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JUVENATRIX – Fanzine de Horror & Ficção Científica

ANO 28 – Número 192 – JANEIRO 2018

JUVENATRIX – Desde Janeiro de 1991 – total 4.605 páginas


“A morte é apenas o começo... de uma eterna vida de dor...”
Editor – RR / Capa – Márcio Rogério Silva
INTERNET
Blogs: www.infernoticias.blogspot.com.br & www.juvenatrix.blogspot.com.br
E-mail: renatorosatti@yahoo.com.br / Twitter: www.twitter.com/juvenatrix

Lançamento dessa edição: 22/01/2018 – São Paulo/SP


Distribuição gratuita em arquivo PDF por e-mail

HORROR E METAL EXTREMO


Música: Quintessence / Banda: Darkthrone (Noruega) / Álbum: Panzerfaust (1995)

Eight miles deep the well forgotten by mortals. Oh, I drank it empty in one single sip. Eight miles wide the valley beyond all
hope. Oh, I filled the whole with one single fist. Five million christians on a ride towards us. Oh, I slaughtered the bunch with
one single hit (with my spear). Five million women so alone in the night. Oh, I had them all satisfied profusely (every night by
myself). Ten thousand trolls hard as rock cold as ice. Oh, they ran when I rose to face them. Ten hungry waves they swallowed
my ship. Oh, I steadily walked home (and I only got wet on my feet). No single book were beholden by me. Oh, no question I
cannot do answer. Only one single lamp do show me this way. And that is the eye of satan.

Memórias do punk hardcore:


LP vinil – “Afflicted Cries in the Darkness of War” (1989) – coletânea com as bandas suecas
“Anti-Cimex”, “Crude SS”, “Fear of War” e “Rovsvett”
DIVULGAÇÕES & CURIOSIDADES
R.I.P. Bradford Dillman (1930 / 2018)

Ator americano que morreu em 16/01/18. Esteve em "A Fuga do Planeta dos Macacos" (1971), "Balada Para Satã" (1971),
"Praga Infernal" (1975), "Piranha" (1978).

Fanzine: “Quadrinhos Independentes” 148


“Quadrinhos Independentes” – Foi lançada a edição 148 (Novembro / Dezembro de 2017), editado por Edgard Guimarães,
com 32 páginas, formato meio ofício e impressão digital.
Conteúdo: quadrinhos, artigos, anúncios, ilustrações, seção de cartas dos leitores e divulgação de fanzines.
Traz também o encarte “Artigos sobre Histórias em Quadrinhos” número 9 com “A História do Oeste”, de Carlos Gonçalves,
12 páginas.
Contatos: A/C Edgard Guimarães – Rua Capitão Gomes 168 – Brasópolis/MG – CEP 37530-000
e-mail: Edgard.faria.guimaraes@gmail.com
Mais informações: http://mensagensdohiperespaco.blogspot.com.br/2017/12/qi-148.html

Memórias dos fanzines:


“B-Zine” #1 (1994), “The Lady Vanishes” #3 (2006), “Cinema Mundi” #10 (1995)
“O Corvo” # 7 (2001), “Somnium” # 40 (1989), “Funestos” # 1 (2001)
Confiram uma lista sugerida de filmes de horror, suspense, ficção científica e fantasia
lançados nos cinemas brasileiros durante o ano de 2017
A lista abaixo pode não estar completa, mas serve como uma interessante referência dos filmes com elementos fantásticos
(Horror, Ficção Científica, Suspense, Fantasia) que entraram em cartaz no circuito comercial dos cinemas brasileiros no
ano de 2017, num total de 55 filmes.

1º semestre
* Dominação (Incarnate, EUA, 2016) – estreou em 05/01/17 (horror)
* Passageiros (Passengers, EUA, 2016) – estreou em 05/01/17 (ficção científica)
* Assassin´s Creed (EUA / Inglaterra / França / Hong Kong, 2016) – estreou em 12/01/17 (ação com elementos de horror e
fantasia)
* Resident Evil 6: O Capítulo Final (Resident Evil: The Final Chapter, Alemanha / Austrália / Canadá / França, 2016) – estreou
em 26/01/17 (horror)
* O Chamado 3 (Rings, EUA, 2017) – estreou em 02/02/17 (horror)
* A Cura (The Cure for Wellness, EUA / Alemanha, 2016) – estreou em 16/02/17 (horror)
* A Grande Muralha (The Great Wall, EUA / China, 2016) – estreou em 23/02/17 (ação com elementos de horror)
* BugiGangue no Espaço (Gadgetgang in Outerspace, Brasil, 2016) – estreou em 23/02/17 (animação com elementos de FC)
* Monster Trucks (EUA / Canadá, 2016) – estreou em 23/02/17 (aventura com elementos de fantasia)
* Logan (EUA, 2017) – estreou em 02/03/17 (ação com elementos de horror e ficção científica)
* Kong: A Ilha da Caveira (Kong: Skull Island, EUA / Vietnã, 2017) – estreou em 09/03/17 (aventura com elementos de horror
e fantasia)
* A Bela e a Fera (Beauty and the Beast, EUA, 2017) – estreou em 16/03/17 (fantasia)
* Fragmentado (Split, EUA, 2016) – estreou em 23/03/17 (horror)
* Power Rangers (EUA / Canadá, 2017) – estreou em 23/03/17 (ação com elementos de ficção científica)
* A Vigilante do Amanhã: Ghost in the Shell (Ghost in the Shell, EUA, 2017) – estreou em 30/03/17 (ação com elementos de
ficção científica)
* A Cabana (The Shack, EUA, 2017) – estreou em 06/04/17 (drama com elementos de fantasia)
* Vida (Life, EUA, 2017) – estreou em 20/04/17 (ficção científica com elementos de horror)
* Guardiões da Galáxia Vol. 2 (Guardians of the Galaxy Vol. 2, EUA, 2017) – estreou em 27/04/17 (aventura com elementos
de ficção científica)
* A Autópsia (The Autopsy of Jane Doe, EUA, 2016) – estreou em 04/05/17 (horror)
* Alien: Covenant (EUA / Inglaterra / Nova Zelândia / Austrália, 2017) – estreou em 11/05/17 (ficção científica com elementos
de horror)
* Corra! (Get Out, EUA, 2017) – estreou em 18/05/17 (horror)
* O Rastro (Brasil, 2017) – estreou em 18/05/17 (horror)
* Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar (Pirates of the Caribbean: Dead Men Tell No Tales / Salazar´s Revenge, EUA,
2017) – estreou em 25/05/17 (aventura com elementos de fantasia e horror)
* Mulher-Maravilha (Wonder Woman, EUA / China / Hong Kong, 2017) – estreou em 01/06/17 (ação com elementos de
fantasia)
* A Múmia (The Mummy, EUA, 2017) – estreou em 08/06/17 (horror)
* Colossal (EUA / Canadá / Espanha / Coreia do Sul, 2016) – estreou em 15/06/17 (ficção científica)
* O Círculo (The Circle, EUA / Emirados Árabes, 2017) – estreou em 22/06/17 (thriller com elementos de ficção científica)
* Ao Cair da Noite (I t Comes at Night, EUA, 2017) – estreou em 22/06/17 (horror)

