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5ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS DA

BAHIA

PROCESSO Nº 0004267-62.2014.8.05.0146
CLASSE: RECURSO INOMINADO
RECORRENTE: BANCO HONDA S/A
RECORRIDO: EDVANILSON LIMA MARTINS PAIXAO
JUIZ PROLATOR: VALÉCIUS PASSOS BESERRA
JUIZ RELATOR: ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA

EMENTA

RECURSO INOMINADO. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C


INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. FINANCIAMENTO DE
VEÍCULO. QUITAÇÃO INTEGRAL DO DÉBITO GARANTIDO
POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PERMANÊNCIA INDEVIDA DO
GRAVAME JUNTO AO ÓRGÃO DE TRÂNSITO, EMBARAÇANDO
O USO DA COISA EM SUA PLENITUDE. OFENSA AO DIREITO
DE PROPRIEDADE. DANOS MORAIS CONFIGURADOS.
ARBITRAMENTO DA INDENIZAÇÃO EM VALOR ADEQUADO
AOS FATOS. NÃO PROVIMENTO DO RECURSO.

Dispensado o relatório nos termos do artigo 46 da Lei n.º 9.099/95.

Circunscrevendo a lide e a discussão recursal para efeito de registro,


saliento que a parte Recorrente, BANCO HONDA S/A, pretende a reforma da sentença
lançada nos autos que, considerando indevida a permanência do gravame existente no
veículo, oriundo do contrato de alienação firmado com o Recorrido, EDVANILSON LIMA
MARTINS PAIXAO, condenou-a ao pagamento de indenização por danos morais, no valor
de R$ 4.000,00 (quatro mil reais).

Presentes as condições de admissibilidade do recurso, conheço-o,


apresentando voto com a fundamentação aqui expressa, o qual submeto aos demais
membros desta Egrégia Turma.

VOTO

A sentença recorrida, tendo analisado corretamente todos os aspectos do


litígio, merece confirmação integral, não carecendo, assim, de qualquer reparo ou
complemento dentro dos limites traçados pelas razões recursais, culminando o julgamento do
recurso com a aplicação da regra inserta na parte final do art. 46 da Lei nº 9.099/95, que
exclui a necessidade de emissão de novo conteúdo decisório para a solução da lide, ante a
integração dos próprios e jurídicos fundamentos da sentença guerreada.

A título de ilustração apenas, fomentada pelo amor ao debate e para realçar


o feliz desfecho encontrado para a contenda no primeiro grau, alongo-me na fundamentação
do julgamento, nos seguintes termos:

Os contratos de financiamentos garantidos por alienação fiduciária


encontram disciplina no Decreto-Lei nº 911/69 e no próprio Código Civil, salientando que as
atividades bancárias estão inseridas no conceito de serviço estabelecido no artigo 3º, § 2º, do

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Código de Defesa do Consumidor.

Regulamentando o registro de contratos de financiamento de veículos com


cláusula de alienação fiduciária, arrendamento mercantil, reserva de domínio ou penhor, nos
órgãos ou entidades executivos de trânsito dos Estados e do Distrito Federal e para
lançamento do gravame correspondente no Certificado de Registro de Veículos – CRV, a
Resolução nº 320/09 do CONTRAN1, em seu artigo 9º, preceitua que, no prazo máximo de
10 dias, a instituição credora, após o cumprimento das obrigações por parte do devedor,
providenciará, automática e eletronicamente, a informação da baixa do gravame junto ao
órgão ou entidade de trânsito no qual o veículo estiver registrado e licenciado.

Discutindo-se a prestação defeituosa de serviço, cabia o Recorrente ilidir a


responsabilidade civil objetiva inerente ao próprio risco da atividade econômica, consagrada
no art. 14, caput2, do CDC, que impõe ao fornecedor o ônus de provar causa legal excludente
(§ 3º do art. 143), algo que não se desincumbiu.

Ao contrário, restou provado que, não obstante a quitação do


financiamento do veículo informado, o Recorrente não providenciou a baixa oportuna do
gravame incidente, só o fazendo por determinação judicial através da medida liminar
deferida no MM. Juízo a quo.

A suposta ausência de repasse pelo agente credenciado do valor alusivo a


quitação, na forma cogitada nas razões recursais, não exclui a responsabilidade do
Recorrente, por ser de sua inteira responsabilidade a indicação, ressaltando entre eles a
existência de sistema de cooperação voltado ao lucro para facilitar seus empreendimentos
econômicos, que atrai a solidariedade preconizada no CDC, que iguala todos os que
participam da cadeia empresarial, independentemente do grau de culpa e de atuação na
prestação dos serviços ou oferta de produtos, podendo o consumidor acioná-los conjunta ou
individualmente, nos termos do § único, do art. 7º, do CDC4.

“A simplificação de procedimentos para agilização da atividade


econômica, em prejuízo da segurança, é risco assumido pela empresa para bem exercer sua
atividade de fins lucrativos. Se houve falha nesse procedimento, advindo dano à vítima, esta
não pode ser responsabilizada, mas a própria empresa, que assumiu o risco de sua ocorrência
ao exercer a atividade econômica”. (TAPR – AC 0244359-0 – (209920) – Foz do Iguaçu – 6ª
C.Cív. – Rel. Juiz Luiz Carlos Gabardo – DJPR 20.08.2004).

