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Janeiro

Abril 2010
2010Número
Número
2 0Ano
Edição1
1

ECO da Voz di Paz


cu

   
Boletim Informativo
Boletim Informativo

MULHER E PAZ
Um tributo à Mulher Guineense

Editorial Pág.2

O que são os
ERD? Pág.2
Artigos de interesse especial: Imagens do Pág.7
Quotidiano
• ACTIVIDADES VOZ DI PAZ….………..…………….p.3  Feminino
 
Homenagem a Pág.11
• AS MULHERES DA MINHA TERRA…………......p.5  Figuras de Paz:
  Djariatu Baldé
Pág.12
• MULHERES PELA PAZ ‐ ENTREVISTAS.………..p.8  Eco da Voz di
paz I DI NÓS
Página 2
ECO da Voz di Paz Boletim Informativo

O que são os ERD - Espaços


EDITORIAL
«Mulher é Paz» Regionais de Diálogo? Fafali Koudawo
Certas associações de palavras são, à
primeira vista, tão evidentes que soam O conceito Espaço Regional de
como um pleonasmo. Mulher e a paz Diálogo (ERD) foi desenvolvido O ERD é uma estrutura
entram nesta categoria. Associar as como uma inovação nos regional, criada no âmbito
duas palavras levanta o eco de uma processos sociais implemen- da Voz di Paz.
repetição. O efeito é similar para tados depois da guerra de 7 de - É um elo de ligação entre
mulher e vida. Pois, a mulher dá a Junho (1998). É uma das a estrutura central da Voz
vida. maiores inovações no domínio
No entanto, nem sempre foi assim na di Paz e as populações;
da consolidação da paz na - Funciona como uma
mentalidade popular, nem na história
Guiné-Bissau. O seu surgimento estrutura flexível, gozando
da humanidade. Em muitas culturas a
mulher aparece como um pomo de
é fruto de uma reflexão sobre de uma larga capacidade de
discórdia. Assim, na mitologia grega a as vias e os meios para melhor iniciativa;
bela Helena é a causa da guerra entre enraizar a paz, tornando-a - É constituído por um
Gregos e Troianos. Nas lendas da propriedade das populações na núcleo de personalidades
Europa do norte, as valkyries, base. criteriosamente escolhidas,
mulheres em cavalos com asas, em função da sua
decidem quem vai morrer no campo da A emergência deste conceito capacidade de servir de
batalha. Quanto às fabulosas leva em conta a especificidade
Amazonas, cujo território a lenda missionários abnegados da
da sociedade guineense e a paz, encarregues de
coloca nos confins do Mar Negro, elas
necessidade de promover alargar, sem restrição nem
teriam edificado uma sociedade
baseada na arte da guerra feita por
espaços de intercâmbio regular, exclusão, o espaço de
mulheres que iam até privar-se de uma susceptíveis de contribuir para diálogo a todas as esferas
mama direita, cortada para melhor diminuir as tensões recorrentes sociais e geográficas da
permitir manejar o arco, e excluíam o cuja acumulação origina região e do país;
casamento e mesmo os homens válidos frequentes surtos de violência. - É o motor da apropriação
da sua companhia. Trata-se, portanto, de espaços das iniciativas de
Mas as lendas e a história estão de construção da paz na base consolidação da paz no
também repletas de figuras femininas através do diálogo inclusivo, da
evocadoras de sacrifícios para a paz. âmbito da Voz di Paz e obra
troca de experiências, do para o enraizamento local
Para escolher, desta vez um exemplo, convívio na diversidade, da
em África, apraz apontar a figura da de um processo inclusivo de
Abla Poku, princesa Baulé* que, por
coligação das forças positivas diálogo nacional.
amor ao seu povo que fugia à guerra, locais a favor de objectivos
foi capaz de sacrificar o seu filho para pacíficos.
abrir através do tumultuoso rio Comoé
o caminho da salvação e paz noutra Assim, o espaço regional de Os ERD são constituídos por
margem. diálogo é o instrumento de uma individualidades criteriosa-
Esta capacidade de dar a vida e pedagogia da paz fundada na mente seleccionadas em
sacrificar-se pela paz aparece como estimulação de uma consciência função da sua capacidade de
um traço singular da mulher. Ela da necessária “pacificação” das ser agentes e catalizadores de
confirma que apesar de lendas dinâmicas locais de
relações locais como
belicistas pregadas pelos homens às enraizamento da paz.
mulheres, a expressão mulher e paz é
antecâmara do desenvolvi-
mesmo um pleonasmo. Então, porque mento económico e social. Para
o efeito, o espaço regional de As funções dos ERD são
não dizer simplesmente, mulher é paz?
dialogo é chamado a valorizar, definidas por um quadro de
* Baulé, etnia do grupo Akan no sul da Côte desenvolver e a difundir referência consensualmente
d’Ivoire. O seu nome faria referência ao
ferramentas e abordagens de elaborado e adoptado. O
sacrifício do filho da princesa Abla Poku que
teria dito: “Bauli” isto é “Morreu a criança”. transformação de conflitos. quadro de referência clarifica
a natureza do ERD, define o
Fafali Koudawo Desde 2007, a Voz di Paz criou perfil dos seus membros e
um total de 10 ERD, uma ou detalha as funções específicas
Director de Pesquisa duas por região administrativa articuláveis com as tarefas
«Voz di Paz» gerais das estruturas centrais
em função das especificidades
geográficas e sociais. da Voz di Paz.
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Actividades Voz di Paz – Abril 2010  


