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29/07/2012 - 02h30

Filósofo discute relações entre ética e


estética a partir da fotografia
DE SÃO PAULO

No prefácio de "Beleza Exorbitante - Reflexões sobre o Abuso Estético", o


filósofo e historiador da arte Jean Galard declara que os ensaios desse livro
foram desencadeados pela exposição "Êxodos" (2000), do brasileiro Sebastião
Salgado: "O repórter fotográfico mostra populações atingidas pela desgraça,
expulsas pela guerra ou pela pobreza (...). Numerosos espectadores
expressaram o mal-estar que suscitam, que deveriam suscitar tais imagens em
que a beleza, diz-se, combina demais com a dor".

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Sebastião Salgado

Imagem de refugiados clicada em 1994 na Tanzânia integra a série "Êxodos", de Sebastião Salgado, tema do livro de Jean
Galard

Não apenas os espectadores. Também críticos de arte publicaram artigos


sugerindo que Salgado tirava proveito do sofrimento, aventurava-se
"perigosamente nos limites da desgraça e da beleza". A partir desse choque
entre as imagens de Salgado e sua recepção crítica, Galard escreve um livro
que aborda com excepcional clareza um tema complexo: o estatuto do belo nas
artes e suas mutações, incluindo o sentido ético da representação.

"Beleza Exorbitante" não é sobre a fotografia, mas identifica nesta (e em


linguagens correlatas, como cinema, televisão, videoarte) um ponto de
inflexão. Basicamente, ele pergunta: por que uma fotografia como a "Pietà"
(retrato de uma mulher desmaiando durante massacre na Argélia, em 1997),
de Hocine, pode gerar questionamentos que não atingem, por exemplo, os
inúmeros quadros que representam a agonia de Cristo?

A formulação parece simplista, mas o filósofo francês extrai daí reflexões


instigantes sobre ambiguidades que dizem respeito tanto aos fotógrafos
(preocupados com luzes e enquadramentos diante de situações extremas)
quanto ao nosso deleite diante de figurações e estetizações da dor.

São especialmente esclarecedoras as reflexões sobre a "arte abjeta" e sobre as


representações dos campos de concentração nazistas (filmes como "Kapo", de
Pontecorvo, e "Shoah", de Lanzmann), das quais Galard extrai uma regra
paradoxal: "A beleza abandona tudo que é feito com a única intenção de
produzi-la".

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