2º semestre
* Homem-Aranha: De Volta ao Lar (Spider-Man: Homecoming, EUA, 2017) – estreou em 06/07/17 (aventura com elementos
de fantasia e ficção científica)
* Transformers: O Último Cavaleiro (Transformers: The Last Knight, EUA, 2017) – estreou em 20/07/17 (ação com elementos
de ficção científica)
* 7 Desejos (Wish Upon, EUA, 2017) – estreou em 27/07/17 (horror)
* Planeta dos Macacos: A Guerra (War for the Planet of the Apes, EUA, 2017) – estreou em 03/08/17 (ficção científica)
* Valerian e a Cidade dos Mil Planetas (Valerian and the City of a Thousand Planets, França, 2017) – estreou em 10/08/17
(aventura com elementos de ficção científica e fantasia)
* Malasartes e o Duelo Com a Morte (Brasil, 2017) – estreou em 10/08/17 (comédia com elementos de fantasia)
* Annabelle 2: A Criação do Mal (Annabelle: Creation, EUA, 2017) – estreou em 17/08/17 (horror)
* A Torre Negra (The Dark Tower, EUA, 2017) – estreou em 24/08/17 (ação com elementos de horror e fantasia)
* Atômica (Atomic Blonde, Alemnaha / Suécia / EUA, 2017) – estreou em 31/08/17 (thriller)
* Os Guardiões (The Guardians, Rússia, 2017) – estreou em 31/08/17 (ação com elementos de ficção científica e fantasia)
* It: A Coisa (It, EUA, 2017) – estreou em 07/09/17 (horror)
* 2:22 – Encontro Marcado (2:22, EUA / Austrália, 2017) – estreou em 07/09/17 (thriller)
* Amityville: O Despertar (Amityville: The Awakening, EUA, 2017) – estreou em 14/09/17 (horror)
* Mãe! (Mother!, EUA, 2017) – estreou em 21/09/17 (drama com elementos de horror e mistério)
* Sono Mortal (Dead Awake, EUA, 2016) – estreou em 28/09/17 (horror)
* Blade Runner 2049 (EUA / Canadá / Inglaterra, 2017) – estreou em 05/10/17 (ficção científica)
* A Morte Te Dá Parabéns! (Happy Death Day, EUA, 2017) – estreou em 12/10/17 (horror)
* Além da Morte (Flatliners, EUA, 2017) – estreou em 19/10/17 (horror)
* Tempestade: Planeta em Fúria (Geostorm, EUA, 2017) – estreou em 19/10/17 (ação com elementos de ficção científica)
* Thor: Ragnarok (EUA, 2017) – estreou em 26/10/17 (ação com elementos de ficção científica)
* A Noiva (The Bride / Nevesta, Rússia, 2017) – estreou em 02/11/17 (horror)
* Big Pai, Big Filho (The Sono f Bigfoot, França / Bélgica, 2017) – estreou em 18/11/17 (animação de aventura com elementos
de fantasia)
* Liga da Justiça (Justice League, EUA, 2017) – estreou em 16/11/17 (ação com elementos de fantasia)
* Boneco de Neve (The Snowman, EUA / Inglaterra / Suécia, 2017) – estreou em 23/11/17 (horror)
* Assassinato no Expresso do Oriente (Murder on the Orient Express, EUA / Malta, 2017) – estreou em 30/11/17 (thriller)
* Jogos Mortais: Jigsaw (Jigsaw, EUA / Canadá, 2017) – estreou em 30/11/17 (horror)
* Star Wars: Os Últimos Jedi (Star Wars: The Last Jedi, EUA, 2017) – estreou em 14/12/17 (aventura com elementos de
fantasia)