O mês de Abril foi - A 13 de Abril, o tema foi: “Má
colocado sob o signo da governação e conflitos:
formação e reforço de desequilíbrios do poder que
geram conflitos”; Aqui,
parcerias. analisou-se aspectos tais como o
difícil equilíbrio a nível das
- No início do mês, a Voz di Paz instituições; a fraca cultura
apoiou a concretização de uma institucional; a tendência à
iniciativa salutar visando mudar personalização do poder; o
as mentalidades no Sector de João XXIII em Bissau, a Voz di fraco respeito pelos princípios
Nhacra, que tem uma imagem Paz apoiou uma formação em de limitação do poder inerentes
execrável como ninho de roubos matéria de gestão de conflitos, à democracia e a fraca tradição
e violências. A iniciativa foi organizada pela Comissão de descentralização;
baptizada como “Voz di Paz luta interdiocesana justiça, paz,
contra o roubo, violência e direitos humanos e desenvol- - A 20 de Abril o tema foi “Más
delinquência juvenil». vimento. Fafali Koudawo políticas e conflitos: enfraque-
Os membros do Espaço regional orientou um atelier interactivo cimento das Instituições”,
de Dialogo de Oio estiveram sobre as causas de conflitos, os destacando o enraizamento do
nesta promoção da cultura de tipos de conflitos, e os modos poder pessoal, a instabilidade
paz que contou com uma de resolução de conflitos. política e institucional, a
palestra do Prof. Fafali instrumentalização das insti-
Koudawo intitulada “Práticas - A parceria com a Assembleia tuições para fins políticos, entre
nefastas, conflitos e paz”. Nacional Popular na organização outros.
Um dos momentos altos desta da Conferência nacional:
iniciativa foi a luta tradicional “Caminhos da reconciliação, paz - A 27 de Abril foi produzida
que congregou os melhores e desenvolvimento” traduziu-se uma emissão sobre o tema da
lutadores balantas da região. O ao longo do mês pela corrupção, sua definição,
resultado saudado por todos foi participação nos preparativos formas, tipos e agentes de
a ausência total de violência ao deste que será um grande corrupção como factores de
longo de manifestações e acontecimento nacional. conflitos.
competições, que em termos
gerais têm sido nos últimos anos Emissões Radiofónicas do mês Actividades com espaços
lugares de ajustes de contas de Abril de 2010 regionais de diálogo – Abril de
entre grupos de jovens 2010
temerários adeptos da Durante o mês de Abril de 2010,
violência. a Voz di Paz, em parceria com a Durante o mês de Abril, a
Rádio Sol Mansi, produziu equipa de Voz di Paz esteve nas
- A Voz di Paz apoiou também programas radiofónicos sobre a regiões de Bafatá e Gabú, para
uma iniciativa do Espaço má governação e os conflitos. encontros de trabalho com os
Regional de Diálogo da região Assim: espaços regionais de diálogo,
de Cacheu em parceria com a - A 06 de Abril, o tema da com os seguintes objectivos:
associação da juventude local. emissão foi: “Más práticas - Apresentar informações sobre
Intensas actividades culturais políticas: fraudes eleitorais e as mutações institucionais na
tiveram lugar nos dias 16, 17 e conflitos em África”; A emissão Voz di Paz; a nova estrutura e
18 de Abril na cidade de salientou a falta de confiança seu funcionamento, os membros
Canchungo onde entre outros nos princípios democráticos, o etc.
préstimos da Voz di Paz, apego ao poder, a instrumen- - Assistir à programação das
Manuela M. Mendes deu uma talização do poder, e as actividades dos espaços
palestra sobre os “Fundamentos modalidades de fraude, tanto regionais de diálogo para o
da cidadania e paz”. no processo eleitoral como na restante ano de 2010.
proclamação dos resultados; Os ERD de leste tiveram os
- No dia 24 de Abril, no liceu seguintes programas:
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Programa do ERD de Gabú


1. Realização de um torneio
transfronteiriço de Paz em Pirada
previsto para o mês de Maio de
2010;

2. Encontro de luta livre em


Setembro de 2010 em Sonaco;

3. Provas de ciclismo e
atletismo , previstas para o mês de
Novembro 2010 em Pitche;
Sede da ONG Mers Bodjer e do ERD de Biombo
4. Realização de um programa
radiofónico intitulado “Djumbai de
Paz”, em associação com duas
rádios comunitários na cidade de
Gabú no dia 24 de Setembro de
2010.

