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Guia de

Cardiologia
para Estudantes de Graduação

Vol. I
Prefácio
Em pouco mais de uma década de existência, a Liga Universitária de Cardiologia e Cirurgia
Cardiovascular do Amazonas – LUCAV-AM vem trabalhando incansavelmente para o aprimoramento
do conhecimento do médico em formação na bela e vasta área que é a medicina cardiovascular.
Além disso, em cada um de nós, membros efetivos e egressos, existe uma preocupação em
especial com o exercício da boa medicina, que apesar de ser estudada e debatida em forma separada,
não se divide em tópicos quando apresentada ao jovem médico.
Estes guias surgem da necessidade de um material acessível, objetivo e confiável para o
estudante de medicina. Não substitui, de forma alguma, o conhecimento contido nos grandes e
consagrados tratados da área, muitos deles utilizados como referência para a elaboração deste
trabalho, mas sem dúvida, ambiciona se tornar um material à mão que aborda assuntos importantes de
forma clara e prática. Neste primeiro volume, trouxemos temas elementares da prática cardiológica e
ansiosos pelo êxito, objetivamos a introdução gradual de novos assuntos.
Esperamos que este trabalho, assim como os subsequentes, cumpra sua função quanto ao
auxilio no estudo e aprimoramento do vasto campo da cardiologia.

Bons estudos!

Os editores,
Erika Christina e José Baena.

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Sumário
Prefácio 3

SEÇÃO 01 – BASES DA CARDIOLOGIA


Semiologia Cardíaca Insuficiência Cardíaca
Noções de Anatomia e Fisiologia 5 Conceitualização 69
Semiologia 10 Epidemiologia 69
Fisiopatologia 70
Bases Eletrocardiográficas Diagnóstico 71
Bases Eletrocardiográficas 27 Classificação 74
ECG Normal 29 Tratamento 75
Bradicardia 32
Taquicardia 34
Sobrecargas 38
Síndromes Isquêmicas 42
Situações Clínicas Especiais 45

Hipertensão Arterial
Conceitualização 53
Epidemiologia 53
Pré-hipertensão 54
Fatores de Risco 54
Fisiopatologia 55
Diagnóstico 59
Classificação 62
Avaliação Clínica e Complementar 63
Abordagem Terapêutica 63
Medidas de Prevenção 67

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SEMIOLOGIA CARDIOVASCULAR
Erika Christina Silva, Marina Palhano de Almeida, Tiago Souza Amorim

1. Noções de anatomia e fisiologia

1.1. Anatomia cardíaca

O coração humano funciona como uma bomba, cuja função é bombear sangue
para as diversas partes do organismo, fazendo-o se estender até a microcirculação, local
no qual ocorrem trocas metabólicas, dando sentido à existência do sistema cardiovascular.

O coração localiza-se no mediastino médio e é dividido em duas partes principais –


coração direito e esquerdo – por um septo longitudinal. Cada metade é constituída de duas
câmaras: átrio e ventrículo. Aos átrios cabe à função de receber sangue das veias,
direcioná-lo aos ventrículos para que estes possam, por sua vez, impulsioná-lo as artérias,
dado vazão a bomba.

O átrio direito do recebe sangue venoso sistêmico por intermédio das veias cavas
superior e inferior, direcionando-o ao ventrículo direito e passando pela valva tricúspide. O
sangue que chega ao ventrículo direito é impulsionado ela contração do mesmo e
ultrapassa a valva pulmonar, chegando à artéria pulmonar que o distribui a trama vascular
pulmonar, oxigenando-o. A partir daí, o sangue oxigenado retorna ao coração através das
veias pulmonares e deságua no átrio esquerdo. Neste momento, o sangue flui ao
ventrículo esquerdo por diferença de pressão, ultrapassando a valva mitral. A partir da

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contração do ventrículo esquerdo o sangue oxigenado chega à aorta, ultrapassando a
valva aórtica, e sendo distribuído a todo o corpo. (Fig. 1)

Fig. 1 Anatomia do coração, mostrando a relação dos que desaguam nele e por ele são preenchidos. FONTE: Texas
Heart Institute.

As valvas atrioventriculares (tricúspide e mitral) consistem de um anel fibroso que


circunscreve o óstio atrioventricular, as cordoalhas tendíneas, as cúspides e os músculos
papilares. As cordoalhas tendíneas inseridas na face livre das cúspides garantem que as
mesmas não evertam, e as que se inserem na face ventricular reforçam sua firmeza. As
valvas semilunares (pulmonar e aórtica) estão situadas na origem da artéria pulmonar e
aórtica, respectivamente. Cada uma apresenta três cúspides que são constituídas por
tecido fibroso e avascular.

O coração é formado por três camadas musculares: epicárdio, miocárdio e


endocárdio. O endocárdio tem uma superfície mesotelial e uma camada de tecido
conjuntivo. O miocárdio contem as fibras musculares cardíacas, sustentadas por um
esqueleto de tecido conjuntivo no qual se insere a musculatura. O endocárdio, formado
principalmente por uma camada endotelial, confere ao interior do coração um aspecto liso
e brilhante.

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O coração é irrigado pelas artérias coronárias direita e esquerda, sendo sua
drenagem venosa feita por numerosas veias que desembocam nas câmaras cardíacas ou
se unem para formar o seio coronário, tributário do átrio direito. A artéria coronária direita
nutre o ventrículo direito, porção direita da parede posterior do ventrículo esquerdo e parte
do septo interventricular. A artéria coronária esquerda irriga a maior parte do ventrículo
esquerdo, parte do ventrículo direito e a maior parte do septo interventricular. (Fig.2)

Fig. 2 Artérias Coronárias. FONTE: EKG Case Studies.

O sistema de condução consiste em fibras nervosas autônomas que incluem fibras


sensoriais oriundas dos nervos vagos e dos troncos simpáticos. As contrações rítmicas,
intrínsecas, das fibras musculares cardíacas são reguladas por um “sistema de comando”
e a ritmicidade intrínseca do sistema de comando, por sua vez, é regulado por impulsos
nervosos dos centros vasomotores do tronco encefálico, através do sistema nervoso
autonômico-simpático e parassimpático. O sistema de condução do coração adulto
compreende o nó sinoatrial, o nó atrioventricular e o feixe atrioventricular com seus dois
ramos e os plexos subendocárdicos de fibras de Purkinje.

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O estímulo tem origem no nó sinoatrial (sinusal), avança em direção ao nó
atrioventricular por meio de tratos intermodais e na direção do átrio esquerdo pelo feixe de
Bachmann; alcança o nó atrioventricular sofrendo atraso em sua transmissão para que a
contração atrial se complete antes da ventricular; rapidamente percorre o feixe de His,
seus ramos direito e esquerdo e suas subdivisões para finalmente chegar às fibras de
Purkinje.

1.2. Fisiologia Cardíaca

A célula cardíaca é constituída por miofibrilas, núcleo, sarcoplasma, sarcolema,


discos intercalares, mitocôndrias e reticulo sarcoplasmático. As miofibrilas são compostas
por sarcômeros (unidades de contração do músculo cardíaco) que são formados por duas
estruturas: actina e miosina. A actina por sua vez é auxiliada por dois tipos de proteínas:
troponina (receptora de cálcio) e tropomiosina (recobre os pontos de acoplamento do
sistema miosínico).

A contração da célula cardíaca resulta do deslizamento da actina sobre a miosina,


sendo a energia necessária pra esta ação proveniente do rompimento de ligações de ATP.
Além disso, o cálcio representa importante papel na contração miocárdica visto que a
elevação do mesmo no interior do sarcômero resulta em sua interação com a troponina,
culminando na contração da miofibrila.

Quanto às propriedades fundamentais do coração, listamos as seguintes:

a) Automaticidade (cronotropismo): propriedade das fibras de gerar impulso


espontaneamente;

b) Excitabilidade (batmotropismo): propriedade das fibras de iniciar potencial


de ação em resposta a um estimulo adequado;

c) Condutibilidade (dromotropismo): propriedade das fibras de conduzir e


transmitir às células vizinhas um estímulo recebido;

d) Contratilidade (ionotropismo): capacidade de responder a um estímulo


elétrico com uma atividade mecânica (contração miocárdica).

1.2.1. Ciclo cardíaco

Para melhor compreensão dos fenômenos estetoacústicos se faz necessário


revisarmos rapidamente os eventos que constituem o ciclo cardíaco.

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Iniciaremos o estudo do ciclo cardíaco pelo fim da diástole, momento no qual os
folhetos da valva mitral encontram-se semiabertos com pouca ou nenhuma quantidade
de sangue passando por eles devido a pequena diferença pressórica entre átrio e
ventrículo esquerdo – enchimento ventricular lento.

O nó sinusal emite um estímulo, excitando os átrios e contraindo sua


musculatura, aumento a pressão em seu interior e forçando o sangue a passar pela
valva mitral em direção ao ventrículo esquerdo.

O estimulo elétrico então passa pela junção atrioventricular, distribui-se pelo


feixe de His e de Purkinje, excitando em seguindo a musculatura ventricular,
despolarizando-a e gerando sua contração que eleva a pressão intraventricular até que
a mesma ultrapasse a pressão intra-atrial, forçando o fechamento da valva mitral - 1ª
bulha cardíaca.

O crescente aumento da pressão intraventricular após fechamento da valva


mitral torna o ventrículo uma cavidade fechada, visto que valvas aórtica e mitral
encontram-se cerradas, constituindo a contração isovolumétrica do coração.

Quando a pressão intraventricular supera a pressão intra-aórtica, abrem-se as


valvas aórticas, iniciando a ejeção ventricular. O decréscimo da pressão intraventricular
durante a ejeção torna aquela menor que a pressão intra-aórtica, levando ao
fechamento por gradiente pressórico da valva aórtica – 2ª bulha cardíaca.

Neste momento finda a fase sistólica do ciclo cardíaco.

O período de relaxamento isovolumétrico tem inicio com a 2ª bulha e se


acompanha de decréscimo da pressão intraventricular.

