limnologia do Brasil.


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Ainda em 1970, em primeiro de outubro, surge o Laboratório de Hidrobiologia da Universidade


Federal do Maranhão, idealizado pelas professoras Maria Marlúcia Ferreira Correia e Ilka Maria
Prazeres Paixão, instituição que contribuiu com recursos humanos, instalações e equipamentos para a
fundação, em 1982, do Departamento de Biologia, pelo geneticista Warwick Estevam Kerr.
Voltando ao marco histórico, a idade de onze anos da Limnologia, partiu do artigo publicado
por Barbieri et al. (1989), versando sobre as características limnológicas dos lagos Açu e Viana.
A partir de 1994, desponta o Núcleo de Limnologia, resultado da ação de limnólogos
envolvidos com a crescente demanda de questões na área de recursos hídricos sob a liderança de
Florimar de Jesus Aranha (in memorian). Esse núcleo, viria a ser, dois anos mais tarde, o precursor do
Departamento de Oceanografia e Limnologia, que propiciou a consolidação e o surgimento de novas e
bem definidas linhas de pesquisa, amparadas na experiência acumulada nos últimos anos por todos os
seus diversos integrantes.
No intuito de atrair a atenção de outros limnólogos para os diversificados ambientes naturais
maranhenses, bem como lançar as bases de um programa de pós-graduação, a comunidade científica
local organizou o seminário "Recursos Hídricos do Estado do Maranhão – Bases Ecológicas para o
Desenvolvimento Auto-Sustentado", em dezembro de 1995, que contou com o apoio financeiro do
CNPq e com a presença de renomados cientistas nacionais e estrangeiros como Ramón Margalef,
Henry Dumont, José Galizia Tundisi, Carlos Eduardo de Matos Bicudo, Denise Campos Bicudo,
Francisco de Assis Esteves e Odete Rocha, principalmente, que tiveram a oportunidade de conhecer in
loco as características de alguns trechos da planície de inundação das bacias dos Rios Mearim e
Pericumã e a visão aérea dos lagos do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses.

OS LIMNÓLOGOS E A INTERDISCIPLINARIDADE

A criação do Departamento de Biologia, conforme mencionado, permitiu agregar, em 1984, aos


pesquisadores autóctones de atuação mais oceanográfica do que propriamente limnológica do
Laboratório de Hidrobiologia, os limnólogos Maria do Socorro Rodrigues Ibañez e Ricardo Barbieri. O
cunho acadêmico do Departamento de Biologia permitiu o surgimento de vários estudos que vieram a
compor as monografias dos estudantes de graduação.
A motivação para a realização de estudos de pós-graduação de mestrado e doutorado em outras
instituições nacionais e estrangeiras ocasionou o afastamento temporário de alguns pesquisadores
locais.
No sentido de fortalecer e ampliar novas linhas de pesquisa o Departamento de Oceanografia e
Limnologia agregou na década de 90, à sua equipe, os limnólogos José Policarpo Costa Neto, na
condição de professor visitante e Marcelo Luís Martins Pompêo, Viviane Moschini-Carlos e Naiza
Maria Castro Nogueira, como bolsistas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico.
Alguns dos investigadores, acima citados, que vêm tendo influência no desenvolvimento da
Limnologia regional, estão na Fig. 1.
Os descendentes intelectuais de proeminentes limnólogos como José Galizia Tundisi foram os
pesquisadores Antonio Carlos Leal de Castro, Florimar de Jesus Aranha e José Policarpo Costa Neto, o
de Wolfgang Johannes Junk foram além de Ilka Maria Prazeres Paixão, Maria do Socorro Rodrigues
Ibañez. Ricardo Barbieri foi discípulo de Francisco de Assis Esteves, enquanto Marcelo Luís Martins
Pompêo foi de Raoul Henry. Odete Rocha orientou o doutoramento de Viviane Moschini-Carlos.
A área de recursos pesqueiros, bastante afim com a Limnologia, pode contar com formadores
de expressão como Miguel Petrere Junior, Ana Emilia Amato de Moraes Vazzoler, Paulo Emílio
Vanzolini, Julio Cesar Garavello e Lúcia Helena Sipaúba Tavares, além da participação de Nivaldo
Magalhães Piorski e Antonio Carlos Leal de Castro em estudos da taxonomia e ecologia de peixes de
trechos das bacias dos Rios Itapecuru, Pericumã, Turiaçu, rios da ilha (Castro, 1997) e bacias lacustres
como Viana e Lençóis.
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(da esquerda para a direita) 1. Nivaldo Magalhães Piorski, 2. Viviane Moschini-Carlos, 3. Marcelo Luiz Martins
Pompêo, 4. Maria do Socorro Rodrigues Ibañez, 5. Maria José Saraiva Lopes, 6. Naiza Maria Castro Nogueira,
7. Maria Marlúcia Ferreira Correia, 8. Ilka Maria Prazeres Paixão, 9. José Policarpo Costa Neto, 10. Rica Barbieri.