      Membro ERD de Mansoa


Co-organizadora do
Kussundé sem violência,
Março 2010

Programa do ERD de Bafatá


1. Realização de um encontro
desportivo transfronteiriço em
Cambadju com a participação de
Salquenhe; o tema de
sensibilização serão as crianças
talibés e a fronteira, no dia 1 de
Junho de 2010.

2. Encontro de danças
tradicionais e canções de paz de
diferentes grupos étnicos em
Bambadinca no dia 13 de
Novembro de 2010.

3. Realização de actividades
desportivas de confraternização
entre agricultores, criadores de
gado, pescadores e pais e
encarregados de educação em
Bafatá no dia 11 de Dezembro de
2010.
Sessão de trabalho do ERD da Região de Cacheu
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«AS MULHERES DA MINHA TERRA»*


Joacine Katar Moreira

Pretende-se neste álbum de pelas dificuldades que têm


Histórias de Vida, a apresentação impedido o regresso dos filhos à
individual de mulheres Guiné. É ela também, a
guineenses, numa procura de provocadora de nostalgia
conhecimento e valorização das sofrida, da exaltação do
diversas experiências e passado quando comparado com
percursos, entendidos como o presente...e vice-versa.
fontes de aprendizagem e de
Pano Preto inspiração. O segundo pano, pano di pinti,
que embora não seja tradição
A singularidade de cada mulher, de todas as culturas guineenses,
permite-nos chegar ao colectivo, pode ser simbolicamente visto
fazendo uso das micro-histórias como o pano Real da Guiné,
para a construção de Histórias de porque o pano di pinti é o pano
Vida de Mulheres da Guiné. do bambaram, onde as mães
trazem os filhos às costas,
É com prazer que escrevo este sendo assim o pano da união e
Prefácio, sendo eu uma dessas da maternidade.
Pano de Pinti
mulheres e sendo,
principalmente, o resultado das Com padrões normalmente de
suas vidas. cor neutra (os padrões e as
cores dependem do tipo de
Como muitas mulheres cerimónias), este pano é
entrevistadas, a minha vida marcado pelo simbolismo, pela
contém episódios de migração, força e pela tradição. Força da
da separação e do reencontro. Mulher Grande e esperança da
Reencontro com os meus e Padida. Este pano é o pano do
reencontro com a Guiné. Com regresso à Guiné, pois aqui se
base nas experiências e vivências enquadram as cerimónias
Pano Legos destas mulheres, de forma tradicionais que levam muitas
Fotografias IMVF (Sandra Oliveira) simbólica, podemos dizer que as migrantes a regressar ao país
mulheres guineenses vivem com natal, para não ferir os
      pelo menos três panos ao longo antepassados e para proteger e
das suas vidas: iluminar o caminho dos seus
Sou filha de Elsa Katar Madi e de descendentes.
Quinzinho Moreira. Neta de Nonó - O pano preto, o pano
Barbosa, enfermeira, e da di pinti e o legós. Por fim o pano legós, apelador
falecida Queta Vieira. Queta de dos sentidos, alegre e por vezes
Aliu Katar Madi. Nonó, Nonó de O pano preto, como cantou Zé brejeiro. O legós representa o
Nána, Nána de Farim, que vivia Carlos Schwarz (mindjeris di quotidiano e o social. Ele é
em Belém. pano preto), é o pano do pranto prazer e comunicação, vaidade
e da dor, dor de corpo e dor da e feminilidade. O legós é festa
Assim se apresentam as mulheres alma, derivado de partidas, e gargalhada. É o pano com o
da Guiné, país em que, mais separações, do abandono pelos qual comunicamos na diáspora,
significativo do que o «quem companheiros e da despedida e que vestimos quando nos
somos» é o «de quem somos», ausência dos familiares. queremos sentir próximos di
pois a identificação colectiva é tera.
mais importante que a individual. É sofrimento causado pelo O deambular, os corpos
Isto não retira a individualidade a desespero, pela carência de bens apertados, coloridos e
cada um, apenas acrescenta e a procura quotidiana de adornados pelo legós são a
história à sua existência alternativas. Esta dor é também chama ardente da sedução e da
enquanto tal. causada pela instabilidade e africanidade.
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Os três panos em conjunto assim como é o mosaico étnico


