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https://doi.org/10.15202/1981996x.

2017v11n4p32

CONTRIBUIÇÕES DA BIOLOGIA MOLECULAR PARA A PROTEÇÃO ANIMAL


E A INVESTIGAÇÃO DOS CRIMES CONTRA A FAUNA1
MOLECULAR BIOLOGY CONTRIBUTIONS FOR ANIMAL PROTECTION AND
THE INVESTIGATION OF CRIMES AGAINST WILDLIFE

RODRIGO GRAZINOLI GARRIDO


Doutor em Ciências;
Instituto de Pesquisa e Perícias em Genética Forense/PCERJ;
Professor Adjunto do PPGD-UCP e da FND-UFRJ
grazinoli.forense@gmail.com

EDUARDO LEAL RODRIGUES


Mestra em Ciências; Promega Corporation
rodrigues.dna@gmail.com

RESUMO ABSTRACT

Atividades antrópicas mal coordenadas ou Poorly coordinated or criminal human activi-


criminosas têm gerado extinção de espécies animais. ties have led to the extinction of species. Currently,
Atualmente, ferramentas moleculares podem contri- molecular tools can contribute mainly in two aspects
buir sobretudo em duas vertentes da proteção animal: of preservation: in the fight against biopiracy; and
no combate à biopirataria; e no manejo reprodutivo de reproductive management of species. From literatu-
espécies. A partir de revisão da literatura, buscou-se re review, we sought to provide an overview of the
oferecer uma visão geral sobre as principais ferramen- main molecular tools used in the protection of fauna
tas moleculares utilizadas na proteção à fauna e des- and describe examples of these technologies in species
crever exemplos destas tecnologias na identificação de identification for typifying the crimes against wildlife,
espécies para a tipificação de crimes contra a fauna, in addition to promoting the reproductive management
além do fomento ao manejo reprodutivo de espécies species at risk of extinction.
em risco de extinção
Keywords: Environmental crime. Environmental sur-
Palavras-chave: Crime ambiental. Perícia ambiental. vey. Molecular taxonomy.
Taxonomia molecular.

____________________
1 Parte desse artigo foi apresentada no 22nd International Sustainable Development Research Society Conference, School of Science and
Technology, Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, Portugal, 13 – 15 July 2016.

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Revista Semioses, V 11, n.04, 2017
CONTRIBUIÇÕES DA BIOLOGIA MOLECULAR PARA A PROTEÇÃO ANIMAL E A INVESTIGAÇÃO DOS CRIMES CONTRA A FAUNA1

