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BIOTECNOLOGIAS DA REPRODUÇÃO ANIMAL

PRODUÇÃO IN VITRO DE EMBRIÕES BOVINOS

Paulo Bayard D. GONÇALVES1, M.H. BARRETA, L.C. SIQUEIRA, A.Q.


ANTONIAZZI

INTRODUÇÃO
A produção in vitro de embriões (PIV) é uma biotécnica de reprodução
assistida e uma ferramenta para pesquisa de eventos relacionados à
maturação e fecundação de oócitos, capacitação espermática e
desenvolvimento embrionário na fase de pré-implantação. Além disso, a PIV é
um instrumento de suporte para outras biotécnicas como clonagem,
transgênese e transferência nuclear. Sua aplicação em escala comercial se
tornou viável após o advento da aspiração folicular in vivo e pelo
aprimoramento das condições de cultivo in vitro.
Passam-se 25 anos após o nascimento do primeiro bezerro produzido in
vitro e os índices de blastocistos obtidos ainda estão aquém do desejado,
variando entre 20-50% (média de 35%). Além da baixa eficiência da técnica, os
embriões que conseguem se desenvolver in vitro apresentam qualidade inferior
àqueles produzidos in vivo. Diversos parâmetros são utilizados para avaliar a
qualidade dos embriões PIV como morfologia, criotolerância, transcrição
(mRNA), eclosão in vitro e prenhez após a transferência. Entretanto, nenhuma
dessas técnicas permite uma seleção eficiente que assegure bons índices de
prenhez. O aumento da eficiência da PIV está condicionado ao
desenvolvimento de trabalhos que visem aperfeiçoar e simplificar as condições
de cultivo durante as várias etapas do processo, principalmente no que se
refere à maturação citoplasmática e molecular de oócitos obtida in vitro.

Maturação nuclear, citoplasmática e molecular do oócito


In vivo, a maturação nuclear do oócito inicia após o pico pré-ovulatório de
LH durante o estro e in vitro, a retirada do oócito do ambiente folicular reinicia a
meiose. Em bovinos, a maturação nuclear do oócito requer de 18-24h e
compreende a progressão do estádio diplóteno da primeira prófase meiótica
até metáfase II. A capacitação do oócito, avaliada pelo desenvolvimento
embrionário, tem sido positivamente associada com o tamanho do folículo
antral do qual foi recuperado (LONERGAN et al., 1994), com o estádio de
desenvolvimento folicular (MACHATKOVA et al., 2004) e com o local de
maturação (in vivo vs. in vitro; RIZOS et al., 2002). O TCM199 é o meio mais
difundido entre os laboratórios de PIV. Seus principais suplementos são o soro
fetal bovino, FSH, LH, piruvato, penicilina e estreptomicina. A maturação in vitro
varia de 18-24h em 5% de CO2 em ar e umidade saturada.

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Laboratório de Biotecnologia e Reprodução Animal, Universidade Federal de Santa Maria,
Santa Maria, RS, Brazil. e-mail: bayard@biorep.ufsm.br

Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 11, suplemento 1, p.135-138, abril, 2008


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In vivo, os folículos pré- CCOs em um sistema de maturação


ovulatórios atingem um diâmetro de com células foliculares, angioten-
12-20mm, e ovulam um oócito com sina II e IGF-I aumentou as taxas de
núcleo e citoplasma maturados clivagem, blastocisto e eclosão in
adequadamente. Entretanto, os vitro (STEFANELLO et al., 2006).
oócitos coletados para PIV são em
sua maioria oriundos de pequenos Fecundação in vitro
folículos antrais e apesar de In vivo, o espermatozóide
competentes para o reinício da percorre um longo trajeto para
meiose, apresentam baixa capa- chegar ao infundíbulo e fecundar o
citação para o desenvolvimento oócito. Durante esse percurso,
embrionário, por apresentarem uma glicosaminoglicanas presentes no
maturação citoplasmática e mole- trato genital feminino induzem sua
cular insuficiente. As condições de capacitação. Para fertilização in
cultivo in vitro têm sido constan- vitro, a capacitação espermática é,
temente manipuladas para melhorar geralmente, promovida pela hepa-
a capacitação do oócito após sua rina. Antes do processo de
retirada do ambiente folicular. capacitação, os espermatozóides
Fatores de crescimento, gonado- viáveis contidos em uma palheta de
trofinas e esteróides têm sido sêmen precisam ser separados do
adicionados aos mais diversos plasma seminal, crioprotetores,
meios de maturação. Porém, extensores e células mortas. Para
apenas modestos incrementos na bovinos, os métodos de separação
capacidade de desenvolvimento espermática mais utilizados são o
embrionário puderam ser obser- gradiente de percoll e o swim-up. O
vados e a produção de blastocistos co-cultivo de espermatozóides e
raramente atingiu 50% oócitos é realizado por um período
(THOMPSON, 2000). Métodos de 18-22h, a 39˚C e 5% de CO2 em
celulares e bioquímicos têm sido ar e umidade saturada. O sistema
usados para inibir o reinício da de fertilização in vitro tenta
meiose dos oócitos após sua mimetizar as condições in vivo.
retirada do ambiente folicular, Porém, resultados variados são
visando melhorar o desenvol- obtidos com espermatozóides
vimento citoplasmático e molecular oriundos de touros ou partidas
na ausência de maturação nuclear diferentes.
(SIRARD, 2001). Esses estudos
demonstram que é possível manter Desenvolvimento embrionário in
o reinício da meiose bloqueado por vitro
24-48h sem afetar drasticamente o O momento crítico para o
desenvolvimento embrionário ou desenvolvimento embrionário come-
fetal. Porém, nenhuma dessas ça após a fecundação, quando a
metodologias tem melhorado a segunda meiose é reiniciada para
capacidade de desenvolvimento formar o pró-núcleo feminino, e
embrionário. Recentemente, nosso termina com a ativação do genoma
grupo demonstrou que a angio- embrionário 8-16 células (BREVINI
tensina II é capaz de reverter o GANDOLFI & GANDOLFI, 2001). O
efeito inibitório das células da teca desenvolvimento nesse período é
sobre a maturação nuclear de dependente de mRNA e proteínas
oócitos bovinos (GIOMETTI et al., acumuladas durante a maturação
2005). Além disso, o cultivo de citoplasmática (BLONDIN &