simbolizam a vida e as suas da Guiné-Bissau. Mulheres
diferentes fases. Assim como papéis, manjacas, fulas, bijagós,
as fases da vida podem-se mancanhas, entre outras, que “De longe
fundir e confundir, os panos são sobretudo guineenses – pois entre as
também podem usados juntos a miscigenação tocou a todas - e sete colinas
e de várias maneiras. acima de tudo mulheres. vejo-te
mulher-grande
sofredora
A capacidade de substituição Joacine Katar Moreira
e meiga
dos panos e a sua utilização Consultora do Projecto «Rostos
Imagino-te
«psicológica» em determinadas Invisíveis» do IMVF e Investigadora
suave
situações pode significar a como quem
*Prefácio do Livro Storias di Mindjeris,
garantia de sobrevivência para edição do IMVF e de Joacine Katar
diz amor”
muitas mulheres. Moreira, realizado no âmbito do (Tony Tcheka,
Projecto “Rostos Invisíveis”, uma 2008, Guiné)
As mulheres da Guiné são iniciativa IMVF, NEP/CES e IPAD.
sobreviventes natas do jogo
Maria Leonor Barbosa (Nonó), enfermeira
da vida. São «engenheiras» In Storias de Mindjeris/ Fotografia de Neni Glock
por natureza, aquelas que se
formaram na procura de
soluções quotidianas para os
desafios dos tempos. “Só Mulher,
Mas também podem ser tão Mulher”
ameaçadoras, sabotadoras e
vingativas. Mulheres de sangue Mulher da Guiné
quente e língua de faca. Que
tudo fazem para proteger os Sorriso suspicaz
seus, como mães leoas,
perante o inimigo. Histórias de Vida de Mulheres da Paz e sossego em
Guiné-Bissau. Autoria da ONGD
A migração poucas vezes Portuguesa IMVF e de Joacine Katar corpo fêmea
Moreira
trouxe paz à mulher
guineense. Normalmente o Na hora do Kufentu
destino das migrantes é  
apimentado por mais desafios,
No rufar dos macaréus
quer pessoais, quer
Projecto «Rostos Invisíveis» Na kasabi
profissionais. Mas aquilo que
mais pesa na migração, para as Coordenado pelo IMVF (Ana Isabel
Castanheira), este projecto visou
Libertas amor
nossas mulheres, é a educação
e acompanhamento dos filhos contribuir para uma melhor integração da
abordagem de género nas políticas de E orquestras
noutros contextos que não o
cooperação, enquanto catalisador do
seu original. Num espaço desenvolvimento e erradicação da Sinfónicas risadas
aonde elas também se tentam pobreza O objectivo específico foi
adaptar. sensibilizar e informar, numa perspectiva - És mulher crescendo
de género, para os múltiplos papéis,
Porquê um álbum de histórias mecanismos e causas associadas às De mansinho
de vida de mulheres práticas violentas no Brasil e Guiné-
guineenses? Porque são Bissau. Só mulher
histórias de valência, de Pretendeu-se com o álbum Storias di
sobrevivência e de esperança.
Mindjeris prestar uma homenagem à Tão mulher!
Mulher Guineense, através do
reconhecimento e divulgação das suas
De guineenses porque histórias de vida: as dificuldades sentidas; Tony Tcheka
procuramos mulheres de os desejos; o que as preocupa e o que as in Guiné, Sabura que dói, 2008
cultura e experiência diversa, motiva.
ECO da Voz di Paz B l ti I f ti
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IMAGENS DO QUOTIDIANO FEMININO

Buscando a água – bem essencial do quotidiano


Carregando água para as necessidades do dia

Cuidando dos filhos e outras crianças


Gerindo e cuidando da sua casa e dinamizando a
sua Tabanka

Cozinhando para alimentar a sua gente, e


não só…
Produção e comércio: produtoras de óleo de
palma

Trabalhando para a Paz: Mulher


arbitrando a luta no Kussundé Participando activamente na vida social e cultural:
Djidia (cantora tradicional)
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MULHERES PELA PAZ- Entrevistas


As Vozes que se seguem são vozes femininas, de gente determinada, a quem o ter a família que eu tive, que me
facto de nascer mulher africana, neste caso guineense, não comprometeu a incutiu os valores do trabalho. Para
formação, o sucesso e a liberdade, num continente muito marcado pela mim tudo o que nós somos é fruto do
desigualdade. Filomena Mascarenhas Tipote, Manuela Mendes e Nazaré Baticam
nosso esforço duma maneira ou de
responderam por escrito a 8 questões sobre a importância e a responsabilidade
de se ser Mulher e da contribuição das mulheres para a Paz. outra e que na vida nada se dá de
graça e de bandeja.

