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C A T E G O R I A S

de .

ARISTÓTELES.

T R A D U Z I D A S DO G R E G O

E ORDENADAS CONFORME A HUM NOVO PLANO

POR

SILVESTRE PINHEIRO FERREIRA.

Para uso das Prelecções Philosophicas do mesmo


Traductor,

R I O D E J A N E l R O.

N A IMPRESSÃO REGIA.

ANNO DE M DCCC X I V .

Com Licença de S. A. R*
III

A D V E R T E N C l A.

H UMA das partes mais essenciaes do C«r?o de


Prelecções Philosophtcas, que estou actualmente pu-
blicando , he a Exposição e Analyse das Obras, es-
colhidas 'dos princip&es PhUosophòs , Oradores • e
Poeta» Ktanto. \aíi»f:Igoá:*»como modernos, sagrados
e profanos, segundo annunciei no Prog amma que
precedeu á publicação da;» mesmas Prelecções*
Ninguém , que com retíexio .tenha lido' o?
PhHosophosi ;antigos e modernos teigppos, po-
derá negar a Aristóteles a primazia sobte todos
elles, E portanto as suas Obras devião ser natu-
ralmente. as primeiras , que figurassem nesta co-
mo Bibliotheca de Philosophia, que tenho em pre-
tendido.
Mas se não precisa de justificação a homena-
gem que assim tributo às Obras de Aristóteles;
precisa-o ianto mais a novidade da forma , effl
que apparecem na presente traducção: novidade,
que deve parecer á primeira vista; hum total trans-
torno do texto do Autora Porém, este transtorno *
que he na verdade grande quanto á ordem da es-
cripta, em nada altera, nem a ordem das idéas
nem a" da leitura. Porquanto se começando nós a
ler o texto na Primeira Parte pela primeira pala-
vra E^/twcos C que he também á primeira no Ori-
ginal ) passarmos, da palavra dijferente é Explica-
ção N.° i â na Segunda Parte: e lida-ella, \ol-
* u
IV

tarmos ao segundo §. da Primeira Parte: Unívocos


porém &c.Mt assim continuarmos, passando alter-
nativamente do Texto "'ás-Explicações, que os nú-
meros , ou os asteriscos indicio : e destas ao Texto ;
ninguém que com os olhos no Original grego nos
escutasse; poderia suspeitar que nelle se hovesse
feito a menor alteração.
Consiste pois esta unicamente em separar , á
maneira de Notas , tòda aquella parte do texto ori-i
ginal , que- não accrescenta nada ao que fica dito t
& sé.serve a exemplificar» ou aclarar por qualquer
outro modo * o que precede: sem que este novo
arranjo violente a ligação dehuma e outra coisa:
ifem eu tenha para isso omittido , accresentado,
ou substituído palavra alguma, do Original, poisr
antes as conservei na ordem da S y n f a x e , que ca*
da huma dèllas alli occupa. .
. Duas são as vantagens , que me parecia se*
guirem-se desta disposição: primeiray tornarem-se
mais sensíveis e perceptiveis as doutrinas do. A u t o r :
Segiinda , convidar mais a lerem-se , .e facilitar 6
conâultarem-se Obras, que se por algum, tempo ja-
zerão ( a } em hurna especie de injusto esquecia
mento: e por não lidas experimentarão hum tan-*
to mais injusto ' d e s p r e z o i s s o derivou era grande
parte do fastio que causava aqiiella multiplicidade

C a ) Seja-me desculpado o uso deste prèterito do verbo


jn^er. Eu sei que os' nossos bons Escriptores ou se servi-;
rão de jouverão , ou o evitarão. Mas ò uso geral na con-
versação e trato da Corte , não menos do que a analogia.^
são basttmtfe auctoridade em meu façor* - «4 • j
. V

de explicações, que interrompem a cada passo o


Ho das idéas.
Quisera eu que o texto grego apparecesse em
frente desta traducção : tanto para excitar a Mo-
cidade ao estudo da Lingua Grega , que no meu
conceito constitue o mais glorioso monumento dâ
perfeição do Espirito humano ; mas também por-
que devendo esta traducção abundar em defei-
tos inevitáveis pelo pouco tempo em que sou
obrigado ,a faze-la e publica-la ; conviria muito ,
que a facilidade de a cote/arem com o texto offe-
recesse aos intelligentes o meio de corrigirem as
f a l t a s , que nella não pôde deixar de haver, em
grande numero, e muitas vezes de grande nota.
Por maior porém que fosse este meu desejo,
não me foi possível satisfaze-Io; já porque neste
nascente Estado faltão os meios para se fazer liu-
ma correcta edição de hum texto g r e g o ; logo que
exceda a certos e muito ^acanhados limites : já por-
qtie-a Carestia excessiva dos materiaés e da mão
d'obra tornarião inútil para a maior parte das pes-
s s o a s a cujo uso este meu trabalho he dirigido,
huma obra , que tendo unicamente em vista a ins-
trução da Mocidade , deve estar ao alcance até
daqueíles mesmos que não gozão de avultados bens
da fortuna. V;
Talvez|se oíFereça mais fávoravel conjunctura
que me permitta fazer ao P u b l i c o , serviço mé-
dios ^imperfeito neste mesmo género: E certamen-
te a , saberei aproveitar , se os meus A m i g o s , e
em geral todos aquèlles , a quem estes ensaios pa-
ra o incitamento dos bons estudos interessão, me
Vi
ajudarem com as «tias observações e conselhos.
Resta-me advertir 4 u e para esta traducção me
servi da edição das Obras de Aristóteles dada por
Isaac Casauboao , e impressa em Leão na Offieina
de Jacob Bubon no anno de mil quiohentos e no-
venta: em dois volumes ia folia.

Rio de Janeiro aos 31 de Dezembro de, 1813.


C A T E G O R I A S .

P R I M E l R A P A R T E ,

APHORISMOS.

1. E r q o i v o c o ^ dizem-se os que tem somente


o nome commitm ; mas a rasão desse nome diffe-
rente C 1
2.Unívocos porém dizem-se os que hão somen-
te tem o nome commum, mas também a rasão des-
se nome idêntica ( a
3. E cognominados dizem-se os que tendo ater*
xninação difFerente tem comtudo as attribuições,
que esse nome designa, idênticas C 3
4. Das Locuções, humas exprimem-se ligadas:
outras desligadas C 4 ). ^
5. Das Coisas, humas dizem-se de algum obje-
c t o ; ^ } mas não estão em nenhum objecto ( 5
6. Mas outras sim estão em álgum objecto ; mas
não se dizem de nenhum objecto

( a ) D i g o , que está em algum objecto > o que sem ser


parte delle, não pode existir forai delle. C b ) C O . *
C b ) E chama-se-lhe accidente ou qualidade accidentat
para o distinguir das qualidades essenciaes , cujo cornple*xo
Ire na phrasc do Amor O QUE SE DIZ DE ALGUM OB-
JECTO» p l\ota do Jraductor.
2

7. E ©iltrasLnSo só se dizem de algum objecto;


mas íambem estão-em algum objecto ( 7
8. Outras em fim- nem estão em nenhumfbbjè-
cto; nem se dizem de nenlnim objecto ^ 8
9. Em geral: Tudo o que he indivisível, e hum
em numero não se diz de* nenhum objecto j ornas
nada obsta a. que algumas coisas taes possão estar
em algum objecto { 9 } .
10. Quando se diz de hum-objecto: que elle lie
comprehendido em alguma Categoria; tudo o que
se diz da Categoria, se ha de também dizer d© ob-
fecto Ç i o .
- 11. As coisas que são beterogeneas entre si , e
humàs não são especies, das outras; também tem
differenças especificas heterogenèas entre si C u ) .
12. Mas naquejles generos^ que são-subordina-
dos hiins aos Oijtròs, nada obsta a que tenhão as

1.3. Assim que quantas forem as differenças - da


Categoria , tantas serão as do objecto.
14. As Locuções desligadas ou designão essen-
Ou relação ; ou
lugar; ou tempo; ou estado; Ou acçãopermanen-,
t e ; ou acção transeunte ; ou paixão ( 1 3 •
15. Cada Locução de per si não exprime , nem
affir mação-, nem negação. Porém mediante a liga-
ção de liumas com as outras . resulta aífírmação
•ou negação ; porque toda a aíílrmação ou negação
-Jbe julgada verdadeira ou falsa. Mas das locu-
ções desligadas nenhuma lie verdadeira nem falsa;
16. Primitiva e principalmente ctiáma-se essên-
cia primaria a q u e l J a q u e , n.çm se.djz de, nenhum
objecto , nem está em nenhum objecto ( 1 4 ) .
17. E chamão se essencias secundarias , tanto as
especies , a-que pertencem as essencias primarias,
como os géneros dessas mesmas especies ( 15 j.
18. Do que ficaídito se segue , que tudo o-que
se diz de hum objecto , he necessariamente cate-
goria d e l l e ; não só quanto ao nome;.mas também
quanto á rasão do nome £ 1 6 } .
19. Mas as coisas, que estão em algum objecto ,
pela maior parte hão são categorias do objecto ;
nem quanto ao. nome , nem quanto á rasão do
nome.
20. Porém algumas podem-o talvez ser quanto
ao nome; posto que jamais o podem ser quanto á
rasão do nome £ 17 y
21. Todas as outras coisas ou se dizem das es-
sencias primarias, como de outros tantos objectos;
ou estão nelles , como em outros rantos obje-
ctos ( 18 }
22. D e modo que não existindo as essencias pri-
marias , seria impossível existir nenhuma das outras.
23. Ora das essencias secundarias a espécie he
mais essência do que o genero ( 1.9
24. P | q u e as essencias primarias são a respeito
deftodas asfoutras coisas; isso mesmo. he cada es-
jpeciF a respeito dó genero £ 20
25. D e duas especies. das quaes nenhuma he
genero da outra ; também nenhuma he mais. es-
sencia do que a outra C 2 1
26. O mesmo he das essencial primarias:. que
nenhuma delias he mais essencia do que outra (22).
27. Com rasão pois entre todas as coisas, que
A
4

pão são as essencias primarias . somente os g e n e t


r o s , e as especies se denominão essencias secun-
darias (23)
28. Õ que as essencias primarias são a respeito
de todas as outras coisas : isso mesmo são a respei-
to de tudo o mais os generos e ás espécies, a que
as mesmas essencias primarias pertencem £ 24 .
29. He commum a todas as especies o não es»
tarem em nenhum objecto ( 2 5 ) .
' 30. Ora as essências secundarias são categorias
d o objecto ; não só quanto ao nome , mas também
quanto á rasão do nome Q 2 6 ) .
31. M a s isto não he particular ás essencias; por-
que também as differenças ( a ) são do numero das
c o i s a s , que não estão em nenhum objecto ( 2 7 ) .
32. E as diíFerertças são categorias do objecto a
que se r e f e r e m : até mesmo quanto á : rasão d o
nomé/( a 8 V
33. N e m nos faça confusão o estarem as par*
tes das essencias nos todos a que p e r t e n c e m : de
modo que nos julguemos obrigados a dizer , que el?
las não são essencias. Porquanto nós não dissemos
que as c o i z a s , que estão em algum o b j e c t o , exis>-
t e m em a l g u m , . como partes delle.
34. Verifica-se pois tanto nas essencias , c o m o .
nas diíferenças , que todas as outras coizas derívãó
delias os seus nomes de huma maneira unívoca ( 2 9 )

( a ) Isto he ; as differenças especificas ( V . Aph. 11. )


OH OS caracteres da especie. E he sempre neste sentido
«pie se deve tomar « palavra difíereuça nas Obras de,Aris-
tóteles. Nota d& Traductor*.
5