Figura 1: Alguns profissionais atuantes em Limnologia no Estado do Maranhão.

Quanto à taxonomia vegetal, o Maranhão pode contar com a colaboração de Guacyra de Lavor
Fernandes (Lavor-Fernandes, 1988; 1990), Maria Marlúcia Ferreira Correia (Barbieri et al., 1989), Célia
Leite Sant'Anna, Carlos Eduardo de Matos Bicudo, Denise de Campos Bicudo e Raimundo Paulo
Barros Henriques, principalmente. Maria José Saraiva Lopes (Lopes, 1981/82; 1988), Janet W. Reid
(Turner & Reid, 1989), Takako Matsumura-Tundisi, Odete Rocha, Arnola C. Rietzler e Evaldo Luís
Gaeta Espíndola ofereceram contribuições na área de taxonomia do plâncton animal. Por outro lado,
Cecília Volkmer Ribeiro, desenvolveu estudos inéditos sobre as esponjas na região da Baixada e dos
Lençóis.
Ambientes afetados pela eutrofização cultural como a Lagoa da Jansen foi investigada pelo
pesquisador Jorge Salomão Boabaid Ribeiro. O fenômeno da pororoca no Rio Mearim foi avaliado
cientificamente por Bjorn Kjerfve e Helder Oliveira Ferreira.
A geologia e geomorfologia da extensa bacia do Rio Itapecuru foi analisada pelos geólogos
Ismar de Souza Carvalho e Francisco José Correia Martins.
Uma nova geração, sobretudo de pós-graduandos está sendo formada por pesquisadores como
Maria do Carmo Calijuri, Pedro Américo Cabral Senna, Claudia Padovesi Fonseca e Paulo Roberto
Saraiva Cavalcante, responsáveis pelas orientações de Andreia Araújo, Naiza Maria Castro Nogueira,
Dayani de Fátima Pereira e Mariano Oscar Anibal Ibañez Rojas, respectivamente.
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OS ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS MARANHENSES

O Maranhão possui características singulares quanto à sua fisiografia pois situa-se numa região
de transição entre a floresta tropical úmida e o sertão árido sendo dividido em sete regiões, cada uma
delas representada por diferentes biomas (Pré-Amazonia, Cocais, Litoral, Planalto, Cerrado, Baixada e
Chapadões).
O Estado é bastante privilegiado em termos de recursos hídricos tanto subterrâneos, pois ocupa
a segunda posição no Nordeste, quanto superficiais devido a nove grandes bacias hidrográficas,
predominantemente perenes (Ibañez, 1991). As peculiaridades de alguns ecossistemas aquáticos que
têm sido alvo de investigação serão descritos a seguir.