1. INTRODUÇÃO linos e Zona Costeira e Marinha – há uma magnífica


diversidade de espécies que classifica o Brasil como
Entre as atividades que colocam em risco es- um país de Mega Biodiversidade, juntamente com ou-
pécies animais, o tráfico de animais ou biopirataria tros 17 países (WILSON; PETER, 1988). De acordo
tem papel fundamental. Esta atividade criminosa mo- com o Sistema de Informação Sobre a Biodiversidade
vimenta entre 10-20 bilhões de dólares no mundo e 1 Brasileira (SiBBr), o Brasil possui cerca 170-210 mil
bilhão só no Brasil (RENCTAS, 2001). No entanto, a espécies descritas e estima-se que o país possa abrigar
legislação brasileira sobre crimes ambientais demanda cerca de 1,8 milhões de espécies.
para correta tipificação e qualificação dos crimes con- No entanto, atividades antrópicas mal coorde-
tra a fauna, a identificação da vítima animal ao nível nadas ou criminosas, tais como, queimadas, desmata-
de espécies (BRASIL, 1998). Assim, quando há apre- mentos, poluição, caça e pesca ilegal e introdução de
ensão de carne, peles, ovos e outros materiais bioló- espécies têm resultado na extinção e na ameaça de
gicos, pode não ser possível a classificação a partir de extinção de muitas espécies animais. Em 2014, o Ins-
características externas, demandando a aplicação de tituto de Chico Mendes de Preservação da Biodiversi-
tecnologias moleculares (HEBERT et al., 2004; CAR- dade (ICM-BIO) liberou a Lista das Espécies da Fauna
VALHO, 2013). Brasileira Ameaçadas de Extinção (Portarias MMA nº
Para tanto, várias ferramentas moleculares po- 444/2014 e nº 445/2014, alterada pela Portaria MMA
dem contribuir. Um exemplo importante seria a utili- nº 98/2015), o documento apresentava 1173 espécies
zação de sequenciamento de marcadores moleculares, ameaçadas de extinção.
como alvos do genoma mitocondrial (gene COI e cyt Atualmente, há inúmeros esforços de pesqui-
b) (BOORE et al., 1999). Há também relato do uso do sadores e agência governamentais para a preservação
gene cyt b para identificar espécies de aves areendidas de espécies. Um exemplo é o Biota-FAPESP, que visa
em tentativa de tráfico internacional (CARVALHO, aprimorar o conhecimento acerca da biodiversidade e
2013). distribuição dos organismos no Estado de São Paulo
Por outro lado, a biologia molecular pode con- (FAPESP, 2016). Outro objetivo desses programas é
tribuir com a preservação de em populações animais desenvolver formas de exploração sustentável de orga-
reduzidas, já em risco de extinção. Nesse caso, a prote- nismos com potencial econômico e a criação de área de
ção deve ser garantida através do manejo reprodutivo preservação ambiental.
e mensuração da representatividade genética da popu- Atualmente, no que diz respeito à conservação
lação ameaçada (DESALLE; AMATO, 2004; ALLEN- de espécies, o campo da genética atua em duas verten-
DORF et al 2010). Para essas práticas, marcadores do tes principais: 1- combate à biopirataria; 2- manejo na
tipo microssatélites têm sido amplamente empregados reprodução de espécies.
(FRANKHAM et al., 2002).
Dessa forma, a partir de pesquisa explorató- 3. COMBATE À BIOPITARIA
ria qualitativa, desenvolvida a partir de documentação
indireta de fontes primárias, legislação, e secundárias O termo biopirataria foi introduzido no cená-
como livros, artigos e sites, buscou-se oferecer uma vi- rio científico em 1993, como forma de denunciar abu-
são geral sobre as principais ferramentas moleculares sos econômicos por parte de corporações e instituições
utilizadas na proteção à fauna e descrever exemplos científicas. Atualmente, o termo biopirataria é descrito
desta aplicação na identificação de espécies para tipifi- como a exploração, manipulação, exportação ou co-
cação e qualificação de crimes ambientais, bem como mercialização internacional de recursos biológicos que
no manejo reprodutivo de espécies em risco de extin- contrariam as normas da Convenção sobre Diversidade
ção. Biológica (ONU, 1992).
No tocante ao tráfico ilegal de animais, o mon-
2. BIODIVERSIDADE BRASILEIRA tante associado às negociações no mundo gravita em
torno de 10-20 bilhões de dólares, 1 bilhão no Brasil
O território brasileiro possui uma área de apro- aproximadamente, sendo considerada a terceira ati-
ximadamente 8,5 milhões de Km2, apresentando uma vidade criminosa mais rentável (ficando atrás apenas
dimensão continental e inúmeros ecossistemas. Dentro do tráfico de drogas e tráfico de armas) (RENCTAS,
dos biomas brasileiros – Floresta Amazônica, Cerrado 2001). Como forma de combater a prática de tal ati-
e Pantanal, Caatinga, Floresta Atlântica e Campos Su- vidade, foi criada a Lei 9605/98 que visa tipificar as
