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Meu primeiro encontro

com um Alquimista

Alquimia Operativa
Introdução

O presente texto é parte da obra “O Despertar dos Mágicos”, de Louis


Pauwels e Jacques Bergier. Matéria de leitura da nossa Escola de Altos
Estudos.

Tenho certeza de que você, estudioso da Alquimia e das Ciências Ocultas,


examinará este conteúdo com muito apreço.

Daniel Fidélis ::

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Meu primeiro encontro com um
Alquimista - A Alquimia como exemplo

Foi em Março de 1953 que encontrei pela primeira vez um alquimista.

Isso passou-se no café Procope, que teve, na época, um curto período de


vida. Foi um grande poeta que, na altura em que eu escrevia o meu livro
sobre Gurdjieff, me preparou esse encontro e depois disso, eu muitas
vezes havia de tornar a ver esse homem singular, sem no entanto
desvendar os seus segredos.

Eu tinha, a respeito da alquimia e dos alquimistas, ideias primárias,


extraídas da imaginação popular, e estava longe de supor que ainda havia
alquimistas.

O homem que estava sentado na minha frente, na mesa de Voltaire, era


jovem e elegante. Fizera profundos estudos clássicos seguidos de
estudos de química. Atualmente, ganhava a vida no comércio e dava-se
com muitos artistas, assim como algumas pessoas da alta sociedade.

Não tenho diário, mas acontece-me, em determinadas ocasiões


importantes, anotar as minhas impressões ou os meus sentimentos.
Nessa noite, ao regressar à casa, escrevi:

“Que idade terá ele? Diz ter trinta e cinco. Isso espanta-me. A cabeleira
branca, ondulada, cortada sobre o crânio como uma peruca. Inúmeras e
profundas rugas numa pele rosada, num rosto cheio.

Poucos gestos e lentos, medidos, hábeis. Um sorriso calmo e sutil. Olhos


risonhos, mas que riem com indiferença.

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Tudo exprime sua idade.

Nas suas frases, nem a menor fenda, pausa, ou quebra de presença de


espírito. Há qualquer coisa de esfinge atrás daquele rosto amável fora do
tempo. Incompreensível. E não sou só eu a sentir isto. A.B., que o vê
quase todos os dias há várias semanas, diz-me que jamais, nem por um
segundo, o apanhou em falta de “objetividade superior”.

Ó que o faz condenar Gurdjieff:

1º – Quem sente a necessidade de ensinar não vive inteiramente a sua


doutrina e não atingiu o ponto culminante da iniciação.

2º – Na escola de Gurdjieff não existe intercessão material entre o aluno a


quem se persuadiu da sua inutilidade e a energia que ele deve possuir
para passar ao ser real. Essa energia – essa vontade da vontade, diz
Gurdjieff – deve o aluno encontrá-la em si próprio, apenas em si próprio.
Ora, tal caminhada é parcialmente falsa e só pode conduzir ao desespero.
Essa energia existe fora do homem, e é preciso captá-la. O católico
engole a hóstia: captação ritual dessa energia. Mas se não tiverdes fé? Se
não tendes fé, arranjai uma fogueira: é o princípio de toda a alquimia.
Uma autêntica fogueira. Uma fogueira material. Tudo começa, tudo
acontece pelo contato com a matéria.

3º – Gurdjieff não vivia só, mas sempre rodeado, sempre em falanstério.


Há um caminho na solidão, há regatos no deserto. Não há caminho nem
regatos no homem misturado com os outros.

Faço perguntas a respeito da alquimia que devem parecer-lhe de uma


assustadora estupidez. Sem o deixar transparecer, responde:

Nada além da matéria, apenas o contato com a matéria, o trabalho sobre


a matéria, o trabalho com as mãos. Insiste muito neste ponto:

– Gosta de jardinagem? Eis um belo começo, a alquimia é parecida com a


jardinagem.

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– Gosta de pesca? A alquimia tem qualquer coisa de comum com a
pesca.

Trabalho de mulher e brincadeira de criança.

Não é possível ensinar alquimia. Todas as grandes obras literárias que


resistiram aos séculos têm qualquer coisa desse ensinamento. São a obra
de homens adultos – verdadeiramente adultos – que falaram para as
crianças, mas respeitando as leis do conhecimento adulto. Jamais se
apanha uma grande obra em falta a respeito dos princípios.

Mas o conhecimento desses princípios e o caminho que leva a esse


conhecimento devem manter-se secretos. No entanto, há um dever de
auxilio mútuo para os investigadores do primeiro grau.