BAIXADA MARANHENSE

A várzea maranhense (1.775.035,6 ha) é formada pela invasão em terras baixas das águas dos
cursos inferiores do Rio Pericumã, Turiaçu e Mearim com seus dois grandes afluentes, o Pindaré e o
Grajaú. Os solos aluvionários de origem geológica recente conferem à região grande fertilidade e
riqueza biológica, sobretudo da fauna ictiológica.
Os inúmeros lagos dessa malha fluvial formam extensivos cordões (Lopes, 1970) entremeados
pela predominância de matas de galeria adaptadas à alagação no caso do Turiaçu, gramíneas no
Pericumã e o mangue nas porções sujeitas ao ciclo de marés. O regime hidrológico condiciona a
existência de uma diversificada fauna e flora adaptadas à grande elasticidade dos ambientes. A caça e
pesca predatórias vêm comprometendo a fauna local.
A introdução de rebanho bubalino proveniente da Ilha de Marajó, com sua superpopulação em
certos municípios, vêm causando problemas não só ambientais como a pastagem de gramíneas e
ciperáceas, o revolvimento e a compactação dos sedimentos, bem como sócio-econômicos face à
imposição de um modelo pecuarista extensivo e predatório em detrimento da pesca, vocação natural da
área.
Outros problemas ambientais como o desmatamento dos manguezais, as queimadas, a
implantação de projetos agrícolas e de irrigação, doenças de veiculação hídrica a exemplo da
esquistossomose e outras agravadas pela ausência de saneamento, a pressão antrópica exercida por 84%
da população economicamente ativa na região, aliados à influência de parte do trecho da estrada de
ferro Carajás, vêm comprometendo esses frágeis ecossistemas, detentores de lençol freático raso e
considerados similares à várzea amazônica mas com singulares atributos e mecanismos de
funcionamento.

O RIO ITAPECURU

O abastecimento de água de aproximadamente 65% do contingente populacional da capital do


Estado e de inúmeros municípios ribeirinhos tem sido um fator que vem suscitando a atenção da
comunidade científica local por essa bacia hidrográfica.
A parceria entre limnólogos locais e geólogos do Rio de Janeiro (Aranha et. al., 1998), resultou
num estudo geológico, geomorfológico e limnológico preliminar do Rio Itapecuru, um dos poucos
cujas nascentes estão protegidas (Parque Estadual do Mirador). A preocupação com as questões
conservacionistas resultou num trabalho de percepção ambiental realizado em dez municípios
ribeirinhos para se avaliar o grau de envolvimento de um segmento populacional que usufrui desse
recurso natural (Ibañez et. al., 1999).
O envolvimento do poder público com a problemática do rio fez com que a companhia
estadual de saneamento CAEMA tenha realizado o monitoramento do trecho baixo do Itapecuru, onde
está instalada a estação de captação e tratamento de água Italuís (Silva et al., 1999) e a antiga Secretaria
de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos lançou o cadastro de usuários da bacia, ação
integrante da elaboração do Plano Diretor do Itapecuru.
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LENÇÓIS MARANHENSES

Área de classificação biogeográfica denominada Reino Costeiro Intertropical (Ray e Dolan, in


MMA, 1996), os Lençóis Maranhenses são formações de cordões de dunas costeiras móveis, inseridas
nos limites do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses (155.000 ha). São consideradas como uma
relíquia geológica por sua unicidade e beleza exótica. A vegetação é caracterizada por áreas de formação
pioneira e restinga. A pluviosidade anual entre 1500 e 1750 mm e a existência de pequenos rios e
igarapés sob o leito arenoso propiciam a formação de lagoas de água doce e cristalina.
Apesar da ocupação humana bastante incipiente, a atividade turística vem ganhando crescente
destaque. Os impactos mais evidentes são a pesca predatória e desmatamento de manguezais para a
construção de salinas (Mochel, 1991). Não há plano de manejo em vigência nem tampouco
zoneamento existente na área, de acordo com os levantamentos do Ministério do Meio Ambiente
(MMA, 1996) que a catalogaram como de alta fragilidade em virtude de seus sedimentos
inconsolidados.
Os primeiros estudos limnológicos na região são recentes e fruto da parceria entre limnólogos
maranhenses e sulistas: Espíndola et al. (1998), Garavello, et al. (1998), Rietzler et al. (1998) e Tundisi et
al. (1998).