Durante a diástole ventricular, o afluxo de sangue para o átrio esquerdo


procedente das veias pulmonares resulta em aumento gradativo da pressão do átrio. A
ocorrência de queda da pressão intraventricular ao mesmo tempo em que ocorre
elevação da pressão intra-atrial favorece a abertura da valva mitral, iniciando
esvaziamento do átrio esquerdo, que, apesar de passivo, é de natureza rápida –
enchimento ventricular rápido.

Os folhetos da valva mitral que se encontravam amplamente abertos na fase de


enchimento ventricular rápido, colocam-se em posição semiaberta no fim dessa fase,
devido aa pequena diferença de pressão entre átrio e ventrículos, denominando-se
essa nova fase como enchimento ventricular lento.

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A fase diastólica termina com o período de contração atrial. (Fig.3)

Fig. 3 Correlações das pressões do coração esquerdo com as bulhas cardíacas e com o fechamento e abertura das
valvas aórtica e mitral. FONTE: ECGRAFIK

2. Semiologia

O exame clínico é de fundamental importância para o diagnóstico e seguimento de


afecções cardiovasculares, inferindo inclusive no beneficio trazido pelos exames complementares,
visto que a indicação e interpretação dos mesmos só trazem benefícios ao paciente após todos os
dados semiológicos do mesmo.

2.1. Anamnese
a) Identificação (ID): a identificação é parte fundamental do registro da história do
paciente, pois possui diversas importâncias clínicas, semiológicas, institucionais e
epidemiológicas, devendo ser colhida da forma mais completa possível. É de suma
importância à datação do dia em que foi colhida a história e, sempre conveniente
quando há mudanças rápidas do quadro, o registro da hora.
São obrigatórios os seguintes elementos:
Nome Nunca se deve designar um paciente pelo leito ou
pelo seu diagnóstico.
Idade Cada grupo etário tem sua própria doença.
Sexo/gênero Há enfermidades que só ocorrem em determinado
sexo, ou que tem evolução/prognóstico distinto de
acordo com o gênero.

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Cor/etnia Cor branca, cor parda ou cor negra.
Estado civil Importância médico-trabalhista e pericial.
Profissão Relação entre a doença que lhe acometeu e o
trabalho do indivíduo.
Local de trabalho O ambiente pode envolver fatores que agravam
uma afecção preexistente.
Naturalidade Onde o paciente nasceu.
Procedência Residência anterior ou último local de viagem do
paciente.
Residência Residência atual. Endereço do paciente.
Nome da mãe Diferenciar pacientes homônimos.
Nome do Firmar uma relação de corresponsabilidade ética.
responsável/cuidador/acompanhante
Religião Relevância no processo saúde-doença
objetivamente ou subjetivamente.
Filiação a órgãos de previdência e Facilitar encaminhamento a outros especialistas,
planos de saúde para exames complementares ou outros serviços.
Tabela 1. Componentes estruturais essenciais na identificação do paciente. FONTE: Próprio autor

b) Queixa principal (QP): Deve ser registrada com as palavras do paciente de forma
breve e espontânea. Geralmente um sinal ou sintoma, tentando evitar, sempre que
possível, “rótulos diagnósticos”. Deve-se perguntar o que levou a pessoa a procurar
atendimento médico ou o que mais a incomoda no momento.
Exemplo: “Dor de cabeça”, “dor no peito” ou “Avaliação pré-operatória”.

c) História da doença atual (HDA): A HDA é o principal componente da anamnese.


Deve ser registrada de forma que siga uma sequência cronológica do surgimento e
desaparecimento de sinais e sintomas desde o início até o momento da consulta. É
fundamental, para uma boa obtenção da HDA, que o paciente fale sobre sua doença
sem ser induzido e que o médico esteja atento ao sintoma-guia e oriente sempre a fala
para que o paciente não se perca. A meta almejada é obter uma história que tenha
início, meio e fim. O sintoma-guia e todos demais sintomas relatados durante a
entrevista devem ser analisados de maneira detalhada, seguindo um esquema que
facilite o entendimento do que está sendo relatado.
Na cardiologia, os principais sinais e sintomas analisados são: dor cardíaca,
palpitações, dispneia, tosse e expectoração, chieira, hemoptise, desmaio, alterações
do sono, cianose, edema, astenia a posição de cócoras.

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Sendo o principal sintoma, a dor deverá ser sempre bem caracterizada durante
anamnese para que seja comprovada ou não sua relação com alguma alteração
funcional do coração. Sempre caracterizar a qualidade da dor, localização, duração,
intensidade, irradiação, fatores desencadeantes ou agravantes, fatores atenuantes,
manifestações concomitantes.
A tabela 2 traz de forma esquemática a caracterização que deve ser feita de cada
sinal/ sintoma do paciente:

Início Dia, mês ou ano. Modo de início (gradativo ou súbito).


Fatores desencadeantes.
Duração Estabelece-se de acordo com o início.
Características do sintoma na Localização, intensidade, incapacitação e a relação da
época que teve início queixa com as funções orgânicas.
Evolução Ao longo dos dias, meses, anos e em um mesmo dia.
Fatores de piora e melhora Temperatura, posição, atividades físicas, alimentos,
medicamentos ou repouso.
Relação com outras queixas Procura a partir de probabilidades mais frequentes.
Situação atual Encerra a análise da queixa.

Tabela 2. Esquematização da investigação do sintoma-guia da História da Doença. FONTE: Próprio autor.

Na cardiologia: As doenças do coração se manifestam por variados sinais e sintomas até em


outros sistemas. Devemos sempre analisar e termos atenção na avaliação da dor cardíaca,
palpitações, dispnéia, chieira, tosse, hemoptise, desmaio, alterações do sono, cianose, edema,
astenia e posição de cócoras.

d) História patológica pregressa (HPP): Registrar as doenças sofridas pelo paciente:


doenças comuns na infância com data de acometimento (varicela, sarampo,
coqueluche, caxumba, etc.) e passando às da vida adulta (pneumonia, hepatite,
malária, TB, HAS, DM, gota, etc.). De maneira geral, devem-se anotar doenças
congênitas, cirurgias realizadas, traumas, transfusões sanguíneas e alergias
(principalmente medicamentosas). Importante também registrar nesse momento as
medicações que o paciente faz uso, anotando posologia, motivo e quem prescreveram.

e) História Fisiológica (HFis): Anotar as condições da gestação e do nascimento (se o


paciente nasceu por parto normal ou cesáreo, se foi a termo, prematuro ou pós-termo).
Como foi o desenvolvimento psicomotor e ponderoestatural (as idades em que teve a

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primeira e segunda dentição, quando começou a andar e falar) e o aproveitamento
escolar. A pubarca (idade em que surgiram os primeiros pelos pubianos). Se a paciente
for do sexo feminino: registrar a menarca (idade da primeira menstruação) e telarca
(idade do surgimento do broto mamário); gestações (primigesta, secundigesta,
multigesta); partos (primípara, secundípara, multípara); climatério e menopausa (para
idosas). Orientação sexual: atualmente utilizam-se siglas como HSM, HSH, MSM,
HSMH, MSMH, onde H – homem, M – mulher e S – faz sexo com.

f) História Familiar (HFam): Registro sobre o estado de saúde dos pais e irmãos do
paciente, quando vivos. Se tiver algum doente na família, esclarecer qual a natureza da
enfermidade. Se falecidos, a causa e a idade do óbito. Filhos e cônjuges também
entram no registro.
g) História Psicossocial (HPs): Registrar padrão alimentar do paciente, sua ocupação
atual e anteriores, se faz atividades físicas regulares, se é tabagista (calcular carga
tabágica) e/ou etilista (quantificar) e outros vícios. Hábitos sexuais e usos de métodos
contraceptivos e de proteção sexual. Condições de habitação, culturais e
socioeconômicas. Vida conjugal e questionamento familiar. Se há temores, angustias e
ansiedades, principalmente sobre a percepção da doença atual.

h) Revisão sistêmica: A principal utilidade prática desta parte da entrevista é permitir ao


médico levantar possibilidades e reconhecer enfermidades que não guardam relação
com o quadro sintomatológico registrado na HDA. Para facilitar, existe uma
sistematização que o entrevistador poderá seguir:
Sintomas gerais Febre, astenia, peso, sudorese, calafrios, câimbras...
Pele e fâneros Cor, textura, umidade, temperatura, queda de cabelo,
alteração das unhas...
Cabeça e pescoço Dor, tumoração, zumbido, alteração visual, vertigem,
tosse, dispneia...
Tórax Dor, forma, dispneia, nódulos, soluço, palpitação,
desmaio...
Abdome Dor, náusea, vômitos, pirose, hemorragia, diarreia, ascite,
icterícia...
Sistema Genitourinário Dor, alteração miccional, edema, febre, lesões genitais,
distúrbios menstruais, corrimentos...
Sistema Hemolinfopoiético Astenia, adenomegalias, espleno e hepatomegalias,
manifestações cutâneas...
Sistema endócrino Desenvolvimento físico e sexual, hiper ou hipotireoidismo,

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manifestações adrenais...
Coluna vertebral, ossos, Dor, rigidez, inflamação, limitação do movimento...
articulações e extremidades.
Músculos Fraqueza, atrofia, espasmos, marcha...
Artérias, veias, linfáticos e Dor, cor da pele, edema, temperatura, sensibilidade...
microcirculação
Sistema nervoso Consciência, cefaleia, tontura, convulsões, amnésia,
automatismo, ausência, sentidos, distúrbios do sono,
distúrbios esfincterianos...
Exame psíquico e avaliação Consciência, atenção, orientação, pensamento, memória,
das condições emocionais psicomotricidade, afetividade, comportamento...

Tabela 3. Esquematização da sequência realizada durante a revisão sistêmica. FONTE: Próprio autor

i) Parecer: Registro de qual foi à fonte das informações obtidas (do próprio paciente, do
acompanhante ou de terceiros), se foi colaborativo e se as informações são dignas de
crédito.

2.2. Exame físico


O exame físico compõe um dos principais pilares da semiologia cardiovascular. Ele
deve ser realizado por meio da inspeção, palpação, percussão e ausculta, de maneira
sequencial e englobando uma análise de manifestações gerais e específicas do sistema
cardiovascular.