Logo, nas circunstâncias apuradas, a demora injustificada na liberação do


gravame incidente sobre o veículo, após regular quitação do contrato de financiamento

1
Art. 9º Após o cumprimento das obrigações por parte do devedor, a instituição credora providenciará, automática e
eletronicamente, a informação da baixa do gravame junto ao órgão ou entidade executivo de trânsito no qual o veículo estiver
registrado e licenciado, no prazo máximo de 10 (dez) dias.
§ 1º O crédito a que se refere o presente artigo abrange o principal, juros e comissões, além das taxas, cláusula penal e
correção monetária, quando expressamente convencionados pelas partes.
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Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos
causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou
inadequadas sobre sua fruição e riscos.
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§ 3º. O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:


I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
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Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas
normas de consumo.
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garantido por alienação fiduciária, constituiu negligência da instituição financeira, devendo,
dessa forma, responder pelos danos extrapatrimoniais, presumidamente sofridos, advindos
de sua má conduta obrigacional.

Encontrando previsão no sistema geral de proteção ao consumidor inserto


no art. 6º, inciso VI, do CDC5, com recepção no art. 5º, inciso X6, da Constituição Federal, e
repercussão no art. 186, do Código Civil7, o dano eminentemente moral, sem consequência
patrimonial, não há como ser provado, nem se investiga a respeito do animus do ofensor.
Consistindo em lesão de bem personalíssimo, de caráter subjetivo, satisfaz-se a ordem
jurídica com a demonstração do fato que o ensejou. Ele existe simplesmente pela conduta
ofensiva, sendo dela presumido, tornando prescindível a demonstração do prejuízo concreto.

Com isso, uma vez constatada a conduta lesiva e definida objetivamente


pelo julgador, pela experiência comum, a repercussão negativa na esfera do lesado, surge à
obrigação de reparar o dano moral.

Na situação em análise, o Recorrido não precisava fazer prova da


ocorrência efetiva dos danos morais informados, sobretudo decorrentes do impedindo do
exercício pleno do direito de propriedade. Os danos dessa natureza são presumidos pelos
próprios fatos apurados, os quais, inegavelmente, vulneram sua intangibilidade pessoal,
sujeitando-o ao constrangimento, aborrecimento, grave dissabor e incômodo de não poder
dispor de seu bem, impedindo, inclusive, a transferência da propriedade, pois já tinha
vendido o veículo.

Quanto ao valor da indenização, entendo que, não se distanciando muito


das lições jurisprudenciais, deve ser prestigiado o arbitramento do juiz que atuou no primeiro
grau que, próximo dos fatos, pautado pelo bom senso e atentando para o binômio
razoabilidade e proporcionalidade, respeita o caráter compensatório e inibitório-punitivo da
indenização, que dever trazer reparação indireta ao sofrimento do ofendido e incutir temor
no ofensor para que não dê mais causa a eventos semelhantes.

In casu, entendo que a MM. Juíza a quo respeitou as balizas assinaladas,


tendo fixado indenização em valor adequado aos fatos, não caracterizando, assim,
enriquecimento sem causa do Recorrido, nem provocando abalo financeiro ao Recorrente
face ao seu potencial econômico.

Assim sendo, ante ao exposto, voto no sentido de CONHECER e


NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto, confirmando, consequentemente, todos os
termos da sentença hostilizada, com a condenação do Recorrente ao pagamento das custas e
honorários advocatícios que arbitro em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação
pecuniária imposta, atentando, especialmente, para a natureza, a importância econômica
envolvida na ação, bem como o trabalho do profissional que defendeu os interesses da parte
Recorrida.
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Art. 6º. São direitos básicos do consumidor:


...
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
...
6

“São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano
material ou moral decorrente de sua violação”.

7
“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
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Salvador-Ba, Sala das Sessões, 14 de julho de 2015.

Rosalvo Augusto Vieira da Silva


Juiz Relator

COJE – COORDENAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS


TURMAS RECURSAIS CÍVEIS E CRIMINAIS

PROCESSO Nº 0004267-62.2014.8.05.0146
CLASSE: RECURSO INOMINADO
RECORRENTE: BANCO HONDA S/A
RECORRIDO: EDVANILSON LIMA MARTINS PAIXAO
JUIZ PROLATOR: VALÉCIUS PASSOS BESERRA
JUIZ RELATOR: ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA

EMENTA

RECURSO INOMINADO. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C


INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. FINANCIAMENTO DE
VEÍCULO. QUITAÇÃO INTEGRAL DO DÉBITO GARANTIDO
POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PERMANÊNCIA INDEVIDA DO
GRAVAME JUNTO AO ÓRGÃO DE TRÂNSITO, EMBARAÇANDO
O USO DA COISA EM SUA PLENITUDE. OFENSA AO DIREITO
DE PROPRIEDADE. DANOS MORAIS CONFIGURADOS.
ARBITRAMENTO DA INDENIZAÇÃO EM VALOR ADEQUADO
AOS FATOS. NÃO PROVIMENTO DO RECURSO.

ACÓRDÃO

Realizado julgamento do Recurso do processo acima epigrafado, a


QUINTA TURMA, composta dos Juízes de Direito, EDSON PEREIRA FILHO, ROSALVO
AUGUSTO VIEIRA DA SILVA e ELIENE SIMONE SILVA OLIVEIRA decidiu, à
unanimidade de votos, CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto,
confirmando, consequentemente, todos os termos da sentença hostilizada, com a
condenação do Recorrente ao pagamento das custas e honorários advocatícios que
arbitro em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação pecuniária imposta,
atentando, especialmente, para a natureza, a importância econômica envolvida na
ação, bem como o trabalho do profissional que defendeu os interesses da parte
Recorrida.

Salvador, Sala das Sessões, 14 de julho de 2015.

JUIZ EDSON PEREIRA FILHO


Presidente

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JUIZ ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA
Relator

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