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Oscar Wilde na sua epístola De Profundis disse que “A arte só começa onde a
imitação/[reprodução] acaba [...].” ([1897]; 2000), mas será realmente isto que
acontece? Esta frase oferece-nos um óptimo ponto de partida, para o cerne deste
trabalho. No essencial, a uma questão é a de saber como e através de que
processo/processos uma Obra de Arte se torna um Objecto de Consumo em Massa e/ou
vice-versa. Esta tentativa complexa de saber quais são os processos que levam à
produção e reprodução, e onde é que começa a Obra de Arte e um acaba o Objecto de
Consumo, e vice-versa, leva-nos até Walter Benjamin. Ele diz-nos que à partida, a obra
de arte sempre foi reprodutível. E que os objectos feitos pelo ser humano poderiam
sempre ser copiados. Ainda segundo ele, as réplicas foram feitas pelos alunos na prática
de seu ofício, por mestres na divulgação de suas obras, e, finalmente, por terceiros, em
busca do lucro. Mas a reprodução tecnológica de obras de arte é algo novo (Benjamin,
2008). O que é isto de reprodução tecnológica? Esta é a reprodução por meios
tecnológicos (ou seja, industriais) de Obras de Arte, que antigamente não se fazia. Esta
reprodução em massa levou a que o carácter comercial da Cultura/[Arte] se dissolvesse,
misturando-se assim com a vida quotidiana (Adorno, 1991), isto levou, a que em muitos
casos, não fosse possível a distinção entre Obras de Arte e Objectos de Consumo. Desta
complexidade resulta a necessidade de definir o que é Obra de Arte e o que é Objecto de
Consumo. Para as definir é necessário ver os aspectos que os distinguem. Para Adorno,
o aspecto mais distintivo entre Arte e Consumo, é o aqui e agora da obra de arte e a sua
existência exclusiva num lugar particular. O aqui e agora são, simplesmente, o momento
e o contexto histórico em que a Obra de Arte foi produzida (Adorno, 1991). Para
Benjamin a Obra de Arte baseia-se num testemunho histórico, que vai desde o momento
da sua produção (o aqui e o agora), bem como as mudanças de propriedade. Isto é
justificado pelo estado físico da própria obra, logo este vai fundamentar o pressuposto
anterior (Benjamin, 2008).
O aqui o agora poderiam muito bem ser Paris, no século XIX, um local e um
contexto histórico muito particular. Com estas coordenadas geográficas e históricas
acabamos por facilmente descobrir o período histórico, Modernismo. Para se perceber o
porquê de começar por aqui, primeiro devemos perceber a importância dos períodos
históricos. Alois Riegle definiu Kunstwollen, como sendo a projecção artística da
intenção colectiva [(a vontade artística)], […] e a maneira como uma cultura específica
procura formatar a Arte. O conceito de vontade artística expressa a maneira que a Arte
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tendo sempre como pano de fundo o Monte Fuji. Apesar de todas as outras
representações serem de cenas do quotidiano e, digamos que alegres, deparamo-nos
com uma imagem com um forte carga dramática, na Grande Onda. Esta conta com três
elementos essenciais: o Onda e o Mar; o Monte Fuji; e os Barcos.
Fig. 1 - A Grande Onda de Kanagawa. Gravura estilo Ukiyoe do Séc. XIX, de Katsushika Hokusai.
Além da assinatura de Hokusai no canto superior esquerdo. Todos estes elementos têm
em si, guardados significados muito próprios. Para compreendermos esta Paisagem é
necessário descodifica-los. Mas por agora fiquemos por aqui, continuando com a
descrição do tipo de gravura. Esta gravura em particular foi concebida segundo o género
Ukiyoe. O significado da palavra Ukiyoe é escrito em três caracteres: 浮 (flutuante), 世
(mundo) e 絵 (imagens); sendo frequentemente traduzida como “mundo flutuante” [ou
“imagens do mundo flutuante”], o seu significado aproxima-se mais de “o mundo num
instante de tempo”. Estas são gravuras em blocos de madeira, desenvolvidas durante no
período Edo (que durou de 1603 a 1867), quando o Japão esteve praticamente fechado
ao mundo exterior, proibindo o Cristianismo e promovendo o isolamento do país. O
comércio externo e o transporte internacional eram restritos à Coreia, China e Holanda.