2.2.1 Inspeção e palpação


a) Abaulamento e retração: O abaulamento na região precordial pode indicar a
ocorrência de aneurisma da aorta, cardiomegalia (a dilatação do ventrículo direito
determina o abaulamento, pois esta câmara constitui a maior parte da face anterior do
coração e se relaciona diretamente a parede do tórax), lesões valvares reumáticas,
cardiopatias congênitas, derrame pericárdico e alterações da própria caixa torácica. Para
se diferenciar um abaulamento proveniente de desordem cardíaca ou de alteração
osteomuscular, necessita-se procurar impulsão do precórdio.
A retração pode se dar por deformidade da caixa torácica (congênita ou adquirida)
ou atrofia e retração das lâminas pulmonares que recobrem a face anterior do coração.
A observação dessa região deve ser feita em duas incidências:
 Primeiro: o paciente deve estar deitado e o examinador deve estar de pé do
lado direito dele.
 Segunda: o paciente deve estar deitado e o examinador deve estar junto aos
pés do paciente.
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b) Batimentos anormais: Pode-se ver ou palpar alguns batimentos anormais no
precórdio e nas suas regiões vizinhas. Para buscar alterações deve-se repousar a palma
da mão nesses locais.
Dentre as possíveis anormalidades, tem-se: a retração sistólica apical, que é
quando, na sístole, ao invés de se ver uma impulsão no precórdio, se observa uma
retração; e a hipertrofia do ventrículo direito que repercutirá em impulsão sistólica nas
redondezas do esterno e em pulsação epigástrica no ângulo xifoesternal; bulhas cardíacas
hiperfonéticas (decorrente de estenoses, por exemplo) as quais podem ser sentidas pelas
mãos como um choque de curta duração.
Logo, deve-se fazer inspeção e palpação em procura das seguintes pulsações
precordiais: para-esternais, epigástrica, supra-esternal e na área pulmonar.

c) Ictus cordis: Ao se estudar o Ictus cordis busca-se definir principalmente sua


localização, extensão, mobilidade e intensidade.

Vale ressaltar quem em pacientes portadores de enfisema pulmonar, obesos ou


musculosos, o ictus cordis em geral é invisível e impalpável.

A localização do ictus cordis vai alterar de acordo com o biótipo do paciente.


Alteração na localização esperada pode decorrer de dilatação ou hipertrofia do ventrículo
esquerdo. A seguir, uma tabela de onde se espera encontrar o Ictus cordis em cada tipo:

BIOTIPO LOCALIZAÇÃO

Longilíneo Cruzamento da linha hemiclavicular esquerda com o 6º espaço intercostal

Mediolíneos Cruzamento da linha hemiclavicular esquerda com o 5º espaço intercostal

Brevilíneos Cruzamento da linha hemiclavicular esquerda com o 4º espaço intercostal

Tabela 4: Localização do IC em cada tipo de individuo. FONTE: Próprio autor.

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A extensão do Ictus cordis é mensurada em polpas digitais, sendo aceitável até 1
ou 2 polpas digitais. Além disso, é sugestivo de dilatação ou hipertrofia ventricular
esquerda.

A mobilidade é mensurada em três posições:

 Primeiro: paciente em decúbito dorsal; marca-se a posição do Ictus cordis.


 Segundo: paciente em decúbito lateral esquerdo; marca-se a posição do Ictus
cordis.
 Terceiro: paciente em decúbito lateral direito; marca-se a posição do Ictus
cordis.

Normalmente, a posição do Ictus cordis varia em 1 a 2 cm com a mudança de


posições. Se os folhetos do pericárdio estiverem aderidos entre si e com as estruturas
vizinhas, o Ictus cordis não se desloca.

Para se averiguar a intensidade do Ictus cordis, deve-se repousar a palma da mão


sobre a região dos batimentos. É normal que ela esteja aumentada em casos de estresse
físico ou psicológico ou ainda após esforço físico, sendo que as pulsações mais vigorosas
são sentidas quando há uma hipertrofia ventricular esquerda ou uma dilatação.

d) Frêmitos (sistólicos ou diastólicos): O frêmito é a sensação tátil


decorrente de vibrações produzidas no coração ou nos vasos. A presença deles sugere o
aparecimento de sopros. A sensação é similar à palpação do pescoço de um gato que
ronrona. Ao se achar um frêmito no exame físico, procura-se descrever a localização (em
qual foco de ausculta ele se encontra?), fase do ciclo cardíaco de acordo com a palpação
simultânea do pulso carotídeo ( é na sístole, diástole ou durante ambas?) e a intensidade (
++++/4).

2.2.2 Ausculta
A ausculta cardíaca é parte indispensável do exame cardiovascular e
também do exame físico geral. Com o auxílio deste método é possível ter o
diagnóstico de doenças do coração e mensurar a gravidade da enfermidade do
paciente. A ausculta tem sua origem provavelmente no Antigo Egito, mas sua
aplicação foi aperfeiçoada com a criação, em 1816, do estetoscópio (sthetos = peito
e skopeo = examinar) por René Théophile Hyacinth Laennec (França, 1781-1826).
Este instrumento possui componentes, sendo eles: olivas auriculares que se
encaixam no canal auditivo do examinador; tubos de condução, que é uma haste
em forma de Y que permite a condução do som; campânula, peça que entra em
contato com o corpo do examinado e é mais apropriada para ausculta de sons
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graves (baixa frequência); e o diafragma, que é revestido por uma membrana, peça
que entra em contato com o corpo do examinado e é apropriado para ausculta de
sons agudos (alta frequência).
A demarcação de focos de ausculta cardíaca não significa que o
examinador apenas posicionará o estetoscópio nesses lugares. Os clássicos focos
servem como pontos de referencia visto que as informações mais pertinentes
quanto às valvas são encontradas nesses pontos.
Os focos auscultatórios são: foco mitral, pulmonar, aórtico + aórtico
acessório e foco tricúspide. Na Fig. 4 podemos observar a localização anatômica
desses focos.

Fig. 4 - Localização dos focos de referência para a ausculta cardíaca, notando-se que não coincidem com a
projeção superficial das valvas do coração. FONTE: Hubpages.com

Foco (ou área) Localização anatômica


Aórtico 2º EIC direito, paraesternal
Pulmonar 2º EIC esquerdo, paraesternal
Aórtico acessório 3º e 4º EIC esquerdo, paraesternal
Tricúspide Base do apêndice xifoide ligeiramente à
esquerda
Mitral 5º EIC esquerdo na LHC (corresponde ao ictus
cordis)
Tabela 5. Focos de ausculta EIC: Espaço intercostal, LHC: Linha Hemiclavicular. FONTE: Próprio autor.

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a) Semiotécnica
Ao iniciar o exame, o médico deve estar atento aos seguintes pontos: bulhas
cardíacas, ritmo e frequência, ritmo tríplice, alterações das bulhas, cliques ou estalidos,
sopros, ruído de pericardite, atrito pericárdico e rumor venoso.
Para uma boa ausculta é necessário que o examinador se preocupe em realizá-la
em um ambiente silencioso, e tanto o médico quanto o paciente devem estar acomodados
de maneira confortável. Geralmente, o examinado é colocado em decúbito dorsal com ou
sem apoio para a cabeça, porém essa posição pode ser alterada de acordo com a
necessidade do examinador. O médico deve se posicionar sempre à direita do paciente. O
receptor (diafragma ou campânula) deve estar suavemente apoiado sobre a pele e com
uma perfeita coaptação de suas bordas sobre o precórdio do paciente. Nunca deve se
auscultar sobre as roupas do paciente. O método auscultatório é uma capacidade de difícil
domínio, é necessário bastante treinamento e familiarização com os sons normais do ciclo
cardíaco para então prosseguir para os sons anormais.
As bulhas cardíacas se dividem em B1, B2, B3 e B4:
Bulhas Semiogênese Observações

Corresponde ao fechamento das


Coincide com o ictus cordis e com o
valvas mitral e tricúspide com o
B1 pulso carotídeo. É representado pela
componente mitral antecedendo o
onomatopeia “TUM”.
tricúspide.
Corresponde ao fechamento das
valvas aórtica e tricúspide. Em
condições normais o componente É representada pela onomatopeia
aórtico precede sempre o pulmonar. “TA”. Quando a bulha sofre
B2 Durante a inspiração é possível ouvir desdobramento fisiológico é
o componente aórtico precedendo o representada pela onomatopeia
componente pulmonar, fenômeno “TLA”.
denominado desdobramento
fisiológico de B2.
É mais audível no foco mitral com o
Origina-se das vibrações da parede
paciente em decúbito lateral
ventricular subitamente distendida
esquerdo. E o receptor mais
pela corrente sanguínea que penetra
B3 apropriado para ausculta-la é a
na cavidade durante o enchimento
campânula. Representada pela
causando um turbilhonamento do
expressão “TU”. Causada por estados
sangue.
hiperdinâmicos ou dilatações

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ventriculares. Ouve-se um “TUM TA
TU”, onde B3 é a bulha ouvida logo
após B2.
É resultante do turbilhonamento
sanguíneo causado pelo volume que Ouve-se um “TUM TUM TA”, sendo
chega após a sístole atrial de B4 a bulha ouvida imediatamente
B4 encontro com a massa sanguínea antes de B1. Causada por
existente no interior do ventrículo envelhecimento ou patologias
pouco complacente, ao final da hipertróficas.
diástole ventricular.
Tabela 5. Bulhas cardíacas e seus significados. FONTE: Próprio autor.