4 Eu gostaria de desempenhar o
QUESTÕES: papel de um cidadão que vai dando
1 - Como evoluiu a situação da mulher
seu contributo dia após dia para que
na Guiné, da independência aos nossos este país mude e avance.
dias?
5 Quando estou em casa é dela que
2 - Quais são os desafios e as exigências
que se colocam à mulher guineense eu ocupo e o mesmo me acontece
hoje? quando estou no trabalho. É verdade
que a actividade profissional acaba
3 - Atendendo ao seu percurso, como se Investigadora da Voz di Paz, Bissau
roubando mais tempo sobretudo
caracteriza enquanto mulher?
quando viajo para o interior do país.
Filomena M. Tipote
4 - Que papel gostaria de desempenhar
na sociedade? «Sou sortuda e orgulhosa, por 6 Não gostaria de ser pessimista,
5 - Como faz para conciliar a vida ter a família que eu tive, que mas o meu raciocínio e o que vejo
dia-a-dia me leva a uma triste
profissional com a vida familiar? me incutiu os valores do perspectiva, por uma simples razão:
6 - Como perspectiva o lugar da mulher trabalho» hoje existe uma tendência de
na sociedade guineense nas próximas conseguir tudo sem qualquer esforço
décadas? alianças duvidosas. Todos esses e somos nós mesmas a julgarmos de
factores acabam por limitar o legítimo este facto que o homem
7 - Gostaria de fazer tributo a alguma
mulher? Por que motivos?
acesso à participação política das tem o dever de nos dar. Em
mulheres e em consequência a consequência, esta maneira de ver e
8 - Que contributo especial a mulher lugares de decisão. levar a vida leva-nos a uma maior
pode dar para a paz na Guiné-Bissau? Já no aspecto social existe uma dependência dos homens e quando é
inversão de valores na medida que assim, nos roubam a nossa dignidade
assistimos cada vez ao aumento de e até a nossa própria alma.
1 A situação da mulher na Guiné
número de mulheres como chefes
não tem sido das melhores, à
de família.
semelhança da própria situação do 7 Faço tributo à minha própria mãe,
país e das pessoas que nela se não por ela ser minha mãe, mas sim,
encontram. Após a Independência,
2 Os desafios são muitos e a todos por que é uma mulher que eu
os níveis. Cada vez mais assistimos conheci sempre a trabalhar e nunca
dado a um discurso de emancipação
a uma maior concorrência em tudo, parou de trabalhar. Não teve
e de igualdade do partido único
pelo que nós mulheres, dado o instruções académicas mas foi
havia mulheres nas esferas de
nível em que estamos, isto é, em sempre uma mulher independente e
decisão, nomeadamente no
tudo na última posição, se a um com boas intenções para com os
parlamento e postos de
homem é exigido salto em 2 outros.
administração local. Com a
degraus para a mulher deverão ser
abertura política e o processo
4 degraus de forma a satisfazer as
democrático de alternância de 8 O contributo especial da mulher é,
exigências e a superar os precon-
poder, onde perder tem muitas em primeiro lugar de educar os
ceitos que existem em relação à
implicações como é a percepção filhos com os valores de paz, dizer a
mesma. Isto só é possível
dos partidos, o número de mulheres verdade, não pegar nos pertences
apostando numa educação caseira
na esfera de decisão tende a dos outros e o valor ao trabalho.
que não inferiorize a mulher, mas
diminuir cada vez mais, tendo em Em segundo ser mais interventiva na
que lhe dá auto-estima e uma
conta os aspectos de conquista de busca duma paz duradoura na Guiné-
formação sólida, não de ir buscar
poder que requerem o uso de tudo -Bissau usando de suas redes quer
um papel mais sim o saber.
aquilo que moralmente não seja formais como informais, sobretudo
correcto como insultos, calúnias, rejeitar a atitude de fuga”Nha boca
dinheiros ilícitos para campanha, 3 A primeira coisa que eu digo é ka sta la”.
que sou sortuda e orgulhosa, por
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Manuela Mendes «As mulheres na Guiné actualmente são


