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FATE-BH/ INSTITUTO METODISTA IZABELA HENDRIX

Matteo Ricciardi

ADORAÇÃO À BRASILEIRA: apreciação histórico-teológica da


contextualização do culto evangélico, suas formas e conteúdos

2009
Matteo Ricciardi

ADORAÇÃO À BRASILEIRA: apreciação histórico-teológica da


contextualização do culto evangélico, suas formas e conteúdos

Trabalho de conclusão de curso apresentado como


exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel
em Teologia na FATE-BH/ Instituto Metodista
Izabela Hendrix.

Orientador: Prof. Dr. Levy Da Costa Bastos

Belo Horizonte
2009
Matteo Ricciardi

ADORAÇÃO À BRASILEIRA: apreciação histórico-teológica da


contextualização do culto evangélico, suas formas e conteúdos

Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do grau de bacharel em Teologia, aprovado


pelo Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix de Belo Horizonte em 6 de Dezembro
de 2008 em banca examinadora constituída pelos professores:

_________________________________________
Prof. Dr. Levy Da Costa Bastos – Orientador

___________________________________________
Prof. - Instituição

___________________________________________
Prof. - Instituição
À minha amada Aline, que soube abrir mão de parte do meu tempo e de minhas atenções,
para que eu pudesse dedica-las ao labor teológico para o avanço do Reino de Deus.
AGRADECIMENTOS
À minha família; a todos os professores, pastores e
colegas de caminhada. Pelo suporte, carinho e
perene incentivo.
RESUMO

O presente trabalho apresenta uma reflexão sobre a contextualização do culto brasileiro, suas
formas e conteúdos. A tese da qual se parte para a elaboração é que no Brasil não houve
contextualização da liturgia. Defende-se a idéia que o protestantismo brasileiro herdou a
forma de culto e a teologia das denominações de origem dos missionários, e não preocupou-se
em atualizar, revitalizar seus conteúdos e suas formas ao longo do tempo. O objetivo é
apresentar uma apreciação histórica da implantação do culto no Brasil, fundamentar
teologicamente as relevância do culto cristão e, finalmente, apontar para caminhos de
contextualização. A metodologia adotada é a pesquisa bibliográfica suportada pelo
conhecimento da vivência litúrgica. Finalmente, o trabalho apresenta possibilidades de
contextualização do culto evangélico brasileiro, na perspectiva da interação mútua com a
cultura local, à luz da implantação do Reino de Deus.

Palavras-chave: culto, protestantismo, contextualização, cultura.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .....................................................................................................................7

1. ANÁLISE DA SITUAÇÃO HISTÓRICA........................................................................ 10

1.1 Delimitação do campo de pesquisa. ............................................................................ 10


1.2 O peso do protestantismo de origem missionária nos aspectos cúlticos. ...................... 10
1.3 O pentecostalismo. ..................................................................................................... 13
1.4 O movimento gospel................................................................................................... 15
1.5 Conseqüências: alienação e preconceito...................................................................... 17

2. ANÁLISE BÍBLICO-SISTEMÁTICA DAS DIMENSÕES TEOLÓGICAS DO CULTO


CRISTÃO E SUA CONEXÃO LITÚRGICA....................................................................... 20

2.1 Dimensão cristológica. ............................................................................................... 20


2.2 Dimensão salvífico-escatológica................................................................................. 22
2.3 Dimensão antropológica. ............................................................................................ 24

3. EM BUSCA DA CONTEXTUALIZAÇÃO DO CULTO EVANGÉLICO. ...................... 27

3.1 Enfoque multidisciplinar para a construção de uma liturgia brasileira. ........................ 27


3.2 Definindo os termos. .................................................................................................. 29
3.3 Função encarnacional. ................................................................................................ 30
3.4 Função profética......................................................................................................... 32
3.5 Função hermenêutica.................................................................................................. 35

CONCLUSÃO..................................................................................................................... 37

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................. 39
7

INTRODUÇÃO
O presente escrito se propõe analisar o culto evangélico, suas formas e conteúdos, à
luz da realidade brasileira. O problema constatado é que não houve um trabalho de
contextualização do culto, mas desde o período das missões evangélicas norte-americanas o
Brasil sofre a imposição de padrões estrangeiros nas celebrações, assim como na teologia; a
ausência de musicalidade e conteúdos brasileiros no culto evangélico é devida ao preconceito
com a própria cultura brasileira, fruto deste empreendimento missionário que está nas raízes
da formação do evangélico brasileiro.
A contextualização do culto, além de reavaliar as formas e os conteúdos, abarca a
recuperação da identidade dos membros para dentro da realidade cristã, tornando-os
conscientes da riqueza e da beleza que os faz brasileiros. Tornar-se cristão não significa
deixar de ser brasileiro: os anseios, as lutas e as esperanças que se vivem fora da igreja
podem, e devem, vir a fazer parte da celebração da comunidade. O canto e a música
representam fortíssimos instrumentos de comunicação, de celebração, de denúncia que a
comunidade deve resgatar entendendo que durante o canto também se coloca a realidade
vivencial perante o Deus todo-poderoso aguardando sua resposta fiel. A liturgia pode
proporcionar o encontro entre as necessidades da comunidade, as preocupações eternas dos
seres humanos e a providencia divina.
A arte é um catalisador da multiplicidade dos elementos da experiência humana no
mesmo momento, possibilita ao individuo participar da dinâmica da celebração como um
todo. Com este olhar, o culto se torna a ocasião de expressar publicamente a dimensão
espiritual e interior de cada crente ao mesmo tempo que como comunidade reunida se
estabelece a procura “dos rostos ausentes que estão esperando”1. “A música e o canto
representam para cada geração um lugar de encontro e de abertura para com o mundo e para
com Deus”2; esta arte possui um enorme potencial comunicativo, pois não transporta somente
o conteúdo emocional expresso pela melodia, mas principalmente as palavras de que se
constitui o cântico. Já dizia Jerônimo, que “não a voz, mas as palavras do cantor precisam
encontrar aprovação3”.
A xenofilia que existe amplamente difundida na maioria das áreas do conhecimento
encontra parceria até na religiosidade evangélica, que pelo contrario deveria representar uma
franja da contracultura cristã, que é na essência humanizadora e libertadora. A promoção de

1
GENRE, Ermanno. Il culto cristiano: una prospettiva protestante. Torino: Claudiana, 2004. p. 210.
2
Ibidem. p. 77.
3
Jerônimo. Apud: BRUNNER, Peter. Worship in the name of Jesus: English edition of a definive work on
Christian worship in the congregation. St. Louis: Concordia, 1968. p. 265.
8

um culto mais brasileiro significa estabelecer a legitimidade da identidade de um povo, rico


em diversidade e que encontra em si mesmo elementos suficientes para ser autônomo e
original em suas formas de expressão e nos seus conteúdos.
O material disponível em português sobre culto e liturgia, de forma geral, não trata da
contextualização do culto evangélico. A maioria dos textos se apresentam muito mais como
um manual para a formação e liderança das “equipes de louvor”, e não oferecem uma reflexão
sobre a musicalidade e os conteúdos brasileiros. Os textos que tratam do culto apresentam-se
como uma reconstrução histórica do processo de implantação ou como uma dissertação
sistemática sobre o assunto segundo os modelos da “teologia de gabinete” européia e norte-
americana. É preciso levantar uma discussão sobre o assunto a partir do ponto de vista da
América Latina, que leve em consideração a história, o contexto e as expectativas do povo
latino.
A partir do antigo lema de Próspero de Aquitânia, “Lex orandi, lex credendi”, pode-se
estabelecer a mútua dependência entre celebração e teologia: aquilo que se canta reflete
aquilo que se crê, e vice-versa. Costas declara que
a liturgia é um índice das atitudes, do estilo de vida, da cosmovisão e da participação
social do povo [...] porque reflete um comportamento psicossocial definido, repleto
de imagens socioculturais, com um conteúdo étnico concreto e com uma clara visão
da igreja e da sociedade4.

Na América Latina, uma suposta “cultura cristã” imposta pela evangelização causou
uma desvalorização do que é propriamente latino, deixando-o do lado de fora dos templos,
não incorporando-o nas suas celebrações. É necessário, então, um processo de “apropriação e
expurgo” para com a cultura que possa aproveitar elementos próprios do homem latino para
dentro do cristianismo evangélico.
O culto cristão sempre foi uma manifestação profundamente ligada ao contexto no
qual acontecia; a história da Igreja mostra como liturgia das mais diversas foram se
estabelecendo ao longo do tempo, adquirindo características próprias e singulares a partir do
lugar de implantação. A América latina não precisa depender de formulações e reflexões
teológicas estrangeiras, pois existe um núcleo pensante nela mesmo, núcleo este cônscio da
realidade experimentada pelos irmãos e irmãs, enquanto co-participante da mesma vivencia,
da mesma luta e das mesmas expectativas. A proposta é de dialogo, não trata-se aqui de
eliminar a herança e ficar só com o novo, nem vice-versa, mas sim tentar enriquecer a
celebração evangélica à luz da realidade na qual esta acontece.

4
COSTAS, Orlando. El protestantismo en América Latina hoy. ensayos del camino. San José: INDEF, 1975. p.
8.
9

A música, o canto e os irmão que estão encarregados de cuidar desta parte devem ser
entendidos como parte da ação da congregação, revestidos de uma função diaconal, de
serviço. E a Igreja toda que louva, que adora, que celebra a Deus. Constata-se, no entanto, um
mal entendimento quanto à função das “equipes de louvor” na atual conjuntura histórica que
precisa portanto ser repensada de um ponto de vista teológico alem de prático como tem sido
nos últimos tempos. Quando a Igreja se reúne, o propósito deve ser a edificação coletiva por
isso, todas as partas da celebração necessitam ser inteligíveis quanto às formas de expressão e
a ordem de acontecimento; uma liturgia bem organizada não pode deixar de se perguntar onde
o culto vai acontecer, quando, com que propósito e portanto quais conteúdos serão tratados.

O objetivo principal é apresentar possibilidades de contextualização do culto


evangélico no Brasil, incluindo a musicalidade popular e conteúdos extraídos do mundo-da-
vida do crente brasileiro. Visa-se a reavaliação das possibilidades musicais autóctones
incluindo ritmos, instrumentos e temáticas próprias do Brasil, atualmente não empregadas no
culto evangélico; isso coloca-se numa trajetória de resgate cultural no qual entende-se mais
que necessária a busca de uma religiosidade genuinamente brasileira em suas formas e
conteúdos.
Para a realização do objetivo, o trabalho irá apresentar em três capítulos:
- uma panorâmica da situação histórica atual apontando para as influências do processo de
implantação do cristianismo evangélico no Brasil para a formulação litúrgica;
- um estudo bíblico-sistemático dos princípios teológicos e litúrgicos do culto, que possibilite
o entendimento da abertura intrínseca ao próprio culto quanto à sua organização e conteúdos;
- apontamentos em busca da contextualização do culto evangélico no Brasil.
10

1. ANÁLISE DA SITUAÇÃO HISTÓRICA


Para compreender o amplo panorama de liturgias e temas que compõem os cultos
evangélicos atuais, é necessária uma reconstrução histórica que foque como os conceitos
contemporâneos encontrem seu fundamento no processo de evangelização e estabelecimento
das denominações em território brasileiro.
A reconstrução histórica desenvolvida neste capítulo não pretende ser
cronologicamente exaustiva, pois encontra-se material propriamente produzido sobre o
assunto, mas visa destacar os aspectos teológicos e litúrgicos para a configuração do culto
evangélico brasileiro.