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ações criminosas contra o meio ambiente e em seu o gene COI são ferramentas para identificação de espécies.
artigo 29, define crimes contra a fauna como: “Ma- O cytb codifica a enzima citocromo B, pertencente à famí-
tar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar, vender, expor à lia de genes da cadeia respiratória mitocondrial e compõe
venda, exportar, adquirir, guardar, espécimes de fau- um grupo de 11 proteínas denominados de complexo III.
na silvestre bem como produtos e objetos dela oriun- Na mitocôndria, o complexo III atua na fosforilação oxi-
dos.” E como qualificadora da pena, o § 4º discrimina dativa para a produção ATP celular. Enquanto o gene COI
que “A pena é aumentada da metade se o crime é pra- codifica a subunidade I a citocromo oxidase, esta consiste
ticado [...] contra espécie rara ou considerada amea- de um catalisador terminal da cadeia respiratória mitocon-
çada de extinção” drial, assim como o gene cytb (BOORE et al., 1999).
Assim, a identificação ao nível de espécies Uma vez que tais genes façam parte de uma ca-
se faz necessária como forma de identificar possíveis deia com alto grau de complexidade, qualquer alteração
agravantes. No entanto, alguns cenários não permi- na estrutura das proteínas tende a ser um fator deletério
tem uma identificação taxonômica por meio de carac- para o organismo. Dessa forma, a pressão seletiva consiste
teres morfológicos, como nas apreensões de carne e em uma vantagem para que os mesmos possam ser usa-
peles (HEBERT et al., 2004). Além disso, a identifi- dos como marcadores táxon-específico, pois são mantidos
cação taxonômica requer um nível de conhecimento conservados (WOLSTENHOLME, 1992; ROKAS et al.,
elevado em relação à família da espécie, isto é, há 2003).
necessidade da presença de especialista. Em 2013, o Perito Criminal Federal Carlos Benig-
Tendo em vista tais dificuldades, a identifi- no Vieira de Carvalho publicou um relato de caso, em que
cação por meio de ferramentas de biologia molecular por meio da análise do gene citocromo b foi possível iden-
tem auxiliado na identificação de espécies (HEBERT tificar espécies de aves, cujos ovos e indivíduos imaturos
et al., 2003; HAJIBABAEI et al., 2007; IVANOVA et haviam sido apreendidos. Inicialmente foi feita a incuba-
al., 2007; MEICKLEJOHN et al., 2013). A identifica- ção dos ovos no Jardim Zoológico de Brasília, mas infe-
ção molecular utiliza-se do sequenciamento de mar- lizmente, grande parte dos ovos e dos indivíduos imaturos
cadores moleculares, isto é, regiões-alvo do genoma não se tornaram viáveis, sendo necessária a identificação
mitocondrial, tais como, o gene COI, que codifica a por meio de ferramentas de bióloga molecular (CARVA-
subunidade I da enzima Citocromo Oxidase e o gene LHO, 2013).
cytb, que codifica a enzima citocromo B (BOORE et Por meio da comparação das sequências obtidas
al., 1999). a partir das amostras apreendidas e de sequências previa-
O gene cytb é amplamente utilizado para mente depositadas no GenBank foi possível a identificação
identificação de espécies de vertebrados, enquanto dos 17 espécimes sequenciados, contudo, 11 foram identi-
que o gene COI é usado em um contexto mais am- ficados ao nível de espécie e 6 até o nível de gênero, sendo
plo. Contudo, há inúmeras discussões em relação a enquadradas em duas famílias distintas, Psittacidae e Stri-
região mais indicada para a análise (WILL; RUBI- gidae. As espécies Alipiopsitta xanthops (anteriormente
NOFF, 2004; MORITZ; CICERO, 2004; MEYER; Amazona xanthops) (papagaio-galego), Ara chloropterus
PAULAY, 2005; MEIER et al., 2006). (arara-vermelha-grande), Aratinga aurea (periquito-rei),
Amazona spp, Megascops choliba (corujinha-do-mato).
4. USO DE MARCADORES MOLECULARES Paul Hebert et al., (2003) propuseram um sistema
PARA IDENTIFICAÇÃO DE ESPÉCIES de identificação de espécies por meio do sequenciamento
de uma região de 648pb do gene COI, que, de acordo com
Marcadores moleculares para identificação de o autor, apresentava divergência nucleotídica suficiente
espécies consistem de alvos cujas sequências de nu- para distinguir unidades taxonômicas. Tal metodologia
cleotídeos sejam conservadas e apresentem variação de análise foi nomeada como DNA Barcoding. Contudo,
intraespecífica reduzida (WELLS et al., 2001; NEL- a literatura científica já apresentava tal aplicação do DNA
SON et al., 2007; ROE; SPERLING, 2007; WELLS; mitocondrial, sendo denominado de DNA-Based id.
STEVEN, 2008). Contudo, a utilização de um único A análise do DNA Barcoding em animais está