 Resumo prático das regras para a ausculta cardíaca:


 Regra 1: Identificar B1 e B2 – Sístole vs. Diástole;
 Regra 2: Auscultar na ordem B1 – B2;
 Regra 3: Auscultar os focos clássicos na ordem (FPFAFTFM) e todo o
precórdio identificando possíveis irradiações:
o São locais mais comuns de irradiação: Borda esternal direita e
esquerda, mesocárdio, região infra e supraclavicular, regiões laterais do
pescoço, regiões interescapulovertebrais, fúrcula e axilas;
 Regra 4: Diafragma para sons de 80 a 1000hz (B1, B2, sopros e estalidos).
Campânula entre 20 a 60hz (B3, B4 e sopro do tipo ruflar diastólico – sopro
diastólico da estenose mitral);
 Regra 5: Verificar a características das bulhas: fonese, desdobramentos e
diferenciar ruídos sistólicos de diastólicos, cliques e estalidos;
 Regra 6: Ausculta dinâmica (manobras, decúbitos, agachamento...). Ex:
Manobra de Rivero-carvalho (paciente em decúbito dorsal, coloca-se o receptor
do estetoscópio na área tricúspide e solicita-se que o paciente realize
inspiração profunda. Caso o sopro aumente de intensidade, pode-se concluir
que o sopro é na valva tricúspide e não na valva mitral).

Reconhecidas a 1ª e 2ª bulhas cardíacas, o próximo passo consiste em determinar


ritmo do coração e o numero de batimentos por minutos, ou seja, frequência cardíaca.

Havendo duas bulhas reconhecidas, trata-se de um ritmo cardíaco em dois tempos.


Caso haja um terceiro som audível, patológico ou não, trata-se de ritmo cardíaco em três
tempos.

19
Caso o ritmo cardíaco seja regular, ou seja, haja ritmicidade periódica na ausculta
das bulhas cardíacas, denomina-se de ritmo cardíaco regular. Do contrário, caso haja
diferença no tempo.

b) Alteração das bulhas cardíacas

Fixadas as características normais da ausculta cardíaca, será mais simples reconhecer


as variações de intensidade do timbre e da tonalidade, bem como desdobramentos e
mascaramento de bulhas.

ALTERAÇÕES 1ª BULHA 2ª BULHA


NAS BULHAS
CARDÍACAS
INTENSIDADE Posição das valvas Posição das valvas no inicio do seu
atrioventriculares, nível de pressão fechamento, condições anatômicas
nas câmaras cardíacas, velocidade das valvas, níveis tensionais na
de subida da pressão circulação sistêmica e na circulação
intraventricular, condições pulmonar e as condições
anatômicas das valvas relacionadas à transmissão do ruído.
atrioventriculares, força de
contração do miocárdio e
condições relacionadas com a
transmissão das vibrações.

TIMBRE E Na estenose mitral as valvas se A alteração mais comum diz respeito


TONALIDADE tornam rígidas em decorrência da ao endurecimento das sigmoides,
fibrose e o ruído torna-se mais adquirindo a bulha um caráter seco.
intenso e com timbre metálico.

DESDOBRAMENTO A característica de desdobramento O desdobramento da 2ª bulha pode


da 1ª bulha pode ser observado ser fisiológico, constante e variável,
especialmente em crianças devido fixo e invertido ou paradoxal. O
um assincronismo fisiológico. Caso desdobramento constante e variável
o desdobramento seja amplo, faz- pode ser causado por BRD, devido
se necessário suspeito de bloquei ao assincronismo provocado na
de ramo direito (BRD), que ao contração dos ventrículos. O
retardar a contração ventricular desdobramento fixo ocorre pelo
direita, atrasa o fechamento da aumento do fluxo de sangue para o
cúspide. VD, demandando mais tempo para
esta câmara esvaziar. O
desdobramento paradoxal pode ser

20
observado no BRE, ocorrendo na
expiração, devido retardo no
componente aórtico.

Tabela 6 – Principais alterações das bulhas cardíacas. FONTE: Próprio autor.

 Cliques e estalidos

Os cliques e estalidos podem ser classificados como sistólicos ou diastólicos,


dependendo de sua localização no ciclo cardíaco.

o Estalido de abertura mitral (diastólico): A abertura da valva mitral ocorre no


inicio da diástole, e não gerará nenhum ruído caso a valva esteja normal.
Porém na estenose mitral, em decorrência das alterações anatômicas e
pressóricas, a abertura da valva pode gerar um ruído seco, agudo, metálico
e de curta duração, sendo mais audível com o paciente em decúbito lateral
esquerdo, no foco mitral e na borda esternal esquerda entre 3º e 4º EIC.
Normalmente é seguido de ruflar diastólico
o Estalido de abertura tricúspide (diastólico): O estalido tricuspide é mais
audível na borda esternal esquerda e direita.
o Estalido protossistólico (ruído de ejeção): ruídos de alta frequência, agudos
e intensos, produzidos na artéria pulmonar e na aorta. É possível ouvir o
estalido pulmonar na área pulmonar e na borda esternal esquerdo e ele
pode ser gerado por estenose pulmonar, dilatação da artéria pulmonar, CIA
e hipertensão pulmonar grave. O estalido aórtico é mais audível no 4º EIC
esquerdo junto a borda esternal até o foco mitral, sendo encontrado em
estenose ou insuficiência aórtica, coarctação da aorta, aneurisma de aorta,
dilatação aórtica, tetralogia de Fallot e truncus arteriosus.
o Estalido mesossistolico e telessistolico: ruído de alta frequência, seco,
agudo, situado no meio ou fim da sístole, variando de intensidade de acordo
com os movimentos respiratórios e com as mudanças de posição.

 Sopros

Sopros são produzidos por vibrações decorrentes de alterações do fluxo


sanguíneo. Em condições normais o sangue flui de maneira laminar, sem gerar
turbilhonamento, visto que a geração de turbilhoes leva aos ruídos denominados sopros
cardíacos. Os sopros podem surgir em decorrência de alteração do sangue (aumento da
velocidade, diminuição da viscosidade), das paredes dos vasos ou das câmaras cardíacas
(passagem por uma zona estreitada/ dilatada ou para uma membrana de borda livre).
21
Para avaliar semiologicamente o sopro é necessário investigar parâmetros como
situação no ciclo cardíaco, localização, irradiação, intensidade, timbre e tonalidade,
modificação com a fase da respiração, com a posição do paciente e com exercício físico.

o Situação no ciclo cardíaco

Os sopros podem ser sistólicos ou diastólicos. Como sopros sistólicos


podemos encontrar os sopros de ejeção e de regurgitação. (Fig.5)

Fig. 5 – Tipos de sopro cardíaco quanto a sua localização no ciclo cardíaco. FONTE: Fisioterapia para todos.

Os sopros sistólicos de ejeção iniciam logo após a 1ª bulha, período de


contração isovolumétrica, onde as valvas atrioventriculares acabaram de fechar,
gerando a primeira bulha, contudo a pressão intracavitária ainda permanece menor
que a pressão intravascular (aorta e pulmonar) e por isso as valvas sigmoides
permanecem fechadas. Quando a pressão intraventricular torna-se mais elevada
que a intravascular, o sangue começa a ser ejetado dos ventrículos, primeiro
lentamente, aumentando gradativamente e depois reduzindo novamente (por isso o
sopro é caracteristicamente em crescendo-decrescendo – sopro diamante). O
sopro é gerado por estenose da valva aórtica ou pulmonar, por isso sendo
denominado sopro de ejeção – ocorre durante a passagem do sangue pelas valvas
sigmoides, durante a ejeção ventricular.

Os sopros sistólicos de regurgitação, ao contrário dos sopros de ejeção,


são ouvidos desde o inicio da sístole, acabando por encobrir e mascarar a 1ª bulha,
ocupando todo o período sistólico sem variação de intensidade (diferentemente do
sopro de ejeção), e terminando imediatamente antes da 2ª bulha ou podendo
22
encobri-la. Esses sopros são causados por insuficiência das valvas
atrioventriculares, uma vez que as valvas estão insuficientes acabam não
coaptando as bordas corretamente e permitindo o refluxo ou a regurgitação de
sangue para o átrio. É válido lembrar que no período isovolumétrico a pressão
intra-atrial encontrar-se menor que a pressão intraventricular, gerando refluxo
desde o inicio da sístole até o inicio da diástole. Outra causa para esse tipo de
sopro é a comunicação interventricular.

Os sopros diastólicos podem ser divididos em protodiastólicos,


mesodiastólicos e telediastólicos. Ocorrem em dois grupos de afecções valvares:
estenose atrioventricular e insuficiência aórtica e pulmonar.

Os sopros diastólicos da estenose mitral e tricúspide ocupam a parte media


da diástole, momento do enchimento rápido dos ventrículos. São sopros de baixa
frequência e tonalidade grave, sendo caracterizados como “ruflar diastólico”.

Já os sopros diastólicos da insuficiência aórtica e pulmonar aparecem


quando as valvas não se fecharam completamente, iniciando logo após a 2ª bulha
visto a diferença importante de pressão intravascular e intracavitária. São sopros de
alta frequência, em decrescendo e de tonalidade aguda, sendo caracterizados
como sopros “aspirativos”. São consequência da regurgitação do sangue dos vasos
da base para o ventrículo devido a insuficiência das valvas sigmoides. Não
confundir com sopro sistólico de regurgitação, visto que este é resultado da
insuficiência das valvas atrioventriculares e geram refluxo de sangue para os
átrios.(Fig. 7)

 Localização

Localiza-se um sopro na área em que é mais audível, ou seja, no foco de


ausculta onde o som do sopro seja melhor caracterizado.

 Irradiação

Após a identificação da Localização do sopro sobre o foco de ausculta,


desloca-se o receptor do estetoscopio sobre as demais áreas para determinar sua
irradiação.

23
Fig. 7 – Representação dos sopros sistólicos e diastólicos. FONTE: Creative Commons Attribution

 Intensidade

Quanto à intensidade em que são audíveis, os sopros são caracterizados da


seguinte forma:

Cruzes Característica dos sopros

+ Sopros débeis, audível somente quando se ausculta com atenção e em ambiente


silencioso

++ Sopros de intensidade moderada

+++ Sopros intensos

++++ Sopros muito intensos, audíveis inclusive com o estetoscópio afastado da parede
torácica ou com a mão interposta entre o receptor e a parede torácica

Tabela 7 - Intensidade dos sopros cardíacos. FONTE: Próprio autor.

 Timbre e tonalidade

Essas características estão relacionadas com a velocidade do fluxo e o tipo


de defeito causador do turbilhonamento sanguíneo. Podem ser utilizadas varias

24
denominações: suave, rude, musical, aspirativo, em jato de vapor, granuloso,
piante e ruflar.