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CONTOS

Projeto K9 por Allan Fear


O sol queimava em um céu azul límpido. Passava pouco do meio-dia, a correria no centro da cidade seguia estressante,
transito engarrafado e motoristas apressados que não economizavam nas buzinas.
-Cara eu ferrei aquele bosta- dizia Rodrigo, um jovem de 21 anos para seus dois colegas encostados na parede branca
ao lado de uma agência do Bradesco, de frente para a praça da Sé. –O filho da puta sempre chegava bêbado em casa e brigava
com minha velha, mas neste fim de semana ele quis botar a mão nela.
Seus dois colegas, um rapaz conhecido como Pedrosa, alto, de pele clara, mas bronzeada pelo sol, ouvia os relatos,
enquanto segurava algumas correntinhas douradas e prateadas de metais vagabundos e oferecia a quem passava. Ao seu lado,
uma garota, a quem todos chamavam de Lora, tragava um cigarro e brincava com o piercing na língua, prendendo-o entre os
dentes.
-Era domingo a noite saca?– falou Rodrigo gesticulando, seu semblante estava meio distorcido num misto de raiva
com frustração, mas salpicado de um certo assombro. –Eu estava jantando, aí ele já chegou reclamando e de repente ele pegou
a minha velha pelo pescoço e ergueu o punho fechado, cara ele ia arregaçar a cara dela.
-O sangue ferveu e eu puxei ele, caímos os dois, eu tava com a faca de serrinha que cortava o bife, aí eu furei ele até
botar suas tripas pra fora. Foi que nem linguiça saindo da máquina no açougue saca?
-Pô Rodrigo mandou bem- elogiou Lora, cumprimentando-o com seu melhor aperto de mão. –Mas e aí o que quê
pegou depois?
-A velha mandou eu dar no pé até a poeira baixar, aí pensei em passar uns dias com você prima. Você sabe, eu posso
ajudar nos corre.
-Tamo junto velho, - murmurou Pedrosa em sua voz áspera, fitando Rodrigo com aquele olhar de malandro e
cumprimentando-o. –Família da Lora é sempre bem vinda na nossa comunidade morou?
Rodrigo agradeceu, exibindo seu sorriso torto, de dentes encavalados e encardidos.
Mentir se tornara tão fácil, ele sabia fazer com emoção, às vezes até chegava a acreditar em suas mentiras. Ele queria
ter matado o pai, queria mesmo, mas não era forte, ou mesmo corajoso o suficiente.
Rodrigo tentava ser durão, sabia que precisava disso para sobreviver nas ruas desde que largou a escola e decidiu
vadiar.
Ele tentou mesmo deter o pai quando este estapeou sua mãe, mas o homem era mais forte e o ameaçou com uma
peixeira. Rodrigo ainda sentia o pequeno furo que a faca lhe causara uns centímetros acima do umbigo. O pai lhe falara tanto,
um belo sermão, e jurou que o abriria como um porco. Era difícil duvidar, pois estava com uma faca pressionada em sua
barriga, penetrando em sua pele lentamente.
A mãe implorou para que o pai o deixasse ir e Rodrigo ficou paralisado pelo medo, se borrando todo, sem reação.
O homem pensou por um instante, com a faca na barriga de Rodrigo, e o libertou, cuspindo-lhe ameaças amargas,
afinal era o único da casa que trabalhava e achava que a mulher e o filho eram suas propriedades.
O pai o libertou e deu-lhe uma hora para juntar suas tralhas e dar o fora dali, do contrário quando voltasse para o
barraco, o esfolaria vivo.
Rodrigo sabia que o pai tinha uns homicídios nas costas, já estivera preso algumas vezes, e sabia bem que ele cumpria
suas promessas. Era um homem frio, nervoso, explosivo.
A mãe implorou para que Rodrigo fosse embora, tinha lágrimas nos olhos. Ela temia o marido, chorava e implorava,
mas aceitava ser espancada, se submetia as suas fantasias sexuais doentias.
Rodrigo juntou algumas tralhas e deixou o barraco onde morava, descendo o morro da Vila Jacui na calada da noite
quente de verão.
Rodrigo sabia que sua prima e os amigos dela vadiavam na rua, roubando, usando drogas e aprontando. Mas que
escolha ele tinha? Pelo menos assim ele descolava uns trocados, pois os 30 reais que a mãe lhe dera não duraria muito.
Pedrosa usava de suas artimanhas da rua, fingia conhecer alguns jovens que passavam e estendia a mão para
cumprimentá-los, com o intuito de vender as correntinhas. Era um truque funcional, pois a pessoa olhava para Pedrosa e ficava
tentando se lembrar de onde o conhecia, e isso era a deixa para fazer o cumprimento e já ir colocando a correntinha no pescoço
da vítima, forçando-a a comprar.
-Qual é a boa de hoje?- indagou Rodrigo, de braços cruzados em frente ao peito, sobre o blusão vermelho, tentando
disfarçar suas preocupações.
-O lance tá na moral – falou Lora chegando mais perto dele, -tamo nos esquemas de celular morou?
-Vem com a gente,- chamou Pedrosa, colocou as correntes que segurava no próprio pescoço e seguiu, com seu
gingado de malandro pela rua, atrás de um coletivo vermelho que parara em um ponto para pegar passageiros.
-Observa- murmurou Pedrosa voltando-se para Rodrigo.
Pedrosa parou próximo ao ônibus, olhando atentamente os passageiros sentados próximos à janela e viu uma moça
loira, aparentando uns 25 anos, com um Smartphone na mão, digitando concentrada no teclado de um aplicativo de mensagens.
Pedrosa preparou seu bote, olhando ao redor, se certificando de que não havia policiais por perto ou potenciais
ameaças, esperou ouvir o ruído de ar quando o motorista fechou a porta do veículo e pisou com força no acelerador. Foi neste
exato momento que, impulsionado pela adrenalina, Pedrosa deu seu bote, saltando e pegando o celular da jovem moça,
agarrando-o com sua mão forte, puxando-o com força.
A moça gritou de surpresa, chamando a atenção dos demais passageiros, enquanto Pedrosa pousou os pés no chão e
começou a correr.
Lora fez sinal com a cabeça para Rodrigo que estava aturdido e correram para o lado oposto de Pedrosa.
Pedrosa ouviu gritarem: “pega ladrão” enquanto corria entre os carros, desviando deles. Cruzou uma esquina e viu um
policial gordo atravessar a rua e vir em sua direção.
Mas o policial não estava no mesmo pique que Pedrosa, os poucos passos que dera, já havia acabado com seu fôlego,
seu rosto branco e gordo estava vermelho, minando suor.
Pedrosa desapareceu de sua vista por entre os carros, dando trombadas em alguns pedestres e cinco minutos depois se
encontrou com Lora e Rodrigo embaixo de um viaduto, na Avenida 23 de Maio, onde havia muitos papelões sobre o chão.
Pedrosa chegou e os conduziu por uma boca de lobo para os esgotos, escondida debaixo dos papelões. Desceram as
escadas de ferro e Rodrigo viu que era ali o quartel general dos vagabundos de São Paulo.
O local era uma parte desativada dos esgotos, provavelmente uma obra inacabada, e não passava um canal por ali.
Estava seco, muitas moradas de papelão se estendiam pelo perímetro. Tambores com chamas crepitando serviam de
iluminação. Fogões de lenha feitos de tijolos se estendiam entre uma morada e outra. Um cheiro de urina com carne assada
pairava no ar.
Outros vagabundos conversavam e bebiam na extensão do esgoto. Uns riam e dançavam. Outros estavam caídos pelos
cantos, provavelmente de porre.
Pedrosa retirou da cintura e exibiu um grande aparelho celular de cor dourada.
-O Edu vai pagar uma nota nesse aí!- exclamou Lora sorrindo e pegando o celular e examinando-o nas mãos. Depois o
devolveu ao amigo e acendeu outro cigarro, ofereceu um ao Rodrigo, mas este recusou.
-Já que cê tá com a gente, a meta vai ser conseguir uns 10 aparelhos hoje pode crê?- indagou Pedrosa abraçando
Rodrigo pelo pescoço, naquela conversa de manos.
-Pode deixar comigo- assentiu Rodrigo, sentindo um arrepio gelado percorrer seu corpo. Não era muito bom em
roubar, ele sabia que tinha que fazer o que fosse preciso para sobreviver, mas não leva muito jeito pra coisa.
No ano passado, com uma turma com quem andava, disseram que era a vez dele, e tentou roubar o relógio de uma
mulher na rua, quando ela saia de uma loja, era quase final de tarde. Chegou nela por trás, como seus colegas faziam, e foi
metendo a mão em seu relógio, mas não conseguiu que ele se soltasse do seu braço e a mulher começou a gritar, era uma
senhora já na casa dos 40.
Desesperado pelos gritos da mulher, sentindo as pernas moles, tremendo como vara de bambu, ele começou a correr e,
para seu espanto, um homem corpulento e alto, saiu de uma loja e veio atrás dele, cuspindo ameaças.
Rodrigo nunca correra tanto na vida e só conseguiu escapar depois que quase foi atropelado por um carro, ganhar um
dos becos do morro e subir em disparada.
Depois disso foi muito zombado pela galera e decidiu não andar mais com eles. Jurou para si mesmo que não iria mais
roubar as pessoas.
Mas ali estava ele, sabia que se não ajudasse a roubar não o iriam aceita-lo no bando. Ele não tinha pra onde ir, não
tinha mais parentes em São Paulo e sabia que se ficasse sozinho pelas ruas seria estuprado ou mesmo morto.
Sua tia Rosaura, mãe da Lora, preparou para eles uma carne bovina com pães dormidos. Ele comeu avidamente. A
mulher era uma viciada em crack, morava ali, debaixo da Avenida 23 de Maio. Era magra e os traços de parentesco com Lora
já haviam desaparecido.
Após a refeição saíram os três para a rua. O dia seguia quente, a temperatura chegando aos 37 graus.
- Vamos para a Avenida da Liberdade- disse Pedrosa, deu num longo trago no Derby e continuou –quero ver você agir
mano, sempre vamos pra lá nesse horário. Lá é sossegado e os tiras não aparecem, é dar o pulão e correr pra casa.
-Não tem erro primo, - começou Lora, abraçando Rodrigo pelo pescoço, -você dá o bote e corre, até a pessoa se dar
conta do que tá acontecendo cê já se mandou.
-Pode Crê- assentiu Rodrigo, nervoso, apreensivo.
-Aqui nos damos o bote nos balai verde já é?- indagou Pedrosa.
-Por que os verdes?
-Se liga brown, eu já matutei o lance todo, os move não abrem a janela, e os verde que passam aqui não tem ar
condicionado, aí é manha dar o bote porque sempre tem um com a janela aberta, distraído no celular.
-Saquei.
-É só dar o bote e vazar, é super de boa- falou Lora dando no primo um soco no ombro de brincadeira.
Os jovens ficaram próximos à lanchonete, Pedrosa ofertando suas correntinhas vagabundas, então fez sinal para
Rodrigo agir quando viu o ônibus da linha verde parou no ponto.
Rodrigo apreensivo, nervoso, sentindo o misto de medo com adrenalina invadir seu corpo, lutando contra as pernas
que tremiam, olhou, da calçada, para as janelas abertas do ônibus, e lá estavam três potenciais vítimas sentadas nas poltronas
com as janelas abertas, cada uma com um smartphones nas mãos. Ele poderia escolher de quem roubar.
A primeira vítima era uma mulher, aparentava uns 45 anos, estava sentada próxima a roleta do cobrador. Era uma
mulher gorda, segurava o telefone com a mão direita e falava através do gravador de voz.
A segunda vítima era um rapaz jovem, de uns 20 anos, estava sentado na cadeira mais alta, que fica sobre as rodas
traseiras do ônibus. Segurava o telefone com a mão esquerda e parecia ler algum artigo.
A terceira vítima era uma adolescente, estava sentada na última cadeira, depois da porta traseira, e segurava um grande
telefone de cor branca, digitando freneticamente.
Rodrigo sabia que tinha pouco tempo, mas precisava vencer o nervosismo, pois apenas cinco pessoas estavam
embarcando no ônibus e outras duas descendo.
Precisava ser rápido, e diante da situação, em sua mente, a terceira vítima parecia a melhor opção, pois uma
adolescente não teria força para segurar o telefone quando ele o puxasse, e como ela estava na parte de trás do veículo, seria
mais ágil pegar e já se distanciar rapidamente do veículo.
Era hora de agir, o ultimo passageiro já havia embarcado no ônibus, Rodrigo deu um pique até o veículo, ouviu o
ruído de ar quando o motorista fechou a porta, chegou perto e já ia dar o bote quando a menina parou de digitar e olhou para
ele, com um ar interrogativo estampado no rosto branco e delicado.
Rodrigo sentiu a respiração presa na garganta, o ônibus começou a acelerar, e sem pensar, agindo apenas por impulso,
ele usou a mão esquerda para apoiar na janela e saltou, enfiando sua mão dentro do veículo e puxou com força o telefone.
A menina deu um grito estridente, agudo, enquanto ele pousava os pés no asfalto e se preparava para correr, mas o
grande telefone caiu de sua mão, se espatifando no chão.
Rodrigo pensou em pegar o aparelho assim mesmo, mas ouviu o som das rodas do ônibus derraparem e o veículo parar
e abrir as portas.
O coro “pega Ladrão” explodia de dentro do ônibus, enquanto Rodrigo corria como um louco. Corria para longe dali,
corria enquanto a palavra de seu pai lhe retumbava na mente: “Fracassado”. A palavra que ele usava para defini-lo desde sua
infância. “Fracassado”.“Fracassado”.“Fracassado”.
Rodrigo estava ofegante quando parou debaixo do viaduto da Avenida 23 de Maio. O suor lhe minava da testa.
-Que merda cê fez lá cara?- indagou Pedrosa saindo das sombras, uma carranca estampada na face cinzenta. –cê ferrou
tudo seu cuzão!!
-Me desculpem- murmurou Rodrigo cabisbaixo, com uma mão apoiando o corpo numa das vigas do viaduto, tentando
recuperar o fôlego. –A mina se virou e me encarou, daí tentei pegar o telefone, mas ele escorregou da minha mão e...
-Esquenta não primo- começou Lora, se aproximando dele, acendendo um cigarro. –A gente volta lá e consegue meter
a fita noutro otário.
Passava pouco das 16 horas. O sol começava a mudar de cor, lançando seus raios avermelhados pelas ruas e prédios.
Pedrosa e seus amigos estavam de volta na Praça da Sé, observando o movimento.
As pessoas passavam apressadas em seus carros ou a pé enquanto outras, angustiadas, esperavam pelos ônibus nos