' 35- Toda a esâencia parece significar o que ttU


auma co'i7,a hei E quanto ás essências primaria»
he verdade indubitável , que significão o que al-
guma èoiza lie C 30 Quasto ás essências secun-
darias sim parece pela_ forma do seu enunciado ;
que também significão o que alguma coiza he
(31) mas isto he mera apparencia*; porque tàes
expressões denotãó antes qual seja a coiza a que
se referem ; nem se appíicão a hum só objecto ,
como.as és e 11 cias primarias•( 3a). Çomtiído não
denotão huma simples qualidade £ 3Í3 O
36. Assim que , tanto a espécie , como o genero ,
determinão as qualidades das essencias; porque de-
terminão de-hiima .dada essencia*, qual ella seja;
37.. Mas esta determinação he mais ampla no
genero do que na especie C 34 3*
38. Também se verifica nas essencias o não te-
rem nada ,QfBe lhes «eja contrario (_ 3 5 ) .
- 39. Mas isto» não lie particular ás essencias ;
inas também se verifica em muitas outras coizas,
como nas quantidades Q 36 ). ;
40. Parece outrosim que as essencias não sãò
susceptíveis dé mais nem de menos. ( 37 v
41. Porém o que principalmente parece ser par-
ticular ás essencias, h e , que hum e o mesmo in-
dividuo lie susceptível de ser em hum tempo o
contrario do que era em outro tempo ( 38
42. De modo que he proprio das essencias o-
aídmittirem estados contrários , vindo ellas mesmas
a mudarem Ç 39 Mas o que fica dito bastará a
respeito dai essencias.
43. Das quantidades "humas são discretas a ou-
A ii
6
trás são continuas: humas conslão de partes que
tem certa situação entre si~: e outras, cujas par-
tes não são susceptíveis de situação entre si.
44, He quantidade «discreta* qualquer numero 2
qnalqirer discurso: e continua â i f n h a , a superfí-
cie , o corpo: e além destas , 0 lugar , e o tem-
po C 4 o >
45* Absolutamente failando M estas que temos,
nomeado, he que são quantidades : todas as ou-
tras só o são accidenralmente ( 4 1 ) . .
46. Além disso á quantidade nada he contra-
rio C 4 a
47. Nem tão pouco a quantidade determinada
lie susceptível de mais nem de menos Q 43
48. Q que he principalmente particular . ás quan-
tidades lie o dizerem-se iguaes ou desiguaes C44D»
49., Cliamão-se relativas aquellas coisas , que ©
que são | sã0*0 de ootras coisas : ou*por outro al-
gum modo o são relativamente a outras coizas £ 45 y
50 Os relativos sãO susceptíveis de contrario £46).
51. Mas nem todos os relativos são susceptiveis
de contrário Q 47
52. Também parece serem os relativos, suscep-
tíveis de mais,, e de "menos ( 49
53. Mas nem todos os relativos são susceptiveis
de mais, nem de meiíos ( 49 ).
54. Todos os relativos são recíprocos daquelles
é e quem se dizem ( 5 0 )
55. Comtudo ás vezes pôde parecer , que nãó
existe esta reciprocidade; a saber, quando o cor-
relato se não exprime em termos próprios ;Ve isto
á proporção que o nome do relativo se afastar do
do seu correlato ( 51
7

56.Igualmente parece ser da naturezá dós cor-


relatos o existir hum , sempre qfte existe o* ou-
tro. E com effçito assim se verifica pela maior par-
te "
57. Mas não hè/d^uatureza de todos os corre»
latos o deverem sempre coexistir ( 53
58. Pôde entrar em duvida se ha alguma es-
sencia , que seja* d<r numera aas coisà4 relativas;
corno com . effeito parece não a haver: ou se. isto só
acontecer com algumas das essencias secundarias;
porque'quanto às primarias he certo ser assim C54).
59. Eu chamo qualidade a aquiilo por onde se
! designa, quaes sejão certos e determinados ob-
jectos. i . H 1 p * ? * * >
60. Mas a qualidade he do numero daquellas
* palavras .jqiie admittem muitos sentidos. Forqiian-
to lia primeiramente humã espécie de qualidades,
que he a dós hábitos e a das affecções ( 55 1
61. E ha huma segunda especie, que lieaquella
pela qiial dizemos de ajguem, que elle he fraco ou
' què he forte no pugilado, ou na carreira , ou na
saúde: ou pela qual .'em gerpl affiimamòs alguma
coiza sobre a força 011 a fraqueza própria da na-
tureza de qualquer, objecro £ 56 j.f ,;
62! Ha outra terceira especie de qualidades, que
são as qtial.idades- passivas ou as paixões ( 57 '
63. É*Jia em fim linma..quarta especie de fí!%*
lidades, que são a, figura e as modificações de ca-i
da figura £ 5 8 ) .
64. Eis-aqui as que se chamão qualidades : e
chamão-sè quaes os objectos que por cqgnomirsa.
ção;se- dizem a respeito'delias, ou por algum ou*
8

tro modo trazem delias o nome, pelo qual os de-


signamos.
65. Da maior parte e de quasi todas ellasse de-
íivâo por congnorninaç&o aquelles nomes ( 59
66.: Mas em algumas não* pôde ter lugar a CO-
gnorainação; porque não existe nome para a res-
pectiva qualidade £ 60 _).
67. Em .outros porém , posto que a qualidade
tenha nome l o do objecto a que ella se refere,
não se deriva delle por cognomiftação Q 61. ").
68. As qualidades são susceptiveis de contra-
rio C 6 2 )*
69. Mas isto. não acontece a todas as qualida*
des C 6 3 >
70. Além disso , todas as vezes que hum de"
dois contrários he qualidade, também o outro o
lie necessariamente ( 6 4 ) .
71. Também admittem as qualidades mais e me-
nos ( 65 }
72. Mas não todas , porém sim a maior par-
te C 66 |.
73. Comtudo nenhuma das sobreditas proprie-
dades he particular ás" qualidades. O que lhes he
particular he a semelhança ou a dessemelhança (67)»
74. Nem nós cauze confusão, se alguém nos
observar , que tratando-se aqui- dàs qualidades*,
enumer.amos muitas cousas que pertencem aos re-
lativos ( 68 ). Porquanto, he de notar , que de
quasi todas essas coifcas são os generos os que per*
tencem aos relativos; e os indivíduos ás qualida-
des ( 6 9 Porém quando acontecesse^ encontfar-
se 'huma mesmá coiza entre à$r relativos e entre
9

a$ qualidades, não haveria nisso absurdo a l g u m ,


porque pôde muito b e m ' l i ti ma mesma coisa per>
tençer a dois generos diffe/entes.
75. Tanto a acção , como a paixão são susce»
ptiveis, não só de contrario, mas também de mais
e de menos £ 70
76. Passando a tratar dos oppostos, e de quantos
modos as coisas costumão ser oppostas entre s i ;
lie de saber , que lia quatro modos de opposiçáo ;
que vem a ser: ou como relativos, ou'como con»
trarios, ou como privação e effectividade, ou co»-
co aííirmação e negação ( 7 1 I
77. A s coizas que são oppostas como relativasj'
isso "que s ã o , ou o são dos seus oppostos , ou de lies
se affirmão por alguma outra maneira ( 7 2 ) .
78. E as que o são como contrarias , não se
podem de nenh.um modo affirmar humas dasouv-
i r a s : mas sim que humaS são contrarias das õíi-
tras C 73 > ' • •
79. Aquelles contrários , de que se verifica q u e
necessariamente haíde existir hum delles nos obje-
ctos a que elles por natureza pertencem , ou de que
elles são categorias, não admittem nenhum termo
médio : bem como aquelles, dos quaès não he for-
çoso que exista hum .delles, póde-se-lhes sempre
assignar hum termo médio ( 7 4 ).
80. Algumas vezes este termo médio tem ímm
nome C f s l i z mas outras vezes não he fácil o de-
signa-lo com hum nome particular; e então Heter-
mina-se pela negativa de hum dos extremos ( 7 6 ) .
81. Tanto a p r i v a ç ã o , como a effectividade re-
ferem-se sempre a hum mes-mo e determinado ob-
jecto ( 7 7 }
IO

82. Q u a n d o se diz, de alguma coiza » que elía


está privada dequalqilêr effectividade , he nos ca-
sos , em que nella. não existe o que nelia por sua
natureza devia existir , ao menos no momento de
que se trata Ç 78 ) .
83. M a s estar privado , e ter a e f f e c t i v i d a d e ,
não he 0 mesmo1 qtie a privação , e a effectivi-
dade C .79 )• '
84. Q u a n t o á opposição entre o estar privado
je o ter effectividade, parece ser a mesma que en-
tre a privação e a e f f e c t i v i d a d e ; por isso que o
modo da opposição lie idêntico ( 80
85. Pela mesma razão as coizas sobre que re-
cahe a affirmação Ou á n e g a ç ã o , não são affirma-
ç ã o nem negação Ç 81
86. Q u e a p i i v a ç ã o e a effectividade não são
entre si oppostos como r e l a t i v o s , he e v i d e n t e ;
pois quç de nenhuma delias se diz que o que el-
la .he , o he da sua Opposta Q 82
87. D o que ficá dito se v ê também , que a pri-
v a ç ã o e effectividade não são .entre si oppostas
como os contrários; ( 83 Seguindo-se de quan-
to fica dito , que nem podem p e r t e n c e r aos con-
trários que admittem termo médio , nem a aquel-
les que o não admittem C ?4
88. A s coizas que são entre s i . o p p o s t a s , como
affirmação e negação , he evidente que o não po-
dem ser por" nenhum dos referidos modos; porque
-íjellas somente se verifi'ca que de necessidade hu-
m a ha dç ser verdadeira , e a outra falsa: entre-
tanto que nem nos contrários , nem nos relativos ,
jpem na privação e •effectividade se v e r i f i c a , que
11

dos oppostos hum haja de ser necessariamente ver-


dadeiro e o outro falso C 8 5 ) .
89. A o bem he necessariamente contrario o mal
( 8 6 ] ) . P o r e m ao mal humas vezes he contrario o
b e m , outras vezes he-o outro mal ( 8 7 ). Com tu-
do este ultimo caso em. poucos se v e r i f i c a : pela
maioi* parte o contrario do mal lie o bem.
90. H e de notar , que de dois contrários não he
necessário que existindo hum , deVa existir o ou-
tro ( 88 >
9 1 . He facií de çomprehender que os objectos
de dois c o n t r á r i o s , devem ser idênticos , tanto em
genero , cooio era especie ( 89
92. E portanto lie de necessidade , que dois con-
t r á r i o s ou se comprehendão em hum mesmo g é n e -
ro , ou em generos contrários; ou que,, elies sejão
•generos por si mesmos C 9 0 ) ,
ê 93. Q u a t r o são os modos , porque huma coisa
se diz. ser primeira do que o u t r a : o primeiro e o
principal he em razão do ? tempo ( 9 1 ) : o segun-
do he quando ,- devendo-se concluir da exjistencia
desta a d a q u e l l a , não se pôde c o n c l u i r reciproca-
mente ( 9 2 3 : o terceiro he quando se diz primei-
r o em razão dè alguma determinada ordem ( 93 ) :
e além d e s t e s , que ficão d i t o s , parece ser primeiro •
por n a t u r e z a , 0 que he m e l h o r e mais e s t i m a d o ( 9 7 ) .
94. Poderia lembrar , que além dos quatro, r e f e -
jridos ainda eXisíe outro quinto modo de priorida-
d e ; porque de.duas coisas, das quaes dada a exis-
tência de huma se conclue a da o u t r a : e recipro-
c a m e n t e ; aquella de entre a m b a s , que de algum
modo lie cauza de existência da o u t r a , com ra- .
B
12

zâo se poderia chamai; primeira por sua natureza


(95) E neste sentido poder-se-hia-dizer , que sãp
cinco os modos-, porque huma coiza se ^)óde de-
nominar primeira do que outra, .
* 95. Chamão-se connexas as coizas, no sentido
Riais amplo , e principalmente , quando a sua for-
mação he acontecida no mesmo tempo; de mQ-
do que huma não he anterior^ nem-a outra poste-
rior : E chama se-lhes simultaneas , ou conjunctas
em tempo.' • •
96. Chamão-se porém-connexas por natureza
aquellas, cuja dependencia he t a l q u e dadà a exis-
tência de qualquer delias , se pôde seguramente
concluir a da outra : sem que Comtudo huma se-
ja causa dá existência da outra C 96).
97. As especies , que há de movimentos, são
seis; a saberí formação, destruição, augmento,
di minuição f transformação V 0 mudança de lu-
gar ç 97 > ^ â í ^ E f e ^
98. Também são muitos os sentidos da palavra
l e r ; porque se diz de qualquer effectividade ou dis-
posição, ou em geral, de qualquer outra qualida-
de £98). D-iz-se das quantidades C99 Diz-se dos
accidentes externos ao corpo todo ( 100 } , ou a
lauma perte delle ( 101 y Diz-se das partes do cor*
po C 102 ). Diz-se das vasilhas (103). Pfe-se do que
se possue ( 104 ). Talvez se poderião ainda achar
outros sentidos da palavra t e r ; nats os que se cos-,
tu mão usar, são pouco mais ou meãos, os que
«ão enumerados. * .
1

C A T E G O R I A S.

S E G U N D A P A R T E .

EXPLICAÇÕES.