marcador molecular é passível de questionamento, voltada, principalmente, para os genes mitocondriais, de-
haja vista que um marcador apenas pode não ser sufi- vido à abundância dessa organela nas células, sendo uma
ciente para discriminar a diversidade molecular pre- vantagem para a obtenção de material genética exíguos
sente entre táxons (WILL; RUBINOFF, 2004). ou degradados. Tal abordagem pressupõe que indivídu-
Conforme mencionado acima, o gene cytb e os possuam sequências de nucleotídeos com alto grau de
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similaridade, em relação às sequências homólogas de sido amplamente empregada para tal finalidade, uma
indivíduos de espécies diferentes. Hebert e colabora- vez que possuam alto grau de polimorfismos e, conse-
dores (2003) propuseram um limiar de identificação, quentemente, permitem avaliar o grau de diversidade
comumente conhecido como Barcoding Gap. O Bar- genética e desenvolver estratégias de manejo da popu-
coding Gap seria definido quando a sequência de um lação (FRANKHAM et al., 2002).
indivíduo que obtivesse uma variação de 3% ou mais. Os microssatélites, também nomeados como
No entanto, a literatura reporta que há uma ampla so- STRs, são marcadores moleculares dispersos por todo
breposição entre valores de variação intra e interespe- o genoma e com elevada diversidade alélica (BUTLER
cífica para diferentes táxons. Assim, é preciso estudo e et al., 2005). Estes marcadores genéticos consistem de
validação para aplicação em famílias distintas em con- repetições curtas consecutivas, isto é, possuem uma
junção com a análise taxonômica (MEIER; PAULAY, unidade de nucleotídeo repetida de forma consecutiva,
2005; MEIER et al., 2006; WIEMERS; FIEDLER, podendo ser do tipo Di-, Tri-, Tetra- e/ou Pentanucleo-
2007; MEIER et al., 2008; SRIVATHSAN; MEIER, tídeos.
2012). Estes polimorfismos são gerados e mantidos
Por outro lado, apesar da aplicação do DNA por meio de erros atribuídos ao momento da replica-
para fins de identificação consistir em uma das etapas ção do locus. O termo aplicado à falha no processo é
para a proteção do Patrimônio Genético, é preciso sa- “Slippage” (ou escorregão) da polimerase, podendo
lientar que as espécies ameaçadas de extinção são po- ocorrer dois tipos, “Backward Slippage” e “forward
pulações com um número de indivíduos relativamente Slippage”, o que resulta em eventos de contração do
baixo e, portanto, apresentam diversidade genética re- locus (perda de repetições) ou na expansão do locus
duzida. (ganho de repetições), respectivamente (ELLEGREN,
Tanto o número reduzido de indivíduos quan- 2000, 2004).
to a baixa diversidade genética colocam as populações Comumente, a genotipagem de certas popu-
em risco, isto porque, quaisquer eventos estocásticos, lações naturais é realizada a partir de metodologias
ambientais ou demográficos, como desastres naturais, não-invasivas, como por exemplo, penas e fezes. Des-
variação dos recursos, taxas de mortalidade e natalida- sa forma, é preciso ser cuidadoso com a genotipagem
de, podem levar a um declínio da população ou mesmo dos microssatélites, uma vez a extração de DNA de
a extinção completa (DESALLE; AMATO, 2004; AL- tais amostram tendem a gerar baixas concentrações de
LENDORF et al., 2010). Além de tais fatores, há a es- material genético. O DNA em concentração reduzida
tocatiscidade genética, ou seja, a diversidade genética pode gerar artefatos de técnicas, como desequilíbrio
reduzida favorece a ocorrência de cruzamentos endo- alélico em perfis genéticos heterozigotos, com maior
gâmicos, fazendo com haja aumento na taxa de morta- presença de um alelo em relação ao outro (DEMERS et
lidade devido à depressão endogâmica (FRANKHAM al., 1995). Além disso, pode ocorrer o denominado de
et al., 2002; ALLENDORF et al., 2010). Alelo “Drop-out”, o que gera erroneamente um perfil
A genética por meio da genotipagem de mar- genético homozigoto, devido à baixa concentração do
cadores moleculares polimórficos e manejo de cruza- material e não-amplificação de um dos alelos (ALON-
mentos visa reduzir o risco de extinção de espécies. SO et al., 2001).
Trata-se de um esforço de longo prazo, cujo resultado Uma forma de verificar se ocorreram erros na
é o aumento populacional e da diversidade genética, genotipagem e testar hipóteses relacionadas à popula-
consequentemente, de seu potencial evolutivo (AL- ção, consiste em analisar se a mesma está em Equi-
LENDORF et al., 2010). líbrio de Hardy-Weinberg. A aplicação do Equilíbrio
A diversidade genética é um aspecto muito im- de Hardy-Weinberg permite também detectar falhas