pontos.
A turma sondava os pontos, quando Pedrosa olhou para uma das paradas de ônibus do outro lado da rua e viu algo que
lhe causou um arrepio nas costas.
No ponto de ônibus havia quatro pessoas, eram elas: um cadeirante já idoso com um jornal dobrado repousando sobre
seu colo, dois homens altos, magros vestindo ternos pretos, conversando animadamente e uma mulher estranhamente magra e
de pele muito clara, aparentava ter uns 40 anos. O que chamou a atenção do marginal foi o grande celular que ela segurava com
um desenho de uma maçã mordida na parte de trás.
Pedrosa sabia que aquele celular valeria uma fortuna. Se não fosse pelos dois homens, com certeza teria o surrupiado
da pobre mulher ali mesmo no ponto, mas seria arriscado. Valia a pena esperar ela entrar no ônibus e quem sabe tivesse sorte
de efetuar o furto pela janela como era de costume.
Entre um cigarro e outro, inquieto, Pedrosa ficou esperando. Mais adiante Lora e Rodrigo o observavam, já haviam
entendido o que ele planejava fazer.
Não levou cinco minutos para que um ônibus vermelho aparecesse e a mulher erguer o dedo e em sinal para que
parasse.
O ônibus parou no ponto, a mulher embarcou, seguida dos dois homens, então o cobrador acionou o elevador do
veículo e ajudou o cadeirante a embarcar também.
Pedrosa viu a mulher magra, de cabelos pretos e ralos passar o cartão e rodar a catraca, em seguida se sentou numa
cadeira ao lado da janela e retornou a digitar no telefone.
Pedrosa não viu mais nada, como se tudo estivesse borrado, a não ser a mulher com o telefone na mão, ao lado da
janela totalmente aberta, esperando por seu bote.
Como um felino, Pedrosa andou sorrateiramente em direção ao ônibus, pronto para dar o seu melhor bote.
Quando ouviu as portas do ônibus se fecharem e o ronco do motor que fez o ônibus começar a andar, Pedrosa deu o
bote, pulando na janela e enfiando sua mão no interior do veículo em busca do celular.
Mas para seu espanto, a mulher, que parecia distraída numa conversa, afastou seu corpo, colando-se ao encosto do
banco, fazendo a mão de pedrosa passar direto. Mas quando foi puxar seu braço, frustrado pela astúcia da mulher, Pedrosa
sentiu mãos fortes o agarrarem com força.
-Hey!!- gritou Pedrosa surpreso, -Mas que merda é essa?
O ônibus acelerava, ganhando velocidade, fazendo pedrosa correr para acompanhar o veículo enquanto se debatia,
tentando soltar seu braço.
-Me larga seus merdas!- xingou Pedrosa ao conseguir ver dois homens abaixados junto aos bancos, ele os reconheceu,
eram os dois que estavam no ponto de ternos pretos. –O que vocês querem seus viados?
Então Pedrosa sentiu uma fincada no braço, exatamente como uma agulhada, em seguida uma pressão, estavam
injetando algo em seu braço. Ele berrou a plenos pulmões e rapidamente o soltaram, fazendo ele cambalear no asfalto para em
seguida cair sobre o solo duro e quente.
Lora e Rodrigo o acudiram e o ajudaram a sair da rua. Pedrosa havia ralado os cotovelos e o joelho direito na queda.
-Mas que porra foi aquela?- Indagou Lora, estudando o rosto de Pedrosa. –Aqueles caras te agarraram...
-Eles me seguraram e me espetaram com uma agulha- vociferou Pedrosa, estava furioso. Examinava o braço direito,
onde no antebraço havia um pequeno furinho de onde escorria uma gota de sangue. –Tá vendo, olha a picada da agulha aqui!
Essa merda tá ardendo pra cassete.
Rodrigo estava olhando, incrédulo, sem reação.
-Por que eles fizeram isso?- indagou Rodrigo num fio de voz.
-E eu é que vou saber? Esses filhos da puta do caralho.
-Deve ser alguém que teve o celular roubado e agora tá se vingando.- falou Lora, pensativa. –Mas foi estranho, parece
até que estavam armando pra gente.
-Vamos pra outro pedaço,- murmurou Pedrosa andando, procurando seu maço de cigarros nos bolsos da bermuda. –Se
eu pegar aqueles filhos da puta vou fazê-los engolir aquela seringa com agulha e tudo.
Pedrosa e seus amigos continuaram a rondar as ruas da cidade à procura de novas vítimas, mas ele não se sentia muito
bem, grossas olheiras começavam a se formar sob seus olhos, sua cabeça latejava de dor e seu corpo ardia em febre, estranhos
calafrios se espalhavam por sua nuca. Seu braço direito parecia pesado, dormente.
-Cara você não parece nada bem- disse Rodrigo, encarando o amigo. –Vamos pro hospital, pra saber o que tinha
naquela seringa e...
-Seu bosta- rosnou Pedrosa pegando Rodrigo pela gola do blusão. –Você acha que os médicos estão se lixando pra
moradores de rua? Se eu for lá é bem capaz de chamarem a polícia pra mim e falar que eu tentei roubá-los.
-Aqui nas ruas uns cuidam dos outros- falou Lora passando um braço em torno do ombro de Pedrosa, ajudando-o a
caminhar. –Vamos voltar pro nosso lar. Lá você toma uns comprimidos pra febre baixar e descansa um pouco.
Seguiram em silêncio, Pedrosa estava ofegante, com o suor minando de seu corpo. Os olhos quase fechados,
avermelhados, a pele cada vez mais pálida. O local da picada no braço inchando como um furúnculo.
O sol estava se pondo, já passava pouco das 18 horas quando chegaram na Avenida 23 de Maio e entraram para o
subterrâneo do viaduto.
Lora deu alguns comprimidos para Pedrosa, alguns copos com água e uma sopa. Deixou-o deitado e colocou
compressas de pano úmido em sua testa na esperança de baixar sua temperatura. Depois jantaram ovos fritos com tomate e
beberam um pouco de rum barato sob a luz das chamas que queimavam nos tambores.
Rodrigo ficou surpreso com a quantidade de moradores que habitavam aquele espaço. Eram por volta de algumas
dúzias, dentre eles homens, mulheres e crianças. Havia também alguns cães vira latas.
Depois da janta todos começaram a se aninhar em seus barracos de papelão e lenções para dormir. Rodrigo ficou num
barraco amplo com Lora e Pedrosa. Era simples, papelões e lenções forravam o chão e a coberta era um tecido xadrez, igual
aos usados em redes de balanço.
Desde que jantara a sopa que Lora lhe dera na boca, Pedrosa não falou mais, tentava dormir, enquanto o corpo tremia.
Lora dissera que ele iria melhorar, os remédios o deixariam com muito sono e quando acordasse estaria melhor.
Mas Rodrigo não sabia se poderia acreditar em sua amiga. Pedrosa estava muito mal. O braço direito estava ficando
roxo e tremia bastante. O local da picada da agulha já estava inflamado, inchado do tamanho de um pêssego.
Por fim todos já estavam dormindo, exceto Rodrigo, que se sentia inquieto com a respiração ruidosa de Pedrosa e
aquele cheiro de carniça que começou de repente. De inicio ele pensou que algum sem teto estivesse defecando por perto.
Lora estava deitada em uma extremidade do barracão e dormia profundamente. No meio estava Pedrosa, deitado de
barriga para cima e do seu lado direito estava Rodrigo.
Ainda havia um tambor com fogo lá fora, fazendo sua luz entrar por algumas frestas no papelão que servia de parede
do barracão, deixando o local numa penumbra. Rodrigo se levantou, pegou uma garrafa de água numa prateleira improvisada
de madeira e deu duas longas tragadas, ele estava arrasado com sua situação, expulso de casa, ter de roubar para sobreviver
correndo risco de ser morto ou preso.
Rodrigo guardou a garrafa na prateleira e se aproximou de Pedrosa, tapando o nariz com a gola da blusa. O fedor
estava mais forte e parecia vir do moribundo.
Rodrigo notou que o braço de Pedrosa estava cheio de bolhas que iam inchando, se tornando cada vez maiores. O
braço estava cada vez mais roxo. Parecia tão grande quanto sua coxa.
Algo estava errado. Isso Rodrigo sabia. Mas o que havia injetado no braço de Pedrosa? O que iria acontecer com ele?
Será que ele sobreviveria àquela noite?
-Lora- chamou Rodrigo, estudando as bolhas no braço de Pedrosa que cresciam, atingindo o tamanho de laranjas. –
Lora, acorda! Tem algo errado acontecendo com o braço do Pedrosa.
Ela acordou sonolenta, piscando e cambaleou de joelhos até o amigo.
-Porra- grunhiu ela tapando o nariz e a boca com a palma da mão, -Que carniça. Esse fedor...
-Tá vindo do braço, olha- falou Rodrigo apontando para o braço inchado, de cor roxa cujos caroços não paravam de
crescer. –Parece que vão...
“Bruurffff” Foi como o som de um peido nojento quando os caroços começaram a estourar, liberando uma gosma
malcheirosa e antes que pudessem protestar, os olhos de Pedrosa se abriram, olhos vermelhos cheios de sangue, e de sua boca
um urro animalesco explodiu no pequeno barracão.
Enlouquecido de dor, de desespero, com uma dose absurda de adrenalina pulsando em seu peito, Pedrosa, aos berros
ensandecidos, levantou suas mãos e agarrou seus amigos, puxando-os.
Sua mão direita agarrou no rosto de Rodrigo, enterrando dois dedos em sua boca e apertando de forma sobre humana,
enquanto a mão esquerda agarrou o pescoço de Lora, estrangulando-a, esmagando sua traqueia.
Os jovens tentaram se libertar, gritando, sufocados pela carniça putrefata que lhes penetrava pelas narinas.
Mas a força ensandecida da loucura de Pedrosa era por demais absurda e deslocou o maxilar de Rodrigo, quebrando-o
em seguida.
Sua mão esquerda torceu o pescoço de Lora como se torce o pescoço de uma galinha.
Os outros sem teto arrancaram os papelões do barracão para ver do que se tratava toda aquela gritaria e se depararam
com os corpos caídos de Lora e Rodrigo, enquanto Pedrosa, agora com uma aparência inumana, bestial, não apenas com o
braço direito inchado, mas todo o corpo, que agora ganhara uma cor roxa, se erguia enlouquecido pronto para atacar e destruir
tudo a sua volta, berrando ferozmente.
Os mendigos, os quatro que haviam acordado, estavam assustados, tentando entender se aquele horror era real ou se
fazia parte de seus delírios, tentaram contê-lo.
Mas Pedrosa, ou aquela coisa asquerosa em que se transformara, os atacou de forma animal, mordendo e dilacerando-
os enquanto os furúnculos continuavam a crescer e estourar por todo o seu corpo, liberando uma estranha gosma que ao atingir
outras pessoas queimava lhes a pele, como ácido, derretendo até os ossos.
Parado, nas sombras da Avenida 23 de Maio, já por volta das 4 da manhã, havia um Volvo preto. O Motorista, um
rapaz de uns 30 anos, com cabeça raspada e vestindo roupas sociais escuras, olhava para o Rolex de ouro em seu pulso. Estava
calmo e sereno. Mascava tranquilamente um chiclete.
Passados mais cinco minutos ele abriu a porta do Volvo e saiu do veículo carregando uma lanterna. Olhou em volta, a
avenida estava calma e deserta, uma brisa fresca soprava do norte.
O homem foi em direção ao esgoto desativado que ficava embaixo do viaduto. Passou pelos papelões no chão, ligou a
lanterna e sob sua luz brilhante achou a entrada secreta dos sem teto.
Tirou uma máscara especial que pendia sobre o peito e a colocou sobre a face. Ajeitou suas luvas pretas de couro nas
mãos e começou a descer as escadas de ferro apoiando os pés e uma das mãos enquanto a outra segurava a lanterna.
O rapaz chegou ao fundo do esgoto, escuro, silencioso, malcheiroso e contemplou uma cena macabra, onde dezenas de
corpos em putrefação se espalhavam pelo perímetro. Todos estavam inchados, com a pele completamente roxa, cheio de
perebas e buracos por todo o corpo.
Ele tirou o celular do bolso e começou a fotografar os corpos, iluminando-os atentamente com a lanterna, dali mesmo,
parado próximo as escadas de ferro. Tirou ao menos uma dúzia de fotos, depois retornou as escadas, apesar da máscara, o odor
de carniça era demasiadamente insuportável.
O homem camuflou a entrada do esgoto novamente e voltou para seu carro. Deu a partida e acelerou pela Avenida
enquanto fazia uma ligação.
-Como foi?- indagou uma voz feminina do outro lado da linha após o segundo toque.
-Um sucesso. Exatamente como se dá quando uma barata ingere o veneno e volta para o ninho onde morre e mata
todos com ela.
-Muito bom- disse a mulher, expressando excitação. –Então o Projeto K9 é um sucesso. Finalmente criamos um vírus
capaz de eliminar essa escória pela raiz.
-Sim senhora. Pelo que pude ver o indivíduo infectado se torna agressivo e adquire uma força sobre humana e mata
qualquer um à sua volta. E à medida que o vírus entra no estágio três o individuo infectado morre. Como o contágio se dá pelo
contato com o infectado ou pela inalação dos gases que seu corpo libera quando os furúnculos crescem e estouram, a
eliminação da espécie se dá de forma bem rápida.
-Maravilhoso!! Você foi ótimo hoje, o plano foi bem simples e rápido, um sucesso total. Eu quero o relatório completo
com as fotos amanhã até às 11 horas na minha mesa.
O rapaz deligou a chamada. O carro ia a 70 quilômetros pela avenida deserta. Diminuiu para passar em um sinal
vermelho, observando o cruzamento, quando teve de frear bruscamente ao ver uma garota atravessar na frente do carro e cair
no meio da rua.
-Você está bem?- indagou o rapaz saindo do carro e indo verificar a jovem. Quando a viu, percebeu, pela forma
maltrapilha como se vestia, que era uma mendiga.
-Perdeu otário- falou uma voz esganiçada em seu ouvido, ele se virou e viu um rapaz alto, vestindo uns trapos,
apontar-lhe uma faca no pescoço. –Me dá o Rolex ou te furo seu merda!
-Pode levar- disse o homem entregando o relógio, enquanto olhava nos olhos do ladrão, como fazem os encantadores
de serpentes. –É todo seu.
O malandro pegou o relógio e ao ver outro carro se aproximando, saiu em dispara pela rua com sua amiga, até
desaparecer numa encruzilhada.
-Acham que metem medo, que são os donos da rua - murmurou o homem votando para seu carro e arrancando. –Mas
não passam de baratas prontas para serem eliminadas.
CINEMA