2.2.3 Pulsos

A palpação dos pulsos é de extrema necessidade na semiologia


cardiovascular visto que reflete o funcionamento do coração. Devem ser analisados
o pulso radial, capilar, artéria carótida e veias jugulares.

Para a avaliação do pulso radial devem-se levar em conta as seguintes


características: estado da parede arterial (sem tortuosidade e facilmente
depressível), frequência (60 a 100 bpm), ritmo (ausência de intervalos variáveis –
ritmo regular), amplitude ou magnitude (amplo ou magnus, mediano e pequeno ou
parvus. Ex.: pulso magnus na insuficiência aórtica e parvus na estenose aortica),
tensão ou dureza, tipos de onda e comparação com a artéria homóloga.

Quanto ao tipo de onda do pulso radial, caracteriza-se da seguinte forma:

 Onda de pulso normal;


 Pulso célere ou em martelo d’água: aparece e some com rapidez –
observado nas fístulas arteriovenosas, insuficiência aórtica, anemias
graves e hipotireoidismo;
 Pulso anacrótico: pequena onda inscrita no ramo ascendente da
onda pulsátil – estenose aórtica;
 Pulso dicrótico: dupla onda em cada pulsação, sendo a primeira
mais intensa e a seguinte de menor intensidade – doenças que
cursam com febre;
 Pulso bisferiens: duplas onda em cada pulsação, ocorrendo as duas
no ápice da onda de cada pulso – estenose e insuficiência aórtica
associadas;
 Pulso alternante: onda ampla seguida de onda mais fraca,
sucessivamente – insuficiência ventricular esquerda;
 Pulso filiforme: pulso de pequena amplitude e mole – colapso
circulatório periférico;
 Pulso paradoxal: diminuição de amplitude das pulsações durante a
inspiração forçada – pericardite constritiva, derrame pericárdico
volumoso e enfisema pulmonar.

25
Outra característica que deve ser analisada durante o exame dos pulsos é a
presença de ingurgitamento jugular que representa hipertensão venosa no sistema
da veia cava inferior e parece quando há insuficiência ventricular direita ou
pericardite constritiva. Para a realização da manobra basta deixar o paciente em
decúbito dorsal e depois pedir que ele adote a posição semissentada (45º entre o
dorso e o leito). Se a jugular permanece turgida, o sinal é positivo.

2.2.4 Pressão arterial

Pressão arterial é a força exercida pelo sangue sobre as paredes dos


vasos, tendo por finalidade promover boa perfusão dos tecidos e assim possibilitar
as trocas metabólicas. Está relacionada com o trabalho cardíaco e traduz o sistema
de pressão vigente na árvore vascular arterial.

As recomendações quanto a aferição da pressão arterial, bem como a


utilização do monitoramento ambulatorial da pressão arterial (MAPA) e o
monitoramento residencial da pressão arterial (MRPA) serão melhores discutidos
no capítulo de Hipertensão Arterial Sistêmica, vide página XXXX.

REFERÊNCIAS

1. PORTO, Celmo Celeno. Semiologia Médica. 7ª Ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.
2. Carvalho VO, Souza GEC. O estetoscópio e os sons pulmonares: uma revisão da literatura. Rev Med (São
Paulo). 2007 out.-dez.;86(4):224-31.
3. STEFANINI, Edson et al. Guia de medicina ambulatorial e hospitalar da UNIFESP – EPM: Cardiologia. Barueri,
SP: Manole, 2009.
4. Martins, Cássio. Semiologia Cardiovascular: Ausculta Normal e Bulhas - Fonese e Desdobramentos.
Disponível em:
<http://www.uff.br/cursodesemiologia/images/stories/Uploads/semio_cardiovascular/aulas/aula3_b1b2.pdf>.
Acesso em: 07 Set. 2017.
5. COUTO A. A., NANI E., MESQUITA E. T., PINHEIRO L.A.F.P., ROMÊO L. J. M., BRUNO W. Semiologia
Cardiovascular. 1ª Ed. São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, 2002
6. Ashley EA, Niebauer J. Cardiology Explained. London: Remedica; 2004. Chapter 2, Cardiovascular
examination. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK2213

26
BASES ELETROCARDIOGRÁFICAS
Elizeu Rodrigues Matos, Fernanda Souza Henrique, José Emanuel Baena,
Lucas Edwardo Silva, Thomás Benevides Said, Tiago Souza Amorim

Neste capítulo, objetiva-se o ensino das principais alterações eletrocardiográficas


observadas diariamente nos ambulatórios de cardiologia. Posteriormente será realizado o
estudo fisiopatológico de cada afecção apresentada.

1. Bases eletrocardiográficas
O coração é dotado de um sistema excitatório e condutor especializados para gerar
impulsos elétricos rítmicos que causam contrações rítmicas do miocárdio e conduzir esses
impulsos rapidamente por todo o coração. As células do sistema elétrico capazes de gerar este
estímulo (automaticidade) são as células marcapasso encontradas no nó sinusal, nas fibras do
sistema de condução, no nó atrioventricular, no feixe de His, seus ramos e no sistema ventricular
de Purkinje. (Fig 1)
O impulso normal se origina no nó sinusal - localizado na junção do átrio direito com a veia
cava superior - e segue até o nó atrioventricular por meio das vias internodais anterior, posterior e
mediana a uma velocidade de condução de 1000mm/s. O nó atrioventricular situa-se abaixo da
valva tricúspide, inferiormente ao ao átrio direito; suas fibras caudais formam o feixe de His, que
origina os ramos ventriculares. Os ramos direito e esquerdo distribuem o estímulo pelas fibras de
Purkinje em cada um dos ventrículos a uma velocidade de condução de 4000 mm/s.
Como resultado de seu funcionamento normal, os átrios irão se contrair ⅙ de segundo
antes da contração ventricular, o que permite o enchimento dos ventrículos antes de bombearem

27
o sangue para os pulmões e para a circulação periférica. Além disso, quando estimuladas, as
diferentes porções dos ventrículos irão se contrair quase simultaneamente, o que é essencial para
gerar pressão nas câmaras ventriculares com o máximo de eficiência.
Quando esse impulso elétrico passa através do coração, uma corrente elétrica também se
propaga do coração para os tecidos adjacentes que o circundam. Ao serem colocados eletrodos
sobre a pele é possível registrar os potenciais elétricos gerados pela corrente. A este registro dá-
se o nome eletrocardiograma.

Fig.1 – Sistema excitocondutor. FONTE: Lumen learning

O eletrocardiograma normal é composto pela onda P, pelo complexo QRS e pela onda T.
Constituem ondas de despolarização a onda P, produzida pelos potenciais gerados quando átrios
despolarizam antes do início da contração atrial, e o complexo QRS, gerado pela despolarização
dos ventrículos antes da contração dos mesmos. A onda T é produzida pelos potenciais gerados
enquanto os ventrículos se restabelecem do estado despolarização, sendo dessa maneira uma
onda de repolarização.
Antes que a contração possa acontecer é preciso que a despolarização se propague pelo
músculo para iniciar os processos químicos da contração dos ventrículos. Os átrios se repolariza,
cerca de 0,15-0,20 segundo após o término da onda P. Consequentemente a onda de
repolarização atrial (onda T atrial) é encoberta pelo complexo QRS. A onda de repolarização
ventricular é a onda T do ECG normal; este processo se inicia cerca de 0,20 s após o início do
QRS, mas em muitas fibras demora até 0,35 s de modo que a onda T é uma onda de longa

28
duração, mas de voltagem bastante menor que o QRS, parcialmente em razão de sua duração

prolongada
Fig. 2 – Representação eletrocardiográfica do ciclo cardíaco. FONTE: EKG Komplex.svg

2. Eletrocardiograma normal
Como dito anteriormente, o eletrocardiograma consiste no registro gráfico da atividade
elétrica cardíaca. Classicamente ele consiste em 12 derivações: 6 do plano frontal e 6 do plano
horizontal ou precordial. Essa disposição permite a visualização tridimensional da atividade
elétrica cardíaca . Na tabela abaixo estão as principais paredes do coração seguidas das
derivações que melhor as visualizam:

Septal V1 e V2
Anterior V3 e V4
Lateral V5 e V6
Lateral alta DI e aVL
Inferior DII, DIII e aVF
Tabela 1 – Paredes cardíacas e suas respectivas derivações. FONTE: Próprio autor.

As derivações sao representadas por setas que vão do pólo negativo para o positivo. Se a
projeção do vetor tiver o mesmo sentido da derivação estará gerada uma onda positiva. As seis
derivações do plano frontal podem ser dispostas em uma única imagem denominada “rosa dos
ventos” ou sistema hexa-axial.
O registro eletrocardiográfico é interpretado como um gráfico de voltagem X tempo, de
maneira a representar as diferenças de potenciais ao longo de um ciclo cardíaco. Utiliza-se papel

29
milimetrado com demarcações de quadrados de linhas claras com 1mm e de quadrados de linhas
escuras com 5mm para a interpretação do registro. O eixo vertical representa a voltagem no qual
cada milímetro equivale a 0,1 mV. O eixo horizontal representa o tempo e cada milímetro irá
equivaler a 0,04s.
O aparelho deve ser sempre calibrado antes de iniciar o registro para que a proporção 1
mV = 10 mm seja respeitada. A velocidade padrão de registro é de 25 mm/s. Estes sao os
parâmetros padrões de ECG convencional.