portante para qualquer população. É preciso mencionar associadas aos resultados, como genotipagem errônea
que as mudanças ambientais são processos contínuos e nos marcadores genéticos. Sem a análise do Equilíbrio
a diversidade genética está associada à capacidade de de Hardy-Weinberg, tais erros associados com a ge-
uma espécie ou população se adaptar a essas mudan- notipagem poderiam afetar de maneira significativa
ças. A perda da diversidade genética resulta na redução as análises subsequentes (SINGLE et al., 2002). Além
em taxas de reprodução e sobrevivência, ou seja, reduz disso, o excesso de indivíduos homozigotos pode indi-
o valor adaptativo da espécie. car um outro artefato de técnica denominado de “Ale-
A utilização de marcadores do tipo microssa- los Nulos” (GOMES et al., 1999). O alelo nulo con-
télites (ou STRs, do inglês Short Tandem Repeats) tem siste da não-amplificação de um alelo devido à uma
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mutação na extremidade 3’ do sítio de hibridação do que se torna importante no combate a crimes ambien-
oligonucleotídeo iniciador, gerando um perfil homo- tais e na preservação de espécies.
zigoto errôneo, da mesma forma que ocorre com o Ferramentas moleculares são importantes, sobretu-
Alelo “drop-out”. Sendo assim, a análise do Equilí- do, na identificação de animais em casos complexos,
brio de Hardy-Weinberg permite agregar qualidade e como por exemplo, nas apreensões de peles, carnes,
segurança as pesquisas científicas (HOSKING et al., ovos. Contudo, tal metodologia requer validação com
2004). o aumento de amostragem dos táxons de forma a iden-
Outro parâmetro a ser mensurado é o Tama- tificar o intervalo de variação interespecífica. A tecno-
nho Populacional Efetivo (Ne) de uma população logia molecular também contribui com a garantia da
ameaçada. Essa medida é definida em termos de re- sustentabilidade quando aplicada diretamente no ma-
presentatividade genética, isto é, o número de indiví- nejo conservativo de espécies ameaçadas. O uso de
duos equivalente ao de uma população-padrão com marcadores polimórficos, tais como os STRs, ganha
capacidade de manter a diversidade genética, ou seja, importância especialmente em populações pequenas.
todos os indivíduos que se reproduzem e deixam des- Nessas populações, são aumentadas as chances de
cendentes e, por conseguinte, transmitem seus genes alelos deletérios estarem em homozigose, reduzindo
(KLIMAN et al., 2008). o valor adaptativo da população e contribuindo para
De forma geral, a diversidade genética é fun- a extinção.
damental para a manutenção do potencial evolutivo
de uma espécie, portanto, populações reduzidas ten-
dem a ter mais cruzamentos endogâmicos o que po- 6. REFERÊNCIAS
deria ocasionar o aumento da carga genética, isto é,
aumento da frequência de alelos deletérios na popula- ALLENDORF, F. W.; HOHENLOHE, P. A.; LUI-
ção (FRANKHAM, 2005). KART, G. Genomics and the future of conservation
Da mesma forma que em cruzamentos ao genetics. Nature Reviews Genetics, v. 11, p. 697–
acaso, os endocruzamentos podem gerar indivíduos 709, 2010.
heterozigotos e homozigotos. No entanto, pode haver
a geração de homozigotos por descendência, isto é, ALONSO, A.; ANÐELINOVIÆ, S.; MARTÍN et al.
indivíduos cujo genótipo apresenta alelos oriundos de DNA Typing from Skeletal Remains: Evaluation of
um ancestral comum (RODRIGUES et al., 2013). Es- Multiplex and Megaplex STR Systems on DNA Isola-
tes indivíduos podem ser considerados Alozigotos ou ted from Bone and Teeth Samples. Croatian Medical
Autozigotos. Os Alozigotos possuem genótipos em Journal, v. 42, n. 3, p. 260-266, 2001.
que os alelos não são idênticos por descendência, mas
sim por estado e os Autozigotos possuem genótipos BOORE, J. L. Animal mitochondrial genomes. Nucl.
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Alguns alelos deletérios são mantidos na população
ao longo das gerações, mas estes não diminuem o BRASIL. Lei Nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998.
valor adaptativo do indivíduo, devido a relação de Dispõe sobre as sanções penais e administrativas de-
dominância/recessividade com outros alelos do mes- rivadas de condutas e atividades lesivas ao meio am-
mo lócus. No entanto, indivíduos homozigotos para biente, e dá outras providências. Brasília. DOU de
alelos recessivos/deletérios possuem valor adaptativo 13.2.1998
reduzido ou até mesmo nulo. Dessa forma, o cruza-
mento endogâmico tende a elevar a geração de indi- FAPESP. Brazilian Biodiversity Research: a Pro-
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