AS AGÊNCIAS DE FOMENTO

O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), desde 1984, é a


agência que mais tem contribuído para o avanço das investigações limnológicas no Estado do
Maranhão, não só na forma de auxílios a projetos individuais de pesquisa mas também de bolsas nas
modalidades de Desenvolvimento Científico e Regional, Iniciação Científica e Aperfeiçoamento.
O advento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Maranhão (FAPEMA), em 1990,
até os dias de sua extinção em 1999, abriu novos incentivos à pesquisa, a princípio nas modalidades
auxílios e bolsas e posteriormente apenas bolsas.
A demanda na execução de estudos de impacto ambiental por exigências do Banco Mundial
abriu um emergente campo de atuação por parte dos limnólogos como foi o caso do "Estudo
Ambiental das Obras de Melhoramento e Pavimentação da Rodovia BR-230, trecho Balsas (MA) e
Floriano (PI)", em convênio com a Universidade Estadual do Maranhão.
A Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), mediante convênio com o
Laboratório de Hidrobiologia, apoiou a execução do projeto "Diagnóstico Ambiental do Estuário do
Rio Bacanga, Ilha de São Luís- MA: Caracterização Química e Biológica"
Merecem destaque o apoio da Academia Brasileira de Ciências para o projeto "Biodiversidade
em Ecossistemas Aquáticos Brasileiros: Estudo Comparativo em Sistemas Naturais Tropicais e
Subtropicais", da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (CHESF) para um projeto de
monitoramento das águas do reservatório de Boa Esperança (Pompêo et. al., 1999), a Fundação
ALCOA para vários sub-projetos do "Programa Integrado do Estudo Ecológico dos Manguezais do
Estado do Maranhão", do Ministério do Meio Ambiente e Recursos Hídricos para um projeto da
microbacia do Rio Balsinhas, da International Foundation for Science (Suécia) e do UNICEF.
Na área de prestação de serviços à iniciativa privada, alguns trabalhos têm sido desenvolvidos
para a empresa CELMAR.
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A PRODUÇÃO CIENTÍFICA

O registro mais antigo de cunho limnológico que se tem conhecimento é o manuscrito


"História dos Animais e Árvores do Maranhão" de D. Frei Cristovão de Lisboa (Alumar, 1985), com
data incerta entre 1625 e 1631. A obra contém a descrição acompanhada da iconografia da ictiofauna e
avifauna maranhenses. O autor curiosamente separa os peixes em duas categorias por ele denominadas
de "não bons de comer e melhores de comer". Quanto aos pássaros ele os dividiu entre os que "andam
ao longo do mar, lagos e rios de água doce" dos de matos e campinas e nas categorias "bons de comer e
outros e os que são honrados pelas penas".
Em 1970, o geógrafo Raimundo Lopes lança o seu livro "Uma Região Tropical" (1970), uma
obra com requintes de erudição contendo ricos detalhes sobre a hidrografia e os campos da baixada.
Qualitativamente, a produção científica tem se restringido a uma Limnologia mais básica e
descritiva, centrada em estudos de curta duração, voltados, como pode ser visto, para alguns
ecossistemas fluviais, lacustres e estuarinos, mais próximos geograficamente da capital, mas nem por
isso de rápido e fácil acesso, em virtude das dimensões territoriais do Estado.
A partir da seleção de trabalhos realizados em bacias hidrográficas com base no levantamento
da produção científica, feito por Damázio et al. (1989), num período compreendido entre 1977 a 1988,
uma década, portanto, pode-se verificar que de aproximadamente cem trabalhos de cunho
eminentemente regional e voltados para regiões estuarinas, apenas uns 10% foram publicados em
revistas científicas de divulgação nacional, o que revela o limitado poder de irradiação do conhecimento
dos pesquisadores de regiões tropicais e todas as suas implicações, conforme bem colocado por
Williams (1994).
A partir de uma análise simplificada dos fatores que condicionaram a incipiente produção
científica publicada, da década acima citada e da seguinte, ou seja, de 1989 a 1999, pode-se observar um
número reduzido de trabalhos realizados nos ecossistemas regionais, mas uma proporção maior de
publicações de ambientes alóctones.
Dos vários e complexos fatores que condicionam essa atividade, é possível presumir que o
afastamento dos profissionais da terra para os cursos de qualificação em centros de formação,
sobretudo no sul do país, levou-os a se desagregarem de seus núcleos originais de atuação e a
investigarem sistemas naturais de outras latitudes.
Outro fator que contribuiu desfavoravelmente para esse cenário foi a ausência de fomento para
a aquisição de material permanente, no caso equipamentos e instrumentais, de custo relativamente
elevado, necessários à pesquisa limnológica, fato que tem a ver com a política nacional e regional de
fomento. Um aspecto favorável da migração foi a intensificação das parcerias científicas e institucionais,
fruto do contacto dos limnólogos com outros parceiros.