Fig. 3 – Representação milimétrica do traçado eletrocardiográfico. FONTE: CV Physiology

Para a avaliação do ritmo cardíaco o fator mais importante a ser verificado é a origem do
estímulo responsável pela despolarização ventricular. Normalmente o ritmo cardíaco é dito
sinusal, sob a análise dos seguintes critérios: a onda P positiva em DI e DII e negativa em aVR,
precedendo todos os complexos QRS e o intervalo PR constante e inferior a 200ms. Também
verifica-se a regularidade dos ciclos.
Em relação a frequência cardíaca, está normalmente fica entre 60 e 100 bpm quando em
repouso. Uma frequência abaixo deste intervalo é chamada bradicardia, enquanto que uma acima
é denominada taquicardia. Para o cálculo da frequência cardíaca existem diferentes métodos:
1. regra dos 1500 : divide-se 1500 pelo número de quadrados pequenos que
separam os picos de duas ondas R de complexos QRS consecutivos.
2. método dos 300 ou da sequência: como cada 5 quadrados pequenos equivalem a 1
quadrado grande, em um minuto são percorridos 300 quadrados grandes.
dividindo-se 300 pelo número de quadrados grandes entre duas ondas R obtém-se
os valores 300, 150, 100, 75, 60 e 50. Procura-se uma onda R com sua origem em
uma linha espessa e inicia-se a contagem desta sequência.
3. regra dos 3 segundos: é um método para cálculo da frequência cardíaca em
eletrocardiogramas com ritmo cardíaco irregular. Consiste em contar o número de

30
ondas R no decorrer de 15 quadrados grandes (3 segundos) e multiplicar o valor
encontrado por 20.

Fig. 4 – Método para o cálculo da frequência cardíaca. FONTE: Cardiopapers

O eixo cardíaco normal pode variar de - 30° a + 90°. Para calculá-lo, deve-se
primeiramente isolar o vetor resultante em um dos quadrantes da rosa dos ventos através da
análise de D1 e seu eixo perpendicular (aVF). A interseção destas duas derivações define em qual
quadrante se encontra o eixo. Após isso, analisam-se as outra derivações perpendiculares (DIII e
aVL, DII e aVR) para obter o intervalo mínimo de 30° do eixo cardíaco.

Fig. 5 – Como calcular o eixo cardíaco. FONTE: ECG now

É importante também analisar os componentes do eletrocardiograma. A onda P


normalmente apresenta morfologia arredondada, positiva e monofásica, com duração de até 100
ms (2,5 quadrados pequenos) e amplitude de até 2,5 mm. O intervalo PR é a associação da onda

31
P e o segmento PR de maneira a referir-se a condução atrioventricular; tem duração entre 120 e
200 ms ( 3-5 quadrados pequenos). O complexo QRS se inicia na onda Q e termina no ponto J.
tem morfologia variável tornando-se progressivamente positivo de V1-V6; sua duração geralmente
varia entre 2,5 - 3 quadrados pequenos, devendo ser inferior a 120 ms; a onda Q deve ter duração
inferior a 40 ms e amplitude menor que ⅓ à da onda R. O segmento ST deve ser isoelétrico; não
apresenta uma duração normal estabelecida entre ele e o início da onda T sendo o mais
importante verificar ocorrência de supra ou infradesnivelamentos. A onda T tem morfologia
assimétrica, positiva, sem critérios bem estabelecidos para seus limites normais de duração e
amplitude.

Resumo dos passos para a análise do ECG


1. Padronização
2. Ritmo
3. Frequência cardíaca
4. Eixo cardíaco
5. Características morfofisiológicas dos componentes eletrocardiográficos

3. Bradicardia
Uma arritmia cardíaca consiste em uma alteração da frequência, formação e/ou condução
do impulso elétrico através do miocárdio. Com base nisso, classifica-se bradicardia como uma
arritmia em que sua frequência se apresenta inferior a 50 bpm, fugindo do parâmetro de
normalidade estabelecido entre 50 e 100 bpm.
Suas causas variam entre não cárdicas e cardíacas.

3.1. Não cardíacas:


 Fisiologia normal de um atleta saudável em exercícios regulares

Está presente em cerca de 80% dos atletas de alto rendimento, apresentando durante
seu repouso frequências ≥ 30bpm sendo consideradas normais neste tipo de atleta.

Fig. 6 - ECG, Brasicardia Sinusal. FONTE: Science Direct

32
 Hipotireoidismo

Pacientes hipotireoidianos apresentam alterações no ECG que associada a baixa


voltagem difusa, sofrem o aumento do intervalo QT e achatamento ou inversão da onda T,

Fig. 7 - ECG, aumento do intervalo QT e inversão da onda T. FONTE: Science Direct

 Síncopes Neuromediadas

A síncope neurocardiogenica engloba um grupo heterogéneo de condições em que os


reflexos cardiovasculares se tornam temporariamente inapropriados, em resposta a um
estímulo, resultando em vasodilatação e/ou bradicardia.

Na síncope vasovagal a resposta cardio-inibitória é mais frequente, depende da


diminuição do tónus parassimpático e provoca bradicardia.

 Síndrome do seio carotídeo

Esta é uma doença rara, em que certos movimentos bruscos do pescoço podem
provocar a queda da pressão arterial e uma diminuição da frequência dos batimentos do
coração.

3.2. Cardíacas:
 Idade

Com o passar dos anos de uma pessoa doenças relacionadas ao nó sinusal aumenta
como, por exemplo, a fribose do nó sinusal, do tecido perinodal e do descontrole neurogênico
da frequência cardíaca. As alterações mais frequentes são: bradicardia sinusal persistente,
pausas sinusais e síndrome braditaquicárdica.

Fig. 8 - ECG, Bradicardia sinusal persistente. FONTE: Science Direct

33
Fig. 9 - ECG, Pausa sinusal. FONTE: Science Direct

Fig. 10 - ECG, Síndrome bradi-taquicardica. FONTE: Cardios

 Fibrilação atrial

A fibrilação atrial com FC muito lenta ,ou seja, menos de 40 bpm ou com pausas
prolongadas devem ser descartadas quando relacionadas doença do nó atrioventricular. FA
com frequência ventricular lenta e complexos QRS rítmicos, suspeita-se de Fibrilação Atrial
com Bloqueio AV completo e ritmo de escape.

Fig. 11 - ECG, Fibrilação atrial com bloqueio de AV. FONTE: MY-EKG

 Infarto do miocárdio ou ataque cardíaco que afeta a região inferior do coração costuma
cursar com BS em sua fase aguda.
 Na miocardite os pacientes que se encontram na fase aguda de miocardite podem
desenvolver tanto taquiarritmias como bradiarritmias. Essas arritmias frequentemente
desaparecem após a fase aguda da miocardite.
 A artéria coronária direita é responsável pela irrigação do nó sinoatrial, se comprometido
pode haver obstrução geralmente superior a 70% ou total que levará a Bradicardia Sinusal.
 Outros fatores cardíacos também podem culminar em uma bradicardia, como: Distrofias
musculares, Síndrome do seio enfermo, Bloqueio cardíaco, Lesão do sistema elétrico do
coração por cirurgias e Cardiopatias congênitas.

4. Taquicardias

As taquicardias podem ser supraventriculares (taquicardia sinusal, taquicardia atrial,


fibrilação atrial, flutter atrial) e ventriculares (taquicardia sustentada monomórfica e
polimórfica, não sustentada, torsades de pointe e fibrilação ventricular). É didaticamente
interessante dividir as taquicardias com base na largura do QRS: as de QRS largo (duração
maior que 120 ms), em geral, são representadas pelas taquicardias ventriculares; e as de
QRS estreito (duração menor que 120 ms), frequentemente, são taquicardias
supraventriculares.
34
4.1. Taquicardias supraventriculares
Ocorrem acima da bifurcação do feixe de Hiss. Em geral, apresentam o QRS estreito
(duração menor que 120 ms).

a) Taquicardia Sinusal
Frequência cardíaca superior a 100 bpm, com ondas P morfologicamente iguais
ao padrão sinusal normal.

Fig. 12 - taquicardia sinusal. FONTE: Science Direct

b) Taquicardia Atrial
A onda P apresenta-se de forma alterada em relação ao ritmo sinusal, sendo
que a frequência atrial pode variar entre 100 e 250 bpm. As linhas isoelétricas entre as
ondas P tornam possíveis diferencias a taquicardia atrial do flutter atrial.

Fig 13: eletrocardiograma normal. FONTE: Science Direct


Fig. 14: taquicardia atrial. FONTE: Science Direct

35
c) Fibrilação Atrial
É caracterizada pela ausência da onda P, com atividade atrial rápida e
intervalos R-R irregulares. Complexo QRS estreito. A frequência cardíaca pode variar
entre 350 a 600 bpm.

Fig. 15: comparação do ECG normal (seta azul, apontando as ondas P presentes) e fibrilação atrial
(seta vermelha, ausência de ondas P). FONTE: Science Direct

d) Flutter Atrial
Aspecto em ‘dentes de serra’, apresentando as ondas ‘F’, comumente
visualizadas como deflexões negativas nas derivações D2, D3 e aVF e positivas em
V1, com frequência variando entre 250 e 350 bpm.

Fig. 16 - flutter atrial. FONTE: Science Direct

4.2. Taquicardias ventriculares


Ocorrem abaixo da bifurcação do feixe de Hiss. Em geral, possuem o QRS
alargado (duração maior que 120 ms) e ausência da onda P.

a) Taquicardia Sustentada Monomórfica


Taquicardias ventriculares com duração maior que 30 segundos, frequência
maior que 100 bpm e QRS com morfologia uniforme.

36
Fig. 17: taquicardia monomórfica sustentada. FONTE: Science Direct

b) Taquicardia Sustentada Polimórfica


Taquicardias ventriculares com duração maior que 30 segundos, frequência
maior que 100 bpm e QRS com morfologia variável.

Fig. 18 – Taquicardia polimórfica sustentada. FONTE: Science Direct

c) Taquicardias não-Sustentadas
Taquicardias ventriculares com duração menor que 30 segundos, autolimitadas,
geralmente com término espontâneo.

Fig. 19 - taquicardia não-sustentada. FONTE: Science Direct

37
d) Torsades de Pointe
Complexo QRS em formas, amplitudes e durações variadas, aparentemente
formando um aspecto de ‘trançado’ em torno da linha de base.

Fig. 20 - torsades de pointe. FONTE: Science Direct

e) Fibrilação Ventricular
Ritmo ventricular rápido, com intervalos R-R irregulares, complexos QRS
polimórficos e anômalos, deflexões bizarras e largas, com frequência cardíaca próxima
dos 500 bpm.
f)

Fig. 21: fibrilação ventricular. FONTE: Science Direct

5. Sobrecargas

5.1. Sobrecarga Ventricular

a) Ventricular Direita

Existem duas formas com as quais o ventrículo direito pode ser sobrecarregado,
são elas: pressão, um exemplo é a estenose pulmonar, e por volume, como é o caso da
insuficiência da válvula tricúspide. No primeiro caso, essa condição recebe o nome de
sobrecarga sistólica e a segunda recebe o nome de sobrecarga diastólica.