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SIRARD, 1995). A transcrição nicas que dependam da PIV. Para


deficiente antes da ativação do isso se faz necessário o
genoma embrionário não permite o desenvolvimento de um sistema de
desenvolvimento em várias espé- maturação in vitro adequado que
cies. Isso foi um dos obstáculos da permita uma maior capacitação dos
PIV nas décadas de 60 e 70, fato oócitos e conseqüentemente uma
que contribuiu para melhoria dos maior taxa de desenvolvimento
sistemas de cultivo. embrionário.
Diversos fatores de cresci-
mento têm sido adicionados aos
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
meios de cultivo in vitro para
melhorar os índices de desenvol-
vimento embrionário (LONERGAN BLONDIN, P.; SIRARD,M.A. Oocyte
et al., 1996; MATSUI et al., 1997). and follicular morphology as
Porém, apenas em meios definidos determining characteristics for
esses fatores incrementam as taxas developmental competence in
de blastocisto. O cultivo in vivo no bovine oocytes. Molecular
oviduto de ovelhas (LONERGAN et Reproduction and Development,
al., 2003) e vacas, de embriões v.41, n.1, p.54-62, 1995.
bovinos fertilizados in vitro, parece
fornecer um ambiente adequado BREVINI GANDOLFI, T.A.L.;
para o desenvolvimento embrio- GANDOLFI, F. The maternal legacy
nário. A produção de blastocistos to the embryo: cytoplasmic
em sistemas de cultivo in vivo não é components and their effects on
superior a observada in vitro, mas a early development.
qualidade dos blastocistos cultiva- Theriogenology, v.55, n.6, p.1255-
dos in vivo é superior (RIZOS et al., 1276, 2001.
2002). GIOMETTI, I.C. et al. Angiotensin II
O cultivo embrionário in vitro reverses the inhibitory action
varia de 7-9 dias a 39ºC, atmosfera produced by theca cells on bovine
controlada (5% de O2, 5% de CO2 e oocyte nuclear maturation.
90% de N2) e umidade saturada. A Theriogenology, v.63, n.4, p.1014-
taxa de blastocisto geralmente é 1025, 2005.
avaliada no 7º dia após a
fecundação sendo que, os blasto- LONERGAN, P. et al. Role of
cistos podem permanecer na estufa epidermal growth factor in bovine
até o 9º dia para avaliar a taxa de oocyte maturation and
eclosão in vitro. preimplantation embryo
development in vitro. Biology of
CONSIDERAÇÕES FINAIS Reproduction, v.54, n.6, p.1420-
A otimização da técnica de PIV 1429, 1996.
visando à produção de embriões de LONERGAN, P. et al. Effect of
boa qualidade e em número cada follicle size on bovine oocyte quality
vez mais expressivo resultará na and developmental competence
diminuição do custo por embrião following maturation, fertilization,
produzido e possibilitará uma maior and culture in vitro. Molecular
difusão da técnica entre os Reproduction and Development,
produtores. Ainda, tais melhorias v.37, n.1, p.48-53, 1994.
seriam de grande valia para o
aprimoramento de outras biotéc- LONERGAN, P. et al. Temporal
Divergence in the Pattern of

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Messenger RNA Expression in


Bovine Embryos Cultured from the
Zygote to Blastocyst Stage In Vitro
or In Vivo. Biology of
Reproduction, v.69, n.4, p.1424-
1431, 2003.
MACHATKOVA, M. et al.
Developmental competence of
bovine oocytes: effects of follicle
size and the phase of follicular wave
on in vitro embryo production.
Theriogenology, v.61, n.2-3, p.329-
335, 2004.
MATSUI, M. et al. Stimulation of the
development of bovine embryos by
insulin and insulin-like growth factor-
I (IGF-I) is mediated through the
IGF-I receptor. Theriogenology,
v.48, n.4, p.605-616, 1997.
RIZOS, D. et al. Consequences of
bovine oocyte maturation,
fertilization or early embryo
development in vitro versus in vivo:
implications for blastocyst yield and
blastocyst quality.
Mol.Reprod.Dev., v.61, n.2, p.234-
248, 2002.
SIRARD, M.A. Resumption of
meiosis: mechanism involved in
meiotic progression and its relation
with developmental competence.
Theriogenology, v.55, n.6, p.1241-
1254, 2001.
STEFANELLO, J.R. et al. Effect of
angiotensin II with follicle cells and
insulin-like growth factor-I or insulin
on bovine oocyte maturation and
embryo development.
Theriogenology, v.66, n.9, p.2068-
2076, 2006.
THOMPSON, J. G. In vitro culture
and embryo metabolism of cattle
and sheep embryos -- a decade of
achievement. Animal
Reproduction Science, v.60-61,
p.263-275, 2000.

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