Cerca de meia-noite interrogo-o sobre Fulcanelli, e dá-me a entender que


Fulcanelli não morreu:

– Pode viver-se, diz-me, infinitamente mais tempo do que o homem não


esclarecido o supõe. E pode mudar-se totalmente de aspecto. Eu o sei.
Os meus olhos sabem-no. Eu sei também que a pedra filosofal é uma
realidade. Mas, trata-se de outro estado da matéria, diferente daquele que
conhecemos. Esse estado permite, como todos os outros estados,
mensurações. Os processos de trabalho e mensuração são simples e não
exigem aparelhos complicados: trabalho de mulher e brincadeira de
criança…

Acrescenta:

– Paciência, esperança e trabalho. E, seja qual for o trabalho, nunca se


trabalha o bastante.

Esperança: em alquimia, a esperança baseia-se na certeza de que há um


objetivo. Não teria começado, disse ele, se não me tivessem provado
claramente que esse objetivo existe e que é possível atingi-lo nesta vida.

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Tal foi o meu primeiro contato com a alquimia. Se a tivesse abordado por
meio da magia, creio que as minhas investigações não teriam ido longe:
falta de tempo, falta de gosto pela erudição literária. Falta de vocação
também: essa vocação que se apossa do alquimista, quando ele ainda se
ignora como tal, no momento em que abre, pela primeira vez, um velho
tratado.

A minha vocação não é a de executar, mas a de compreender. Não é


realizar, mas ver. Creio, como diz o meu velho amigo André Billy, que
compreender é tão belo como cantar, mesmo se a compreensão for
apenas fugitiva. Sou um homem apressado, como a maior parte dos meus
contemporâneos. Tive o contato mais moderno possível com a alquimia:
uma conversa num botequim de Saint-Germain-des-Prés.

Em seguida, quando pretendia dar um sentido mais completo ao que me


dissera aquele jovem, encontrei Jacques Bergier, que não saía coberto de
pó de um sótão cheio de velhos livros, mas de locais onde a vida do
século se concentrou: laboratórios e escritórios de informações. Também
Bergier procurava qualquer coisa no caminho da alquimia. Não era para
fazer uma peregrinação ao passado. Esse homem extraordinário,
completamente ocupado com os segredos da energia atômica, tomara
aquele caminho para abreviar.

Eu voava, agarrado às abas do seu casaco, por entre os textos


veneráveis, concebidos por gente sensata apaixonada no seu cárcere de
Reading. Óscar Wilde descobre que a falta de atenção do espírito é o
crime fundamental, que a atenção extrema desvenda o acordo perfeito
entre todos os acontecimentos de uma vida, e também, possivelmente,
num plano mais vasto, o acordo perfeito entre todos os elementos e todos
os movimentos da Criação, a harmonia de todas as coisas.

E exclama: Tudo o que é compreendido está certo. É a mais bela frase


que conheço. Pela lentidão, inebriada de paciência – eu voava a uma
velocidade supersônica. Bergier gozava da confiança de alguns dos
homens que, ainda hoje, se dedicam à alquimia, bem como da estima dos
sábios modernos.

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Junto dele, em breve adquiri a certeza de que existem íntimos pontos de
contato entre a alquimia tradicional e a ciência de vanguarda. Vi a ciência
lançar uma ponte entre dois mundos. Meti-me por essa ponte e verifiquei
que ela se aguentava.

Senti uma grande felicidade, uma calma profunda.

Há muito refugiado no pensamento anti progressista hinduísta,


gurdjáeffiano, vendo o mundo de hoje como um princípio de Apocalipse,
não esperando mais (e com grande desespero) do que um horroroso final
dos tempos e não muito seguro no orgulho de estar à parte, eis que me era
dado ver o velho passado e o futuro darem-se as mãos.

A metafísica da alquimia, várias vezes milenar, escondia uma técnica


finalmente compreensível, ou quase, no século XX. As pavorosas técnicas
de hoje abriam-se sobre uma metafísica quase semelhante à dos tempos
antigos.

Que falsa poesia havia no meu refúgio! A imortal alma dos homens luzia
com a mesma chama de cada lado da ponte.

Acabei por acreditar que os homens, num passado muito longínquo, tinham
descoberto os segredos da energia e da matéria. Não apenas por meio de
meditação, mas também de manipulação. Não apenas espiritualmente, mas
tecnicamente.

O espírito moderno, servindo-se de vias diferentes, pelos caminhos durante


muito tempo desagradáveis, a meus olhos, da razão pura, da falta de
religião, com processos diferentes e que durante muito tempo me tinham
parecido maus, preparava-se por sua vez para descobrir os mesmos
segredos.

Interrogava-se a esse respeito, entusiasmava-se e inquietava-se


simultaneamente. Tropeçava no essencial, exatamente como o espírito de
elevada tradição.

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Vi, então, que a oposição entre a prudência milenária e a loucura
contemporânea era uma invenção da inteligência demasiada fraca e
demasiada lenta, um produto de compensação para o intelectual incapaz de
tanta velocidade quanta a sua época exige.