Comentários de Cinema – Parte 36


* O Altar do Diabo (The Dunwich Horror, EUA, 1970)
* Contos da Escuridão (Tales of Tomorrow, EUA, 1951 / 1953, PB) série de TV – episódios “Frankenstein”, “O
Ovo de Cristal”, “Encontro em Marte”, “The Evil Within”
* The Earth Dies Screaming (Inglaterra, 1964, PB)
* O Grito da Caveira (The Screaming Skull, EUA, 1958, PB)
* O Mistério do Invisível (The Unseen, EUA, 1980)
* Mystics in Bali (Indonésia / Austrália, 1981)
* Zombie Nightmare (Canadá, 1987)

* O Altar do Diabo (1970)

Produção executiva de Roger Corman e história baseada em H. P. Lovecraft na tentativa de retorno


dos Antigos para dominar a Terra
“A lenda do Necronomicon diz que antigamente a Terra era habitada por uma espécie de outra dimensão. Com certos
cânticos do livro, junto com antigos ritos de sacrifício, esta raça de outrora pode ser trazida de volta.”

“O Altar do Diabo”, dirigido por Daniel Haller, é baseado na história “The Dunwich Horror”, de H. P. Lovecraft,
produzido pela nostálgica “American International”, de James H. Nicholson e Samuel Z. Arkoff, com produção executiva do
“Rei dos Filmes B” Roger Corman, e elenco liderado por Dean Stockwell e Sandra Dee, além dos veteranos Ed Begley e Sam
Jaffe.
Um jovem estudioso de ocultismo, Wilbur Whateley (Dean Stockwell), vive na pequena cidade de Dunwich em sua
casa imensa e sinistra. Ele é temido pelos supersticiosos e assustados moradores locais, depois que sua mãe Lavinia (Joanna
Moore Jordan) enlouquece após o parto e é internada num hospício. Ele tenta através dos ensinamentos do raro, poderoso e
proibido livro “Necronomicon”, e com um ritual de sacrifício humano no “altar do diabo”, da bela e jovem Nancy Wagner
(Sandra Dee), abrir um portal que permitiria a entrada dos “Antigos”, uma raça ancestral de outra dimensão, que habitava nosso
planeta em tempos imemoriais, reassumindo o controle da Terra e destruindo a raça humana.
Para tentar combatê-lo e impedir o retorno dos “Antigos” ao nosso mundo, o Dr. Henry Armitage (Ed Begley),
professor de filosofia da Universidade de Arkham, une forças com o médico Dr. Cory (Lloyde Bochner), de Dunwich, e juntos
seguem de perto os passos do jovem ocultista, principalmente depois que o livro “Necronomicon” é roubado.
Filme de horror com uma atmosfera sinistra constante, explorando vários elementos presentes na mitologia dos “Mitos
de Cthulhu”, criada por Lovecraft, com citações ao livro “Necronomicon” e à entidade cósmica maléfica “Yog-Sothoth”. A
diversão é garantida, graças à presença de Roger Corman nos bastidores e pelo elenco interessante, formado por jovens em
ascensão na época como Dean Stockwell e Sandra Dee, ou pelos veteranos Ed Begley e Sam Jaffe, rostos conhecidos por
longas carreiras em séries diversas de TV. Mas, o resultado final certamente poderia ser ainda mais interessante com uma
exploração maior das criaturas indizíveis de Lovecraft, algo que ficou mais restrito pelas questões de orçamento reduzido.
Entre as curiosidades, o filme foi exibido dublado na televisão brasileira na extinta TV Manchete, na Sessão “Terça
Especial”, de onde gravei em VHS entre os anos 80 e 90 do século passado, e passei depois para a mídia DVD. Em 2009
tivemos outra versão, produzida pela “Nu Image”, conhecida pelas bagaceiras de seu catálogo. O elenco tem o cultuado ator
Jeffrey Combs (de “Re-Animator”) como Wilbur e novamente Dean Stockwell, só que em outro papel, interpretando o Dr.
Henry Armitage. O filme foi lançado em DVD por aqui pela “Focus Filmes” com o nome “Bruxas”.