1. EXEMPLO '. Animal tanto o he o homem I


como aquelle nome escripto. Entretanto não tem
de cominum senão o nome; mas a rasão des?e no-
me he diíFerente para cada hum delles. Porquanto
se alguém houver de dar a rasão de se applicar o
nome de animai a cada qual delias ; para cada hum
ha de dar huma rasão particular.
2. Exemplo: Animal tanto o hé o homem, co-
mo o boi; porque ai^bos elles se designSo pèlono-
me commum de animal. E até mesmo a rasão des-
se nome he idêntica para ambos. Porquanto se
alguém houver de dar a rasão , porque qualquer
delles he animal , deve dar huma e a mesma
rasão.
' 3. Exemplo: De Grammatica, Grammatico; de.
Valor , Valoroso.
4. Humas ligadas, como : o boi corre', o homem
vence. Outras desligadas, como: Homem , Boi , cor"
re\ vence.
5. Exemplo: Homem diz-se de algum objecto,
isto h e , de algum determinado homem; mas não
está em nenhum objecto. * .
B U
2
6. Exemplo : A, Sciencia grammatical de alguém
está em algum objecto, que he a alma; mas não
se diz de nenhum objecto. A brancura de algum
determinado corpo está em algum Objecto, isto
h e , nesse mesmo corpo; mas não se diz de ne-
nhum objeçto.
7. Exemplo: A . Sciencia está em algum obje-
cto , que he a alma: e diz-se de algum objecto »
como por exemplo, da Grammatica
8. Exemplo: Hum determinado homem, hum de-
terminado cavalld ; porque nenhum destes está em
nenhum objecto » nem se diz de nenhum objectai
9. Porque a Sciencia grammatical de alguém he
daquellas coisas, que. se achão em hum objecto: e
comtudo não se diz de nenhum ohjecto.
10. Exemplo: . Na Categoria de Homem com-
prehende-se hum determinado homem. E na de Ani-
mal compréhende-se o Homem. Logo hum deter-
minado homem cómprehende-se na Categoria de
Animal; porque esse determinado homem he Ho-
mem e Animai.
11. Exemplo: As de Animal e as de Seiencias.
Porque as differenças de Animal são reptil, bi-
pede , yolatil, e aquatil. Ora as de Sciencia não
são; estás ; porque, nenhuma Sciencia differe de ou-
tra Sciencia em ser bipede.
12. Porque os generos principaes são Catego-
rias , que contém as subalternas.
13; Essência, para o dizer com exemplos, he
eomo : Homem , Cavallo.
Quantidade. Exemplo: De dois covados; de tre&
cavados. ' •
3

Qualidade. Exemplo : BrancaGrammatico.


Relação. Exemplo:|Dobrado ^Metade^Maior.
Lugar. Exemplo : Na.praça , No tfocio.
Tempo. Exemplo: Hontem , Antefiontém.
Estar. Exemplo: Está'recostado , Está sentado. M.
Acção permanente. Exemplo: Calçar-se\ Armar-se;
Acção Uanseunte. Exemplo: Cor/tf/* , Queimar. *
Paixão. Exemplo: Ser cortado, Ser queimado.
14. Exemplo Hum determinado liomem; líum
determinado çavallo. <
15. Exemplo: ,Hum determinado homem he com-
prehéndido na espeçie Homem : E o genero desta
espécie he Animal. São pois as essências secunda-
rias taes, como Homem e Animal.
16: Exemplo: Hum determinado homem he hum
objecto, que se comprehende na Categoria de Mo-
ntem'. primeiramente quanto ao nome ; porque de
qualquer^determinado homèm se dizser Homem: e
em segundo lugar a rasão categórica de Homem he
applicayei a qualquer determinado liomem ; porque
qualquer determinado homem he Homem ç Animal.
17. Exemplo: A brancura , - que está em hum
objecto ^ qual lie o corpo ) he Categoria em qjie
se comprehende o'corpo ; porquanto o corpo se diz
branco: mas a rasão Categórica de brancura não
he applicavel ao corpo.
18, Isto se faz manifesto da consideração de ca-
da huma das coisas de per si; por exemplo: Ho-
mem contém-se na Categoria de Animal; e por
eonseguinte também qualquer determinado liomsm
se conterá nessa mesma Categoria; porque se al-
gum determinado homem se não-contêm nella: m-
4

tão também. senão comprehenderá o Homem em


• geral. Do mesmo modo a côr existe no corpo: e
logo também em qualquer, determinado corpo;
porque se não existe em algum corpo . então tam-
bém não existe no corpo em geral. E portanto
todas as outras coisas ou se dizem das essencias
primarias , como de outros muitos objectos: ou es-
tão nellas, como em outros tantos objectos.
,19. Porque está mais próxima á essencia prima-
ria. Porquanto querendo-se designar o que seja hu-
ma essencia primaria , se designará mais clara e
propriamente apontando se a sua especie , do que o
seu genero. Por exemplo : querendo-se designar o
que seja hum determinado homem, se designará
mais claramente, dizendo-se que he Homem , do
que. dizendo-se, que he Animal. Porque aquella
primeira designação he mais própria desse deter-
minado homem: entretanto que esta he ipaiscorn-
mum. E querendo-se designar huma determinada
a r v o r e , se designará mais claramente , dizendo-sô
ser huma arvore , do que dizendo~ser hum vegetal. \
20.^Porque a especie passa a ser objecto relati-
vamente ao genero; visto que a . especie se com-
prebende-na Categoria do genero: e não inversa-
mente o genero na da especie. E por isso também
he a especie mais essencia do que o genero.
. 21. Por isso que querentlo-se designar hum-de-
terminado homem , não se denotará mais propria-
mente dizendo que lie Homem , do que sequeren-
do«se designar hum-determinado cavailo, se disses-
se ser Cavallo.
22. Porque hum determinado homem não he
mais essencia, do que hum determinado boi.
5

23. Porque de todas as Categorias, em que a es-


sencia primaria s*e comprehende, nenhuma a designa
tão b e m , como os géneros e as especies. Porquan-
to , se se quizer designar o que he hum determi-
nado homem , designa r-se-ha com propriedade denp-
tando-se a stta especie , ou o seu «genero ,, e desi-
gnar-se-ha mais cláramente diz endo-se , que he Êo-
mem QU Animal. Mas se se apontasse, qualquer ou-
tra coisa, designar-se-hia de hum modo estranho;
como 'se se dissesse ser branco, on que corre , ou
outra alguma coisa semelhante. Por ondé cora ra-
são , de entre todas as coisas, a ellas sós se lhes tem
dado o nome de essencias. E mesmo .as essencias
primarias não se chamão com especialidade essen-
• cias, senão porque são objectos , que se corapre-
Iieridem em todas as outras coisas, como em outras
Captas Categorias. *
24. Porque, todas as outras coisas são outras tan-
tas Categorias em que ellas secontém. Porquanto
assim como de ttum determinado homem he que
diremos ser grammatico, assim também do que hé
homem, do que he animai lie que diremos ser
grammatico. O mesmo acontece em tudo o mais.
25. Porque ás essencias primarias nem estão' errr
nenhum objectoy nem se dizem de nenhum. ( E
quanto ás secundarias também he claro, que ne-
nhuma delias está em objecto algum. Pois homem
sim se diz de algum o b j e c t o , que he qualquer de-
terminado homem; mas não está em nenlitim ob-
jecto ; .porque homem não está em nenhum deter-
minado' homem. Do mesmo modo animal sim se
diz de algum objecto , que he qualquer determin»:
c
6

do homem ; mas animal não* está em nenhum de-


terminado homem. A l é m disso as coisas, que estão
em algum o b j e c t o , nada obsta a que sejão Catego-
rias delle quanto ao n o m e ; mas quanto á razão
do nome he impossível que o sejão..
26. Porquê a rasão categórica ( a ) de homem
y' he applicavel a qualquer determinado homem: E
do mesmo modo a rasão categórica dé animal. D e
tudo o que se segue , que nenhuma essençia pô-
d e ser do numero das coisas, que estão em al-
gum objecto.
27.Porque o ter p é s , e o ser b i p e d e , diz-se
y do h o m e m , como objecto ; mas não está em ne-
nhum o b j e c t o ; porquanto não. está no homem o
ter p é s , nem o ser bipede.
28. Exemplo : se se diz do homem o ter pês,
r he porque ao homem he applicavel a rasão cate-
górica desta expressão; pois que o homem he hum
animal dotado de pés. 1 . ;' . .

29. Porque todas as Categorial , que delias se


wi d e r i v ã o , ou comprehendem indivíduos ou especies ,
visto que das essencias primarias se não deriva ne-
- nhuma Categoria , sendo assim que se não dizem
de nenhum objecto. E quanto-a aq.uellas , que se
derivão das essencias secundarias , a especie compre-
hende os indivíduos: e o g e n e r o comprehende as
especies e os indivíduos. Do mesmo modo as diffe-
renças fornecem outras tantas Categorias, em que
se compreheudem^species e os indivíduos. Além*

( a ) Isto he s a rasão do nome', ou o caracter da or-


dem , clssse , genero , especie etc. A7ofa do Traãuctor.
7

disso a rasSo categórica , tanto das e s p e c i è s c o m o


dos generos, he applicavel ás essencias primarias;
porque tudo o (Jue se diz oo objecto, se ha de tam-
bém dizer das Categoriás, em que elio se compre-
hende. Semelhantemente a rasão categórica das dif-
ferençashe applicavel ás especies, e aos indivíduos.
Ora éftronymltt^erão os que tinlião o mesmo no-
me , e a rasão do nome idêntica. Logo todas as coi-
sas , que sç compreliendem nas Categorias das essen-
cias e das differenças, tirão delias os seus nomes
de huma maneira univoça.
30. Porque cada huma delias significa hum ob-
jecto indivisível , ,e hum em nu-mero.
3 1 . Como quando se d i z : Homem , Animal.
32. Porquanto Homem , Animal dizem-sede mui-
tos.
33. Como Branco , que nada mais significa do
"N> que hiíma simples qualidade. •
34. Porquanto quem diz Animal* abrange a
mais, do que quem diz Homem.
„ r 35. Porque quanto ás essencias primarias, que he
o que lhes poderia ser contrario ? Por exemplo: a
hum determinado h o m e m ? a hum determinado
animal? Sem duvida, que nada lhes lie contrario.
<1 Tão pouco tem "contrario Homem , ou Animal.,"
36. Porque a ser de dois covados ou a ser de
c^fc tres covados nada he contrario: bem como nem a
; _ _ d e z , nem a outra nenhuma coiza semelhante. /
37,. Eu não digo, que não ha huma essência
mais ou menos essencia do que outra; porque isso
já fica ensinado afirmativamente. O queeu digo,
l i e i que pada huma das essências, isso que he»
c ii *
8

não se pôde dizer que o h® ifiais, nem menõ».


Por exemplo se a essencia de que ,se trata he hum
h,omern , não. pôde ser mais , nem menos homem
do que elle»mestno : nem tão pouco mais ou me-
nos homem do que o u t r o ; pois h u m homem não
h e mais homem do que outro , do mesmo modo
que huma coiza branca pôde ser mais. ou menos
branca do que outra : ou huma coiza formoza , pô-
de ser mais ou menos formoza do qúe outça: e
até cada huma delias em si mesma mais e m e n o s ;
por exemplo hum corpo que lie branco diz se
agora mais ou menos branco do que antes: hum
que está quente , diz-se estar mais ou menos
quente. Mas as essencias não se dizem ser nem
mais nem menos essencias; porque se não diz que
hum liomem seja sfgora mais ou menos homem do
que antes: E assim todas as demais coisas que se
chamão essencias. Donde se segue , que nenhuma
essencia he susceptível de mais, .nem de menos.
38. Q u e lie o que jamais se pôde verificar em
nenhuma outra coisa, que não for essencia; por-
que apezár de ser huma em numero, nem por is-
so lie susceptível de contrario : por e x e m p l o , hu-
ma determinada c o r , apezar 4e ser huma em nu-
mero , não pôde ser - branca e preta : huma e a
mesma, acção , a pezar de ser huma em n u m e r o ,
não pôde ser boa e m á : e assim em todas as demais
coisas que nâó são essencias. Porém as essencias,
sendo cada qual delias huma e a mesma em nume-
ro , são susceptiveis de estados contrários. Por exem*
pio , hum determinado homem, sendo num e "o
mesmo, ora he b r a n c o , ora denegrido: ora está
9