1.1 Delimitação do campo de pesquisa.


A pesquisa a ser desenvolvida foca o material produzido pelos evangélicos fruto do
trabalho missionário norte-americano, pois percebe-se que a este deve-se a fundamentação
teológico-ideológica das igrejas hoje consideradas como evangélicas.
As igrejas protestantes das comunidades de imigrantes não serão objeto de estudo,
pois mantiveram os padrões das denominações de origem, inclusive nos aspectos sócio-
culturais, e não se inseriram na dinâmica mercadológica à qual assistimos hoje.
Enquanto se desenvolvia um trabalho autônomo entre os imigrantes, aconteceu um
movimento amplo de evangelização para o Brasil católico endossado pelas igrejas
protestantes do sul dos EUA. Estas igrejas fruto do trabalho missionário reproduziram o
mesmo denominacionalismo existente nas regiões de origem, e apresentaram ao longo do
tempo um paradigma sócio-econômico e cultural fortemente marcado pela inserção no
mercado, entendido como meio de propaganda e estabelecimento de padrões.

1.2 O peso do protestantismo de origem missionária nos aspectos cúlticos.


A primeira matriz para a elaboração do culto evangélico no Brasil remonta à obra dos
missionários e ao estabelecimento das denominações no território brasileiro. A reconstrução
histórica evidenciou como este período destaca-se como fundamental para lançar as bases dos
conteúdos teológicos dos cânticos e para a formatação litúrgica, que até hoje podem ser
localizados nas celebrações evangélicas. Dadas estas premissas, o presente parágrafo será
desenvolvido em duas partes: a primeira relativa aos conteúdos teológicos que foram
pregados e incorporados aos cânticos; e a segunda quanto à formulação litúrgica
desenvolvida.
11

O protestantismo que chega no Brasil através da obra missionária é fortemente


influenciado pela teologia dos avivamento dos EUA que por sua vez incorporara as ênfases
pietistas e puritanas dos pais fundadores. Matriz comum das igrejas fruto desta evangelização
é o conversionismo: a adoção da nova fé se dava através da experiência pessoal e emotiva.
Esta postura incorpora, porém, traços individualistas e excludentes, num processo pelo
qual junto à conversão ao cristianismo evangélico deveria acontecer também um transplante
cultural. O evangelho pregado pelos missionários configurava-se como um modo de vida, de
fato o “American way of life”, com padrões teológicos e ideológicos pertencentes a uma
realidade completamente diferente da brasileira. Num primeiro movimento esta injeção de
valores acontecia diretamente através das igrejas, dada a ligação direta (i.e. financeira) com as
denominações de origem, e depois da parcial emancipação das denominações nacionais,
através das organizações para-eclesiásticas.
Sendo assim, pode-se concluir que as igrejas derivadas do protestantismo de missão
mantêm uma forte ligação com a cultura religiosa americana, com uma tendência para manter
confronto com a cultura brasileira. Enquanto o movimento de evangelização católico-romano
escolhera a via da inculturação, o protestantismo de missão (fortemente marcado por uma
postura anti-católica) escolheu o caminho oposto, associando vários aspectos da cultura
autóctone à igreja católica.
Uma fonte importante para a reconstrução do panorama dos temas que se difundiram
nas primeiras décadas de trabalho de evangelização é representada pelas coletâneas de
cânticos produzidas pelos próprios missionários.
O primeiro hinário evangélico é “Salmos e Hinos”, editado em língua portuguesa no
ano de 1861; foi resultado do trabalho de Sara Kalley, que se empenhara na tradução e escrita
de novos hinos. Braga o considera como “um dos monumentos” do evangelismo pátrio5.
No ano de1891 apareceu uma segunda coletânea de hinos evangélicos, o Cantor
Cristão, preparada por Salomão Luiz Ginsburg, que “foi o Kalley batista, no domínio da
hinologia”6.
O estudo mais completo sobre os conteúdos teológicos do protestantismo de missão
via cânticos é de Antonio Gouvêa Mendonça7.

5
BRAGA, Henriqueta Rosa Fernandes. Música sacra evangélica no Brasil: contribuição à sua história. Rio de
Janeiro: Kosmos, 1961. p. 129.
6
Ibidem. p. 195.
7
MENDONÇA, Antonio Gouvêa. A nova religião. In: ______. O celeste porvir: a inserção do protestantismo no
Brasil. São Paulo: ASTE, 2005. p. 171-240.
12

Ele releva que a hinologia deste período reflete a herança de uma “teologia do amor de
Deus” por todos os homens pecadores que aceitam pela fé a morte vicária de Cristo e
ingressam uma vida visível regenerada na expectativa da vida eterna no céu.
A isso somam-se novos elementos que se manifestaram especificadamente no Brasil e
que iriam distinguir profundamente o sucessivo desenvolvimento da Igreja. Vai se
formulando uma “teologia da Igreja espiritual”, marcada por uma preocupação com um outro
mundo diferente, paradisíaco e a-parte deste presente, e, por conseqüência disso, uma
supervalorização da vida futura; esta postura torna-se justificadora e conservadora do status
quo, projeta os interesses e os anseios dos fiéis somente para o porvir, e promove o não
envolvimento nas questões seculares. Esta elaboração é conseqüência das idéias da
peregrinação e do milenarismo que chegaram junto com os missionários.
Junto a isso, evidenciam-se certos traços da teologia do pietismo, com seu
emocionalismo característico que acompanharão o sucessivo avanço do protestantismo
brasileiro preparando um campo fértil para o movimento pentecostal . A ênfase pietista sobre
a intimidade com Deus manifesta-se num grande individualismo, pois incentiva-se a leitura
solitária da Bíblia e sua interpretação literal ou espiritualizada, rumo a uma experiência
individual da fé; além disso os traços típicos desta linha apresentam a contemplação espiritual
da cruz, descrevendo com detalhes o sofrimento vicário e exaltado-o com grande emoção;
finalmente, é marcado pela negação do mundo e desprezo dos prazeres da vida, evidenciando
uma fuga do material e do temporal.
Uma terceira característica deste primeiro momento formativo é a do “protestantismo
guerreiro”. A ideologia da guerra é transportada do material para o espiritual: as forças em
jogo são a do bem e do mal, numa transposição invisível da guerra santa como figurada no
entendimento medieval. Cabe aqui pontuar como estes hinos diferem bastante da roupagem
da teologia da “batalha espiritual” que passaram a fazer parte do discurso e dos cantos
evangélicos ao final da década de 1980, e portanto objeto de análise num tópico mais adiante
deste trabalho.
O denominacionalismo recebido em herança pela obra do missionários norte-
americanos parece afetar os evangélicos no plano doutrinário e aproximá-los no plano
litúrgico.
Quanto à formulação litúrgica, o aporte de maior influencia deve-se ao missionário
escocês autônomo Robert Kalley. Ele produziu um conceito leigo de culto, estabelecendo
aqueles que seriam posteriormente definidos como “cultos de família”, “cultos domésticos”.
Autores apontam para esta formulação litúrgica mais uma técnica de evangelização de que
13

propriamente um conceito e prática de culto8. Manifestou uma influência na direção do


congregacionalismo9, já que nos cultos domésticos todos os da casa e os vizinhos eram
convidados. A estrutura era simples, pois acontecia uma leitura da Bíblia seguida de algum
comentário, cantavam-se hinos e se faziam orações. A impostação dos “cultos domésticos”
torna-se cada crente missionário e cada casa centro de evangelização; formulado desta forma,
porém, o culto ficava incompleto. Verificava-se a ausência dos sacramentos por longos
períodos de tempo, e foi se desenvolvendo a idéia do culto como “trabalho”: o crente ia ao
culto para aprender e para trabalhar, e no entanto ocorria o esquecimento da devoção e do
amor.
Gouvêa10 atribui ao casal Kalley a semente da Igreja Congregacional no Brasil. Numa
síntese das contribuições do casal, ele demarca a introdução de uma teologia conversionista
simples e superficial semelhante à dos avivamentos, e a produção do livro de hinos
preponderância teológica pietista. O autor situa a liturgia no plano das igrejas livres, i.e., não-
litúrgicas.
Sendo assim, podería-se encontrar a matriz das igrejas não-litúrgicas no formato do
“culto nos lares”. Não havia uma ordem completamente pré-estabelecida, a não ser a
expectativa primária da pregação da palavra com comentário, dos cânticos e das orações. O
desenvolvimento no território brasileiro reforçou o modelo, e acrescentou um novo fator:
dada a extensão geográfica do território e o escasso número de pastores, instaura-se o padrão
de culto leigo sem sacramentos e limitada estrutura.

1.3 O pentecostalismo.
Uma segunda matriz de elementos relevados para a organização do culto evangélico é
o movimento pentecostal e suas ramificações. O termo pentecostal, no Brasil, abrange uma
enorme gama de manifestações e organizações eclesiais. Seria possível classificar o culto
pentecostal dentro dos movimentos não-litúrgicos acrescentando a estes o destaque que
adquire a ação do Espírito Santo.
Entre as várias classificações do movimento, adotar-se-á a de Paul Freston que divide
o desenvolvimento em três ondas:

8
MENDONÇA, António Gouvêa. O culto que chega ao Brasil. In: MARASCHIN, Jaci (Org.). O culto
protestante no Brasil, Estudos de religião, São Bernardo do Campo, Imprensa Metodista, ano 1, nº 2, out. 1985,
p. 34-35.
9
HAHN, Carl Joseph. Conceito e prática de culto no ministério dos primeiros missionários protestantes no
Brasil. In: ______. História do culto protestante no Brasil. São Paulo: ASTE. p. 132-83.
10
MENDONÇA, António Gouvêa. Igreja Congregacional. In: ______; VELASQUES FILHO, Prócoro.
Introdução ao Protestantismo no Brasil. São Paulo: Loyola, 1990. p. 34-35.
14

A primeira onda é a década de 1910, com a chegada da Congregação Cristã (1910) e


da Assembléia de Deus (1911) [...] A segunda onda pentecostal é dos anos 50 e
início de 60, na qual o campo pentecostal se fragmenta, a relação com a sociedade se
dinamiza e três grandes grupos (em meio a dezenas de menores) surgem: a
Quadrangular (1951), Brasil para Cristo (1955) e Deus é Amor (1962) [...] A terceira
onda começa no final dos anos 70 e ganha força nos anos 80. Suas principais
representantes são a Igreja Universal do Reino de Deus (1977) e a Igreja
Internacional da Graça de Deus (1980).11

Nas igrejas da “Assembléia de Deus” a liturgia é livre. Na denominação “Cristã do


Brasil” o culto é simples, mas ordenado; a igreja num sentido geral baseia-se numa cultura
oral, pois não é encorajado o estudo sério da Bíblia e da teologia.
A Assembléia lançou seu hinário próprio em 1922; sob o titulo de “Harpa Cristã”, que
“inclui a obra dos cânticos originais e hinos tomados à coleção Salmos e Hinos”12.
A Congregação Cristã do Brasil também possui sua coletânea, intitulada “Hinos de
louvores e súplicas a Deus” que “inclui varias produções da hinologia anglo-americana
presentes em outros hinários evangélicos nacionais, porém em diferentes traduções”13.
O pentecostalismo é caracterizado pela ênfase na emoção mística religiosa, à qual se
soma uma rejeição de qualquer ordem preestabelecida em nome da liberdade do Espírito. Nas
igrejas pentecostais o pastor é responsável pela pregação, que representa o centro do culto
pentecostal, e lidera as diversas atividades dentro da igreja local; acompanhado por outros
cantores e orquestra, inclusive instrumentos de percussão, conduz o cântico. O culto é o
momento no qual os membros buscam forças para continuar fiéis a Deus nas atividades do
dia-a-dia secular, numa catarse dos conflitos do cotidiano na busca de poder e de cura; é a
celebração da imanência, da presença viva de Deus no culto.
A organização da celebração é livre, marcada por uma forte espontaneidade; os hinos
são escolhidos pelos fiéis, que acompanham o andamento do culto com expressões de louvor,
de demonstração de envolvimento emocional e até choro. Se somam a isso orações,
testemunhos, ofertas e a pregação da Palavra.
Os temas que caracterizam a pregação das igrejas pentecostais são a salvação da alma,
pessoal e individual; a santificação, ou busca da perfeição cristã, entendida como segunda
obra da graça; a segunda vinda de Cristo, e a sempre presente necessidade de estar
preparados com isso. As questões sociais e do dia-a-dia aparecem somente quando
solucionadas pela ação de Deus nas orações ou nos testemunhos. Por conseqüência, o louvor