Uma vez que as influências externas entravam em poucos lugares e portos, a cultura
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japonesa cresceu num ambiente bastante isolado. Nesta altura eram uma forma de Arte
em emergência (Masato, 2009).
Fig. 2 – Fuji visto da ponte de Mannen em Fukagawa. Gravura Ukiyoe de Hokusai. Parte das “36 visões
do Monte Fuji”.
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disso, o hoje em dia é chamado de artista, que no caso em d’ A Grande Onda, Hokusai,
na altura não era considerado como tal e era visto como um artesão. Logo o produto do
trabalho quer dele, bem como dos outros envolvidos no processo de produção das
gravuras era artesões. E como tal o que produziam era artesanato. Este trabalho era
sempre orientado pelo princípio: “Vender-se-á?” O preço de uma gravura Ukiyoe era
quase o mesmo que uma taça de massa, logo baratas. Por isso, qualquer um, nessa
altura, podia sentir a sensação de tocar numa gravura destas. (Mami, 2009). Hoje em
dia, são emoldurados e expostos em galerias de arte, na qualidade de arte, mas, no
período de Edo (1603-1867) eram reproduzidos em massa (Mami, 2009). Esta última
frase deixa-nos a pensar. E traz-nos uma pergunta: é isto o que acontece realmente com
A Grande Onda, actualmente? Se pensarmos esta forma de arte, como representações da
Natureza, as Paisagens, e depois como representações de representações da Paisagem,
então elas estão por todo lado. Mas isto é muito mais complexo do que isto, logo leva-
nos a novas questões.
Para tentar perceber se A Grande Onda é um Objecto de Consumo e/ou uma Obra
de Arte, é pertinente colocar questões e uma estratégia para que isso nos encaminhe a
uma conclusão. Mas apesar de encontrado o Objecto de Estudo também é necessário ter
um Terreno, para se por em prática a investigação. Neste caso optou-se, pela Internet,
por se considerar que ela permite uma rápida circulação de informação, onde há
facilidade de compra, de venda e troca de bens de consumo, bem como obras de arte e
artesanato. A juntar a isto existem também os blogues, que são páginas pessoais onde as
pessoas publicam os mais variados temas e exprimem opiniões, e as redes sociais que
mexem o mundo virtual.
Tendo o Objecto de Estudo e o Terreno onde o estudar, passemos às questões que
são pertinentes responder. Comecemos pelas questões relacionadas com a imagem d’A
Grande Onda. O que é que ela significa? Ou seja, o que é está representado na imagem,
e qual o seu significado quer do Monte Fuji, quer do Mar e a Onda, bem como dos
Barcos e dos seus Remadores? Entrando agora nas questões ligadas ao consumo,
perceber quais são os seus valores de troca, de uso e de signo? Quais são as formas que
são comercializadas e por quem é que são criadas? Quais são as diferenças entre as
reproduções ditas caras e as ditas baratas? Estas são algumas das questões que
tentaremos responder.
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Fig. 3 – Autor: João Montanaro. Desenho publicado no jornal brasileiro Folha de São Paulo, do dia 12 de
Março de 2011.
Fig. 4 – Autor: desconhecido. Desenho publicado no jornal francês Le Mond, no dia 15 de Março de
2011.
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Mas A Grande Onda não é uma onda de Tsunami, é sim, uma Super-onda. Este
fenómeno só há bem pouco tempo é que foi descoberto, como explica o cientista Chris
Swan do Imperial College de Londres. Logo Hokusai não retratou algo fantasioso, criou
uma representação da Natureza. Passemos agora ao Monte Fuji, ao porquê de ter sido
representado.