Dentre as alterações no eletrocardiograma que a Sobrecarga Ventricular Direita,


tem-se uma tendência para a direita do eixo elétrico QRS no plano frontal (no adulto o
ângulo será de +110 graus e na criança de +90 graus).

38
Haverá a presença de onda R de alta voltagem em V1 e V2. Na sobrecarga
sistólica terá um padrão qR, enquanto que na sobrecarga diastólica, qRS será o padrão do
eixo.
Nas derivações precordiais esquerdas – D1, aVL, V4, V5, V6 – se forma um
complexo RS ou rS, com uma redução de ondas r e ondas S mais profundas.
Outra aparição importante são os vetores finais para a direita, isso devido a um
segmento S em D1, D2, D3 e a um segmento terminal aVR.
Quando há uma relação R/S em V1 é maior que 1, existirá ondas T positivas
durante os 3 dias de vias e os 6 anos de idade.

Fig. 22 - ECG de paciente com sobrecarga ventricular direita secundária à comunicação biatrial. FONTE: Figuinha

b) Ventricular esquerda
Assim como a direita, a sobrecarga esquerda pode ser causada por pressão ou por
volume, sendo elas classificadas da mesma maneira. Diferente da direita o não é padrão-
ouro, porém possui relevância para os critérios que serão usados no diagnóstico.
Dentre os vários critérios utilizados, os mais recomendados são os índice Sokolow-
Lyon, onde é considerado positivo quando a soma da amplitude da onda S em V1 mais a
onda R em V5 for maior ou igual a 35 mm. E o índice de Cornell que soma as onda R de
aVL com a S de V3 e será positivo se, em homens for 28 mm e mulheres maior de 20 mm.
Além dos critérios, há alterações de repolarização ventricular, em que a onda T é
achatada em derivações esquerdas (D1,aVL, V5 e V6) ou há um padrão strain, ou seja, um
infradesnivelamento do segmento ST mais a onda T negativa e assimética.

39
Fig. 23 - Exemplo de ECG de com sobrecarga ventricular esquerda secundária a uma insuficiência mitral. FONTE:
Figuinha

c) Biventricular
Vale lembrar que as duas sobre cargas ventriculares podem coexistir na mesma
pessoa, nessa caso, irá haver as seguintes alterações: o eixo elétrico estará desviado para
a direita, mas terá associados critérios de voltagem para Sobrecarga Ventricular Esquerda.
O eletrocardiograma será típico de Sobrecarga Ventricular Direita porém terá um ou dos
fatores a seguir: ondas Q profundas em V5 e V6 e em derivações inferiores. R de voltagem
aumentada em V5 e V6. Onda S em V1 e V2 mais a onda R em V5 e V6 com critério
positivo de Sokolow. E deflexão intrínsecoide em V6 maior ou igual a 40mm. Por fim, os
complexos QRS isodifásicos amplos, do tipo R/S, nas precordiais intermediárias de V2 a
V4.

5.2. Sobrecarga Atrial


a) Atrial Esquerda
Na sobrecarga Atrial Esquerda é possível observar um aumento na duração da onda P,
nos adultos é superior a 0,1 segundo e na criança, 0,09 segundos. Pode ser notado que, com
o aumento do átrio esquerdo, o verto médio de ativação atrial tende a desviar para esquerda e
para trás. Com uma alteração morfológica do átrio, é possível que haja uma entalhe (onda P
mitrale) na onda P, geralmente em D1, D2 e aVL, que irá apresentar com dois ápices,
contendo um intervalo entre 40 ms, sendo o primeiro referente ao átrio direito e os segundo ou
esquerdo. Além disso, a onda P terá um componente negativo aumento em V1. Existe
também, o índice de Morris, o qual consiste em uma área da fase negativa de 0,04 mm/s ou
igual ou a maior que 1mm2.

40
Fig. 24 - Exemplo de ECG com sobrecarga atrial esquerda. FONTE: Figuinha

b) Atrial Direita
Uma característica muito importante da sobrecarga atrial é que ela
raramente está isolada, normalmente, encontra-se associada com sobrecarga
ventricular direita, além disso, é o fato da onda P se tornar apiculada, podendo
apresentar uma amplitude de 2,5 mm. Em relação a derivação V1, ela apresentará
porção inicial positiva maior 1,5mm..
Algo muito importante são os sinais acessórios e indiretos de sobrecarga
atrial direita que são: Peñaloza-Tranchesi, que indica é a presença de complexos
QRS de importante baixa voltagem em V1 e que, nas próximas derivações, estarão
em contrate pois serão com uma voltagem bem superior. E o Sodi-Pallares que
observa o aparecimento de complexos qr, qR, qR ou qRs nas derivações
precordias direitas (geralmente em V1, porém pode ocorrer até V3 ou V4).

41
Fig 25 – Exemplo de ECG de paciente SAD devido à atresia tricúspide. FONTE: Figuinha

c) Biatrial

Assim como as sobrecarga ventriculares podem coexistir, as atriais também


podem, e nesse caso, o paciente apresentará uma associação dos critérios das
duas.

6. Síndromes Isquêmicas

As doenças cardiovasculares ainda são a principal causa de morte no Brasil, totalizando


quase 32% de todos os óbitos. As primeiras horas de manifestação do Infarto Agudo do Miocárdio
(IAM) são as mais críticas, uma vez que a maioria das mortes ocorre neste momento inicial, sendo
40 a 65% na primeira hora e, aproximadamente, 80% nas primeiras 24 horas. A história clínica á
capaz de predizer a probabilidade de o paciente estar apresentando uma síndrome coronariana
aguda e o ECG nos mostra precocemente alterações, como a inversão da onda T, infra ou o
supradesnivelamento do segmento ST, que são achados determinantes na conduta médica. Por
isso, em situação de emergência é necessário ter em mãos um ECG em menos de 10 minutos
para uma melhor conduta clínica e prognóstico.

42
6.1. SÍNDROMES ISQUÊMICAS MIOCÁRDICAS INSTÁVEIS SEM SUPRADESNÍVEL DO
SEGMENTO ST (SIMISSST): ANGINA INSTÁVEL (AI) E IAM SEM SUPRADESVÍVEL DE
ST (IAMSSST)
A angina instável é definida como uma síndrome clínica situada entre a angina estável e o
infarto agudo do miocárdio. Nos Estados Unidos a AI é a causa cardiovascular mais comum de
internação hospitalar, sendo também a responsável pela maioria das internações em unidades
coronarianas. Durante a evolução, uma parte destes pacientes desenvolve elevações nos
marcadores bioquímicos de dano miocárdico, configurando o quadro de IAMSSST. O paciente
com AI tem prognóstico variável quanto a eventos desfavoráveis como IAM, óbito, recorrência de
angina e necessidade de revascularização miocárdica. Em virtude da ampla variação das
manifestações clínicas das SIMISSSTs, sua estratificação de risco ajuda a determinar estratégias
para tratamento ambulatorial ou hospitalar, propiciando uma adequação de custos em função de
maior eficácia terapêutica. Daí a importância de uma história clínica e diagnóstico precisos.

6.2. INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO COM SUPRADESNÍVEL DO SEGMENTO ST


(IAMCSST)
Está sempre associado a uma oclusão total de uma artéria coronariana. O quadro clínico,
as alterações eletrocardiográficas e a elevação dos marcadores bioquímicos de necrose são a
base do diagnóstico. Os sintomas são bastante diversificados e imprecisos em boa parte dos
casos e a elevação dos marcadores inicia-se cerca de 6 horas após o início da dor, tornando,
então, o ECG o principal instrumento diagnóstico e determinante da conduta.
O ECG pode mostrar: (1) Supradesnível do segmento ST ≥ 1mm em duas derivações
contíguas (que representem a mesma parede miocárdica); (2) Agudização seguida de inversão de
onda T; (3) Aparecimento de ondas Q patológicas (ou seja, largas e/ou profundas); ou (4)
Bloqueio de Ramo Esquerdo Novo.
(1) Desnivelamento do segmento ST: Este achado indica lesão da célula miocárdica e
quando é encontrado indica que houve liberação de CKMB e Troponina, confirmando
laboratorialmente o IAM. O supradesnível do segmento ST >1 mm em duas derivações
contíguas determina o diagnóstico e correlaciona-se com a topografia do infarto. A
topografia se baseia nas seguintes correlações:

a) Parede anterosseptal V1, V2, V3


b) Parede anterior V1, V2, V3 e V4
c) Parede anterior localizada V3, V4 ou V3-V5
d) Parede anterolateral V4 a V5, V6, D1 e AVL
e) Parede anterior extensa V1 a V6 , D1 e aVL
f) Parede lateral baixa V5 e V6

43
g) Parede lateral alta D1 e aVL
h) Parede inferior D2, D3 e aVF
i) Parede dorsal V7 e V8
Fig 26 – Paredes cardíacas e suas correlações eletrocardiográficas. FONTE: Próprio autor

Como medir o desnivelamento de ST?


1º: detectar o fim do segmento PR no final da onda P e início do QRS.
2º: traçar uma linha imaginária tocando o final do segmento PR.
3º: identificar o ponto J (ponto entre o fim do QRS e início do ST).
4º: tracejar uma linha imaginária no ponto J.
5º: medir a diferença entre as duas linhas.

Fig 27 – Passos para medir o desnivelamento do segmento ST. FONTE: Cardiopapers

(2) Agudização e inversão de onda T: a onda T torna-se simétrica e invertida.


Representa uma isquemia celular, não sendo um diagnóstico de IAM. A onda T
invertida por mais de 6 meses pode ser considerada indicativo de pior prognóstico.