11
FRESTON, Paul. Protestantes e politica no Brasil: da Constituinte ao impeachment. Campinas, Tese de
doutorado em sociologia, IFCS-UGRj, 1993. Apud: MARIANO, Ricardo. Neopentecostais: sociologia do novo
pentecostalismo no Brasil. São Paulo: Loyola, 1999. p. 28-29.
12
BRAGA, Henriqueta Rosa Fernandes. Música sacra evangélica no Brasil: contribuição à sua história. Rio de
Janeiro: Kosmos, 1961. p. 220.
13
Ibidem. p. 221.
15

apresenta letras que se concentram muito mais na pessoa de Deus e pouco falam de seus atos
salvíficos. Campos Jr. declara que
a ênfase está colocada nos “dons” que os fiéis podem receber. As letras dos cânticos
enfatizam as experiências dos membros dos diversos grupos e a ação divina, de
forma especifica durante o culto.14

A espontaneidade das celebrações possibilitou a inserção de elementos musicais


brasileiros nas músicas, contudo a teologia que compõe as letras é de forte ênfase
fundamentalista; o acento na emotividade proporcionou um culto mais alegre, mais informal
que pude incorporar elementos da música popular, como a música ritmada, os aplausos e a
dança.
O culto pentecostal visa experimentar o Espírito e vivenciar seus efeitos na mente e no
corpo; é uma liturgia que foge do racional, como uma fuga da vida com a inserção no
sagrado, com traços de anti-intelectualismo. No entanto
tem-se caído no extremo de considerar que um culto em que não há êxtase
emocional é um culto morto, que não tem valor. De certa forma tem-se perdido o
rumo deixando de lado o aspecto racional e adotando o outro extremo, o subjetivo,
emocionalista, e com um toque especial de mistério.15

Enquanto o culto, realizado como um evento de adoração coletiva, em ritmo festivo e


alegre, é o ponto central da vida espiritual no pentecostalismo, por outro lado constata-se uma
ligação com a teologia fundamentalista acompanhada por um rígido controle dos costumes.
É necessário destacar como as denominações históricas brasileiras de origem
missionária passaram por um momento de renovação, incorporando traços do pentecostalismo
no que se refere à experiência do “batismo do Espírito Santo” e na sua ação soberana da
direção das reuniões de culto, acentuando o caráter não-litúrgico que as distingue.

1.4 O movimento gospel.


A ultima influência para a conformação atual do culto evangélico deve-se ao
movimento gospel. Os autores consultados traçam um escorço histórico pelo qual o
movimento gospel aparece como característico da terceira fase do pentecostalismo brasileiro,
também definida como neopentecostalismo.
Existe uma continuidade com os conteúdos dos períodos precedentemente analisados,
revestidos de algumas ênfases especificas. O termo, originariamente, refere-se ao movimento

14
CAMPOS JÚNIOR, Luís de Castro. Pentecostalismo: sentidos da palavra divina. São Paulo: Ática, 1995. p.
143.
15
DARINO, Miguel Angelo. La Adoración: analisis e orientación. California: Dime, 1992. p. 87. Apud:
DORNELES, Vanderlei. Liturgia Pentecostal Rompe Barreiras entre o Religioso e o Popular. Disponível em:
www.musicaeadoracao.com.br/artigos/meio/liturgia_pentecostal.htm. Acesso em: 28 fev. 2009.
16

de avivamento ocorrido nas primeiras décadas do século XX nos EUA. Foi caracterizado pela
introdução da musicalidade popular, com ressalto das comunidades negras, no repertorio
sacro protestante.
No Brasil, no entanto, o termo demarca um período que começa no inicio dos anos 90,
com esporádicos precursores, que define-se pela mensagem: “ para os crentes, gospel é toda
música que fale de Deus, de seus atributos e propósitos”.16 Neste momento, acontece uma
incorporação da musicalidade pop dos EUA, mas não da brasileira que, mesmo começando a
ser explorada nas suas diferentes manifestações (alguma inserção de ritmos brasileiros como a
bossa- nova e o baião), continua relegada a espaços extra-cúlticos (festas, encontros diversos).
O processo de assimilação da musicalidade popular que acontecera nos EUA não parece
interessar à geração gospel que aceita o padrão estrangeiro sem o menor constrangimento, já
que o produto que chegou ao Brasil já tinha passado por um processo de sacralização; o
mesmo não aconteceu com a cultura autóctone. Aconteceu a sacralização de instrumentos
antes considerados profanos e, trilhando o caminho do pentecostalismo, abriu-se espaço para
o instrumental popular, como as guitarras e as baterias; no entanto o fenômeno não chega a
participar da liturgia na vertente popular brasileira.
A musicalidade que caracteriza o movimento é de fácil melodia, versos curtos, ritmo
animado. A estrutura das músicas foi simplificada, o que permite uma assimilação mais
rápida, ao passo que as melodias saíram do domínio da congregação para torna-se palco de
prova dos solistas.
Os cânticos são definidos por Denise Frederico como doxológicos, de batalha
espiritual e de teologia da prosperidade17. Além disso constata-se uma ênfase no Deus
soberano, recuperando a teologia do AT ligada à tradição sustentadora do templo e dos reis, e
a linguagem mística da tradição do apocalipse. A pregação recalca os mesmos assuntos dos
missionários: conversionismo individual, milenarismo, piedade pessoal, negação do mundo,
sectarismo, anti-ecumenismo.
A herança pietista encontra nesta fase seqüência direta, pois o movimento é
caracterizado pela ênfase na emoção e no sentimentalismo em contraposição com a razão, e
pelo individualismo. Isso acarreta um novo traço que manifesta-se na intimidade com Deus,
que apresenta-se em declarações como entre amantes, nas quais a menção ao nome de Deus é
quase inexistente. A isso soma-se o uso de repetir frases de auto-afirmação nos moldes da

16
MARIANO, Ricardo. Neopentecostais: sociologia do novo pentecostalismo no Brasil. São Paulo: Loyola,
1999. p. 213.
17
FREDERICO, Denise. A música na igreja evangélica brasileira. Rio de Janeiro: MK, 2007. p. 184-188.
17

auto-ajuda, “pregando a idéia de que o sucesso depende de ações que estão ao alcance de
todos, contrariando a própria realidade econômica e culturalmente competitiva e desigual de
nossa sociedade”18.
Uma das marcas que delineia o movimento consiste em “refazer as linhas divisórias
entre o sagrado e o profano, condenando a música secular”19; longe de ser um movimento
tipicamente popular e que instaure um diálogo crítico com a cultura a fim de enriquecer os
próprios conteúdos teológicos e musicais, o movimento gospel representa uma “cultura de
manutenção e não algo novo, transformador, desafiador, que responda às demandas
sóciopolíticas-econômicas-culturais do tempo presente”20. O gospel não representa somente
uma manifestação eclesiástica, mas se estabelece como fenômeno que transcende os limites
da igreja e insere-se na dinâmica do mercado musical nacional.
Numa análise do movimento, Magali Do Nascimento Cunha afirma que
Há uma utilização ideológica da teofania das tradições monárquicas de Jerusalém
[...] A tradição é utilizada para se reconstruir, no século XXI, uma noção de religião
templária, intimista, centrada no louvor e na adoração, que se contrapõe à teologia
mosaica, e cristológica, do pastoreio e do serviço à comunidade.21

É neste momento que no lugar dos grupos musicais começam a aparecer os ministérios
de louvor e adoração; estes assumem papel fundamental não somente na liturgia, mas na
própria vida do povo gospel. A música é entendida como veiculo para se chegar a Deus;
segunda as palavras do mentor do movimento Tommy Tenney “a adoração é mais importante
que a pregação”. Neste modelo, o ministro de louvor, pode e deve pregar mensagens
(“ministrar”) e fazer orações entre uma música e outra, assumindo um papel estratégico na
liturgia, tornando o louvor a parte mais importante do culto. O trânsito dos fiéis entre uma
igreja e outra deve-se em grande medida às preferências musicais que encontram respaldo
neste ou naquele ministério de louvor, muito mais que por questões doutrinárias ou
teológicas.

1.5 Conseqüências: alienação e preconceito


Terminando esta parte de reconstrução histórica do estabelecimento da liturgia
evangélica, de suas formas e seus conteúdos, cabe agora uma crítica a algumas das
características que se evidenciaram como marcas dos cultos evangélicos.

18
CUNHA, Magali do Nascimento. A explosão gospel: um olhar das ciências humanas sobre o cenário
evangélico no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007. p. 129.
19
Ibidem. p. 131.
20
Ibidem. p. 32.
21
Ibidem. p. 186-187.
18

A partir da análise efetuada pode-se inferir uma dupla matriz litúrgica da igreja
evangélica brasileira contemporânea: por um lado é nítida a herança do protestantismo de
missão, quanto aos conteúdos e a impostação não-litúrgica das celebrações; do outro, a marca
tipicamente pentecostal da ênfase nas manifestações extáticas e de poder do Espírito Santo,
que pretende ser entendido como aquele que dirige a espontaneidade nos cultos. A marca
pentecostal que perpassa as mais diversas denominações limitou-se a um destaque das
manifestações de poder do Espírito Santo (línguas, curas e milagres) deixando de lado as
outras características da ação da terceira pessoa da Trindade, como aquele que sustenta a
criação, que renova o intelecto e torna-o conforme a vontade de Deus. Alem disso, constata-se
uma preponderância da ação do Espírito em detrimento da trindade.
Duas palavras poderiam resumir as conseqüências que os cultos evangélicos
proporcionam: alienação e preconceito.
A evangelização dos missionários norte-americanos lançou profundas raízes dualistas:
a dicotomia entre espiritual e “carnal”, o confronto entre razão e fé, a separação entre igreja e
mundo secular, o afastamento do presente mundo maligno e para o futuro reino celestial. Ao
participar do culto, o crente evangélico é convidado a deixar do lado de fora as suas
preocupações, os seus anseios, como se entrando na “casa do Senhor” estivesse entrando
numa dimensão completamente diferente. Bem afirma Costas ao dizer que
um culto que provê uma experiência libertadora termina alienando os seus adeptos
porque os faz escapar do mundo e de seus conflitos. [...] O culto representa um
afastar-se do mundo, um refugio, que permite à comunidade de fé de desvincular-se
por completo dos problemas da sociedade. [...] Numa sociedade convulsionada
como a América Latina, o culto pentecostal apresenta uma igreja indiferente ao
problemas da opressão, injustiça, exploração, fome e miséria que vive o continente.
Isto é completamente inconseqüente em relação à experiência libertadora que os
fieis vivem durante o culto.22