“... e com o portão aberto, os Antigos vão passar. O Homem governa agora o que eles governavam antes. Eles
aguardam pacientes e potentes. E por aqui eles reinarão de novo. E governarão por onde antes caminhavam...”

(RR – 07/01/18)

* Contos da Escuridão (1951 / 1953)

Primeira série de TV de Ficção Científica dos longínquos anos 1950: indispensável para os
apreciadores do cinema fantástico bagaceiro
“Contos da Escuridão” (Tales of Tomorrow, EUA, 1951/53) foi uma série de televisão com fotografia em preto e
branco, produção de baixo orçamento, apresentando antologias de episódios independentes com aproximadamente trinta
minutos de duração. Eram histórias básicas de ficção científica, encenadas pelos atores, sem gravações e transmitidas ao vivo
pela televisão. Os elencos contavam com muitos atores que já eram conhecidos na época ou que se tornaram bem sucedidos nas
carreiras que se seguiram. É considerada a primeira série de TV americana a tratar especificamente o tema da ficção científica,
sendo seguida por outras similares extremamente cultuadas pelos fãs, como “Além da Imaginação” (The Twilight Zone) e
“Quinta Dimensão” (The Outer Limits).
A série teve duas temporadas, sendo que a primeira entre 1951 e 1952 teve 42 episódios, e a segunda, entre 1952 e
1953, teve 43 episódios. No Brasil, foram lançados apenas três episódios num único DVD, através da antiga “Works” (também
conhecida por “Dark Side”), que está fora de catálogo há muito tempo. Os episódios são “Frankenstein”, “O Ovo de Cristal” e
“Encontro em Marte”. Também tive acesso ao episódio “The Evil Within”, baixado do blog “Cine Space Monster” e legendado
em português.
Pelo título escolhido no Brasil, vale ficar atento para não confundir com outra série de mesmo nome, “Tales From the
Darkside” (1983 / 1988), e que também teve um filme em 1990, no formato de antologia com três histórias.
Seguem comentários e curiosidades sobre esses quatro episódios citados, de uma série rara, divertida e altamente
recomendada para os apreciadores e colecionadores das nostálgicas bagaceiras do cinema fantástico de meados do século
passado.

“Frankenstein”
A famosa obra literária de Mary Shelley, adaptada à exaustão pelo cinema, também foi utilizada para a produção do
episódio homônimo “Frankenstein”, que traz Lon Chaney Jr. no papel do monstro criado artificialmente a partir de restos de
cadáveres, pelas mãos e mente brilhante do cientista Victor Frankenstein (John Newland). Porém, ao despertar para a vida pela
ação de eletricidade e aparelhos científicos complexos e bizarros, a enorme criatura deformada fica confusa e não entende sua
condição de monstro feito de partes de corpos humanos mortos e age com violência e irracionalidade, colocando em risco a
vida da noiva do cientista, Elizabeth (Mary Alice Moore) e de seu pai (Raymond Bramley), além dos empregados, Matthew
(Farrell Pelly) e Elise (Peggy Allenby), que trabalham no imenso castelo do século XVI isolado no meio de um lago, onde o
cientista montou seu laboratório.
Como o episódio foi apresentado ao vivo pela televisão, existe uma curiosidade sobre a participação de Lon Chaney
Jr., ator mais conhecido como o lobisomem no clássico da “Universal” de 1941, e por diversas outras bagaceiras do cinema
fantástico. Ele estaria bêbado em cena, não percebendo que estava ao vivo no cenário, e uma vez pensando se tratar de apenas
um ensaio, teve o cuidado de não quebrar uma cadeira que deveria ser arremessada no chão, levantando-a para o alto com força
excessiva e depois colocando em seu lugar novamente com cuidado, mantendo-a intacta. Essa cena é claramente perceptível.

“O Ovo de Cristal”
O escritor inglês H. G. Wells é um dos grandes nomes da literatura de ficção científica, com vários de seus livros e
contos transformados em filmes cultuados como “A Guerra dos Mundos”, “A Máquina do Tempo”, “A Ilha do Dr. Moreau”,
“Os Primeiros Homens na Lua”, “O Homem Invisível”, “Daqui a Cem Anos”, “Viagem à Lua”, etc.
Sua obra também inspirou a produção do episódio “O Ovo de Cristal”, onde um cientista renomado, Prof. Frederick
Vaneck (Thomas Mitchell) recebe a visita do dono de um antiquário, Sr. Cave (Edgar Stehli), que lhe traz um misterioso
artefato, um “ovo de cristal”, para ser analisado e avaliado, depois que um homem estranho, Walker (Gage Clark), demonstrou
um interesse incomum em comprá-lo a todo custo. Após trabalhar por incontáveis horas estudando o objeto, o cientista acaba
ficando obcecado por seus mistérios depois que consegue visualizar através dele a superfície de outro planeta, e de descobrir
que estamos sendo observados por marcianos.
O ator Thomas Mitchell já era muito experiente e conhecido na época, tendo participado de clássicos como o western
“No Tempo das Diligências”, o drama “... E o Vento Levou” e o horror “O Corcunda de Notre Dame”, todos de 1939. Esse
episódio tem uma história muito interessante ao abordar o mistério por trás do ovo de cristal e sua relação com uma
conspiração alienígena, destacando a cena onde um marciano tosco típico do cinema bagaceiro do período está espionando a
Terra.

“Encontro em Marte”
Um grupo de três astronautas viaja pelo espaço sideral até Marte numa missão de exploração de minérios, descobrindo
grande quantidade de urânio, extremamente valioso e que os deixaria ricos na Terra. O grupo é formado pelo piloto da nave
Capitão Robert (Leslie Nielsen), Bart (William Redfield) e Jack (Brian Keith). Eles encontram um planeta árido coberto por
arbustos estranhos e pedras para todos os lados, e aparentemente sem pessoas ou vida inteligente, com um incômodo e
constante uivo de fortes ventos. Sem os monstros verdes de olhos esbugalhados e fogo saindo da boca, idealizados pela cultura
popular. Porém, começam a ocorrer graves crises de relacionamento entre eles, com brigas, discussões e acessos de loucura e
violência, evidenciando características típicas da raça humana como ganância e desconfiança, levando o grupo para um fim
trágico.
O ator canadense Leslie Nielsen estaria depois no clássico “Planeta Proibido” (1956), um dos mais importantes filmes
da história do cinema de FC, e curiosamente muitos anos mais tarde seu nome seria eternamente relacionado ao gênero
comédia, com uma infinidade de títulos na carreira como “Apertem os Cintos... o Piloto Sumiu”, “Corra Que a Polícia Vem
Aí”, “Drácula – Morto, Mas Feliz”, “Mr. Magoo”, “2000.1 – Um Maluco Perdido no Espaço”, etc.

“The Evil Within”


O cientista Peter (Rod Steiger) está trabalhando arduamente num soro especial que estimula os sentimentos ruins
internos das pessoas. Sem testar ainda em seres humanos, ele traz o experimento para casa para mantê-lo refrigerado, uma vez
que a geladeira de seu laboratório quebrou. Em casa, sua esposa dedicada Anne (Margaret Phillips) está incomodada com a
vida solitária, sem a atenção do marido ocupado com o trabalho científico, e reclama da situação desconfortável no casamento.
As coisas se complicam ainda mais depois que um acidente fez com que ela ingerisse um pouco da poção química sem perceber
e seu comportamento e personalidade transformaram-se, trazendo à tona o seu “mal interno” do título. Agora, o cientista
precisará encontrar um antídoto para salvar a esposa.
Esse episódio lembra a ideia básica de “O Médico e o Monstro”, livro de Robert Louis Stevenson que foi adaptado
incontáveis vezes no cinema. O ator James Dean, que fez uma participação minúscula como Ralph, o ajudante do cientista, teve
uma carreira curta falecendo num acidente de carro em 1955, apenas com 24 anos de idade. Ele já era um ator cultuado, apesar
de muito jovem, por participações em clássicos como “Juventude Transviada” e “Vidas Amargas” (ambos de 1955). Rod
Steiger (1925 / 2002) também foi outro ator com nome bastante reconhecido por sua carreira bem sucedida com quase 150
créditos.
(RR – 20/01/18)

* The Earth Dies Screaming (1964)