quente , ora frio : ora lie máo , ora he bom. Po-


rém nada disto parece Verificar-sé em nenhuma
das outras coisas. Excepto se alguém quisesse in-
sistir dizendo , que o discurso e a opinião são sus-
ceptíveis de contrariadade ; porque parece , qite hum
mesmo e determinado discurso pôde ser verdadei-
ro é falso* Por exemplo ; se fosse verdade o dizer-
se qile alguém está sentado: logo que elJe se le-
vante este dito passa a ser fálso/E o mesmo he
de qualquer opinião ;. porque se alguém julgasse
cora verdade que outrem estava sentado: logo que
este se levantasse, julgaria erradamente formando
a respeito delle o mesmo juiso. K Porém ainda ad- i
mittindo isso , 'há total differença quanto ao modo.
Porque, quanto ás essencias, ellas não são susce-
ptíveis de estados contrários, senão quando mudão :
como por exemplo , o que está frio , depois de ter
estado quente, passou por huma mudança: o que es-
tá denegrido , depois de ter sido branco , varia z
bem como o que he bom , depois de ter sido máo:
E assim de todas as outras, que só admittem esta-
dos contrários, quando experimentão mudança. Mas
o discurso, e a opinião ficão absolutamente immu-
daveis: e passão aserem o contrario do que e r ã o ,
quando mudado objecto , a que se referem: como
o dito de que alguém está sentado fica sempre sen-
do o mes'mo ; e só pela mudança do ^nbjeito lie
quç ora he verdadeiro e depois falso. O mesmo se
pode dizer da opinião. Donde se se^ue, que lie
particular ás essências o admittirem ^ela sua pró-
pria mudança estados contrários.-
39. Mas he de advertir, que quem admittisse, que
10

o discurso e a opinião são susceptiveis de contra


riedade , admittiria hum e r r o ; porque nem o dis-
curso nem a opinião passão a serem o contrario
do que erão , porque lhes sobreviesse alguma coi-
s a , mas porque se applicão a outro cazo: pela
simples existencia ou não existencia do f a c t o , lie
que o discurso que a elle se refere se d i z ser ver-
dadeiro ou falso: e não porque o mesmo discurso
em si admittissè estado contrario ao que era an-
tes ; porque em nada absolutamente se acha ter
mudádo , nem o discurso , nem' a opinião. Ora não
tendo elles recebido mudança alguma em contra-
rio ,. não se podem dizer susceptiveis de passarem a
sereni o contrario do que erão. A o contrario porém
as essencias, que por isso que recebem modificações
contrarias , he que se dizem susceptiveis de está-
dos contrários: como por exemplo ; porque he sus-,
ceptivel de doença ou de saúde , de brancura ou de
negridão ; 'e assim do resto ; he que §é diz ser.susce-
ptivel de contrariedade. Lògo he particular ás essen-
cias , que sendo cada qual delias huma e a mesma
em numero , pela sua própria mudança passão a
serem o contrario do que erão.
40. Porque as partes do numero não tem termo
nenhum commitm , em que as partes* do mesmo nu-
mero se encontrem. Por exemplo cinco considerado
como parte de d e z , n5o tem hum' termo com-
111 um em que se encontre com os outros cinco ,
mas são quantidades discretas. Do mesmo modo
tres e septe > não se encontrão em. nenhum termo
commum. E em geral he impossivel assignar hum.
termo c o m m u m , em que se encontrem as partes
11

de qualquer n u m e r o ; mas sempre são discretas.


D e modo que o numero he huma das quantidades
discretas. Do .mesmo modo o discurso. Ser o dis-
curso quantidade he evidente porque se mede por
syllabas longas e breves. Eu fallo do discurso pro-
nunciado. Mas não ha termo# nenhum cornmum »
em que as partes do discurso concorrão: pois que
as syllabas não se encontrão em nenhum termo"
cornmum , mas antes ficão discretos entre si,
Porém a l i n h a , essa he continua: e.póde-se
tomar hum termo cornmum , em que se vem a en-
contrar as partes de que ella consta , que he o pon-
to : e da superfície be-o a l i n h a ; pois que as par-
tes de hum plano se encontrão em algum termo
cornmum. Do mesmo modo he sempre possível to-?
mar em qualquer corpo hum termo commum, em
que as partes concorrem , que he a superfície ou
a linha. Outro tanto acontece ao tempo e ao Ili-
b a r ; porquanto o tempo presente"pega com o pas-,
sacio , e com o futuro. Por outra parte o lugar lam-
bem lie do numero das quantidades continuas ; por-
que as partes de qualquer corpo occupão algum
l u g a t e ellas concorrem em hum termo c o m m u m ,
logo também as partes do lugar , que occupão as
do corpo , hão de concorrer em o mesmo termo
commum , em que ás partes do corpo concorrem.
D o que se s e g u e , que o lugar he huma quantida-
de c o n t i n u a , por isso. que as partes, de qne elle
^se compõe , concorrem em hum termo commum.
4 1 . Exemplo : A s partes da linha tem liuma si-
tuação respectiva entre s i ; porque cada huma delias
j a z em hum lugar : tf se pôde achar e demonstrar
12

aonde ella j a z ' no plano, e quaes sejão de entre


as oneras partes, aquellas com que ella concorre
rio plano. Do mesmo modo as partes, do plano tem
liuma determinada situação entre si; porque tam-
bém se pôde assignar aonde jaz cada liurq^ delias,
e quaes das outras partes são aquellas, com que
cacla huma concorre. E o mesmo he a respeito dos
'solidos' , e do espaço.
Mas quanto aos números, não he possível mos-
trar, qug as partes, de que cada qual delles se com-
põe , tenfião certa situação respectiva, nem quaes
sejão as que se encontrão com esta ou com aquel-
la. Outro tanto se pôde dizer do tempo; por isso
que nenhuma daspartes delle fica subsistindo: e
"como poderia ádmíttir situação aquillo que não
subsiste? Mais depressa se poderia dizer que tem
huma certa ordem.; pois que hum he primeiro em
teympo ^ e o u j r o he posterior. E o mesmo lie dos
números; porque também hum se conta primeiro
do que dòis/e do.is do que três. De modo que se
pôde dizer gué* tem huma certa ordem ; mas não
se pôcle àdmittuv que tenhão entre si nenhurna si-
tuação. .Assim também com as palavras , d%que
ijeníiuma parte fica subsistindo,; ma" huma vez pro^
nunciadas, se não podem tornar a tomar; por oif-
dè~ não são susceptiveis de situação, pela simpleá
,razão de não serem áubsistentesí De tudo, o que
sefsegue , que liumas coizas constãó de partes , que
tem entre si huma certa situação: e outras, cujas
partes não são susceptiveis de situação respectiva.
42. Porque he "em consideração ás primeiras,
/que nos chamamos quantidacfcs a todas as outras.
13

Pòr exemplo , dizemos da brancura que he mui-


t a , attendendo a haver milita superfície branca. E
(de huma acção dizemos ser extensa, attendendo
a ser oiuito o tempo que ella durou : E he des-
te modo que se diz ter sido o movimento muito.
Porém nenhuma destas coizas he em si mes-
ma huma certa quantidade ; porque se alguém hou-
ver desdizer em que sentido attrifeue o quantitati-
vo a huma acção , lia de determina lo pelo tempo da
sua duração , como de 'lium anno, ou outra coi-
za semelhante Efallando da brancura, como quan-
tidade, ha de determina-la pela superfície; porque
quanto maior for a superfície , tanto maior he a
brancura. Assim que absolutamente fallando só são
quantidades aquellas, que acabamos de enumerar :
de todas as outras nenhuma o he por si mesnaa;
mas só por a c ridente.
42. Porque das quantidades determinadas he
evidente que não tem contrario ; pois nada o pô-
de ser á qualidade de ter dois ou tres covados: ou
a huma superfície: ou a qualquer outra coiza se-
melhante a estas. Excepto se por ventura alguém
disser, que muito he contrario de p o u c o , e gran-
de dé pequeno. Porém estas expressões não designão
quantidades, mas stm relações ; porquanto nada
he por si mesmo grande nem pequeno , mas somen-
te em quanto se refere a outra alguma coiza. He
assim que hum monte pôde ser pequeno, e gran-
de hum grão de painço, por,ser este maior que as
outras coisas do mesmo genero: e aquelle, menor;
Ha pois nisto huma comparação ; porque a não a
h a v e r , nunca hum monte poderia ser pequeno, nem
D
14

grande hum grão de painço. Outro exemplo : lí£


assim que dizemos haver muita gente em huma A l -
deã: e pouca em. Athenas; posto que o numero
desta exceda muitas vezes ao daquella : dizemos
haver em caza muita gente-, e pouca no theatro;
bem que neste haja muitas vezes mais gente que
em casa.
Além disso ter dois ou tres covados , &c. são
expressões de quantidades determinadas; mas ser
grande Ou pequeno não são expressões de quanti-
dades determinadas, porém sim de relações. Por-
que grande e pequeno sempre se referem a al-
guma outra coisa ; e logo he evidente que o
que designão são relações. Mas quer as ponhão
entre as quantidades , quer ás uão ponhão, não
se pódç assignar nada que lhes seja contrario;
porque como he que se pôde assignar o contrario
de huma coisa , que se não considera em si mes-
ma , porém só com relação a outra ? Além de que
se grande e pequeno são contrários, acontecerá
que huma mesma coisa admittirá ao mesmo tem-'
po dois contrários: e será huma mesma cois.t con-
traria a si mesma; pois que acontece que huma
mesma coisa lie ao mesmo tempo grande e'peque-
na : grande a respeito de hum objecto, e peque-
na a respeito de outro: e assim a mesma coisa b(S
ao mesmo tempo gran.de è pequena; e portanto
viria a admittir dois contrários. Mas nada pódead-
mil rir dois contrários ; á excepção das essencias»
p.Qrquç essas parecç poderem admittir contrários.
Porém ninguém pôde estar ao mesmo tempo são»
e doente; ser ao mesmo tempo branco e preto: e
15

fcssina de outras coisas, que nenhuma admitte con-


trários. E aconteceria que huma coisa seria con-
traria a si mesma; porque se pequeno he contra-
rio ao grande : como huma mesma«coisa pôde ser
ao mesmo tempo grande e pequena ; viria a ser
contraria a si mesma.- Ora he do numero dos impos-
síveis que huma coisa seja contraria a si mesma ;
logo pequeno não he contrario a g r a n d e ; nem
muito a pouco. De m o d o , que ainda quando al-
guém dissesse que estas expressõés não pprtencem
ás de relação , mas ás de quantidade ; nem por
isso lhes poderia descobrir contrario.
Mais depressa poderia parecer que o lugar
considerado como quantidade , he susceptível de
contrários , porque se chama superior o que he
contrario ao i n f e r i o r ; referindo se o inferior a
ijum ponto médio : e determinando o ponto mé-
d i o , por ser a sua distancia aos pontos cardiaes
do M u n d o maior que a dos extremos. E em ge-
ral chamão-se contrarias entre si as coisas , que
sendo cie hum mesmo genero , são entre as suas
congeneres as que mais distão entre si.
43. Por exemplo , o ter dois covados; porquanto
isto não admitte mais nem menos. O mesmo sue-:
cede eom os números, por exemplo : tres não he
mais cinco do que cinco , nem mais tres do que
cinco : e o mesmo he de cinco a respeito de tres:
nem hum determinado tempo he mais tempo do
" q u e outro tempo. Em geral nenhuma das que
dissemos serem quantidades , he susceptível de
mais ou de menos. Logo as quantidades determi-
nadas não são susceptiveis de mais ou de menos.
D ii
16