Posto desta forma, o culto não pode ter a prerrogativa de pregar um Cristo Encarnado
no mundo-da-vida dos fiéis, um Deus próximo que conhece a realidade e inspira a
transformação. Costa ainda releva que
este tipo de culto revela uma igreja que vive alienada da sua cultura e dos problemas
da sociedade à qual pertence. No caso de muitas igreja missionárias, o culto é
vertical, dualista e desencarnado. É um culto escapista que reúne os fieis para
transporta-los à presencia de Deus. Está presencia é definida com categorias
metafísicas com expressões culturais estrangeiras.23

O resultado destas posturas poderia-se formular como uma suma das duas matrizes, de
herança missionária e pentecostal, que dá origem a “uma força conservadora que se opõe à
22
COSTAS, Orlando. El protestantismo en América Latina hoy. ensayos del camino. San José: INDEF, 1975. p.
26.
23
Ibidem p. 14.
19

mudança e ao surgimento de um novo amanhecer nesta América Latina que sangra de dor,
que pede justiça, paz e amor”24.
Quanto à formatação da liturgia, é mais que verificado que enquanto o louvor celebra
determinados assuntos, a pregação que a isto segue não trata dos mesmos, a palavra de Deus
que chega em resposta à palavra dos homens não parece fazer parte do mesmo dialogo, chega
absoluta como se não importasse o que a comunidade acabou de cantar, de apresentar a Deus
em louvor e adoração. A liturgia parece muito mais uma justaposição de partes caracterizada
pela concentração no oficiante, seja ele o pastor ou o ministro de louvor, derivante da não
formulação/reflexão teológica do culto, evidente desde a implantação protestante de missão.
A participação ao culto aparece não integrada, e, mesmo reconhecendo a legitimidade do
caráter não litúrgico25 das igrejas de origem missionária, percebe-se a necessidade de melhor
elaborar a ordem dos acontecimentos na narração cúltica evangélica.

O escorço histórico acima esboçado evidencia, portanto, a necessidade de uma crítica


que re-avalie as possibilidades cúlticas da Igreja Cristã e dê novos rumos para os conteúdos e
as formas litúrgicas. Esta crítica encontra seu fundamento na reflexão bíblico-sistemática que
segue no próximo capítulo e que constituirá a base para os apontamentos de contextualização
do último.

24
COSTAS, Orlando. El protestantismo en América Latina hoy. ensayos del camino. San José: INDEF, 1975. p.
28.
25
Para uma definição do termo, consultar VELÁSQUEZ FILHO, Prócoro. O protestantismo, segundo a tradição
cúltica. In: MARASCHIN, Jaci Correia (org.). O culto protestante. Estudos de religião, São Bernardo do Campo,
UMESP, ano 1, n. 2, p. 70-74, out.1985.
20

2. ANÁLISE BÍBLICO-SISTEMÁTICA DAS DIMENSÕES TEOLÓGICAS DO CULTO


CRISTÃO E SUA CONEXÃO LITÚRGICA

O presente capitulo apresentará os aspectos bíblico-sistemáticos do culto cristão com a


finalidade de demonstrar a abertura intrínseca desta celebração, e que portanto sustenta a tese
da legitimidade do anseio pela contextualização do culto no Brasil que o presente trabalho se
propõe sustentar.
No lugar de uma busca por uma definição da palavra “culto”, que acabaria se tornando
um retrato fenomenológico daquilo que se entende com este termo no meio evangélico, foram
escolhidas quatro dimensões teológicas que dão condição de ser e fundamento ao culto
cristão; são estas dimensões a cristológica, a salvífico-escatológica, a antropológica e a
cosmológica.

2.1 Dimensão cristológica.


O culto cristão encontra fundamento em vários aspectos de natureza cristológica. Não
tendo como objetivo uma tratamento exaustivo da Cristologia, esta parte do trabalho se
limitará a abordar os aspectos da pessoa de Jesus Cristo que são diretamente ligados à
existência e valor do culto cristão.
Em primeiro lugar é necessário destacar as declarações acerca da presença de Jesus em
meio aos seus seguidores. O evangelho de Mateus oferece três ocorrências importantes. A
primeira encontra-se na recordação da profecia de Isaías em Mt 1:23 que diz que “o chamarão
de Emanuel o que traduzido significa: Deus está conosco”; a segunda está em Mt 18:20 que
declara que “onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estou eu no meio deles”;
e a terceira em Mt 28:20 que diz “eis que estou convosco todos os dias, até a consumação dos
séculos”. Acerca desta última referência Darino comenta que
la experiencia de celebración del Cristo victorioso y resucitado no pudo ser
encasillada en un sólo sistema litúrgico realizado en un lugar específico. Las
implicaciones de la nueva concepción y opción por la presencia de Cristo son
tremendas, pues ahora se puede adorar a Dios en cualquier lugar y no solamente en
el Templo o sinagoga. Su presencia es respaldada por la Palabra.26

A natureza divina de Jesus Cristo garante a possibilidade da participação dele na


assembléia dos fiéis; depois da glorificação e do derramamento do Espírito Santo, o Deus
trino se faz presente onde quer que os cristãos se reúnam para celebra-lo. A partir das

26
DARINO, Miguel Angel. La adoración y la Biblia. Disponível em:
http://www.convencionbautista.com/dr__darino.htm. Acesso em: 28 fev. 2009.
21

afirmações dos Evangelhos pode-se inferir uma promessa que manifesta a disponibilidade e
assegura a presença dele em meio à comunidade celebrante. Kirst pontua que Jesus
coloca-se livre e generosamente à disposição da comunidade, para que ela o
encontre onde e quando quiser, bastando que invoque o seu nome. É graças a essa
irrestrita e graciosa disponibilidade que uma comunidade cristã pode marcar um
horário e um lugar de culto, e confiar que o Senhor comparecerá ao encontro.27

Prosseguindo a reflexão sobre a dimensão cristológica do culto cristão é necessário


relatar e afirmação de J.J. von Allmen segundo o qual a adoração da Igreja “tem uma dupla
fundamentação cristológica: o culto terreno celebrado pela vida, morte e glorificação do
Cristo encarnado, e o culto celeste que, na glória, Ele celebra até o dia do mundo vindouro”28.
Isso implica uma reflexão que leve em conta duas realidades: por um lado, a obra do Jesus
histórico e sua atitude cúltica, e por outro o Cristo da glória, primícia e eterno sumo-
sacerdote.
A vida de Jesus pode ser concebida como uma vida litúrgica. Von Allmen postula que
“o culto cristão tem por fundamento o “culto messiânico” celebrado por Jesus no período que
medeia entre sua encarnação e ascensão”29. Os atos terrenos podem ser interpretados como
fazendo parte de uma grande liturgia que tem como marcos principais os eventos fundantes da
vida de Jesus Cristo: encarnação, vida, morte, ressurreição. Cada um deles expressa uma
peculiar atitude do Deus-homem em relação ao Pai e ao seu próximo. Os atos de Jesus Cristo
revelam a sua natureza; neste sentido, Hoon afirma que
a pessoa de Cristo é conhecida pela obra de Cristo. E o que Jesus Cristo faz é
sobretudo uma liturgia - um serviço [...] Nesta liturgia, sempre e simultaneamente,
Deus serve o homem, o homem serve o homem, e o homem serve a Deus.30

A igreja que se reúne para celebrar encontra seu fundamento na obra de Jesus Cristo,
pois a sua vida litúrgica “é ao mesmo tempo humana e divina”31. A humanidade de Jesus
Cristo é inspiradora e oferece à assembléia celebrante um modelo da relação com o divino e
com o humano que é a essência do próprio cristianismo. O relacionamento que Jesus
experimentou com Deus durante a sua vida possui a mesma intensidade do que vivenciou para
com o seu próximo; poderia-se até dizer que os dois estão diretamente ligados, na medida que
o relacionamento com o Pai só encontra sua realização e expressão no ato amoroso para com
o outro ser humano. É necessário ressaltar que já que “o culto é um processo contínuo pelo

27
KIRST, Nelson. Liturgia. In: HARPPRECHT, Christoph Schneider (Org.). Teologia Prática no Contexto da
América Latina. São Paulo: ASTE, 2005. p. 121.
28
ALLMEN, Jean Jacques von. O culto cristão: teologia e prática. São Paulo: ASTE, 2005. p. 25.
29
Idem. p. 23.
30
HOON, Paul Waitman. The integrity of worship: ecumenical and pastoral studies in Liturgical Theology.
Nashville: Abingdon, 1971. p. 184. Tradução livre do autor.
31
Ibidem. p. 185.
22

qual assumimos um compromisso com Jesus e seus valores”32, nunca pode se negligenciar
uma compreensão da humanidade de Jesus Cristo em sua expressão no encontro do outro
como modelo de práxis, tanto litúrgica quanto vivencial.
Quanto ao Cristo da glória, este pode ser entendido como primícia da nova
humanidade resgatada para a genuína adoração ao Pai e como eterno sacerdote. Sanches
afirma que
a vida de Jesus é o próprio sacrifício, constituindo-se sua morte no centro da sua
oferenda sacerdotal. Na entrega do seu corpo, Jesus cumpriu seu dever sagrado
sacerdotal e habilitou-se a permanecer sacerdote para sempre [...] instituído como
novo guia da adoração da humanidade redimida.33

O evento cabal da obra de Cristo estende suas conseqüências para a eternidade e


investe todos aqueles que se reúnem para a adoração do Deus trino. Cullman afirma que
todo culto posterior centra-se neste acontecimento histórico: a vida humana vivida
de uma vez por todas por este sumo sacerdote, coroada de uma vez por todas pela
morte expiatória que dá a esta vida sua plenitude e sua perfeição.34

A possibilidade que a Igreja tem de se reunir em comunidade para celebrar, reside na


realidade celeste do Cristo que “assume para si a direção do culto oferecido por toda a
criação”35. Neste mesmo assunto Allmen também afirma que “importa ir mais afundo e
perceber na adoração da Igreja um reflexo da oferenda celestial perpétua da qual Jesus Cristo
é o eterno e soberano sumo-sacerdote”36. Alem disso a adoração da igreja é possibilitada pelo
fato “o sacrifício de Jesus tira os pecados e assegura o aperfeiçoamento dos demais ministros
para que ofereçam um culto definitivo a Deus”37: todos os membros do corpo de Cristo são
elevados à dignidade de ministros e sacerdotes pela obra cumprida em Jesus Cristo.
À conclusão deste assunto pode-se citar Darino que destaca que
Es necesario recalcar, sin embargo que el sacerdocio de la Iglesia no es un
sacerdocio independiente del de Cristo, sino que se da por, y como parte de éste.
[…] Liturgia es así el culto comunitario de la iglesia, que prolonga el sacerdocio de
Jesucristo y tributa a Dios la más alta glória por medio de El 38.