O Monte Fuji constitui provavelmente o elemento natural mais icónico do Japão. Mas
ele foi incluído nesta representação, e nas restantes “36 visões do Monte Fuji”, porque
era um local místico e sagrado. Para o editor de Hokusai, depois de este lhe sugerir o
tema, seria garantido que a imagem do Monte Fujo venderia bem, visto que as pessoas
admiravam e faziam peregrinação à Montanha Sagra. Seria uma maneira de ter um
bocado dela em casa. No caso da inclusão dos barcos e dos remadores a sua inclusão,
prende-se com questões muito particulares da vida de Hokusai. Uma vez que 36 visões
do Monte Fuji foi um dos seus últimos grandes trabalhos. Mesmo a própria inclusão de
uma imagem tão marcada e forte, leva-nos a pensar, o que é que isto faz aqui? No final
da sua vida Hokusai tinha bem presente a morte, apesar de nas restantes gravuras “36
visões do Monte Fuji” retratar cenas típicas do quotidiano, aqui ele retrata o último
momento destes remadores e seus barcos, prestes a serem engolidos pela onda. Isto
porque a ideia presente da morte em Hokusai, levara-o a deixar uma mensagem
subliminar, de que a morte estaria sempre à espreita por detrás da alegria que caracteriza
o Ukiyoe.
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A Internet nos últimos anos tornou-se um local de consumo, como uma espécie de
centro comercial, mas sem lugar definido. Neste mundo virtual existem lojas para todos
os gostos, e uma quantidade infinita de ofertas, que podem ir desde uma simples réplica
de uma gravura até a um painel dessa mesma gravura. A Grande Onda não é excepção e
também se vende na rede. Em baixo podemos ver as inúmeras formas de
comercialização d’A Grande Onda.
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Fig. 7 – Poster d’A Grande Onda com alterações. Preço 11.50£ mais portes de envio.
A maioria dos objectos tem um preço acessível à maioria dos ocidentais, contudo
existem alguns produtos que só estão ao alcance de algumas pessoas. No Chipre surgir
um projecto de uma Villa inspirada n’A Grande Onda, como é o exemplo da figura em
baixo.
Apesar de não ser vendida através da Internet esta Villa, contribui para a disseminação
d’A Grande Onda, e ao mesmo tempo é uma representação de uma representação.
Com o trabalho no Terreno terminado, por assim dizer, já que é impossível termina-
lo. Isto porque dentro dele existem sempre outros mais pequenos ou maiores, ou outros
semelhantes, mas paralelos, é fundamental apresentar a conclusões resultantes desta
pesquisa. Estas foram as seguintes. Em primeiro lugar a grande A Grande Onda foi e é
um Objecto de Consumo, uma vez que na sua génese está um tipo de trabalho que seria
para venda, não foi concebido para ser arte. Se pensarmos segundo a teoria de Marx e os
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seu valor de troca, esta desde a sua génese, e como ainda verificamos nos dias de hoje,
na maioria dos artigos comprados os preços são baixo. Apesar de serem mudadas as
formas de consumo originais por outras, quer sejam caneca de leite ou chã, quer sejam
calendários, todos eles têm valores de troca baixos. Contudo deixou de ser uma Peça de
Artesanato, isto porque o método de reprodução d’ A Grande Onda foi se perdendo no
tempo, e novas formas de reprodução foram surgindo. Apesar disto podemos considerar
que actualmente ela voltou a ser Artesanato, uma vez que o Instituto de Xilogravura
Adachi, no Japão, voltou a recuperar a técnica de criação de Ukiyoe, comercializando-os
de novo, isto tudo feito sobre os mais rígidos processos de produção, obedecendo às
regras antigamente usadas. Mas também dá largas à imaginação, deixando os seus
alunos e futuros mestres incluir novos temas, para além dos de sempre. No seu sítio na
Internet, na página inicial temos A Grande Onda em destaque, provavelmente como é
mundialmente conhecida facilitará a venda dos Ukiyoe. A questão de saber se A Grande
Onda é uma Obra de Arte é difícil de explicar, mas provavelmente tornou-se Obra de
Arte, pela mão dos grandes pintores europeus do século XIX, que ganharam um fascínio
especial por esta forma de arte. Isto porque da fascinação resultou a necessidade de
possuir um exemplar, pedindo a artistas europeus que estavam familiarizados com esta
técnica, reproduzindo alguns Ukiyoe, podendo muito bem A Grande Onda ser um deles.