Há várias maneiras de aceder ao conhecimento essencial. E o nosso tempo


tem algumas. As antigas civilizações tiveram as delas. Não falo apenas de
conhecimento teórico.

Vi, finalmente, que, sendo as técnicas atuais mais poderosas,


aparentemente, do que as técnicas de outrora, esse conhecimento essencial,
que os alquimistas provavelmente já possuíam (e outros sábios antes deles),
chegaria até nós com maior força ainda, maior peso, maiores perigos e maior
número de exigências.

Atingimos o mesmo ponto que os Antigos, mas a uma altura diferente. Em


lugar de condenar o espírito moderno em nome da sensatez iniciática dos
Antigos, ou em lugar de negar essa sensatez declarando que o
conhecimento real começa com a nossa própria civilização, seria
conveniente admirar e venerar o poder do espírito que, sob diferentes
aspectos, torna a passar pelo mesmo ponto de luz, elevando-se em espiral.

Em vez de condenar, repudiar, escolher, seria conveniente amar. O amor é


tudo: a um tempo repouso e movimento.

Vamos submeter à vossa apreciação os resultados das nossas investigações


sobre alquimia.

Trata-se, apenas, evidentemente, de esboços. Ser-nos-iam necessários dez


ou vinte anos, e talvez faculdades que não possuímos, para dar ao assunto
uma contribuição realmente positiva.

No entanto, aquilo que fizemos, e a maneira como o fizemos, torna o nosso


trabalho muito diferente das obras até aqui consagradas à alquimia.

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Encontrareis poucos esclarecimentos sobre a história e a filosofia desta ciência
tradicional, mas algumas explicações sobre as inesperadas relações entre os
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sonhos dos velhos filósofos químicos e as realidades da física atual. É
preferível revelarmos imediatamente as ideias que nos guiaram.

A alquimia, segundo a nossa opinião, poderia ser um dos mais importantes


resíduos de uma ciência, de uma técnica e de uma filosofia pertencentes a
uma civilização desaparecida.

Aquilo que descobrimos na alquimia, à luz do saber contemporâneo, não é de


molde a fazer-nos acreditar que uma técnica tão sutil, complicada e precisa
possa ter sido o resultado de uma revelação divina caída do céu.

Não quer dizer que desprezemos toda a ideia de revelação. Mas, ao


estudarmos os santos e os grandes místicos, jamais podemos chegar à
conclusão de que Deus fala aos homens em linguagem técnica: Coloca o teu
crisol sob a luz polarizada, ó meu Filho! Lava as escórias com água
ultradestilada!

Também não acreditamos que a técnica alquimista se possa ter desenvolvido


por meio de tentativas, pequenos passatempos de ignorantes, fantasias de
maníacos do crisol, até atingir aquilo a que temos de chamar a desintegração
atômica.

Antes, nos sentiríamos dispostos a acreditar que existem na alquimia restos de


uma ciência desaparecida, difíceis de compreender e de utilizar, por faltar o
contexto.

A partir desses restos há inevitavelmente tentativas, mas em direção


determinada. Há também uma superabundância de interpretações técnicas,
morais e religiosas. E há por fim, para os detentores desses restos, a
imperiosa necessidade de guardar segredo.

Finalmente, pensamos o seguinte: o alquimista, no fim do seu trabalho sobre a


matéria, assiste, segundo a lenda, a uma espécie de transformação na sua
própria pessoa.

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Aquilo que se passa no seu crisol passa-se igualmente na sua consciência
ou na sua alma. Há uma mudança de estado.

Todos os textos tradicionais insistem nesse ponto, evocam o momento em


que a Grande Obra se realiza e em que o alquimista se transforma num
homem desperto. Parece-nos que esses velhos textos descrevem deste
modo o termo de todo o conhecimento real das leis da matéria e da energia,
incluindo o conhecimento técnico.

É para a possessão de tal conhecimento que se precipita a nossa civilização.


Não nos parece absurdo supor que os homens serão chamados, num futuro
relativamente próximo, a mudar de estado, como o alquimista lendário, a
sofrer qualquer transformação. A menos que a nossa civilização desapareça
por inteiro um momento antes de ter atingido o fim, como é possível que
tenham desaparecido outras civilizações.

Também se podia dar o caso de que, no nosso último segundo de lucidez,


não desesperássemos, pensando que se a aventura do espírito se repete, é
sempre, de cada vez, num grau mais alto da espiral. Remeteríamos a outros
milenários o cuidado de conduzir essa aventura até ao ponto final, até ao
centro imóvel, e afundar-nos-íamos com esperança.

Espero que você tenha gostado do texto e se inspirado à lançar-se na


insólita aventura que é a Alquimia.

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Irmandade Hermética
da Sagrada Arte,
I::H::S::A::

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