REFLEXÕES CRÍTICAS

A Limnologia deverá enfrentar no Maranhão crescentes e variados desafios, dentre eles:

• Os problemas decorrentes da ação sinérgica da desembocadura de grandes rios do continente


para a constrição geográfica do Golfão Maranhense, que recebe todo o aporte da malha fluvial
da Ilha de São Luís, rios todos eles, consideravelmente afetados pelo desmatamento, por
práticas agrícolas inadequadas e o lançamento de resíduos in natura de efluentes domésticos e
industriais;

• O avanço da frente de desmatamento do sul do Pará com todos os agravantes na redução do


patrimônio natural da rica floresta tropical existente na Pré-Amazônia;

• Os impactos da devastação do cerrado e a sustentabilidade de suas bacias hidrográficas em


função da implantação de mega-projetos irrigados do pólo de grãos ao sul do Estado;
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• Os efeitos adversos da exploração de ouro na bacia do Gurupi e o turismo predatório na bacia


do Rio Munim e sua ameaça na região dos Lençóis;

• A crescente perda das matas ciliares e a redução da biodiversidade das bacias lacustres e fluviais,
com o inevitável empobrecimento dos recursos pesqueiros;

• O comprometimento dos lençóis freáticos pelo desmatamento e a contaminação por


defensivos agrícolas;

• A propagação de doenças de veiculação hídrica resultado da ausência indiscriminada de


saneamento básico;

• A bioacumulação de metais pesados e compostos orgânicos sintéticos da mineração, indústria e


agricultura nos organismos aquáticos;

• Redefinição de novas unidades de conservação abaixo do paralelo latitudinal de 04° 00', que
contemplem mormente as nascentes de grandes rios, uma vez que a maioria dessas unidades
estão acima desse limite;

• O estabelecimento da política estadual de gerenciamento dos recursos hídricos em consonância


com a lei recentemente promulgada e, com vistas à incorporação por parte de todos os
segmentos da sociedade da "cultura do gerenciamento de bacias", a exemplo de experiências em
franco andamento nos Estados de São Paulo e Bahia;

• Busca incessante de integração entre todos os órgãos responsáveis pela gestão dos recursos
hídricos sejam federais, estaduais ou municipais;

• Baixo poder de retenção de profissionais pós-graduados pelas instituições de ensino superior


locais o que tem provocado a sua evasão para outras regiões do país;

• Os paradoxos entre os padrões de exigência das comunidades científicas e das agências de


fomento nacionais e internacionais em contraposição às reais condições locais para a geração de
informações inovadoras;

E por fim, não menos relevante, o oportunismo de alguns consultores que vêm ao Estado a
serviço de empresas estatais e particulares em busca de dados secundários, sem o mínimo senso ético e
de respeito pela inteligência local.

SÍNTESE E PERSPECTIVAS

Se a Limnologia é considerada uma ciência relativamente recente (Margalef, 1983), essa área do
saber no Estado do Maranhão encontra-se numa fase todavia pueril de sua existência, quando
comparada com a de outras regiões do país.
A consolidação de um programa de pós-graduação para a formação de profissionais
competentes para o exercício dessa profissão tem sido uma grande lacuna.
O programa denominado Ecologia e Recursos Naturais Tropicais, proposto pelo
Departamento de Oceanografia e Limnologia da Universidade Federal do Maranhão é um fato
concreto que aguarda atualmente parecer favorável da CAPES para a sua implementação em março de
2000.
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Outro fator crucial é a necessidade premente da inserção de profissionais qualificados ao


quadro efetivo do Departamento de Oceanografia e Limnologia, realmente produtivos, cientificamente
engajados em tempo integral com a academia, ingredientes sem os quais não se pode avançar com
seriedade e compromisso. A interdisciplinaridade para o enfrentamento das questões relativas aos
recursos hídricos é algo que deve ser continuamente perseguida.
Esse programa de mestrado aliado à implantação da graduação em Ciências Aquáticas, nas
modalidades gerenciamento ambiental e aquicultura, no início do ano 2000, permitirá um considerável
avanço da Limnologia nesta região do país.
À essas duas ações acrescentam-se as seguintes vantagens e potencialidades: equipe qualificada
de pesquisadores mas numericamente reduzida, instalações condizentes, acervo bibliográfico
consistente, passível apenas de atualização e ampliação, uma miríade de ecossistemas de potencial
totalmente inexplorado e carentes de investigação, muitos à beira do ecocídio, além de um povo ávido
de conhecimento, qualificação e educação ambiental.

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