44. Porque cada huma das coisas referidas se di£


igual ou. d e s i g u a l : o mesmo he de hum numero
ou de hum determinado tempo ; que também se
dizem iguaes ou desiguaes : e assim t a m ^ m das
outras coisas acima mencionadas; das quaes todas
se diz , que são iguaes ou desiguaes. D e tudo o
mais p o r é m , que não lie quantidade , não tem mui-
to lugar o ser igual ou desigual : como por e x e m -
plo : huma affecção não se pôde dizer com muito
a c e r t o , que he igual ou d e s i g u a l ; ; mas sim seme-
lhante ou dessemelhante : nem de huma coisa bran-
c a i s e diria bem , ser igual ou desigual em cor , mas
antes semelhante ou dessemelhante. D e modo que
parece ser sobretudo proprio das quantidades o di-
zerem-se iguaes ou desiguaes.
45. E x e m p l o : Maior sempre se diz relativamen-
te a o u t r o , em toda a extensão do s i g n i f i c a d o ;
porque se diz maior que alguma outra coisa. D o
mesmo modo o que se diz ser duplo , também se
d i z rèlativamente a outra coisa, em toda a exten-
são do seu significado , porque de alguma outra
coisa se diz d u p l o : E assim de tudo o mais.
T a m b é m pertencem aos relativos expressões
taes como h a b i t o , disposição, sciencia, situação ;
porque fodas • e l l a s , isso que são , são-o de outras
coisas , ou por a l g u m modo relativamente a outras
coisas: e sem isso nada significão; porquanto ha-
bito lie habito de alguma coisa ; e sciencia he sci-
encia de alguma coisa: a posição he posição de
alguma coisa: e assim do resto. L o g o isso que são\
são-o relativamente' a alguma outra coisa aquel-
l a s , que se dizem serem de outras : ou de a l g u m
17

modo relativamente a o u t r a s ; como por exemplo


se*diz de hum monte , que he grande relativamen-
te a outro ; porque só relativamente a outro lie
que se diz grande. Assim também ó que se diz
semelhante , he semelhante a outro. E he deste mo-
do , que todàs as outras coisas se chamão relativas.
O estado de j a z e r , de estar em pé , de estar sen-
tado são certas situações; mas j a z e r , estar em pé ,
estar sentado são expressões que se derivão da-
quellas situações.
46. E x e m p l o : A virtude he o contrario do vi-
c i o : e cada humas destas expressões lie relativa.
D o mesmo modo a sciencia he o contrario da igno-
rância.
47. Porque a duplo não lia nada que seja con-
trario ; nem a t r i p l o ; nem a nenhuma outra des-
tas coisas.
48. Porque semelhante e dessemelhante dizem se
se lo mais ou menos. I g u a l e desigual também se
dizem se-lo mais ou menos: estas expressões são
relativas ; porque o semelhante, a alguma coisa he
semelhante: o d e s i g u a l , he-o a respeito de algu-
ma coisa.
49. Porque huma coisa dupla não se diz ser mais
ou menos d u p l a : nem nenhuma das outras coisas
semelhantes.
50. E x e m p l o : O servo he servo de seu senhor;
e o senhor he senhor do seu s e r v o : o duplo he-o
da sua m e t a d e ; e a metade he metade do seu du-
p l o : o que he m a i o r , he-o do que he menor: e o
que he menor he-o do que he maior : e assim
das demais expressões semelhantes. A ' s vezes as
18

expressões correlatas differem na desinencia; co-


mo por exemplo o conhecimento lie-o do conhe-
cido; e o conhecido he-o do conhecimento : a sen-
sação he-o do sentido ; e o sentido he-o da sen-
sação.
51. Exemplo: Se se diz que a asa he da a v e ;
nem por isso se pôde dizer reciprocamente que a
ave he da asa. Porque não tem entre si analogia
(grammatical) as duas expressões: asa da ave;
porquanto não he por se dizer ave, que se diz
ser delia a asa; mas porque se diz aladaz sendo
assim que ha asas de muitas outras coisas, que não
são aves. De modo que se se desse o nome analo*
g i c o , então haveria reciprocidade; a saber: asa he
asa de alado: e alado refere-se a asa.
Mas ás vezes seria necessário formar hum
nome analógico, quando o não ha apropriado.
Exemplo: Se se tratasse do leme de huma em-
barcação, não seria analogico o nome de l e m e í
porque não hc por ella se chamar embarcação , que
ao leme se lhe chama assirn ; pois que ha em-
barcações, que não tem leme; e por isso não ha
reciprocidade entre aquellas duas expressões : nem
se diz de huma embarcação que he embarcação
de tal leme. Seria porém analogico o nome, se se
dissesse ser o lem e de hum alemeado , ou outra
expressão semelhante; mas não existe esta , nem ou-
tra alguma expressão cognominada ; que se existis-
s e , então haveria reciprocidade ; porque se diria
ser o alemeado do leme. O mesmo he de outras ex-
pressões, como por exemplo fallando-se de cabeça
seria mais analogico dizer cabeça de hum capita-;
19

(Jo ; do que dizendo-se cabeça de, bum a n i m a l ;


porque não he por ter cabeça , que he a n i m a l , pois
ha muitos animaes que não tem cabeça.
Assim acontecendo não ter huma coisa nome
analogico com o do seu correlato , o mais fácil se-
ria dar-lhe nome derivado deste com quem essa
mesma coisa se acha em reciprocidade; como nos
exemplos precedentes de asa ou a l a , alado ; de le-
me alemeado. De tudo o que se s e g u e , que todos
os correlatos se se enuncião com propriedade , são
recíprocos entre si. Mas se cada hum se nomea ao
acaso, e sem analogia com o seu correlato; não pôde
haver reciprocidade entre elles com propriedade.
Digo p o i s , que mesmo daquellas coisas, que
são reciprocas enrre s i , e que tem nomes cogno-
minados, desapparece a reciprocidade , se em v e z
de eu enunciar a qualidade correlata de h u m »
delias para com a outra , enuncio qualquer outra
ao acaso. E x e m p l o ; se querendo-se nomear o cor-
relato de servo; em v e z de senhor , se disser horrmni
ou b i p e d e , ou outra coisa semelhante;- n£o pode-
rá haver reciprocidade ; porque se não apontoei a
expressão apropriada. E portanto se deixando .ut>
parte tudo o que he accidental a hum dos corre-
latos , se expressar somente o nome apropriado ao
do outro correlato ; sempre este se poderá affirmar
daquelle Por exemplo , tratando-se do servo rela-
tivamente a seu senhor , se deixando de parte tudo
o que lie accidental ao senhor ( c o m o o ser bipede,
intellígente , homem ) se chamar somente s e n h o r ;
sempre se poderá affirmar deste que outro he seu
servo ; por isso que o servo he servo do seu senhor.
20

E a rasão lie que se não enunciarmos só a


qualidade apropriada do correlato , deixando de
parte todas as o u t r a s ; ninguém dirá que he cor-
relato. Porque supponhamos que se dig, o servo do
homem , e a asa da a v e , deixando se dè parte o di-
z e r do homem que he s e n h o r ; não se segue que
se deva dizer o servo do homern ; porque se elle
não for s e n h o r , também o outro não he seu servo.
D o mesmo modo ommittindo-se o dizer da ave que
he a l a d a , não se segue ser correlato de asa ; por-
que não se suppondo o ser alado , não se lhe pôde
referir aquella expressão de asa. D e tudo o que se
segue , que convém nomear os correlatos dè hurra
maneira a n a l ó g i c a : o que he fácil quando ambos tem
nomes entre si analogos; mas quando os não tem
analogos, cumpre muitas vezes crea los. Ora dados
clles he evidente que existe reciprocidade entre
ambos os correlaiosj *
52. Porque cíuplo e metade sempre andão jmi-
cos: e se ha duplo , he porque ha metade. Se ha
servo , he porque lia senhor: e se ha s e n h o r , he
porque ha servo. E á semelhança destas , todas as
demais coisas. Igualmente se verifica que tirado
liura dos correlatos, se tira também o outro ; por-
que, não havendo metade não pôde haver o du-
plo : e não havendo duplo , não pôde haver coisa
a que se dê o nome de metade. O mesmo se pô-
de dizer de todas as outras coisas a estas seme-
lhantes.
53. Porque parece que o objecto da sciencia de-
v e existir antes da sciencia; sendo assim , que pela
maior parte primeiro existem as coisas a n t e s , que
21

nós delias tenhamos conhecimentos: E serão pou-


cos , ou nenhuns os casos , em que se verifique , que
os objectos começão a existir juntamente com o
conhecimento delles;:; Além disso não existindo o
objecto do conhecimento, tam-bem este não pôde
ter lugar; mas nem por isso que não existe co-
nhecimento , deixa de existir o objecto delle. Por
exemplo: da quadratura do circulo não existe a
sciencia , mas nem por isso deixa de existir o que
sobre isto ha a saber , se he que se pôde saber.
Por outro lado , não existindo nenhum animal,
também não .ha sciencia , entretanto que nem por
isso cleixão de existir çs muitos objectos de co-
nhecimento. O mesmo acontece com a sensação ;
pois parece que os objectos sensiveis são anterio-
res á sensação ; visto que suppondo-se não existir
o objecto da sensação , também esta não pôde exis»
tir ; mas de não existir a sciencia não se segue
que não existem os objectos delia.
Porquanto as sensações versão sobre corpos , e
nos corpos; e na supposição de não existir o obje-
cto sensível, também não existem corpos (porque
os corpos são do numero das coisas sensiveis) Ora
não existindo corpos, também não pôde existir sen-
sação- E por conseguinte não existindo o objecto
sensível, não existe a sensação ; de não existir a
sensação , não se segue, que não exista o objecto
sensível; porqUe suppondo-se não existir, nenhum
animal, não existirá nenhuma Sensação: e comtu->
do existem objectos sensiveis , como: os corpos
quentes , doces, amargos, e todos os outros quan-
tos são objectos da sensação. Ora a sensação co-
E
22

meça a existir com o ence que sente ; porque a


sensação começa a existir com o animal ; e os ob-
jectos sensíveis são tão anteriores á sensação, co-
mo aos animaes ; porque o fogo , a a g o a , e mais
elementos , de que O animal se compõe , existião
antes de haver animaes nem sensação. Donde com
razão parece que os objectos da sensação são ante*
v riores á mesma sensação.

' Porque as partes de qualquer essencia pri-


maria nem s i n g u l a r , nem collectivamente , se po-
dem considerar como coisas relativas; porquanto
hum certo homem não lie certo homem de certo
h o m e m ; nem hum ceito boi he certo boi de cer-
to boi. O mesmo he de cada huma das p a r t e s ;
pois se não diz ri: certa mão de certo h o m e m ; ,
porém a mão de certo homem: nem certa cabeça
ide certo h o m e m ; ma? a cabeça de certo homem*
Assim também acontece com as essencias secun-
darias ; quero d i z e r , pela maior parte ; por exem-
plo* homem- não- se diz de certo homem; nem boi
de certo boi:- nem páo de certo páo>: bem que
qualquer destas coisas se possa chamar proprieda-
de de alguém. Destas he pois claro que nôo são
relativas. Mas ha algumas outras essencias secun-
darias , sobre as quaes pode haver d u v i d a ; como
por e x e m p l o : a cabeça diz-se cabeça de alguém :
a mão diz-se mão de a l g u é m : e assim de cada
huma das outras coisas semelhantes: de modo q u e
estas com razão podem parecer ser do numero dós
relativos. S e pois a definição que se tem dado de
relativo he acertada , he muito difficil, ou im pose
s i v e i o. demonstrar, que nenhum» essencia lia do*
23

numere dor relativos. Mas se aquella definição nã«


he exacta: e se são relativas aqivellas coisas de que
se verifica ser o mesmo existirem * que existirem
de algum modo a respeito de outra alguma coisa ;
então poder-se-ha talvez dizer que ha coisas coi>
relacas destas essencias. A primeira daquelias de-
iinições sim se verifica em todos os relativos , mas
não he o mesmo serem elles relativos, que serem
de outra coisa , isso que elles são em si mesmos..
De tudo o que fica manifesto , que se alguém
conhecer definitivamente hum relativo , também
conhecerá' definitivamente o seti correlato: e de-
dHz-se claramente do que fica dito , porque se ai*
guem conhece que huma,determinada coisa he do
«umero dos relativos: como ser relativo he ser de
.certo modo a respeitd de outra alguma coisa; se-
gue-se que elle também deve conhecer o objecto
correlato a respeito de quern aqiielle relativo he des-
se modo ; porque se ellè não conhece o correlato a
respeite do qual o relativo he desse modo, também
aão conhece que elle lhe he relativo. Isto mesmO se
manifesta i discorrèndo^sé ^or casos particulares*
Por exempío ; se alguém sabe que liuma determi-
nada . coisa* he duplàií também lia de logo saber o
de que he dupla; porique se não conhece nenhu-
ma coisa determinada de que ellá seja dupla ; igno-
ra absolutamente que ella seja dupla. Do mesmo
modo : se alguém sabe que huma coisa he mais
formosa que outra; também por isso mesmo deve
logo saber determinadamente qual seja essa. outra
que lie menos bel-Ja: nem hé de liuma maneira
indeterminadaque elle saberá ser'essa coisa rnait
E ii
'24

hélla do que a o u t f a ; pois que nes^è ésfèo, haVe-


rla supposição , e não sciencia; põfqtte ainda se
•Inão conhece exactamente se he mais formosa do
que a outra: porquanto a ser assim, segfarfcse-hia
não haver coisa pior do que essoutra.
De tudo o que fica manifesto , que se alguém
conhece determinadamente hum relativo , neces-
sariamente conhece também de huma maneira de-
terminada o seu correlato.
Ora a cabeça , a mão, e outras sémelliantes
jCóisas que são essencias , póde-se muito bem co1»
nhecer determinadamente o que ellas são , sem com
tudò se seguir necessariamente , que devamos co-
nhecer os objectos, a que se referem ; porque não
he consequência necessária, que conheçamos de-
terminadamente de quem he a cabeça' ou a mão.
Logo nenhuma destas coisas he do numero dos' re*
lâtivos í E se nenhuma delias he do numero dor
relativos; será verdade dizer que nenhuma essencia
he do numero dos relativos. Mas talvez não he
fácil o demonstra-lo evidentemente, não se tendo
assiduamente meditado. Não deixa comtiKlo de ter
utilidade o questionar sobre cada huirt. destes ob-
jectos em particular.
55. E differe o habito da áffecção em ser mais
diuturno, e mais permanente. Taes são as sciettcias
e as virtudes. Porque a sciencia parece ser do nu-
mero das coisas mais estáveis e menos mudáveis, por
pouca que seja a sciencia adquirida, huma vez que
por doença, ou por outra alguma semelhante can-
sa não tenha acontecido grande transtorno na pes-
soa. Do mesmo modo a virtude, como a Justiça, a
25