Desse fascínio poderá ter resultado a consagração, uma vez que foram Mestres como
Van Gogh, entre outros que ganharam “o bichinho” por esta forma tão distinta. Talvez
tivesse sido a resultante de mais factores ainda, mas é ainda obscuro o caminho que fez
da grande onda um Objecto do Consumo à escala mundial, mas que encontrou o seu
lugar na história da Arte, e um cantinho especial em inúmeros museus por todo o
mundo. Apesar disso a maioria das pessoas considera Arte, mesmo quando é
representada numa caneca, ou num calendário. Contudo é irónico que Hokusai nunca se
considerou um artista, daqueles que fazem Arte. No fim da vida disse: “Se o Céu me
tivesse concedido mais cinco anos, eu poderia ter-me tornado um verdadeiro pintor.”.
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Bibliografia:
Bell, Desmond; 1993, “Framing Nature: Frist Steps into the Wilderness for a Sociology
of the Landscape” in Irish Journal of Sociology, Vol.3;
Green, Nicholas; 1990 “The Spectacle of Nature. Landscape and Bourgeois culture in
Nineteenth.-Century France”, Manchester, Manchester University Press;
Adorno, Theodor; 1991, “The Culture Industry. Selected essays on mass culture”,
London, Routledge;
Benjamin, Walter; 2008 “The Work of Art in the Age of its Technological
Reproducibility and other Writings on Media”, The Belknap Press of Harvard
University Press, Cambridge, Massachusetts; London, England;
http://4.bp.blogspot.com/_oA1WnKGvAjg/TDyWiaxo_PI/AAAAAAAAAR0/z5MJm7
J1UqI/s1600/the_great_wave_off_kanagawa-xix+by+Katsushika+Hokusai.jpg - Fig. 1
http://caquiscaidosblog.wordpress.com/page/4/?archives-list=1
http://cgi.ebay.com/Great-Wave-Kanagawa-Hokusai-Japan-Giant-Poster-Z311-
/150624861481?pt=UK_Arts_Posters_RL&hash=item2311f0fd29
http://cgi.ebay.com/ws/eBayISAPI.dll?VISuperSize&item=150624861481
http://designno.com/1242/Futuristic-Luxury-Villa-8220Aura-8221/
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Fuji_seen_through_the_Mannen_bridge_at_Fukag
awa.jpg - Fig 2
http://sidhartar.files.wordpress.com/2010/08/monte-fuji.jpg - fig 5
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/0a/The_Great_Wave_off_Kanagawa
.jpg - Imagem da Capa
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http://www.almasurf.com.br/noticias.php?id=1318&canal=6
http://www.almasurf.com.br/noticias.php?id=1318&canal=6
http://www.anglopiracicaba.com.br/fileupload//siteanglo/terremotojapao.pdf
http://www.anglopiracicaba.com.br/fileupload//siteanglo/terremotojapao.pdf
http://www.br.emb-japan.go.jp/nipponweb2.pdf
http://www.br.emb-japan.go.jp/nipponweb2.pdf
http://www.designer-daily.com/hokusais-great-wave-is-everywhere-4697
http://www.designer-daily.com/hokusais-great-wave-is-everywhere-4697
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