“A Terra Morre Gritando” numa divertida produção bagaceira inglesa de invasão alienígena
Um dos sub-gêneros mais divertidos do cinema bagaceiro de ficção científica dos anos 50 e 60 do século passado
certamente foi aquele que abordava o tema de invasão alienígena. Existe uma quantidade imensa de filmes desse período com
roteiros explorando o drama da humanidade tentando sobreviver ao enfrentar uma invasão de criaturas hostis vindas do espaço
sideral com propósitos de conquista. Seja por causa dos valiosos recursos naturais ou simplesmente pelo domínio de uma raça
inferior em tecnologia e força militar.
“The Earth Dies Screaming” é uma produção inglesa com fotografia em preto e branco que tem um título original
sonoro e sensacionalista, típico dos filmes bagaceiros do gênero fantástico daquele período, e que foi dirigida por um
especialista na área. Terence Fisher foi o principal cineasta da lendária e cultuada produtora inglesa “Hammer”, sendo o
responsável por diversos filmes clássicos que ficaram eternizados na história do gênero como “A Maldição de Frankenstein”
(The Curse of Frankenstein, 1957) e “O Vampiro da Noite” (Horror of Dracula, 1958), ambos com os ícones Christopher Lee e
Peter Cushing.
Escrito por Harry Spalding (creditado como Henry Cross), o filme é curto com apenas 62 minutos de duração, e
mostra um vilarejo no interior da Inglaterra onde os moradores são mortos misteriosamente. Jeff Nolan (Willard Parker) é um
piloto de testes americano em exercícios militares na Inglaterra e que ao aterrissar seu avião encontra uma cidade em silêncio e
com várias pessoas mortas espalhadas pelo chão. Ao investigar o mistério, ele encontra num hotel outros sobreviventes, Quinn
Taggart (Dennis Price) e Peggy Hatton (Virginia Field), além do casal formado por Edgar Otis (Thorley Walters) e a esposa
Violet Courtland (Vanda Godsell), que se recuperavam de um acidente com seu carro.
O pequeno grupo de sobreviventes especula sobre o mistério ao redor e acham que a cidade sofreu um ataque de gás
venenoso, fato que poderia explicar as mortes repentinas dos habitantes e sem traços aparentes de violência física. E então
surge outro casal, dessa mais bem mais jovem, formado por Mel Brenard (David Spenser) e a mulher grávida Lorna (Anna
Palk). Enquanto tentam entender a origem do caos, encontram robôs humanoides assustadores caminhando pelas ruas
silenciosas com cadáveres espalhados, e são atacados pelos mortos que voltam a andar como zumbis escravos controlados
pelos robôs, com seus olhos esbugalhados como bolas cinzas. Restando apenas lutar pela sobrevivência enquanto “A Terra
Morre Gritando”...
O filme é uma produção tranqueira de baixíssimo orçamento abordando o tema da invasão alienígena, com uma
atmosfera sinistra de mistério e a presença de robôs alienígenas toscos ao extremo, além de mortos caminhando novamente
sobre a Terra. A especulação sobre uma guerra com gases venenosos nos remete à paranóia da guerra fria daquele conturbado
período tenso que a humanidade vivia após a Segunda Guerra Mundial, com a ameaça de um holocausto nuclear causado pelas
potências opostas da época, Estados Unidos e a antiga União Soviética.
O ritmo é arrastado em alguns momentos, mas isso não chega a prejudicar o entretenimento por causa da curta duração
com pouco mais de uma hora de filme. Os robôs são bizarros e lentos, criação de uma tecnologia superior de alguma raça de
outro planeta, e possuem poderes para matar facilmente os humanos apenas com um toque. Os zumbis são toscos, com seus
olhos inertes, seguindo obedientes os comandos das máquinas. “The Earth Dies Screaming” é o cinema fantástico bagaceiro
dos anos 60, divertido e indispensável para os apreciadores do gênero.
Curiosamente, algumas cenas do clássico “Aldeia dos Amaldiçoados” (1960) foram inseridas no início do filme antes
dos créditos de abertura, a queda de um avião explodindo com o impacto e um carro se chocando contra um muro.
(RR – 06/12/17)

* O Grito da Caveira (1958)

“Nós garantimos enterrá-lo sem custos se você morrer de susto durante O Grito da Caveira” –
jogada de marketing dos produtores
“O Grito da Caveira é um filme que atinge seu clímax num horror chocante. Seu impacto é tão terrível que pode causar
um efeito imprevisto. Pode até matá-lo. Portanto, seus produtores garantem serviços funerários gratuitos para quem morrer de
susto enquanto assistir O Grito da Caveira”.

No final dos anos 1950, uma época de ouro do cinema fantástico bagaceiro, vários filmes de baixo orçamento do
produtor e cineasta William Castle receberam um tratamento diferenciado e criativo na área de marketing e divulgação,
despertando a atenção e curiosidade do público para ir aos cinemas. Utilizando técnicas interativas para assustar os
espectadores como poltronas que tremem e dão pequenos choques elétricos, fornecimento de apólices de seguro de vida para
quem morresse durante a exibição do filme, ou o uso de um esqueleto humano iluminado movimentado por um complexo
mecanismo de polias, cordas e correias, que era arremessado por cima das pessoas. Inspirado por esse marketing inusitado de
William Castle, os produtores de “O Grito da Caveira” (The Screaming Skull, 1958), Thomas F. Woods e John Kneubuhl
(também autor do roteiro), igualmente entraram na onda e prometeram pagar os serviços funerários de quem morresse de susto
durante a projeção do filme (conforme atestam a tagline e a narração de introdução reproduzidas acima).
No filme, dirigido por Alex Nicol (mais conhecido pela carreira de ator coadjuvante), Eric Whitlock (John Hudson) se
casa com Jenni (Peggy Webber) e juntos vão morar no casarão de Eric, que utilizava quando ainda era casado com Marianne,
morta num trágico acidente doméstico, ao se afogar num pequeno lago após escorregar num dia de forte chuva.
Jenni tenta ser feliz ao lado do marido, após enfrentar uma fase conturbada com problemas psicológicos num hospital
psiquiátrico por causa da morte dos pais afogados num acidente de barco. Na mansão ainda vive o suspeito jardineiro Mickey
(Alex Nicol), um homem com retardamento mental que cuida do imenso jardim que rodeia a casa, e continua sentindo uma
devoção exagerada à antiga patroa falecida. E entre os amigos do casal temos os vizinhos Reverendo Edward Snow (Russ
Conway) e sua esposa (Tony Johnson).
Os problemas se iniciam quando Jenni é atormentada por gritos na escuridão da noite e com a suposta presença
fantasmagórica da falecida primeira esposa de seu marido, além de uma misteriosa caveira que está constantemente
perseguindo-a para desestabilizar o seu já fragilizado estado psicológico. Apavorada, o estado mental dela vai
progressivamente piorando, confusa com os acontecimentos sinistros da casa e do passado trágico envolvendo a morte
perturbadora de Marianne.
“O Grito da Caveira” tem fotografia em preto e branco e uma duração curta, com apenas 68 minutos. É uma produção
de orçamento reduzido, poucos personagens (apenas 5), uma história clichê e ingênua com elementos de horror que talvez
pudessem assustar as platéias mais sensíveis de meados do século passado, mas que atualmente dificilmente causaria algum
desconforto. Os efeitos especiais da “caveira que grita” são patéticos de tão hilários. Porém, são exatamente esses ingredientes
típicos do cinema fantástico bagaceiro daquele período que resultam na diversão dos apreciadores dessas tranqueiras. Temos
uma atmosfera sinistra de um casarão envolto em manifestações sobrenaturais, um fantasma atormentado em busca de vingança
e paz, uma mulher lutando para manter sua instável sanidade, e a jogada de marketing promocional com um caixão nos cinemas
reservado para quem morresse de susto durante a exibição do filme.
Curiosamente, “O Grito da Caveira” também recebeu outro nome alternativo nacional: “A Maldição na Noite de
Núpcias”.
(RR – 19/12/17)

* O Mistério do Invisível (The Unseen, 1980)