Temprança ou qualquel outra semelhante não pare-


cem ser coisas que mudem facilmente , o u que fa-
cilmente variem. Ora chamão-se affecçôes aquellas
que mudão f a c i l m e n t e , e que varião com prompti-
d ã o : taes c o m o , o c a l o r , o frio^ a s a ú d e , a doen-
ç a , e outras semelhantes coisas. Porque o homem
de algum modo está Mibjeito a ellas: e com facili-
dade m u d a , passando de quente a frio , e do esta-
d o de saúde ao de doente : E o mesmo he dos outros
casos. Comtudo poderia alguém dizer que huma áf-
f e c ç ã o que tendo durado muito tempo , se tem con»
v e r t i d o em n a t u r e z a , nem se pôde d e s t r u i r , me-
r e c e o nome de habito. M a s nisto mesmo se mos-
t r a , que o que se quer entender por habito , lie o
q u e he de maior duração e de mais difficil mu-
dança. P o r q u a n t o faltando nós daquellas pessoas
q u e não possuem bastantemente alguma s c i e n c i a ,
n u n c a dizemos que esta seja nellas hum h a b i t o ;
porque humas t e z e s estão em m e l h o r , outras em
pior estado relativamente á mesma sciencia. Por
onde differe a affecção do habito em que a pri-
meira, he fácil de m u d a r : e a segunda he de mais
duração e da mais dificultosa mudança M a s todos
os hábitos são a f f e c ç ô e s , posto que nem todas» as
affecçôes sejão necessariamente hábitos. Porquanto
aquelles que tem algum habito , são em certo mo-
do affectados por elle. Ora de quem está affecta-
do não se pôde d i z e r que tem hum habito.
56. Porque de nenhuma destas coisas se d i z , q u e
alguém está affecrado ; mas sim que tem a f o r ç a
physica ou a impotência de fa?er alguma acção ou
de não soffrerem alguma paixão. Por e x e m p l o QS
26

que se dizem hábeis no pugiladO , ou na carreiraT


não se dizem taes, porque se achem affeetados de
hum certo modo , mas porque tem a força physi-.
ca de fazerem certas coisas facilmente. Os que se
dizem sadios, dizenvse taes porque tem a força
physica de não soffrerem facilmente dos acasos que
attacão a saúde: E enfermiços os que são dotados
da impotência para resistirem a esses mesmos.aca-
sos. Semelhantemente a estas expressões se verifi*
ca com at de duro e de brando ; que. se chama
duro , porque tem a força de se não partir facil-
mente: e brando , porque he dotado de impoteiic
cia para lhe acontecer outro tanto.
Taes são por exemplo a doçura o amar-
g o b travo , e outras coisas do mesmo genero. E
assim também o calor e o f r i o : a brancura, e a
negridão. Serem todas estas coisas qualidades, he
evidente; pórque por ellas he que se determina;
de que qualidade são os objectos^ que delias são
susfceptiveis. Por exemplo: o mel por isso que en>-
tra na sua natureza a doçura, he que; se chama
-doce : e hum determinado corpo por isso se diz
branco, porque nelle se verifica a brancura. O
mesmo .acontece com todas as outras expressões. ••
A s qualidades dizem-se passivas, não porque
os objectos, em que ellas se yerificão, padeção al-
guma coisa; porque ao mel não se lhe chama do*
c e , porqúe padece alguma coisa: e assim nos ou>
tros semelhantes.: como também o calor e a frial-
dade se dizem qualidades passivas, não porque as
substancias , em que aquellas qualidades se encon»-
trão » padeção alguma coisa: mas. porque .segundo
27
as sensações que cada qual daquellas qualidades
produz he causa de huma paixão. Pois que a do-
çuia produz huma paixão no gossto : e a frialda*
de, no lacto : e assim das demais. Quanto á bran-
cura , á negridão , e ás outras cores , sim se cha-
mão também qualidades passivas , mas não pela
mesma razão das de que acabamos de faltar; mas
porque derivão de huma paixão. Que ha muitas
mudanças de côr que derivão de alguma paixão,
he coisa evidente; pois que o homem que se en-
vergonha se torna vermelho: e amarello , o que
se toma de medo: e assim nos demais casos seme-
lhantes. De maneira que todas as vezes que al-
guém houver experimentado alguma destas pai-
xões, por ser isso próprio da sua natureza; tam-
bém se pode concluir com toda a probabilidade ,
que tomou aquella mesma Côr. Porque hé de no-
t a r , que a affecção ha pouco observada -no corpo
por. occasião "do pejo , também pode verificar-se
por edfeito da constituição physiea: e por isso pô-
de também resultar a mesma côr , em consequen*
cia da natureza: do stibjeito. .
Todos os symptomas pois que assim com© os
mencionados, tirão a sua origem de alguma pai-
xão durável ou menos subseita a variar , chamão-
sfc qualidades passivas, quer seja péla própria natu*
reza das coisas tal como a negridão ) por isso que
as coisas se dizem taes relativamente a ellas; quer
seja porque em consequência de huma loirgá en-
fermidade , ou por huma queimadura, sobreveio
ao subjeito a pallidez ,; ou negridão, de modò que
oil não mudão facilmente, ©utalvez durão poi toda
28

a v,tda; pois também nestes casos se chamão qua-


lidades ; por isâo que também relativamente a èllas
se denominão taes os objectos, iMás os que deri-
vão de paixões que facilmente se desvanecem , e
com promptidão se mudão; não se chamão quali-
dades , mas paixões; pois que nunca os objectos
se dizem ser taes relativamente a ellas, Assim do
homem que por effeito do pejo se fez vérmelho ,
nãQ dizemos que he vermelho: nem daquelle que
se tornou-pallido por medo, dizemos que he pal-
lido ; mas sómente dizemos , que experimentarão
certa paixão E portanto são aquellas paixões, e
mão qualidade. Semelhantemente no que respeita
á alma, humas se chamão paixões e outras quali-
dades passivas. Porquanto aquellas que logo na sua
origem sé achar , terem derivado de paixões, que
difficilmènte varião ; chamão-se qualidades; taes
como a alienação mental: a cólera: e outras seme-
lhantes ; pois que relativamente a ellas se dizem
os homens coléricos , maníacos. E do mesmo mo-,
do nas demais desordens que se affastão cia huma-
na natureza , mas que de tal modo derivão de
outros symptomas , que ou são mui difficeis 'de
mudarem , ou são absolutamente inamovíveis; pois
todas ellas se chamão qualidades, 4 por isso que con-
formemente a ellas se dizem os homens taes.' Aquel-
las porém que derivão de symptomas que -fácil e
brevemente mudão ; chamão se paixões : como quan-
do alguém exprimentando hum dissabor , se inco-
lerisa; porque em tal caso não se diz que elle he
colérico por Se ter incolerisado durante aquella pai-
xão ; mas atites se diz » que elle padeceu alguma
29
coisa. Assim todas estas coisas se chamão paixões
e não qualidades.
. 58. Isto çomprehende as linhas e superfícies re-
ctas ou curvas , e tudo o que a essas formas se
assemelha. Porque a todos e a cada hum destes
respeitos se dizem as coisas taes. Assim o ser
triangular, ou quadrangular , he ser tal: E do
mesmo modo* o ser recto 011 o ser curvo , cada
hum segundo a sua respectiva figura , se diz tal.
Porventura parecerá que o denso , e o raro :
o liso , e o áspero entrão no numero, das qualida-
des. Mas a«*mim parece-me, que estas expressões
designão coisas, alheias da rubrica da qualidade ;
pois he manifesto que qualquer delias denota mais
depressa huma certa disposição de partes. Por-
quanto denso denota que as partes estão' conche-
gadas : raro , que estão distantes humas das ou-
tras: liso , que estão todas em hum mesmo pla-
n o : e áspero , que humas estão mais a l t a s , e ou-
tras mais baixas. »
Também parecerá talvez h a v e r mais alguma
outra especie de qualidade, Mas as que ordinaria-
m e n t e assim se denominão , são estas. .
59. Por e x e m p l o ; de b r a n c u r a , branco* de litte-
ratura v l e t r a : de justiça , j usto: e assim nos demais.
60. Por exemplo : tratando-se de alguém , que
possue a habilidade do pugilado o u , da carreira ;
não existe qualidade n e n h u m a , donde» elle derive
competente nome , porque aquellas habilidades
não tem n o m e s , conforme aòs q u a e s , o que as
possue, se diga t a l , do mesmo modo que se cha-
ma athletica a sciencia do athleta e cursoria a do
F
30

corsador: e conforme a aquellas denominações sft


chamão taes aos que possuem semelhantes scienciask
Algumas vezes porém tendo nome a qualida-
de , nem por isso se denota cognominadamente o
subjeito que a possue.
61. Por exemplo: Garbo diz-se daquelles, que
tem maneiras nobres e engraçadas ; mas não ha
expressão cognominada para denotar jo subjeito em
quem se verifica semelhante qualidade. isto
acontece em mui poucos casos. Assim, chamão-se
taes todas as coisas, que por cognominação de-
rivão seus nomes dos de alguma qualidade. ,
62. Por exemplo: a justiça he contraria á in-
justiça: a brancura ájiegridão ; e assim as demais.
Bem como são contrarias entre si as coisas em que
se verificão essas qualidades; por exemplo justo a
respeito do injusto: e branco a respeito de preto.
63. Porque o purpureo, a amarello e a quaes*
quer cores como estas, nada he contrario.
64. Isto sa conhece claramente discorrendo-se
por càcla huma das outras categorias. Porque se
a justiça he contraria á injustiça, e a justiça he
qualidade; também será qualidade a injustiça. Por*
quanto nenhuma das outras , categorias quadra á
injustiça ; a saber: nem quantidade , nem relação
nem lugar , nem nenhuma outra , senão qualidade.
O mesmo se verifica em todos os outros contrá-
rios relativamente ás qualidades.
65. Porque de duas coisas brancas se diz ser hu-
ma mais ou menos branca de que outra: de duas
acções justas diz-se ser huma mais ou menos jus-
ta do que a. outra. El até mesmo cada huma dei-
31
las de per si he susceptível de augmento. Porque
huma que he branca , pôde v i r a ser mais branca.
66. Porquanto não faltará quem duvide que se
possa dizer que huma justiça o he roais ou menos
do que o u t r a ; 011 huma saúde maior ou menor
que outra. He v e r d a d e , que se diz , que hum tem
mais ou menos justiça., roais ou menos saúde do
que otitro ! : e semelhantemente de todas as demais
affecçôes. M a s o que daqui se segue he , que i n -
dubitavelmente se pôde applicar o mais ou menos
às coisas que são susceptiveis daquellas qualidades:
como se diz , que hum he mais g r a m m a t i c o , mais
justo ou mais sadio de que outro. E assim nos de-
mais casos semelhantes. M a s hum triangulo ou
hum quadrilátero , ou qualquer outra figura não
parece serem susceptiveis de mais nem de m e n o s ;
porque todas as coisas, a que he applicavel o no-
me de triangulo ou a de circulo são igualmente
triângulos ou círculos I bem como duas coisas, a
que não he applicavel a mesma expressão , não
se pôde chamar huma mais do que a o u t r a ; por-
que hum quadrilátero não he mais circulo do que
hum o v a l ; por isso mesmo que a nenhum delles
he applicavel a expressão de circulo. E m g e r a l ,
todas as v e z e s que a nenhuma das duas coisas he
applicaVel huma expressão , nenhuma delias h e
mais do que a outra , o que essa expressão designa.
Donde se s e g u e , que nem todas as qualidades são
susceptiveis de mais o u de menos.
67." Porque ser semelhante ou desemelhanté a
nada mais se refere do que a aquillo mesmo , em
qtie se verifica a qualidade de que se trata. Por
F ii
32