2.2 Dimensão salvífico-escatológica.


A segunda dimensão teológica que fornece elementos para o culto cristão é a salvífico-
escatológica. Os dois aspectos são tratados no mesmo tópico, pois “carismaticamente

32
COCKSWORTH, Christopher. Santo, Santo, Santo: o culto ao Deus trinitário. São Paulo: Loyola, 2004. p.
215.
33
SANCHES, Sidney de Moraes. Hebreus: espiritualidade e missão. Belo Horizonte: Lectio, 2003. p. 17.
34
CULLMAN, Oscar. Cristologia do Novo Testamento. São Paulo: Liber, 2001. p. 133.
35
SANCHES, Sidney de Moraes. Op. cit. p. 17.
36
ALLMEN, Jean Jacques von. O culto cristão: teologia e prática. São Paulo: ASTE, 2005. p. 25.
37
SANCHES, Sidney de Moraes. Op. cit. p. 20.
38
DARINO, Miguel Angel. La adoración y la Biblia. Disponível em:
http://www.convencionbautista.com/dr__darino.htm. Acesso em: 28 fev. 2009.
23

vivificado, o corpo de Cristo se entende como uma antecipação e como o início da nova
criação de todas as coisas”39. O culto representa tanto a lembrança da salvação em Jesus
Cristo, que ao mesmo tempo projeta a própria esperança para o encontro definitivo da
consumação dos tempos, quanto caracteriza-se como instrumento da proclamação perante o
mundo desta mensagem. Consequentemente o presente parágrafo abordará esta dimensão
teológica em relação à Igreja, ao futuro e ao anúncio para o mundo.
A comunidade que se reúne para o culto tem como pressuposto a mesma fé no evento
salvífico de Cristo, que os torna iguais perante Deus e os possibilita à adoração. Ao elaborar
este assunto, Allmen no capítulo “O culto, epifania da Igreja”40 apresenta uma série de
atributos que o culto revela acerca da Igreja. Entre os cincos apresentados, serão abordados
somente dois para a finalidade contextual a este escrito. Ele caracteriza a Igreja como
comunidade batismal, pois “a comunidade dos batizados que o culto manifesta é de fato uma
comunidade de homens, mulheres e crianças que renunciaram ao mundo e morreram para o
pecado”; a reunião litúrgica é fruto de uma decisão voluntária, cuja finalidade é a adoração e
o encontro com Deus. Nas palavras do autor é “o povo escatológico reunido para encontrar-se
com o seu Senhor”. Prosseguindo, Allmen recupera o conceito da Igreja como Esposa de
Cristo ao defini-la como comunidade nupcial: segundo dois pólos esta é por um lado
motivada pela fé no Salvador e, por outro, pela esperança da sua vinda. Isso é motivo para
continuar a presente reflexão no horizonte escatológico.
Ao proclamar a salvação em Jesus Cristo, a comunidade ressalta uma dupla realidade:
por um lado existe a lembrança do ato histórico, cabal da morte e ressurreição de Jesus; por
outro, permanece a expectativa da sua volta. Desta forma, “a adoração da Igreja aponta para a
consumação futura que está sendo preparada no paraíso com Deus”41, pois a Igreja é “a
comunidade daqueles que em razão da ressurreição de Cristo esperam o reino de Deus e são
determinados em sua vida por esta esperança”42. Esta característica está presente desde as
comunidades primitivas como denota Bosch ao descrever o trabalho missionário de Paulo,
afirmando que “é justamente reunindo-se para celebrar liturgicamente a vitória já alcançada e
para orar para a vinda do Senhor, que estas pequenas e frágeis comunidades paulinas se
tornam conscientes [...] da tensão entre o já e o ainda não”43. É pela ação do Espírito que é

39
MOLTMANN, Jürgen. O Espírito da vida: uma pneumatologia integral. Petrópolis: Vozes, 1998. p. 74.
40
ALLMEN, Jean Jacques von. O culto cristão: teologia e prática. São Paulo: ASTE, 2005. p. 41-54.
41
BRUNNER, Peter. Worship in the name of Jesus: English edition of a definitive work on Christian worship in
the congregation. St. Louis: Concordia, 1968. p. 32.
42
MOLTMANN, Jürgen. Teologia da Esperança. São Paulo: Editora Teológica, 2003. p. 384.
43
BOSCH, David J. La trasformazione della missione: mutamenti di paradigma in missiologia. Brescia:
Queriniana, 1997. p. 207-208.
24

possível esta dupla articulação, que atua como uma ponte entre passado-presente-futuro; nas
palavras de Moltmann é a “pneumatologia que estabelece a união entre a Cristologia e a
escatologia [...] Nele, (no Espírito) origem e acabamento se encontram presente”44. A respeito
deste assunto, Allmen desenvolve a idéia do culto como recapitulação pois
“resume e confirma sempre de novo a história da salvação [...] O passado e o futuro,
o evento capital da história da salvação e sua manifestação triunfante, estão
realmente presentes”45.

Ao reunir-se como conjunto celebrante, as comunidades cristãs são ao mesmo tempo


objeto e agente da salvação: objeto em quanto já experimentaram a salvação, que, como
descrito acima, é razão da celebração; agente, pelo fato que ao reunir-se como congregação
dos salvos, definem a própria identidade perante o mundo e se tornam portadoras da
mensagem evangélica. Num belo ensaio exegético sobre Apocalipse46 Orlando Costas afirma
ser um texto fruto “de uma profunda experiência de culto e de uma situação missionária”. Na
análise da celebração celeste ele ressalta que a reflexão teológica que está por trás disso
mostra que Deus tem o controle da história:
Está presente en nuestra historia, preservándola del caos y conduciéndola hacia su
meta final, juzgando a las naciones con equidad y procurando redimirlas del pecado
y de la muerte, creando una nueva humanidad y transformando el orden existente
[…] (la iglesia) puesto que ha sido liberada por el Cordero, debe con libertad
sumirse y adentrarse en su servicio en el redondel de la historia.47

Nestes mesmo termos, Allmen declara que “o culto cristão é um dos agentes mais
importantes da história da salvação”48 e Cocksworth, numa reflexão sobre a conexão entre
culto e missão, pontua que
a comunidade que pratica o culto personifica o Reino de Deus [...] A missão de
Deus torna-se visível e tangível em uma comunidade de pessoas reconciliadas com
Deus, entre si reciprocamente e com o restante da criação. O culto da Igreja deveria
ser um testemunho vivo do conteúdo da mensagem de Deus.49

2.3 Dimensão antropológica.


Ao tratar da dimensão antropológica do culto é preciso levar em consideração uma
mudança na abordagem da antropologia teológica. Parte-se do pressuposto que a comunidade
que se reúne para celebrar a Deus o faz com sua plena humanidade; entende-se aqui que
característica esta não é problemática, mas próprio propósito de Deus desde a criação. À luz

44
MOLTMANN, Jürgen. O Espírito da vida: uma pneumatologia integral. Petrópolis: Vozes, 1998. p. 74.
45
ALLMEN, Jean Jacques von. O culto cristão: teologia e prática. São Paulo: ASTE, 2005. p. 32-34.
46
COSTAS, Orlando. La misión como celebración. In: ______. Compromiso y misión: reflexión sobre la misión
de la iglesia en este mundo de incertidumbre en que vivimos. San José: Editorial Caribe, 1979. p. 141-153.
47
Ibidem. p. 148.
48
ALLMEN, Jean Jacques von. Op. cit. p. 40.
49
COCKSWORTH, Christopher. Santo, Santo, Santo: o culto ao Deus trinitário. São Paulo: Loyola, 2004. p.
223.
25

de Jesus Cristo, da afirmação de ser humano, será necessária uma reavaliação da concepção
de homem no seu relacionamento com Deus. As implicações deste nova abordagem, que
melhor seria definida como uma mudança de paradigma, são fruto da discussão do século XX
e continuam objeto de pesquisa. Para o seguinte tópico far-se-á referência às elaborações de
Karl Barth, Wolfhart Pannenberg e Jürgen Moltmann.
A obra de Jesus Cristo, entre outras peculiaridade, apresentou à História o homem. Na
sua própria vida, comum, simples, mas ao mesmo tempo única e extraordinária revelou aquilo
que era o plano de Deus para a humanidade. Jesus “realiza em si mesmo a determinação
inicial do homem para a comunhão com Deus. Ele, portanto, é o homem novo pela maneira
especial como se apresentou enquanto homem comum”50. Auler lembra que
no centro da fé cristã está a pessoa histórica de Jesus Cristo. Só conseguiremos olhar
para Deus, olhando para Jesus como ser humano. Lá, vemos Deus e vemos também
a nós mesmos. Jesus Cristo torna-se a referência de Deus e conseqüentemente a
referência do ser humano. O mistério da encarnação tem este
objetivo, revelar Deus e revelar o novo ser humano.51

Não um super-homem, com características angelicais e supra-naturais, mas uma


pessoa que no seu agir apresentou a possibilidade do relacionamento com Deus e com seu
próximo. “Na pessoa de Jesus Cristo viu-se o verdadeiro ser humano, encarnado e tornado
possibilidade para todos os outros homens”52. A conexão que isso tem com a dimensão
antropológica do culto é que
no fato do novo ser humano estar presente e real em Jesus Cristo - por força do seu
significado, poder e ação dessa pessoa como “cabeça” e “Senhor” - também está
presente e real para o seu “corpo”, a igreja e, por intermédio do serviço de sua
igreja, para o mundo inteiro 53.

A própria condição de ser do culto deve-se à realidade do novo ser humano. É esta
nova humanidade que se reúne para oferecer culto ao Deus Salvador que a restaurou para a
sua adoração. Esta nova condição, uma re-criação, a recapitulação segundo o novo Adão é
obra do próprio Deus que neste ato a “reveste de toda a glória de sua própria natureza divina,
com seu poder, dignidade, justiça e santidade”54. Ainda que colocado nestes termos, seria uma
presunção e uma enorme desconsideração achar que a comunidade atual expresse estas
qualidades em plenitude; existe uma expectativa escatológica na qual o presente estado de
humanidade será exaltado, assim como aconteceu com Jesus Cristo, para revestir

50
PANNENBERG, Wolfhart. Fundamentação cristológica da antropologia. Concilium, n. 10, jun. 1973, p. 746.
51
AULER, João Paulo. O corpo na liturgia do culto cristão. 2003. Mestrado profissionalizante em Teologia -
Área de concentração: liturgia. Escola Superior de Teologia, São Leopoldo. p. 18.
52
PANNENBERG, Wolfhart. Op. cit. p. 732.
53
BARTH, Karl. Dádiva e louvor: artigos selecionados. São Leopoldo. Sinodal, 1996. p. 364.
54
Ibidem. p. 366.
26

incorruptibilidade e imortalidade (1 Coríntios 15:45-53). Nas palavras de Pannenberg “aquilo,


porém, que só futuramente se revelará nos cristãos como a nova vida da ressurreição já age
presentemente neles pelo espírito da fé, da ressurreição e do amor”55; esperança de uma
salvação no alem pode (e deve) dar conteúdo e sentido à vida terrestre.
Para o presente estudo o que é interessante realçar é que a humanidade, entendida nas
sua formas de corporeidade e finitude, é uma dádiva do Criador. O ser humano como um
todo, integral, é criação de Deus, sua imagem. Nesse viés, ao tratar do conceito de imago Dei
Moltmann afirma que
a imagem de Deus designa primeiramente um relacionamento de Deus com o
homem e somente depois um relacionamento do homem com Deus. Deus entra num
relacionamento com o homem tal que este se torna a sua imagem e a sua honra na
terra. [...] Partindo do relacionamento de Deus com os homens, se concordará que a
imago Dei não consiste nesta ou naquela propriedade, que diferenciam o homem das
outras criaturas, mas na sua inteira existência.56

A mudança de perspectiva é tanta que a própria possibilidade de ter relação com Deus
é reavaliada; no relacionamento de Deus com o homem, aquele é para este criador e portanto
garante desta união. O pecado, ainda que possa atrapalhar, não tem poder de destruir este
vinculo, pois só Deus tem autoridade para suprimir e suspender57.
A dimensão antropológica, exposta aqui nestes termos, apresenta a sua importância no
fato de que a comunidade cristã que se reúne tem como pressuposto a possibilidade de
comunhão com Deus; isso é possível pois
quem crê no Cristo, se torna imagem do Cristo, do Deus que se fez homem, do
Verbo que se tornou carne, portanto também o seu corpo se torna templo do espírito
santo. Ao longo do processo de redenção e aperfeiçoamento, o homem se torna
imago Dei “tam in corpore quam in anima.58

É a partir desta nova concepção antropológica que será possível ressaltar e incorporar
à liturgia do culto cristão elementos expressivos da humanidade, derivantes da cultura e do
contexto onde o ser humano ser encontra. Seria dilacerante conceber um culto no qual se peça
ao fiéis de deixar se der ser humano para ser tornar algo diferente para adorar.
À luz de quanto exposto até aqui, manifestou-se como o Evangelho não possui caráter
normativo nas questões litúrgicas, mas permite uma rica gama de possibilidades e diretrizes
(ou dimensões como até aqui conceituadas) que norteiam a prática da comunidade. O próximo
capítulo tentará apontar para possíveis rumos de contextualização do culto evangélico no
Brasil, em nível de formas e conteúdos.
55
PANNENBERG, Wolfhart. Fundamentação cristológica da antropologia. Concilium, n. 10, jun. 1973, p. 739.
56
MOLTMANN, Jürgen. Dio nella creazione: dottrina ecologica della creazione. Brescia: Queriniana, 1986. p.
258-59.
57
Ibidem. p. 272.
58
Ibidem. p. 279.
27

3. EM BUSCA DA CONTEXTUALIZAÇÃO DO CULTO EVANGÉLICO.


O presente capítulo apresentará apontamentos de contextualização para a construção
de uma liturgia brasileira, em suas formas e conteúdos. Acerca das formas, buscar-se-á um
enfoque multidisciplinar. Quanto aos conteúdos, a formulação seguirá as três funções da
contextualização postuladas por Darrel Whiteman59: a encarnacional, a profética e a
hermenêutica.