a força, os pilares das famílias»
exemplar da cidadania. A cidadania manhã até à tarde para poder
na Guiné está em crise. Só um conciliar o meu trabalho com as
trabalho árduo da mulher pode leccionações que levo a cabo na
ajudar a restaurar esse valor. A Voz formação, quiçá, dos meus
di Paz está a trabalhar nisso substitutos.
também. Os mais novos já não
sabem quais são as boas maneiras 6 No pináculo efectivo da direcção
de uma boa convivência, a deste país. Ou seja no lugar
Investigadora da Voz di Paz, Bissau
delinquência juvenil está cada vez cimeiro das decisões, pois até lá
1 A situação da mulher na Guiné na mais saliente e preocupante, em os homens já estarão conscien-
verdade evoluiu bastante. Da fim, há uma degradação galopante cializados de que devem ceder,
independência aos nossos dias dos valores sociais. Por isso, devem não entrar em guerra com as
muita coisa aconteceu. A mulher merecer a atenção de todos, mulheres por causa do poder e de
conseguiu a sua emancipação, jogando a mulher um papel outros lugares de decisão que não
embora parcial. Muitas ainda preponderante. implicam necessariamente o
permanecem em casa sem A par disto está o contínuo poder. Não estou a dizer com isso
trabalhar porque os maridos não processo da materialização do que dêem lugar às mulheres, que
querem, não gostam que princípio da igualdade. Deve-se lhes façam favor, que sintam
trabalhem! Muitas ainda investir com qualidade e critérios pena, não. Elas têm que lutar,
choramingam nos cantos, porque os tudo o que faz. conquistar com muito labor esse
maridos decidem mandar os filhos espaço. O que está a acontecer na
para a mendigação no Senegal ou 3 Sou activa e “quase” realizada. realidade guineense é que as
noutras localidades fora do país Digo quase realizada porque mulheres é que são verdadeiras
com o intuito de aprenderem o enquanto mãe (com 4 filhos), estou donas de casa; sobre elas está
Corão, sem serem tidas nem satisfeita. Na área laboral, não todo o peso da família, são elas
achadas. Mas, algumas já ousam tenho nada a queixar. Tenho que se angustiam mais com todos
contrariar trabalhando, rejeitando contribuído para o meu país na os dissabores que este país traz,
os casamentos precoces, etc. justa medida em que o faria um em todos os níveis. Elas é que
As mulheres filiadas em algumas genuíno filho da pátria. Ainda patenteiam atitudes/decisões
formações políticas já não se penso dar mais. sensatas.
contentam com os lugares
suplentes nas listas de candidaturas 4 Gostaria de desempenhar um 7 Quero prestar tributo não a uma
para o Parlamento. As mulheres na papel de apaziguadora, como mas, a muitas que se contentam
Guiné actualmente são a força, os tenho tentado. Um papel activo com o pouco do resto que os
pilares das famílias; são elas que, que sirva aos guineenses em geral e maridos lhes trazem. Gostaria de
com a crise mundial presente, à minha família em particular. apelá-las para se erguerem. Ficar
suportam todas as despesas do lar, em casa sem trabalhar porque o
a maioria com as suas actividades 5 Sacrifico um pouco de cada parte marido não quer ou não gosta, não
informais. Contudo, é bom dizer da vida familiar e profissional. Mas, é solução e nem deve constituir
que muita coisa ainda falta por falando sinceramente, o meu um modo de vida cómodo.
fazer. A emancipação total é um trabalho acaba por ganhar mais em
processo assim como a observância detrimento da vida minha familiar, 8 A mulher deve reforçar a
de todos os princípios que pois passo todo o dia no trabalho, educação dos filhos. Uma vez que
erradicam a discriminação e o chego à casa muito tarde. Saio de ainda não detém as rédeas do
machismo lá muito cedo e só volto às 19H00. poder, deve organizar-se no
Mas nos momentos em que sentido de fazer os companheiros
2 Hoje a mulher guineense permaneço em casa aproveito o desenvolverem acções que
enfrenta grandes dificuldades. As máximo para compensar, sobretudo perenizem a paz; que convidem o
dificuldades são de variáveis níveis. para com os mais pequenos, dando investimento estrangeiro, por fim,
A nível económico, laboral, social, à família os miminhos que só uma que direccionem o país para o
etc. Enquanto profissional, mãe, mãe pode dar. desenvolvimento. Não esqueçamos
esposa e individualidade activa em Apraz-me fazer este sacrifício que o desenvolvimento condiciona
todas as questões actuais, deve se porque estou convicta que estou a a paz. Devem apoiar no máximo os
empenhar ainda mais para educar contribuir para um país melhor. Por trabalhos que a Voz di Paz está a
os mais novos e a todos os que isso não hesito em abandonar o desenvolver no país e além
precisam para um exercício meu filhote de apenas 4 meses de fronteira.
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Nazaré Baticam «A mulher como mãe, poderá orientar os seus


filhos para a paz na Guiné-Bissau»