onde o que viria a ser proprio das q u a l i d a d e s , se-


ria a semelhança ou dessemelhança dos objectos
relativamente a ella.
,68. Porque dissemos, quedos h á b i t o s , e as affec-
çoes pertericião aos relativos^Perquanto a sciencia
tomada em g e r a i , isso que he , he o de alguma-
outra coisa ; porque ha de ser a sciencia de algu-
ma coisaPMàs tomada em particular / então isso
que h e , não o he de outra nenhuma toisa. Por
e x e m p l o : a Grammatica tomada individualmente
não se diz Grammatica de alguma c o i s a ; nem a
Musica , Musica de alguma coisa? Tomadas porém
genericamente , ' então pertencem também aos re-
lativos I por exemplo: a Grammatica diz se nesse
caso sciencia de alguma coisa ; mas não Gramma-
tica de alguma coisa: e a Musica , sciencia de
alguma coisa ; mas não M ú s k a v d é alguma coisa :
6 portanto individualmente não são relativas. E
segundo cada huma delias ém particular he que.
nós nos dizemos taes , por isso- que só as possuímos
em particular. Assim nos dizemos sábios | porque
possuímos'algumas das seiencias em particular. E,
portanto* ejlas só são qualidades tomadas em par-
t i c u l a r , e porque só conforme a ellas tomadas em
particular he que nós nos dizemos taes. M a s en-
tão não são relativas.
J 69. Porque aquecer he» contrario de r e s f r i a r : e
ter calor he contrario de ter f r i o : E estar satis>
f e i t o he contrario de estar triste. Pelo que são sus-
ceptíveis de contrariedade. Quanto acerem susce-
ptíveis de mais e de menos , se vê ; porque tanto-
a q u e c e r , como refriar , como entristece r-se são su-
33

ceptiveis de mais mais e de menos.-Donde se se-


gue , que tanto a a c ç ã o , como a paixão , são susce-
ptíveis de mais e de menos. E lie o qúe bastará a
este respeito. Quanto aos estados, fica d i t o , quan-
do se tratou cios relativos , que elles derivão por
cognominação das situações". E quanto às demais
( isto Ue : ao tempo , ao I n g a r , e ás acções per-
manentes) são pontos tão fáceis de si mesmos, que
não diremos mais nada sobre e l l a s , do que o que
ao principio fica e x p o s t o : que a acção permanen-
te lie como ca/çar-se , armar-se : O lugar he co-
mo : no Lyceo , na Praça. E assim do mais que
sobre cada huma delias fica dito. Pelo que bastará o
que tetemòs ^observado sobre cada liuma das espe-
c i e s , que ficão mencionadas.
' 70. Com exemplos explicaremos o como são es-
tas opposíções. Os relativos são oppostos, como por
e x e m p l o : o duplo á sua metade. Os contrários op-
poem-se ; como por exemplo : o mao ao loní. A e f -
fectividade á p r i v a ç ã o , como por exemplo: a ce-
gueira e a vista. E quanto á affirmação e nega-
ção i como por exemplo : está sentada, ri/ão e-std
sentado.
71. Exemplo ; o duplo de qualquer quantidade,
que he metade delia , o que lie diz-se de outra-;
porque ha de ser duplo de alguma outia coisa." E
a sciencia oppòe-se ao sabido na maneira dos rela-
tivos ; porque o que a scienGia he , diz-se daqui ti-
l o que pôde ser sabido ; é o que he sabido affir-
ma-sê p l t à l qual elle lie , do seu contraposto^ a
sciencia ; porque o que he sabido , di/.-re ser c'e al-
guma c o i s a ; isto he :. de alguma fciencia. De
34

do qtie as coisas, que se contrapoem como reíatfc


vos, isso que são , ou o são de seus contrapostos p
ou se affirmão reciprocamente entre si em algu-
ma maneira.
72. Porque nem o que he bom se diz bom do
que he máo ; mas contrario a elle ; nem o que
branco , se diz branco do qué he preto ; mas con-
trario a elle. De sorte que são differentes as c6n-
traposições de humas e outras.
73. Exemplo: a doença e a saúde são qualida-
des próprias do corpo animal: e he forçoso que
huma delias exista no corpo a n i m a l ; ou doença
ou saúde. Par e impar são categorias d e numero:
e he forçoso que o numero seja par ou impar. E m
nenhum destes exemplos ha meio termo : nem en-
tre doença: nem entre par e impar. Porem quan-
to a aquellas, de que não he forçoso que exista
huma delias , essas tem termo médio. Por exem-
p l o : he proprio do corpo animal o ser preto ou
branco; mas não he forçoso o ser huma ou outra
destas duas coisas ; porque nem todos os corpos
São brancos ou pretos. Bom e máo dizem-se do
homem, assim como de muitas outras coisas; mas
não he forçoso , que huma daquellas duas quali-
dades exista ; porque essas coisas, de que se dizem *
nem todas são boas ( ou más. Em todos estes ca-
sos ha hum termo médio; por exemplo: entre pre-
to e branco ha fusco , pallido, e todas as outras
cores. Entre bom e máo , o que nem he b o m ,
nem máo.
74.Porexemplo: entre o preto e o branco he
o fusco , o pallido , e todas as demais cores.
35
75. Por exemplo: o que nem he bom , nem máo&:
que nâo he justo nem. injusto, f
76. Por exemplo : a vista e a cegueira referem»
fe se ambas aos olhos. E em geral: do objecto , on-
de Costuma verificar-se a effectividade , he que se
pôde affirmar ou esta ou a privação.
77. Por exemplo : chamamos desdentado , não
'' ao que não tem dentes; e cego , não ao que não
vê ; mas sim ao que costumando ter huma ou cutt&
destas duas coisas, lhe falta no caso de que se tra-
ta. Porquanto ha muitas coisas que per sua na-
tureza não são dotadas de vista nem de dentes:
/ - e nem por isso se dizem cegas, nem desdentadas;
X 78. Porque a Vista he effectividade: a cegueira
' he privação. Mas o ter vista não he vista : nem o
ser Cego V cegueira. Porquanto a cegueira he hu-
naa privação : e o estar cego*^ he estar privado,
mas não lie a privação/ Porque se cegueira fosse
o mesmo que ser cego, ambas estas expressões se
poderião ujsar indifferentemente em qualquer dado
caso. Mas dè hum homem diz-se ser cego ; e não
/VKse diz cegueira. "
79. Do mesmo modo que a cegueira se oppóe á visi-
t a ; desse mesmo o ser cego se oppõe a ter vista.
- 80. Porque a affirmação he hum discurso affir*
1 mativo: e a negação hè hum discurso negativo»

Mas aquillo sobre que recahe a affirmação ou a


negação, não he discurso , he hum facto;|Comtu*
do diz*se que estes factos se oppoem entre si»
assim como a affirmação e a negação; porque tam-
bém aqui se verifica, que o modo da opposição
he o mesmo. Absim como a affirmação se opjpõe á
36

negação por exemplo : estár sentado se opp5e


à não estar s e n t a d o : do mesmo modo se oppõe
o estar alguma determinada pessoa sentada a não
estar sentada,
81. Porque a vista não lie vista de cegueira $
nem delia se diz em alguma outra maneira. Do
mesmo modo a cegueira não se diz cegueira da
vista ; mas privação da vista. Além disso os relati-
vos são todos recíprocos entre si: de maneira que
se a cegueira pertencesse aos relativos, seria re-
ciproco daquillo a que se referisse: ora ella não
he reciproca ; porque se não diz da vista , que he
vista de cegueira.
82. Porque naquelles contrários, qtíe não tpm
t e r m o , : he forçoso', que nos casos , em que elles
se 'costumão verificar^ exista hum delles; pois dis-
semos que não dia meio térmo , quando he forço-
s o , que huma das duas coisas se verifique no obje-
cto respectivo ; como por e x e m p l o : a saúde, e a
doénça ; par e impar. Daquellas coiias porém que
admittem meio t e r m o , não lie .forçoso , que algu-
ma delias se verifique em cada lium dos casos, em"
que podem ter lugar. Por e x e m p l o ; não lie forço-
so que seja branco ou preto hum objecto que pô-
de aduiittir qualquer destas coisas: nem, que hum
corpo seja quente ou frio,; porque nada obsta
a que estas coisas tenhão hum meio termo: Por
outra parte dissemos, que tem meio termo aquel-
las coisas , das quaes não he forçoso que huma
delias se verifique no caso em que podem ter lu-
gar. Já se vê que se não falia aqui dos objectos
que por sua natureza só admittem huma dessas
37

coisas; como do fogo o ser quente: e da neve


o ser branca; porque nesses objectos lie forçoso
que se verifique liuma das duas coisas determina-
damente : e não qualquer delias; pois nem o fogo
pôde ser f r i o , nem a neve preta. Por onde nestes
casos não he forçoso, que o objecto, em que huma
das duas coisas, de que se trata , pôde ter lugar
tenha qualquer delias ; mas somente aquella, de
que por sua natureza he susceptível.
Ora na eíFectividade , bem como na privação»
n a d a d o que fica d i t o , se pôde verificar; porque
daquellas coisas, a que por natureza não compete,
o terem vista jamais se pôde dizer que estão c e g o s ,
nem que tenhão vista.
83. Porque he forçoso que em todo o objecto
susceptível tanto da effectividade , como da priva-
ção , se verifique huma delias. Por exemplo : con-
petindo-lhe por natureza o ter vista; dir-se-hadel-
ia que está .cego , ou que vê : mas não determi-
nadamente huma das duas coisas , porém qualquet
delias; pois não he forçoso que v e j a , nem que
esteja c e g o : sendo como he susceptível dè qual-
quer das duas coisas. Ora dos contrários que admit-
tem meio termo , ja vimos não ser forçoso que liúm
delles se verifique em todos os casos, èm que po-
dem ter lugar ; mas somente em alguns: e nesses;
só e determinadamente hum dos dois contrários;
e não qualquer clelles. Por onde he manifesto que
por nenhum dos modos se oppõe entre s i , como;
os contrários, aquellas coisas que são oppostas co-
mo effectividade e privação.
A l é m disso he proprio dos contrários, que
G
38

dado o suhjeito , este he susceptível de mudar de


hum delles para o outro. Não se falia dos casos
em que por sua natureza o subjeito e o contrario
são huma e a mesma cousa; como o fogo sei
quente. Mas nos demais casos bem se vê por exem*
p i o , que quem está bom , pôde adoecer: que o
que he branco, pôde passar a ser preto: que o
que está f r i o , pôde tornar-se quente: que ò que
he virtuoso se pôde tornar vicioso : e vicioso o que
he virtuoso. Porque o vicioso, huma vez que elle
se applique a melhores praticas e discursos, não
pôde deixar de fazer algum progresso , ainda que
seja pouco , para se tornar melhor: e huma vez que
ellè avança , ainda que seja pouco , he evidente , que
ou mudará completamente , ou virá, a fazer gran-
des progressos; pois que se vai tornando cada vez
mais disposto para a virtude, qualquer que seja
© progresso que de principio tiver feito ; donde
com razão se espera que os fará ainda maiores: e
á medida que isto acontecer , se transformará com
inteira t completa mudança" para o habito con-
trario.
Ora entre a privação e a effectividade não
pôde dar-se reciprocidade de mudança de huma
para a outra; porque da effectividade para a pri-
vação, sim pôde havella: mas da privação para a
effectividade he impossível. Por quanto nem huma
pessoa que cegou de todo torna a cobrar a vista:
«tem hum a quem radicalmente cahirão os cabei-
los, lhe tornão a nascer: nem hum que perdeu de
todo os dentes, os torna a recobrar. *
^ 84, Exemplo. A saúde ç a doença são contra-
39
rias entre s i ; mas nenhuma delias he verdadeirt
nem falsa. Do mesmo modo o duplo e a sua meta-
de são oppostos em raí.ão de relativos; mas tam-
bém nenhum delles he verdadeiro nem falso: e as*
sim também as cousas que se comprehendem nas
rubricas de eftectividade ou de privação : como a
vista e a cegueira: ou em geral toda e qualquer
expressão desligada ; pois em todas ellas se verifica *
que nem são verdadeiras, nem falsas: lio qual
cabo estão todas as mencionadas; porque todas el-
las são desligadas. Com tudo poderia parecer que
com mais razão ainda se poderia dizer isso das
expressões ligadas e entre si contrarias; por quanto i
Sócrates está bani lie contrario a Sócrates está
doente: e também não he forçoso que destas e x -
pressões huma seja verdadeira e a outra falsa.. Exis-
tindo Sócrates sim he forçoso que huma delias
seja verdadeira, e a outra falsa. Mas não existiu-'
do elle , ambas são falsas, porque tão falso he
estar Socratas bom como o estar d o e n t e , quando
elle absolutamente nem existe. Quanto aos casos
de effectividade ou de privação, não e&fetindo O
subjeito nenhum delles he verdadeiro ; e existindo,
não se s e g u e , que hum deva ser verdadeiro e õ'
Outro falso: por e x e m p l o : ter vista e êstar cego
são entre si oppostos, em razão de effectividade 6
p r i v a ç ã o ; porque ter Sócrates vista e.sef Sócrates
C e g o , são cousas entre si oppostas, como effecti-
vidade e privação : e não he forçoso que huma
seja verdadeira e a outra falsa: quando natural*
mente nelle ainda se não podia verificar nenhuma?
delias | ambas erão falsas: e quando elle absoluta-
G ii
40