3.1 Enfoque multidisciplinar para a construção de uma liturgia brasileira.


Entendendo o culto como um fenômeno complexo, catalisador das diversas dimensões
teológicas assim como de diferentes Artes, pode-se pensar que a partir disso outras disciplinas
possam fornecer uma contribuição preciosa para a construção de uma liturgia brasileira.
Ao participar do culto, o homem o faz na sua integralidade. Argumenta Buyst que
a ação litúrgica envolve a pessoa como um todo. Todas as suas dimensões são
atingidas e requisitadas: a dimensão corporal, a dimensão psicológica (racional,
afetiva, volitiva), a dimensão espiritual. [...] Todas estas dimensões acontecem ao
mesmo tempo [...] não se trata de experiências sucessivas ou simultâneas, mas
coincidentes60.

Por isso não pode-se pensar que a absoluta espontaneidade, a justaposição de partes e
a idéia que o culto aconteça numa esfera meramente espiritual sejam atitudes fundamentadas,
possíveis e proveitosas para todo aquele que chega à igreja para celebrar. Durante o culto a
vida, com toda a sua humanidade, é trazida perante Deus, é por ele confrontada, consolada,
comissionada para a propagação do Reino. Diz Costas que
o culto dramatiza a vida da igreja durante a semana que acaba de passar e seu futuro
imediato uma vez pronunciada a benção pastoral. É o acontecimento que põe à luz
as preocupações mais íntimas da congregação.61

A ação da comunidade no culto deve ser altamente participativa, pois não somente
uma parte dela pode fazer parte da dinâmica celebrativa, mas toda ela. Diz Floristan que
participar é aderir, tomar parte e intervir. A participação litúrgica exige entre em
comunhão com aquilo de que se participa e com os próprios participantes [...] a
celebração não é um espetáculo ao qual se assiste, mas uma ação da qual a
assembléia participa62.

O louvor que a igreja brasileira acabou assumindo em sua maioria descuida deste
fator, apresentando músicas adequadas para um solista ao invés que para a congregação, e que

59
WHITEMAN, Darrel L. Contextualization: the theory, the gap, the challenge. International Bulletin of
Missionary Research, v. 21, n. 1, jan. 1997.
60
BUYST, Ione. Pesquisa em liturgia: relato e análise de uma experiência. São Paulo: Paulus, 1994. p. 30.
61
COSTAS, Orlando. El protestantismo en América Latina hoy: ensayos del camino. San José: INDEF, 1975. p.
6.
62
FLORISTAN, Casiano. Celebração das comunidades. São Paulo: Loyola, 2002. p. 29.
28

distanciam a comunidade de uma efetiva participação. No lugar de uma assembléia integrada


que participa ativamente, e não somente como espectador, muitas vezes se assiste a uma
apresentação que, mesmo não sendo de alto nível, pode ser oficiada somente para a equipe
que passou por treinamento. Isso implica também em atribuir funções ao “ministério de
louvor” que ultrapassam o limite da diaconia, do serviço, dividindo a assembléia entre
adoradores profissionais e aqueles que recebem a “ministração”. É, portanto, necessária uma
recuperação do valor do serviço para as equipes que se ocupam da música e do canto para que
sejam mais atentas aos limites das comunidades e entendam e própria função na dimensão do
serviço; é preciso devolver o canto ao povo. Esta re-interpretação do papel das equipes nasce
de uma preocupação e de uma possibilidade latente nas manifestações artísticas; afirma
justamente Genre que as artes têm a capacidade de
“expressar, dizer o que linguagem discursiva não é capaz de formular. A arte tem
peculiar poder e capacidade de atingir múltiplos aspectos da experiência humana no
mesmo momento.”63

Em linha com a visão holística proposta por Buyst, a contribuição de Genre aponta
para uma categoria importante para o culto evangélico brasileiro: o encontro. Martins destaca
quatro aspectos principais ao trabalhar a definição de culto como encontro, termo rico por
causa da conotação existencial que oferece64: rememoração, celebração, libertação e
renovação. Estes quatro elementos remetem ao conceito de dramatização, acima citado, de
Costas, pois atualizam no culto os momentos fundantes da fé, os celebram ao passo que
apontam para a mudança e a transformação. Por um lado, então, pode-se perceber um certo
grau de representação e, por outro, o desenvolvimento do culto como uma narrativa. Isso
levaria a pensar à contribuição da teoria da comunicação e da Teologia Narrativa. No entanto,
os pontos levantados neste parágrafo continuariam sendo periféricos se não acontecesse uma
contextualização dos conteúdos celebrados.

Antes de entrar na discussão de alguns conteúdos necessários para o culto evangélico


brasileiro, torna-se oportuna uma pequena digressão sobre os termos utilizados para descrever
a relação entre fé e cultura.

63
GENRE, Ermanno. P. 87.
64
MARTINS, José Cássio. Experiência e proposta de culto evangélico no Brasil. Boletim Teológico, v. 9, n. 28,
out.-dez. 1995, p. 28-45.
29

3.2 Definindo os termos65.


Os dois termos que provocaram a necessidade desta digressão são: contextualização e
inculturação. As fontes pesquisadas utilizam a terminologia as vezes separando os dois
significados, as vezes entendendo um processo como parte do outro, outras vezes tratando-os
como sinônimos. Daí esta pequena reconstrução histórica dos termos.
Kraft66 relata que o Conselho Mundial de Igreja introduziu formalmente o termo
contextualização em 1972. Por causa deste proveniência, muitos evangélicos o rejeitaram, até
que depois da metade da década de 70, foi se impondo na terminologia de missões.
Hesselgrave define contextualização como
a tentativa de comunicar a mensagem da pessoa, das obras, da palavra e da vontade
de Deus de modo fiel à revelação de Deus, sobretudo como está apresentado nos
ensinos das Escrituras Sagradas, e que é significativo aos receptores em suas
culturas e contextos existenciais respectivos.

Quanto ao termo inculturação, apareceu pela primeira vez na Primeira Assembléia


Plenária da Conferencia da Federação dos Bispos da Ásia em 1971. Roest Crosslius à moda
de uma síntese dos vários conceitos define inculturação como
a realização da fé e da experiência cristã numa cultura, de tal modo que não só se
expresse com elementos culturais próprios (tradução), mas também se torne uma
fora que anima, oriente e renova esta cultura (discernimento), contribuindo para a
formação de uma nova comunidade, não só dentre de sua cultua, mas inda como
enriquecimento da Igreja universal (síntese) 67

Whiteman considera os dois termos quase como sinônimos, ao passo que teólogos
católicos não adotaram contextualização “talvez por sugerir um nível mais externo de
inculturação, limitado ao âmbito sóciopolítico e do econômico”68.
Por causa de ausência de material protestante específico sobre a temática aqui tratada,
usar-se-ão os dois termos como sinônimos dada a dupla proveniência de ambiente teológico
da bibliografia utilizada, embora, para os fins deste trabalho, o termo inculturação pareceu
melhor responder a idéia de inter-relação entre liturgia cristã e cultura autóctone. A utilização
aqui proposta tende a interessar-se mais para o resultado proposto pelos dois métodos, mais
que numa definição detalhada das diferenças dos dois.

65
Para uma história detalhada da adoção do termos e sua perspectiva histórico-teológica separou-se uma
bibliografia específica no final do trabalho.
66
KRAFT, Charles. Contextualisation Theory in Euro-American Missiology. Disponível em:
http://www.lausanne.org/all-documents/contextualisation-theory.html. Acesso em: 5 nov. 2009.
67
ROEST CROLLIUS, A. Apud Miranda, Mario de França. Inculturação da fé: uma abordagem teológica. São
Paulo: Loyola, 2001. p. 38.
68
ANTHONY, Francis-Vincent. Ecclesial praxis of inculturation: toward an empirical-theological theory of
inculturizing praxis. Roma: LAS, 1997. Apud MIRANDA, Mario de França. Op. cit. p. 37.
30

3.3 Função encarnacional.


A “Declaração de Nairobi sobre culto e cultura” afirma que
o Jesus a quem oferecemos culto, nasceu em uma cultura específica do mundo. No
mistério de sua encarnação se encontra o modelo e o mandato para a
contextualização do culto cristão [...] Os valores e as normas de uma determinada
cultura, na medida em que estão de acordo com os valores do Evangelho, podem ser
aplicados para expressar o sentido e o propósito do culto cristão.69

A função encarnacional se aproxima do próprio conceito de contextualização,


apresentando a possibilidade e a necessidade de atuar de maneira positiva e enriquecedora
biunívoca entre culto e cultura. Whiteman define esta função como tentativa de
comunicar o Evangelho em palavras e ações e estabelecer a igreja em maneiras que
façam sentido para as pessoas no seu contexto cultural local [...] permitindo-lhes de
seguir a Cristo e permanecer na sua própria cultura70.

O dado cultural não pode ser subestimado, ou anulado (como aconteceu em muitos
empreendimentos missionários do século passado, inclusive no Brasil), mas é um fator basilar
de reflexão para a praxis da igreja e sua manifestação litúrgica. O liturgista Anscar
Chupungco definiu a inculturação da seguinte maneira:
processo pelo qual os textos de ritos usados no culto pela igreja local estão de tal
modo inseridos na estrutura da cultura, que absorvem seu pensamento, sua
linguagem e seus modelos rituais. A inculturação litúrgica opera de acordo com a
dinâmica de inserção em determinada cultura e com a assimilação interior de
elementos culturais. De um ponto de vista puramente antropológico podemos dizer
que a inculturação permite às pessoas de um povo experimentarem em celebrações
litúrgicas um “evento cultural” cuja linguagem e cujas formas elas são capazes de
identificar como elementos de sua cultura71.