1 Acho que a situação da mulher na sentido na vida; uma mulher que não
Guiné-Bissau da independência aos dá ouvidos, quando quer fazer uma
nossos dias evoluiu de uma forma boa iniciativa; sou uma mulher com
contínua e positiva. Logo depois da iniciativas positivas, que luta pelos
independência, não se falava da direitos das mulheres em geral e em
participação de mulher na política, particular das mulheres guineenses;
ou seja a mulher guineense não uma mulher cheia de força de
participava na política, não vontade, que gosta de sacrificar-se
desempenhava um papel importante para conquistar tudo, mas também
no estado. Para quem é guineense humilde, carinhosa, que dá força a
sabe que a discriminação da mulher quem precisa, que ama o próximo, Presidente da Associação de
Mulheres Guineenses, Lisboa
começa no próprio lar familiar. que tem sempre vontade de ajudar os
Porque a mulher não podia trabalhar outros, social, comunicativa,
como estar dentro da sua própria
naquela altura, tinha obrigação de simpática, que gosta de aprender com
casa, seja nas piores condições, na
ficar em casa para desempenhar os outros e que gosta de todos.
pobreza ou na riqueza, na tristeza
todas as tarefas domésticas, e casos ou na alegria é sempre a sua casa,
de mulheres que não tinham sequer 4 O que gostaria de desempenhar na nunca poderá rejeitá-la. Tem que
direito de frequentar a escola. sociedade, é defender todas as unir as suas forças e pedir as forças
Actualmente a mulher já trabalha, já mulheres em geral e em particular as de outras pessoas que querem o
participa activamente na política e mulheres guineenses, contra todo o bem dos guineenses para procurar a
até já ocupa papel importante no tipo de discriminação na sociedade paz e o bem-estar.
estado. em que vivem. Eu enquanto mulher acho que a
Guiné-Bissau está rejeitada pelos
2 Hoje em dia a mulher guineense já 5 É muito difícil conciliar a vida próprios guineenses, o que é muito
se esforça para participar na vida profissional com a vida familiar, eu triste e muito grave.
política; A mulher guineense hoje já tento equilibrar as duas coisas, No meu ponto de vista, como
consegue dar a cara, para contar as embora às vezes ache que dou mais mulher guineense, acho que nunca
suas situações e reivindicar os seus atenção a minha vida profissional. Há podemos abandonar a Guiné-Bissau
direitos na sociedade em que vive; momentos em que sinto que – é o país onde todos nós nascemos
Já consegue participar activamente abandonei a minha família. Só que e crescemos, seja como for é
nas iniciativas (conferências, tive sorte na vida, porque tenho um sempre nosso e nunca deixará de
debates, colóquios) que dizem marido que me compreende muito ser.
respeitos às mulheres. nessas situações. Em 2º lugar: a mulher como mãe,
Exigem-se direitos iguais entre poderá orientar os seus filhos para a
homens e mulheres - igualdade de 6 Nas próximas décadas, acho que o paz na Guiné-Bissau sim. Se a
género. Já se reivindica contra a lugar da mulher na sociedade mulher se colocasse numa posição
violência doméstica contra a mulher guineense irá mudar para melhor e chave na Guiné-Bissau, poderá
e contra o género feminino e a daqui a 20, 30 anos, a mulher conquistar a paz para todos os
eliminação total das práticas da guineense irá conquistar a sociedade guineenses. Para tal deve continuar
Mutilação Genital feminina na Guiné- no seu todo. a lutar para o lugar chave na
Bissau; sociedade guineense, só assim é que
Luta-se contra a desigualdade 7 Por um lado, acho que a mulher a mulher como mãe de todos os
salarial entre homens e mulheres – precisa de conhecer os seus direitos e guineenses, poderá orientar os seus
(trabalho igual, salário igual); deveres, enquanto mulher e mãe na filhos, para um caminho de paz,
É importante a eliminação de todo o sociedade. Por outro lado, queria que sucessos, felicidades e
tipo de discriminação contra a a mulher guineense se colocasse na tranquilidade na Guiné-Bissau para
mulher guineense; Desenvolver posição chave, pois só assim poderá sempre.
brevemente acções de formações na conduzir o mundo para felicidades. Tenho plena certeza que vamos
Guiné-Bissau, para homens conseguir conquistar a paz na
guineenses na área de igualdade de 8 O contributo especial que a mulher Guiné-Bissau sim, porque
género. pode dar para a paz na Guiné-Bissau, merecemos ser felizes.
é o seguinte: Em 1º lugar: a mulher
3 Eu sou uma mulher que sabe o que tem que tomar a Guiné-Bissau como a
quer da vida; que se esforça a todo o sua casa, a sua propriedade privada.
custo para conseguir o que faz Não há nada mais bonito neste mundo
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Informativo
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HOMENAGEM A FIGURAS DE PAZ