ãierite não exista; tão falso lie dizer-seque v e t


como que he cego.
Mas quanto a affirmação e negação » forçosa-
mente ha de huma ser verdadeira e a outra falsa,
quer o subjeito exista, quer não. Por quanto es-
tar Sócrates doente e não estar doente são expres-
sões, das quaes, existindo elle , huma he eviden-
temente verdadeira e a outra falsa: e não exis-
tindo , he falso o estar doente; e he verdade não
estar doente.
De modo que são estes casos de affirmação e
negação os únicos oppostos , de que he proprio que
hum delles; ha de ser forçosamente Verdadeiro ou
falso.
85. Isto se faz manifesto pela inducção de ca-
sos particulares; como: a doença á saúde : a in-
justiça á justiça: semelhantemente a covardia ao
v a l o r : e assim nos demais casos.
86. Porque á penúria , que he hum m a l , he
contraria a superfluidade, que he outro mal; e a
ambas he contraria a mediania * que he hum bem.
87. Porque se todo o mundo lograsse saúde; ha*
veria saúde; e não haveria doenças. Do mesmo modo
se todas as cousas fossem brancas; existiria bran-
cura: e não haveria negridão. Além disso se o e$tar
Sócrates bom he contrario a estar Sócrates doente,
e não tem lugar que nelle se verifiquem ao mes-
mo tempo ambas as cousas; já se vê que não se
segue de existir hum contrario , que deva também
existir o outro ; pois que verificando-se estar Sócra-
tes bom , não tem lugar o estar elle mesmo doente.
88. Porque tanto a doença como a saúde veri*
41
ficj&o-se no corpo animal: a brancura é a negri-
dão no corpo em.geral; e a justiça bem como a
injustiça na alma do homem.
89. Porque. Branco e Preto comprehendem-se
em hum mesmo genero , que he a côr. A justiça
e injustiça comprehendem-se em generos contrá-
rios ; porque o genero de huma he a Virtude: e o
da outra he o Vicio. E Bom e Máo não se com-
prebendem em nenhum genero; mas antes elles
he que são generos , em que putras expressões se
comprehendem.
90. Hè neste sentido que huma cousa se diz
mais velha ou mais antiga do que outra; por isso
que ha mais tempo decorrido.
91. Exemplo: hum he primeiro que dois: por-
q u e , dado, que existem duas cousas , segue-se que
existe huma ; mas de existir huma não se segue , que
existão duas. De modo que não ha reciprocidade,
para que da existencia de hum se possa concluir a
do outro. Neste caso parece ser primeiro aquelle
em quem se não verifica a reciprocidade.
92. Como acontece com as Sciencias e Discur-
sos ; porque r is Sciencias demonstrativas ha cou-
sas que na. ordem devem ser primeiras e outras
que devem vir depois. Porque os princípios são
primeiro do que as proposições: e na Grammati-
co , as letras'são primeiro do q[ue as syllabas. Do
mesmo modo nos discursos ; porque o exordio he
na ordem primeiro do que a narração.
93. Porque os homens costumão dizer que são
primeiros aquelles que entre elles são mais honra-
dos e bem queridos; se bem que esta espesie he
42

de todas a mais heterogenea. Mas nestas se com*


prehendem os differentes - sentidos da palavra pri-
meiro.
-94. Haver algumas cousas taes, he evidente ;
porque o ser homem he intrinsecamente reciproco
de existir; sendo assim que esta segunda se segue
verdadeira e necessariamente da primeira ; pof
quanto se he verdade o dizer-se de algusm , que
he homem ; ta ai bem lie verdade o dizer-se; que
existe: e reciprocamente se he verdade o dizer-se
de hum homem , que elle existe; também he ver-
dade dizer-se que he homem. Mas ser verdadeiro
o discurso não he causa do facto que nelle se af-
íirnja: antes o facto he causa de ser o discurso
verdadeiro ou falso.
95. Exemplo: o duplo e a sua metade, que
são reciprocos entre s i ; pois que se existe o du-
plo , deve existir a metade :' e se existe a metade ,
deve existir o duplo: e com tudo nenhum delles
lie causa da existencia do Outro.
Também se dizem connexas por natureza a i
cousas que pertencem ao mesmo genero; posto
que se distingão e se opponhão liu-mas ás outras.
Mas diz-se , que se distinguem e se oppoem as que
se comprehendem em hiiura mesma rubrica; assim
como alado se distingue e contrapõe a terrestre e a
aquatico; porque entre tanto que pertencem a hum
mesmo genero, se distingue e contrapõe : por quan-
to Animal se distinguem em todas aquellas espe*
cies a saber: em alados, em terrestres , e em aquá-
ticos: dos quaes nenhum he anterior nem poste-
rior ao outro: mas todos elles parecem ser simul-
43

taneos. Igualmente se poderia subdividir cada hum


destès em outras especies. Donde se segue <)ue são
também connexas aquellas cousas; que tem hum get
nero commum e encrão era huma mesma rubrica.
Ora os generos em tanto se dizem anteriores
ás suas respectivas especies em quanto a reciproci*
dade què ha destas paia elles , quanto á conclusão
da existencia, se não verifica delles para ellas.;
porque de existir hum a q u a t i l , segue-se que existe
hum a n i m a l ; mas de existir hum a n i m a l , não se
segue que existe hum aquatil.
Logo também são uaturalmente connexas as
cousas que sem ser huma causa de existência cia
o u t r a , tem entre si reciprocidade quanto à con-
clusão'da existencia : Bem como as que pertencendo
ao mesmo genero , são especies distinctas: e era
geral são connexas todas as cousas que por sua
natureza começão a existir ao mesmo tempo. ,
96. He 5claro que todas estas especies difrer.em
humas das outras, por quanto a geração não he
corrupção: nem o augiíiento he diminuição, ou
mudança de l u g a r : e o mesmo he das outras.
Q u a n t o porém á transformação pôde entrar
em d u v i d a , se o que se transforma não experi-
menta alguma das outras especies de movimento
no acto da transformação. Mas seria erro o affir-
m a l l o ; porque a experiencia nos mostra que todas
ou a maior parte das nossas paixões se transfor-
mão humas nas outras , sem que se verifique ne*
nhuma das outras especies de movimento. Porque
aquelle que experimenta o movimento de qual-
quer paixão ,, nem por isso cresce ou dixuinue: e
44
o mesmo se pôde dizer das oneras especies de mo-
vimentos. He logo a transformação hum movimen-
to differente dos o u t r o s ; porque se fosse idêntica
com alguma das outras especies, seria forçoso
que aquelle que se t r a n s f o r m a , augmentasse oil
diminuísse, ou experimentasse alguma das outras
especie? de movimentos: o que não he assim.
D o mesmo modo seria forçoso que aquelle que
c r e s c e , se transformasse: entre tanto que muitas
cousas crescem , sem se transformarem ; como por
exemplo : se a hum quadrilátero se lhe accrescen-
ta hum gnomon , fica augmentado mas não trans-
formado : e assim nos demais casos semelhantes.
Donde se v ê que as mencionadas especies de m o -
vimentos são todas differentes humas das outras.
Em geral o contrario do movimento he a quie-
tação. Mas cada huma das especies mencionadas
tem seu . contrario participar. Assim o contrario
da geração he a corrupção?: o do augmento he a
d i m i n u i ç ã o : e o da, mudança de lugar he a quie-
tação no ihesmo lugar ; posto que pareceria de-
ver-se dizer que também e com mais propriedade
o he o movimento para a parte contraria: como
por exemplo ao de ascensb o de descenso, e ao
de descenso o de ascenso. Mas a outra especie de
movimento ( a transformação) não he fácil assignar-
se o que lhe possa ser c o n t r a r i o : e até parece que
nem o pôde h a v e r : a menos que alguém lhe não
contrapozesse a cessação da respectiva qualidade,
ou a mudança para a qualidade c o n t r a r i a : bem
como á mudança de lugar se contrapôz a quieta-
ção no mesmo l u g a r , ou o movimento para a par-
te contraria; visto q u e a transformação he huma
mudança t de qualidades. De modo que5 viria a se*
o contrario ao movimento- ou mtidança das quali-
dades, tanto, a quietação ou permanfeiicia deflas %
como o movimento^ ou mudança para as qualida-
des , ;o ser preto a
ser branco; porque se transforma mediante a mu-
dança para liiima qualidade concitaria.
97.Porque.dizemos que temos (ou possuímos},
tal scienci'^ ou^tal^virtude. ; ,
98. Eitémpio:.'; o que tem *hiYÀia certa gran-
deza; como quando se diz' ser detres ou de^ qua-
tro covados.
99. Como de hum vestido: de huma túnica
100.Comodehum annel,
101. Çomo dar mão, do pé.
102. Como: a medida a respeito de trigo: o
^Vasò a respeito dó: vinho ; porque da medida se
^ i z que tem^trigo: e do vaso, que tem vipho.
^ 103. Porque, dizemos ter huma,casag ou hum
campo. 'Também7 se diz de hum homem que elle
tem huma mulher: e dè liuma mulher, qué ella
tem'hum homem: caso este que parece Jpffereeer*
• hum sentido muitO^ differente da palavra ter , do
fjtíe Os que ficfio referidos; porqfue aqui nsão signi-
fica serão cohabitar.

F IM.
ERRATAS.

P R I M E I R A P A R T E .

vV Emendas*
A D V . V,.mas também como também /

tornarião tornaria ' ^


& objecto ( a ) objecto
objecto ( a ) '
6. objectb
m falsa falsa £ 1 4 )
nellas
p
nelles
w
1 especies essências ;
R 42. r mudarem ( $ 9 ) mudaram
# 64^ quaes taes ^ i
1/
Todos 04 números que indicai) Notas 9. desde Ç14)
até se devem attgmeniar dè huma ^unidade: pondo*
:se jtl5), em vez rft? ( 1 4 ) 2 £ 1 6 ) 5 em vez, de 0 0 :
Jim pur diante até (38) , em vet, do qual se deve escre-
ver 13apàgaridó-si este numero no §. 41 ^ onde sc
ach# erradamente»

S E G U N D A P A R T E ,

4* boi corrô homem córie


m
rocio Lycéo /
t-
19- dizendo p dízendo-se fi
29. Synqnynios j Unívocos
Jiicí espécies: as -especies.
% J í V serem . ser v,

'' Todos os numetos dos §§. desde 1 4 até $8 t e desde 69


até ao ultimo 10 yfse devem aúgmeníár de lutma unidade;
porque faltou o §. que devia ser o 1 4 V i e he, o s^e-

14. E x e m p l o : H o m e m , ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ ^ f í p d e i ^ ; 4
O» numero- devesse' apagar na pagina nona 9 onde
v
se acha erradamente* - H§ /
Também deve apagar' o número ^Çl *na paginà utv
decima, pondo^o*p}^ pagina\Ícgáinte ^nde por erro está 42.
O §. 54 que não çstá marendo 9?he o que começa; Por-
cjtie na pagina 22» o §. 69 começa na palavra Por quan-
to * que se acha na quinta regra da pagina } 2*
§* 16 falta > depois da palavra Animal % o seguinte*
E R R A T A S .

E por tanto he Categoria do objecto , não Só^quaQto ao


nome , mas também quanto á fazão do nome.
No 19 jWtaJ) depois da palavra getàl o Seguinte.
Além disso as essencias primarias não se dizem principal»
mente essencias , se não porquê são objectos de todas*
as outras cousas: e todas as outras , cousas , são Catego*
r , • o
rias, em que ellas se contem.
Ho §• J7 Jeito 9 depois da palavra semelhante o se~
guintc : Excepto se alguém disser , que ítouito he coh~
trario a powco , e grande a pequeno. Mas ás quantidades-
determinadas nada he contrario.-
No §• 41 devc-se apagar este numero, e pôr em seu
lugar o principio 9 que falta 9 e he o seguinte. A l é m dis-
so ha humas#qualidades , que admittem situação: e ou-
tras , cujas partes não são susceptiveis delle* Exem-
plo 3 etCr

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