Em outro texto ele afirma que


um resultado da inculturação é que os textos, símbolos, gestos e festas litúrgicas
evocam algo da história, das tradições, pos padrões culturais e do espírito artístico
do povo. Podemos dizer que, se uma liturgia é capaz de evocar a cultura local, isto é
um sinal de que efetivamente ocorreu inculturação.72

O segundo capítulo deste trabalho apresentou a abertura e, consequentemente, as


possibilidades cúlticas que as Escrituras permitem; somando a isso as definições aqui
apresentadas pode-se clamar pela “libertação da liturgia”73:

69
Declaración de Nairobi sobre culto y cultura: desafíos y oportunidades contemporâneas. Disponível em:
http://www.ielu.org/liturgia/documentos/declacion_de_nairobi.htm. Acesso em: 1 nov. 2009.
70
WHITEMAN, Darrel. Contextualization: the theory, the gap, the challenge. International Bulletin of
Missionary Research, v. 21, n. 1, jan. 1997.
71
CHUPUNGCO, Anscar J. Liturgias do futuro: processo e métodos de inculturação. São Paulo: Paulinas, 1992.
p. 38.
72
APUD: STAUFFER, Anita (Org.), Christian Worship: Unity in Cultural Diversity. Genebra: Lutheran World
Federation, 1996. p. 78.
73
As citações deste tópico fazem referência a: MARASCHIN, Jaci. Libertação da liturgia. In: ______. A beleza
da santidade: ensaios de liturgia. São Paulo: ASTE, 1996. p. 133-138.
31

- do clero, “pois a ação litúrgica pertence ao povo [...] a liturgia do povo de Deus sé
tem sentido numa Igreja que leva a serio a realidade teológica do “ministério de todos os
cristãos”;
- das fórmulas estrangeiras, já que “as liturgias permaneceram as mesmas dos paises
de origem”;
- da música alienígena, para “mostrar a sacralidade maravilhosa do violão, dos
tambores, dos pandeiros e das cuícas. E experimentar a beleza do nosso samba, da nossa
marcha-rancho, do nosso xaxado. Mais ainda, a sua superioridade sobre os corinhos norte-
americanos, sobre as tão divulgadas baladas de tipo rock;
- da falsa espiritualidade, pois “a idéia de que a liturgia deve ser antes de tudo
“espiritual” tem levado a Igreja a certas conclusões engraçadíssimas”; já que “a
espiritualidade significa o descobrimento que nosso corpos, afinal, são o templo do espírito, a
sua expressão mais bela e real”;
- dos ídolos, pois a “celebração da esperança da vitória de Jesus sobre os inimigos do
povo desmascara as falsas celebrações que nada dizem, nada ouvem, nada fazem. As
celebrações que nos retiram desta vida e das suas preocupações, elevando-nos para o oásis
celestial, não são celebrações da esperança do Cristo que viveu entre nós e morreu numa
cruz”.

Ao lado destas propostas, no entanto, existe a necessidade de colocar os limites deste


processo e os métodos possíveis. Stauffer alerta sobre a tensão intrínseca da dinâmica entre
culto e cultura afirmando que existe a
necessidade de ser fieis à nossa comum raiz judaico-cristã e ser significativos em
cada cultura [...] o perigo no extremo da autenticidade é que o culto pode tornar-se
culturalmente irrelevante, fora de lugar, desprovido de significado. No outro
extremo, o da pertinência, o perigo é que o culto pode cair cativo de uma dada
cultura, isolado da Igreja de Cristo em seu conjunto e, no pior dos casos,
sincretista.74

Ao passo que Peter Schineller pontua que “cada comunidade cristã local deve manter
sua ligação com as outras comunidades atuais no mundo, e com as comunidades do passado,
através de um entendimento da tradição cristã”75.
Por esta razão, todo processo de diálogo com ao cultura deve passar pelo crivo da
crítica, para poder aproveitar de maneira sadia os componentes culturais.

74
STAUFFER, Anita. El culto cristiano: en procura de adaptación local y universalización. In: ______(Org.).
Dialogo entre culto y cultura: informes de las consultas internacionales. Ginebra: Federación Luterana
Mundial, 1994. p. 11-12.
75
SCHINELLER, Peter. Handbook on Inculturation. New York: Paulist Press, 1990. p. 72.
32

Partindo da realidade da religiosidade popular dos pobres, Leonardo Boff adotou a


posição de que o sincretismo é um autêntico fenômeno humano, distinguindo dentro do
mesmo termo fatores positivos e negativos76. Starkloff 77
afirma que a terminologia utilizada
por Boff ao falar de adaptação, refere-se ao que os missiólogos chamam de inculturação.
Posto este esclarecimento semântico, Boff destaca dois critérios fundamentais de um
verdadeiro sincretismo que mantenha a identidade da experiência cristã: o culto espiritual e o
compromisso ético. Diz ele que
verdadeiro culto e engajamento ético formam uma unidade. Como o mesmo
movimento com o qual o homem se dirige a Deus deve dirigir-se também ao outro.
A causa de Deus implica a causa do homem e vice-versa78.

Esta última afirmação leva para a segunda função da contextualização: a profética.

3.4 Função profética.


Ao exercer sua função profética, a contextualização se manifesta de maneira contra-
cultural; estabelece com a cultura uma relação de denúncia e de confronto das estruturas
desumanizadoras e opressoras, à luz do Evangelho. No âmbito litúrgico isso implica numa
reflexão sobre os conteúdos celebrados nas reuniões.
A análise efetuada no primeiro capítulo aponta para uma problemática típica do culto
evangélico brasileiro: a tendência à alienação e ao confronto com a cultura local como um
todo. A atitude que comumente se pretende dos participantes do culto é que deixem do lado
de fora da porta da igreja os problemas, as lutas, os anseios da vida que dia após dia
continuam desafiando-os. Isso implica também em desconsiderar o caráter missiológico do
povo de Deus; a tese aqui defendida é de que o culto é o lugar de formação, de reconciliação
entre o homem e Deus, e entre o homem e o seu semelhante, para que restaurado este possa
voltar ao mundo e ser um agente de transformação da realidade. Ione Buyst afirma que
o conflito vivido nas relações sociais aparece na liturgia. Daí por que a liturgia será
ou uma liturgia alienada, tentando não tomar posição, ou uma liturgia encarnada na
luta dos mais pobres, uma liturgia em perspectiva transformadora da realidade
histórica.79

Sendo assim, o culto tem como condição e como necessidade tanto a vivencia da
justiça quanto a denúncia profética quando esta não é cumprida.

76
BOFF, Leonardo. Igreja: carisma e poder. Petrópolis: Vozes, 1982. p. 161-170.
77
STARKLOFF S J, Carl F. Inculturation and cultural systems. Theological Studies, n. 55, 1994, p. 283.
78
BOFF, Leonardo. Op. cit. p. 169.
79
SILVA, José Ariovaldo; BUYST, Ione (Orgs.). Liturgia em tempo de opressão: à luz do apocalipse. Cadernos
de Liturgia. São Paulo: Paulus, 1990. p. 41.
33

Para desenvolver este assunto a fonte mais antiga é a própria Bíblia: são notórias as
férreas críticas ao culto realizadas pelos profetas. Aqui serão citados apenas dois, Amós e
Isaías. Acerca das palavras de Amós, Sicre afirma que
quando o homem considera o culto com o mais importante, esquecendo o lugar
fundamental da justiça e do direito, da compaixão e da misericórdia, do próximo,
imagem de Deus, o profeta proclama o caráter secundário do culto, usando as vezes
palavras radicais.80

Um comentário de Fohrer sobre Isaías coloca-se na mesma perspectiva ao afirmar que


o profeta
não critica o culto, mas os homens que o praticam [...] Isaías não rejeita o culto de
modo algum, mas a forma superficial como se realiza, com a boca e com os lábios,
não com o coração.81

Num artigo sobre a contribuição dos profetas para a reflexão sobre o culto atual,
Carroll afirma que a adoração deve questionar as ideologias dominantes, deve tratar das
realidades da vida atual, e deve alimentar um compromisso com a justiça.82 Ele sustenta que é
necessário “discernir quando a fé, consciente ou inconscientemente, se identifica com a
ideologia ou agenda de um partido ou movimento político ou da própria nação”83. Ele adverte,
também, que os cultos fartos de alegria e de fáceis bênçãos podem separar da vida cotidiana;
que não é possível falar do Deus misericordioso se não se demonstra misericórdia aos
necessitados. Aquilo que acontece no culto deve nutrir os crentes com caridade e justiça,
qualidades que devem ser características fundamentais da identidade e missão do povo de
Deus. Falando desta dimensão de denúncia profética Genre afirma que
é necessário que a liturgia se encarregue dos dramas e os coloque no culto,
transmitindo novas visões, novas sensibilidades, novas palavras, novos ritos, novos
símbolos, novas ações, para exercitar o ministério profético de sentinela.84

Está assim posta a conexão entre vida e culto, num relacionamento biunívoco
enriquecedor, sendo a liturgia “a celebração da vida na busca e na união com o Deus da
Vida”85. Um olhar crítico da realidade, que levante as injustiças do mundo e as apresente a
Deus durante a celebração de maneira que por Ele sejam julgados; um momento de denúncia,
de confissão e de renovação das forças e das esperanças. A vivência dos participantes é
assumida, e olhada através do prisma dos valores cristãos. Steve Turner afirma que “a visão

80
SICRE, José Luis. A justiça social nos profetas. São Paulo: Paulinas, 1990. p. 180.<
81
FOHRER. Jesaia 1 als Zusammenfassung. p. 158. Apud: SICRE, José Luis. A justiça social nos profetas. São
Paulo: Paulinas, 1990. p. 271.
82
CARROLL, Daniel. Puden los profetas arrojar luz sobre los debates tocante al culto? DavarLogos,
Universidad Adventista del Plata, n. 6, p. 143-156, 2007.
83
Idem. p. 150
84
GENRE, Ermanno. Il culto cristiano: uma prospettiva protestante. Torino: Cludiana, 2004. p. 203.
85
SILVA, José Ariovaldo; BUYST, Ione (Orgs.). Liturgia em tempo de opressão: à luz do apocalipse. Cadernos
de Liturgia. São Paulo: Paulus, 1990. p. 16.
34

de mundo verdadeiramente cristã é muito mais penetrante e, muitas vezes, menos obviamente
religiosa do que as pessoas imaginam”86. Buyst lembra que a liturgia não pode
simplesmente olhar para trás e celebrar fatos do passado. Mesmo fazendo memória
de um fato passado, fazemos isso dentro de um contexto novo, que pede nova leitura
política e teológica, que pede nova atitude, que exige novo compromisso, para que
possamos falar de uma liturgia libertadora.87

É necessário promover um momento de encontro/confronto entre os valores do


mundo, as injustiças do sistema e o paradigma do Reino De Deus. A advertência de Genre é
perspicaz os afirmar que
quando o culto cristão não é capaz de encontra nos momentos institucionais de
denuncia da injustiça no mundo nem de deixar espaço ao grito de dor daqueles que
sofrem, deixa aberto um inquietante interrogativo.88

Deveria ser prerrogativa do culto cristão denunciar tudo aquilo que desumaniza, que
torna o ser humano menos “à imagem e semelhança” do Criador, que o insere numa rede de
ganância e de poder da qual na maioria das vezes se torna vítima por ser a parte fraca do jogo.
Dois pensamentos sobre as funções da liturgia servirão à guisa de conclusão deste
parágrafo. Buyst diz que
a liturgia tem dupla função: epifânica (manifestadora) e transformadora[...] É um
fato teologal, carregado de energia e presença divina, como reação de Deus e do
povo de Deus à realidade social, política, cultural. É a encarnação da liturgia na vida
e na realidade política.89

E Orlando Costas afirma que


o culto é, ao mesmo tempo, uma palavra de promessa e de juízo. [...] porque reflete
as injustiças, o caos e o desajuste da vida humana e afirma o imperativo de lutar por
um mundo mais igual, mas livre e mais responsável. Por isto, o culto que a igreja
celebra deve estar cheio de símbolos que expressem a realidade concreta do homem.
Os hinos que se cantam, os orações que se elevam e os sermões que se pregam
devem refletir uma profunda preocupação na comunidade de fé para os problemas,
aflições e ansiedade que vive a sociedade.90

Longe de ser tornar um momento de politicagem, de tal maneira que a mensagem do


Evangelho fique reduzida, deturpada com discurso fúteis e anti-bíblicos, a liturgia precisa
redescobrir a sua função profética, denunciando os males do sistema que afligem os membros
da comunidade. Precisa cantar as aflições, as lutas, os anseios do povo, colocando-os perante
o Deus todo-poderoso, aquele que se compadece, que faz justiça ao oprimido, que se faz
companheiro de caminhada, amigo, salvador e redentor; não o Deus de falsa prosperidade,

86
TURNER, Steve. Cristianismo Criativo?. São Paulo: W4Editora, 2006. p. 68.
87
BUYST, Ione (Org.). Liturgia e política. Cadernos de liturgia. São Paulo: Paulus, 1999. p. 46.
88
GENRE, Ermanno. Il culto cristiano: uma prospettiva protestante. Torino: Cludiana, 2004. p. 212.
89
BUYST, Ione (Org.). Opt cit. p. 47.
90
COSTAS, Orlando. El protestantismo en América Latina hoy. ensayos del camino. San José: INDEF, 1975. p.
105.
35

fáceis ganhos e tão monopolizado por um subjetivismo tão extremado que beira o egoísmo
disfarçado de profunda adoração espiritual, que tem se cantado.