Djari , Jovem e excepcional mulher das causas justas…


Fafali Koudawo

Ao longo de três anos de


actividades ao serviço da paz, a
Voz di Paz fez muitos amigos, e
infelizmente perdeu muitos
Djaricunda jamais será
também. como antes

Os primeiros amigos da Voz di Paz «Et rose, elle a vécu ce que


foram os membros dos Espaços vivent les roses, l’espace
Regionais de Diálogo (ERD). Estes d’un matin.»
embaixadores da paz criterio- Esta frase do poeta francês
samente escolhidos em todas as Victor Hugo, lamentando a
regiões tecem com a Voz di Paz morte prematura da sua
uma rede cujas ramificações vão querida filha, desaparecida
dos mais humildes aos mais em plena força da juventude,
influentes dos cidadãos, dos mais recorda estranhamente a vida
jovens aos mais velhos. Imbuídos de Djariatu Baldé. Tal como
de ideais de paz os membros dos uma rosa delicada, ela “viveu
ERD são o elo de ligação da Voz di o tempo que vivem as rosas, o
Paz com as comunidades de base. espaço de uma manhã”. Pois,
Djari na 1ª Reunião geral dos membros dos
Promovem ao longo do ano flor mais procurada e amada,
espaços regionais de diálogo (ERC)
iniciativas de resolução de a rosa sempre vive o seu es-
conflitos, actividades culturais e plendor durante um tempo
desportivas de aproximação dos muito curto.
cidadãos, etc. Assim, 10 ERD, A saudade incomensurável que
integrados por cerca de 100 deixa Djari será dificilmente
pessoas ao todo promovem ao compensada no coração de
longo do ano a cultura de paz na todos aqueles que conheceram
base. esta jovem excepcional,
sorridente, nunca com
Infelizmente, pouco depois do excesso, atenciosa, jamais
arranque das actividades, o ERD com exagero, amável sem
de Mansaba-Farim na região de forçar a sinceridade da sua
Oio perdeu uma jovem e tornar a pessoa central de todas natureza, amiga sem
promissora pessoa. Djariatu Balde as actividades: rádio, patri- vulgaridade, aplicada no
animadora de Kafo, a maior mónio, formação, transformação trabalho sem pretensão, útil,
federação camponesa da Guiné- de produtos, etc. Ela era central com uma delicada discrição.
Bissau e jornalista da Rádio não por expansão açambarcadora, Os germes da amizade que ela
Comunitária Voz di Djalicunda mas simplesmente porque era a semeou nas pessoas mais
morreu inexplicada e alma do Centro. Contactada para humildes como nas mais
repentinamente a 1 de Abril de integrar o ERD da Voz di Paz, ela distintas darão frutos que
2008, deixando uma imensa mostrou uma total entrega e continuarão a sua obra tão
saudade em todos os que algum abnegação ao serviço da causa da simples, tão intensa, tão útil à
dia a conheceram. Paz, fazendo uma natural ligação humanidade, pois útil para as
entre as suas actividades mulheres e os homens mais
Recrutada aos 20 anos por Sambu profissionais, a sua maneira de humildes.
Seck no Centro de Formação estar em sociedade e a sua paixão Adeus, Filha. Para todos,
Camponesa de Djalicunda, pelas causas justas. Djaricunda jamais será o
Djariatu Baldé alargou em 7 anos, mesmo.
o campo dos préstimos e Morreu de repente deixando um
responsabilidades ao ponto de se vazio enorme nas nossas almas.
ECO da Voz di Paz Boletim Informativo

ECO da Voz di Paz I DI NÓS!

Membros ERD Quinará, Guiné-Bissau Membro do ERD de Tombali, Guiné-Bissau


Membro do ERD de Quinará, Guiné-Bissau

Membros ERD de Quinará e Tombali, Guiné-


Bissau Membro do ERD Tombali, Guiné-Bissau

Membros ERD de Quinará e Subgrupo de Bolama Grupo do ERD Quinará, Guiné-Bissau


Membro do ERD de Tombali, Guiné-Bissau

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FICHA TÉCNICA: Eco da Voz di Paz – Boletim Informativo Proprietário: Voz di Paz - Iniciativa para a
Consolidação da Paz Coordenador: Fafali Koudawo Editora: Joacine Katar Moreira;
Redactores: Fafali Koudawo; Joacine Katar Moreira; Concepção gráfica e fotocomposição: Joacine Katar
Moreira Número: 2 Data: Abril 2010 Local: Guiné-Bissau Periodicidade: Mensal - versão electrónica;
bimestral - versão impressa Tiragem: 1500 exemplares

Parceiro: Interpeace
Financiado pelo Governo da Finlândia

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