O desconhecido traz o terror. O invisível... a morte


Uma equipe de mulheres jornalistas de televisão formada por Jennifer Fast (Barbara Bach), sua irmã Karen (Karen
Lamm) e Vicki Thompson (Lois Young), está a caminho da pequena cidade americana Solvang, no Estado da California, para
cobrir uma festa tradicional da região. Porém, com todas as vagas nos hotéis esgotadas, elas procuram alternativas de
hospedagem e encontram uma improvável oportunidade na casa do zelador de um antigo museu que foi hotel no passado,
Ernest Keller (Sydney Lassick). Ele é um homem simpático e bom anfitrião, mas também tem comportamentos estranhos e
esconde um misterioso segredo no porão.
Sua irmã Virginia (Lelia Goldoni) fica extremamente preocupada com a chegada imprevista das convidadas, e sempre
está triste, assustada e com um olhar deprimido e perturbado, ocultando o “mistério do invisível”, representado por uma
criatura demente que vive no porão (“Junior”, interpretado por Stephen Furst).
Enquanto a repórter Jennifer faz seu trabalho, sabemos que está grávida e enfrentando uma crise conjugal com o
namorado Tony Ross (Douglas Barr), um ex-jogador de futebol americano que teve que desistir da carreira por causa de uma
grave lesão na perna.
O que todas elas não esperavam é que uma aparente simples estadia iria se transformar num pesadelo quando suas
vidas são ameaçadas pelo que está escondido no porão, além de enfrentar o suspeito anfitrião que ofereceu sua casa para elas.
“O Mistério do Invisível” é um filme irregular, com alguns momentos arrastados lembrando apenas um thriller comum
daqueles produzidos para a televisão. Mas, também tem boas cenas de tensão e atmosfera sinistra na exploração do “mistério
do título”, na especulação sobre quem vive oculto no porão, sua origem, motivações e atos com conseqüências trágicas. O
desfecho ainda reserva uma longa sequência de confronto com perseguições, lutas desesperadas e insanidade.
O elenco é composto por poucos atores e as atuações são muito boas, principalmente Sydney Lassick, que faz um
homem gentil e brincalhão e ao mesmo tempo sinistro e insano, convidando as mulheres para a morte. E também Stephen Furst,
que aparece pouco, mas de forma intensa no papel do demente que vive no porão.
Entre as várias curiosidades, o diretor e também autor do roteiro Danny Steinmann (1942 / 2012), que tem em seu
pequeno currículo um filme da franquia do popular psicopata Jason Voorhees (“Sexta-Feira 13 Parte 5: Um Novo Começo”,
1985), não gostou do corte final do filme, com a retirada de várias cenas assustadoras, e decidiu assinar com o pseudônimo
Peter Foleg.
Stan Winston, cultuado mestre em efeitos especiais, falecido em 2008, foi um dos co-autores da história, sendo que
uma primeira versão (depois bastante modificada) foi de autoria de Kim Henkel, o criador de “O Massacre da Serra Elétrica”
junto com Tobe Hooper.
A atriz Barbara Bach, que em “O Mistério do Invisível” grita e luta desesperadamente por sua vida, participou também
da divertida bagaceira italiana “A Ilha dos Homens-Peixe” (1979). Ela é casada com Ringo Starr, o baterista da lendária banda
“The Beatles”.
(RR – 01/01/18)

* Mystics in Bali (1981)

Magia Negra, cabeça voadora assassina, efeitos toscos e atores péssimos: Mystics in Bali é um filme
de horror bagaceiro produzido na Indonésia
“Mystics in Bali” é uma tranqueira produzida na Indonésia em parceria com a Austrália, também conhecido pelo título
alternativo “Leák”. Com direção de H. Tjut Djalil, a história mistura elementos de magia negra, feitiçaria e vampirismo,
apresentando uma cabeça voadora com órgãos internos pendurados, em efeitos precários e com um elenco extremamente ruim.
Uma escritora americana, Catherine Kean (Ilona Agathe Bastian), está em Bali (uma ilha localizada na Indonésia) para
pesquisar informações sobre a antiga, estranha, misteriosa e poderosa magia negra “leák”, com o objetivo de escrever um livro
sobre o assunto. Ela é auxiliada pelo namorado Mahendra (Yos Santo), nativo da região, e consegue um contato noturno e
sinistro com uma feiticeira, uma rainha leák (interpretada por Sophia W. D. quando velha, e por Cinthya Dewi quando jovem).
A poderosa bruxa, com voz gutural, aceita passar os ensinamentos da magia para a ingênua Cathy, que se torna uma
discípula das trevas e se transforma eventualmente numa criatura assassina e vampira à procura de sangue e carne de suas
vítimas, sendo que sua cabeça, agarrada à espinha, pulmões e intestinos, se separa do corpo e voa em busca de alimento.
Mahendra tenta salvá-la da maldição e pede ajuda ao seu tio Machesse (W. D. Mochtar) e outros religiosos para combater a
rainha leák e libertar a namorada Cathy de seu domínio maléfico.
Com esse roteiro absurdo já dá para imaginar a imensa tranqueira que é “Mystics in Bali”, um filme tão ruim que o
espectador torce para que acabe logo, mas isso somente ocorre depois de seus longos 87 minutos. Os atores são muito
inexpressivos, artificiais e tão amadores que chegam a incomodar pela precariedade das atuações. A rainha leák dá tantas
gargalhadas histéricas irritantes que nos incentivam a avançar o filme minimizando o incômodo. Sem contar a dança ridícula do
ritual de magia negra.
Os efeitos são extremamente bagaceiros, principalmente a tal criatura demoníaca que é a cabeça voadora de Cathy
possuída, arrastando as tripas pelos ares. Tem também uma mão decepada que caminha sozinha, o tentáculo enorme em forma
de língua da bruxa leák, as cenas de transformação dela e da discípula Cathy em animais como porcos e outras criaturas
gosmentas, além dos vômitos verdes misturados com ratos vivos e o duelo de feiticeiros transformados em bolas de fogo numa
guerra patética de raios, entre outras bizarrices. Mas, onde normalmente isso seria um motivo para agregar valor como
entretenimento para os apreciadores de filmes toscos, acaba surtindo um efeito contrário por causa da ruindade extrema geral
do filme, desde a história sofrível até as atuações inacreditavelmente inexpressivas.
(RR – 22/12/17)

* Zombie Nightmare (1987)


Adam West + Motorhead + zumbi tosco = bagaceira oitentista canadense
Nos créditos iniciais temos a música “Ace of Spades”, da lendária banda inglesa “Motorhead”, apenas uma de várias
outras de heavy metal que participam da trilha sonora como “Girlschool”, “Virgin Steele”, “Thor” e “Battalion”, que desfilam
sua música ao longo do filme. Tem também o ator cultuado da televisão Adam West (falecido em 2017 aos 88 anos), um rosto
reconhecido como Bruce Wayne (Batman) da série homônima de TV dos anos 1960, pastelão e tranqueira ao extremo.
Completa ainda um único zumbi, tosco e super bagaceiro, ressuscitado dos mortos em busca de vingança contra seus
assassinos. O resultado é “Zombie Nightmare”, produção canadense de 1987 dirigida por Jack Bravman a partir de roteiro de
John M. Fasano.
Tony Washington (o cantor Jon Mikl Thor, líder fundador da banda “Thor”, na ativa desde 1977), é um jovem que
morre num acidente trágico, atropelado por um carro guiado por Jim Batten (Shawn Levy), um adolescente acéfalo e rebelde,
que não respeita ninguém e lidera um grupo ainda formado por dois casais de namorados, Peter (Hamish McEwan) e Susie
(Manon E. Turbide), e Bob (Allan Fisher) e Amy (Tia Carrere, atriz que conseguiu algum destaque posterior na carreira). Tony
volta do mundo dos mortos, invocado num ritual de magia negra pela bruxa Molly Mokembe (Manuska Rigaud), e sai de seu
túmulo para se vingar daqueles que causaram sua morte violenta.
Paralelamente, com a ocorrência de mortes estranhas dos jovens rebeldes, a polícia entra em cena com a investigação
do jovem detetive Frank Sorrell (Frank Dietz), auxiliado pelo veterano chefe Capitão Tom Churchman (Adam West). Eles
tentam descobrir o mistério por trás dos assassinatos com toques sobrenaturais, evidenciando o tal “pesadelo zumbi” do título.
“Zombie Nightmare” tem um nome sonoro e chamativo, mas é um filme extremamente ruim, mal feito e datado. Trata-
se apenas de um exemplo do cinema bagaceiro oitentista com pouca diversão, valendo conhecer exclusivamente por
curiosidade.
Exceto pela música do “Motorhead” e pela presença do eterno canastrão Adam West, mesmo somente a partir da
metade do filme, pouca coisa se salva. A história, repleta de furos, é um clichê totalmente sem interesse, cansativo e arrastado.
As interpretações do elenco são amadoras. O zumbi vingativo tem uma maquiagem péssima e sua atuação nas cenas de mortes
é bem patética. Aliás, as mortes também são bem discretas.
Curiosamente, num momento em que o zelador de uma academia de ginástica está dormindo em serviço, permitindo o
ataque do zumbi em seu plano de vingança, podemos ver que em seu colo tem uma revista “Fangoria”, cuja capa mostra o líder
dos caminhões que ganharam vida própria na tranqueira “Comboio do Terror” (Maximum Overdrive, 1986), dirigido por
Stephen King e baseado em seu conto.
(RR – 05/01/18)

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