3.5 Função hermenêutica.


Whiteman define a função hermenêutica como o desenvolvimento de
expressões contextualizadas do Evangelho de maneira que o próprio Evangelho seja
entendido em modos no quais a igreja universal nunca experimentou ou entendendo
antes, que amplie nosso entendimento do Reino de Deus. Neste sentido a
contextualização é uma forma de missão ao contrario, onde aprendemos de outras
culturas como ser mais cristãos no nosso próprio contexto. Esta é uma importante
função da contextualização na missão porque conecta o particular ao universal.

A função hermenêutica, portanto, permite ao culto da igreja local de se colocar em


contato com a sua tradição, com a Igreja universal e com o mundo como um todo. A
especificidade do fator cultural é colocada em relação com as marcas da identidade cristã
histórica e teologicamente estabelecidas. Stauffer chama a atenção para o fato que
o Deus ao qual os cristãos rendem culto é transcendente e transcultural, de maneira
que não faz sentido substituir um cativeiro cultural por outro. Não tem forma
cultural que faça justiça ao Deus do todo o cosmo 91.

É no culto que a igreja demonstra a sua identidade, seus valores, e semeia o germe de
sua praxis. Dando como pressuposto que entende-se “liturgia a reunião do povo de Deus para
celebrar os atos libertadores de Deus na história dos seres humanos e para anunciar ao mundo
essa mesma libertação”92, é durante esta reunião que o povo de Deus revela o compromisso
para como o outro ser humano e com a criação. Costas afirma que
o culto não somente atualiza o passado e futuro distantes, como também próximos.
[...] Revela até que ponto essa igreja está orientada para o mundo. Indica se essa
comunidade leva a seria sua missão profética, sacerdotal e real (1Pd 2:9,10), se está
integrada ou desligada da sociedade, se concebe o culto como um refugio alienante
o como uma celebração libertadora [...] O culto dramatiza, alem disso, a interação
da igreja com a cultura93.

A dinâmica que a igreja estabelece com a cultura pode, e deve, ser uma relação
biunívoca na qual ambas sejam enriquecidas mutuamente, "de maneira que a mensagem cristã
se torne não desconexa da cultura, não um remendo alheio super-imposto, mas uma linha de
desenvolvimento junto à cultura”94. A Igreja precisa redescobrir-se e colocar-se perante o
mundo como agente do Reino de Deus, denunciando tudo aquilo que representa o anti-reino, e

91
STAUFFER, Anita. El culto cristiano: en procura de adaptación local y universalización. In: ______(Org.).
Dialogo entre culto y cultura: informes de las consultas internacionales. Ginebra: Federación Luterana Mundial,
1994. p. 14.
92
MARASCHIN, Jaci. A beleza da santidade: ensaios de liturgia. São Paulo: ASTE, 1996. p. 133.
93
COSTAS, Orlando. El protestantismo en América Latina hoy: ensayos del camino. San José: INDEF, 1975. p.
6.
94
LONERGAN, Bernard. Method in theology. New York: Herder, 1973. p. 362.
36

aprender da cultura como ser mais brasileira sendo mais cristã. No entanto, Carrier alerta para
a necessidade de reconhecer que a fé é distinta de toda cultura:
a fé em Cristo não é produto de nenhuma cultura; não se identifica com nenhuma
delas; é absolutamente distinta, já que vem de Deus [...] Mas esta distinção entre fé e
cultura não é dissociação. A fé está destinada a impregnar toda cultura humana, a
fim de salvar-las e elevar-las segundo o ideal do Evangelho95.

Em linha com este pensamento poder-se-á pontuar a idéia da implantação do Reino de


Deus como paradigma da salvação da cultura. Um processo pelo qual, na troca mútua de
valores, formas e práticas o Evangelho encontre sua forma peculiar de expressão num dado
conjunto cultural, ao mesmo tempo em que esta cultura absorva os valores do Evangelho.
Pinheiro afirma que a expansão do Reino de Deus é
uma vibração espiritual que circula através das comunidades. Mas há também
inúmeras presenças profanas no movimento. A santificação da vida cultural no geral
e no Reino de Deus em particular, é uma marca deixada pelo cristianismo no Reino
de Deus. A santificação da vida cultural não será possível sem uma concentração
dos elementos expressivos da cultura e da sociedade, sem a constituição de
comunidades que estejam imbuídas em levar e transmitir a experiência religiosa às
gerações futuras96.

A implicação desses pontos na prática litúrgica baseia-se na idéia que “a música e o


canto representam para cada geração um lugar de encontro, de abertura, para o mundo todo e
para Deus”97, e portanto o culto deveria ser o principal local de formação do povo de Deus.
Logo, é necessário que novas canções, novos textos, novas aspirações venham a fazer parte
do louvor da igreja para que esta retome a sua identidade de agente de propagação do Reino.
Bem lembra Maraschin quando diz que
estas coisas todas nos remetem, naturalmente, à missão. Liturgia é missão de Deus
para o mundo. Não é apenas uma preparação. O que nós fazemos enquanto estamos
reunidos é de importância fundamental. Nosso encontro comunitário é, de certa
forma, a coisa mais importante que podemos fazer enquanto cristãos. É por isso que
a liturgia sempre foi uma preocupação básica da Igreja. É nela que nos damos conta
do fato de sermos “corpo de Cristo” disseminado no mundo. E portadores do
Espírito Santo, senhor e doador da vida98.

O movimento centrípeto, de reunir-se em um dado local para celebrar a Deus, deve


resultar em movimento centrífugo de igual força que impulsione a Igreja para uma vivência
plena, integrada e transformadora na sociedade, pois a “ética cristã começa quanto o povo de
Deus se reúne para adorar”99.

95
CARRIER, H. Inculturación del evangelio. Disponível em:
http://www.mercaba.org/DicT/TF_inculturacion.htm. Acesso em: 4 nov. 2009.
96
PINHEIRO, Jorge. Deus é brasileiro: as brasilidades e o Reino de Deus. São Paulo: Fonte Editorial, 2008. p.
81.
97
GENRE, Ermanno. Il culto cristiano: uma prospettiva protestante. Torino: Cludiana, 2004. p. 77.
98
MARASCHIN, Jaci. A beleza da santidade: ensaios de liturgia. São Paulo: ASTE, 1996. p. 138.
99
GUROIAN, Vigen. Incarnate Love: essays in orthodox ethics. Notre Dome (Indiana): University of Notre
Dome Press, 1987. p. 71.
37

CONCLUSÃO
O objetivo principal do trabalho foi apresentar a necessidade de contextualização do
culto evangélico brasileiro.
À luz disso, estruturou-se a pesquisa de tal maneira que se mostrassem as raízes
histórico-teológicas da atual conjuntura do culto evangélico no Brasil. Apontou-se para os
limites e as dificuldades do protestantismo de missão e das várias ondas do pentecostalismo
brasileiro no tocante ao culto. Identificou-se o resultado litúrgico destas duas matrizes no
culto dualista, que incorporou as ênfases pietistas e puritanas, resultantes num individualismo
excludente; em conteúdos que apresentam um cristianismo afastado da realidade dos
membros, pouco ou nada preocupado com a inserção dos mesmos na sociedade; uma
musicalidade e uma teologia herdeiras das tradições norte-atlânticas e que mantém confronto
com a cultura brasileira e não respondem aos verdadeiros anseios do povo.
Colocado esse dado histórico, encontrou-se a necessidade de fundamentar
teologicamente as possibilidade de contextualização do culto em suas formas e conteúdos. Ao
invés de procurar uma definição fenomenológica do culto cristão se optou por delinear três
dimensões teológicas que dão fundamento e razão de ser para essa prática da Igreja: através
de uma análise bíblico-sistemática foram apresentadas a dimensão cristológica, salvífico-
escatológica e antropológica do culto cristão. Sendo assim, tentou-se demonstrar que o núcleo
fundamental do culto consegue manter a sua autenticidade ao passo que não se opõe à
contextualização.
O último capítulo apresentou o culto como um evento complexo, tanto na sua natureza
intrínseca, quanto no envolvimento daqueles que dele participam, e apontou para elementos
necessários para que esse se torne mais brasileiro. Se ressaltou o caráter sintético das Artes
que entram a fazer parte do conjunto litúrgico e considerou-se a riqueza que isso representa.
Em seguida, depois de ter brevemente feito clareza entre os termos utilizados (i.e.,
contextualização e inculturação) se optou por apresentar dois temas fundamentais para o
protestantismo brasileiro: a denuncia profética e a implantação do Reino de Deus como
paradigma da salvação da cultura. Se enfatizou a necessidade de encontrar praticas cúlticas
que em seus conteúdos demonstrem a ligação da liturgia com a missão e a ética do povo de
Deus, entendendo-os como parte da mesma tarefa da Igreja para com o mundo.
A pesquisa até aqui desenvolvida tem evidenciado a potencialidade de
contextualização do culto evangélico. Os elementos que o compõem, suas músicas, suas
letras, sua organização podem e devem passar por um processo de avaliação a fim de
conservar o que é autenticamente cristão e libertar-se de toda imposição cultural estrangeira.
38

Muito pode ser aproveitado da cultura brasileira, e sobretudo, muito pode ser dito à cultura
brasileira entendendo a Igreja como agente do Reino de Deus.
Contudo, percebe-se a necessidade de ulterior indagação no tangente ao culto como
primeiro lugar de formação ética do povo cristão: ética para com o outro ser humano e para
com a Criação, como conteúdos necessários para a adoração do povo de Deus. Alem disso,
evidenciou-se a necessidade de elaborar uma correlação hermenêutica entre a liturgia e a vida,
entendidas como grandes narrativas da existência humana, para a construção de uma teologia
do culto brasileira.
Finalmente, espera-se que este ensaio possa contribuir para o crescimento do povo de
Deus, para a propagação do Reino; para que floreça uma igreja evangélica mais brasileira,
sendo mais humana e autenticamente cristã.
39

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