Fig 28 – Alterações da onda T. FONTE: Misodor

44
(3) Aparecimento de ondas Q patológicas: representam a fase final da evolução do
IAM, indicando necrose das células cardíacas e liberação de substâncias intracelulares
(elevando os níveis dos marcadores de necrose miocárdica). Demonstram uma área
eletricamente inativa no ECG. Devem contemplar:
a. Duração > 0,04s
b. Associadas ou não a amplitude > 3 mm, ou,
c. Redução da onda R onde a mesma deveria estar presente.

Obs.: Importante lembrar que existem outras causas para aparecimento de ondas Q patológicas
no ECG além do IAM.

Fig 29 – Ondas Q patológicas. FONTE: Misodor

(4) Bloqueio de Ramo Esquerdo (BRE) Novo: O BRE agudo associado a um quadro
clínico sugestivo de IAM também permite seu diagnóstico. Porém, se o BRE é antigo, o
diagnóstico eletrocardiográfico é dificultado, mas possível se houver supra de ST maior
do que 1mm concordante com o QRS, ou maior que 5mm discordante do QRS.

7. Situações clínicas especiais


O exame eletrocardiográfico é muito útil, entre outras coisas, para o auxílio diagnóstico das
afecções próprias do ritmo cardíaco ou do miocárdio em si. No entanto, uma vasta série de
condições extra cardíacas e sistêmicas, muitas delas de diagnóstico precoce imperativo,
manifestam-se através dos traçados do eletrocardiograma. Nesta seção, procuramos abordar as
alterações eletrocardiográficas de algumas condições clínicas importantes no cotidiano médico de
forma prática e focada no reconhecimento precoce.

45
7.1. Pericardite
A inflamação dos folhetos pericárdicos pode originar-se na própria camada externa do
coração ou em estruturas adjacentes mediastinais. Sua etiologia é variada, podendo ser
infecciosa, imune-inflamatória, induzida por medicamentos, entre outras causas. Dor torácica é a
apresentação comum das pericardites podendo estar acompanhada de sinais e sintomas
relacionados a etiologia. O diagnóstico diferencial com o infarto agudo do miocárdio é muito
importante e baseia-se também em alterações de traçado.
O processo inflamatório é responsável por uma elevação de segmento ST, que
diferentemente da isquemia, não respeita parede, apresentando-se de modo difuso e com
concavidade superior. Podem também ocorrer depressões no segmento PR.

Fig. 30 - ECG de 12 derivações demonstrando supra desnível de segmento ST e infra desnível de intervalo PR em DI,
DII, aVL, aVF e precordiais. Apresentação clássica de pericardite. Notar concavidade para cima. FONTE: Science direct

7.2. Derrame Pericárdico


Consiste no acúmulo anormal de líquido entre os folhetos do saco pericárdico. Geralmente
é o resultado de uma afecção pericárdica prévia, sendo frequente nas pericardites como resultado
do processo inflamatório. Doenças que comprometem equilíbrio hidrostático do sistema
cardiovascular e respiratório, bem como a drenagem linfática mediastinal podem cursar com o
derrame pericárdico. O trauma cardíaco também figura entre as causas de derrame, nesse caso,
o hemopericárdio. O espectro agudo de acúmulo enfrenta a rigidez dos folhetos, resultando na
limitação mecânica do funcionamento da bomba cardíaca, conhecida como tamponamento,
condição crítica que demanda intervenção imediata. Quando de instalação insidiosa, pode resultar
em consequências igualmente críticas, advindas do desarranjo das pressões de enchimento
cavitárias.

46
No traçado, a baixa voltagem é sugestiva de um afastamento entre a fonte elétrica e os
eletrodos. Desse modo, não é patognomonico de derrame pericárdico, no entanto, na presença de
indicativos fisiopatológicos, este diagnóstico não deve ser afastado. Outro achado interessante no
estudo eletrocardiográfico do derrame pericárdico é a alternância elétrica. Consiste em complexos
QRS amplos intercalados com complexos de baixa amplitude, representando um coração
“nadante” no derrame. Como usualmente apresenta-se em decorrência de uma pericardite, não é
incomum que os achados estejam combinados no traçado.

Fig. 31- ECG de 12 derivações apresentando alternância elétrica, evidente nos complexos QRS. FONTE: Science
Direct

Fig. 12 - ECG de 12 derivações apresentando supra desnível de segmento ST difuso, com concavidade voltada para
cima associada a baixa voltagem, sugestivo de pericardite e derrame pericárdico. FONTE: Science Direct
47
7.3. Embolia Pulmonar
Consiste na impactação de substâncias sólidas, líquidas ou gasosas no leito vascular
pulmonar, o que impede a perfusão de áreas do parênquima pulmonar, determinando assim a
dificuldade de trocas gasosas. É intimamente relacionada com a Trombose Venosa Profunda,
podendo também ser consequente a um trauma de ossos longos, líquido amniótico e iatrogênicas.
Apresenta-se clinicamente por dispneia e dor torácica, podendo esta última sugerir a altura do
comprometimento pulmonar. Um quadro suspeito de Embolia Pulmonar, somado a dor pleurítica,
pode sugerir acometimento do leito vascular distal, próximo a pleura.
Ao traçado, algumas alterações podem auxiliar no diagnóstico. O aumento da resistência
vascular pulmonar determina um esforço maior por parte do ventrículo direito, o que pode ser
apreciado, após certo tempo de instalação, como indicativos de dilatação ventricular deste lado.
Bloqueio de ramo direito, identificado pela primeira vez, também pode sugerir a Embolia.
Além dos citados, existe um padrão eletrocardiográfico que sugere o comprometimento do
lado direito do coração de forma muito específica: o S1Q3T3. Consiste na presença de onda S na
derivação DI, onda Q e inversão de onda T em DIII.

Fig. 33 - ECG de 12 derivações apresentando o padrão S1Q3T3. FONTE: Science Direct

Fig. 34 - Representação do padrão clássico de Embolia Pulmonar. FONTE: Science Direct

48
7.4. Distúrbios Séricos Do Potássio
a) Hipercalemia
O Potássio deve estar mais concentrado no meio intracelular do que no meio
extracelular justamente para a manutenção do gradiente de concentração para a
depolarização após a abertura dos canais de potássio. Altos níveis de potássio sérico, ou
seja, fora da célula, dificultam a despolarização e aceleram a repolarização. Deste modo,
podemos facilmente compreender as alterações eletrocardiográficas presentes neste tipo
de distúrbio. São elas: apiculação de onda T e QT curto, que ocorrem em virtude da alta
velocidade com que ocorre a repolarização e o adiantamento da mesma, respectivamente;
achatamento de onda P, alargamento do intervalo PR e complexos QRS alargados,
decorrentes da dificuldade de repolarização.

Fig. 35 - Traçado típico de hiperpotassemia. Achatamento de onda P e QRS alargado, demonstrando a dificuldade de
despolarização e onda T apiculada demonstrando um repolarização veloz. FONTE: Science Direct

49
Fig. 36 - Outra apresentação de hiperpotassemia. Ondas T apiculadas e complexos QRS alargados sugerem as
alterações iônicas na membrana. FONTE: Science Direct

b) Hipocalemia
Já versamos sobre a importância da concentração de Potássio para a manutenção
do potencial de ação celular e a espelho do que fora discutido no tópico anterior, é muito
simples perceber que baixos níveis de potássio fora da célula, tornam mais “fácil” a
despolarização ao reduzir o potencial de ação em conjunto com a diferença de
concentração que aumenta a velocidade de difusão. Em contrapartida, a repolarização
será mais demorada. O novo potencial de repouso é mais negativo e portanto mais
potássio precisará retornar para que ele seja atingido.
Estas alterações traduzem-se no traçado por uma onda T alongada e achatada e
um intervalo QT também mais demorado, em virtude do maior tempo gasto para a
repolarização ventricular. A onda P tende a apicular-se em virtude da rápida
despolarização. Um achado bem típico da hipopotassemia é o aparecimento da onda U,
que representa a repolarização tardia das fibras de Purkinje.

50
Fig. 37 - Traçado apresentando ondas P apiculadas, ondas T achatadas e presença de onda U. Padrão sugestivo de
Hipocalemia. FONTE: Science Direct

REFERÊNCIAS

1. FIGUINHA, Fernando. Curso básico de eletrocardiograma – parte 11 – Sobrecargas ventriculares. Portal


CardioPapers. 2013. Disponível em:<https://www.cardiopapers.com.br/curso-basico-de-eletrocardiograma-parte-11-
sobrecargas-ventriculares//> Acessado Acessado em: 14/09/2017.
2. Ricardo C. Rodrigues, Gomes Serrão, Susana Gomes, Décio Pereira Novos «critérios refinados»
eletrocardiográficos na avaliação de atletas. Revista Portuguesa de Cardiologia, Volume 35, Issue 12, December
2016, Pages 711-713
3. The pre‐sports cardiovascular evaluation: should it depend on the level of competition, the sport, or the state? Pediatr
Cardiol., 33 (2012), pp. 417-427
4. Sociedade Brasileira de Cardiologia I Diretriz de Miocardites e Pericardites.• Volume 100, N° 4, Supl. 1, Abril 2013
5. PASTORE, CA et al . Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Ánalise e Emissão de Laudos
Eletrocardiográficos. Arq. Bras. Cardiol., São Paulo , v. 93, n. 3, supl. 2, p. 1-19, 2009 . Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0066-782X2009001800001&lng=en&nrm=iso>. Acesso
em: 23 Set. 2017.
6. PASTORE, CA et al. ABC do ECG. São Paulo: CBBE, 2010.
7. PESARO, Antonio E.P. et al. Infarto Agudo do Miocárdio – Síndrome Coronariana Aguda com Supradesnível do
Segmento ST. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ramb/v50n2/20786>. Acesso em 23 Set. 2017.
8. NICOLAU, JC et al . Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Angina Instável e Infarto Agudo do
Miocárdio sem Supradesnível do Segmento ST (II Edição, 2007) - Atualização 2013/2014. Arq. Bras. Cardiol., São
Paulo , v. 102, n. 3, supl. 1, p. 01-75, Mar. 2014 . Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0066-782X2014000800001&lng=en&nrm=iso>. Acesso
em: 23 Set. 2017.
9. PIEGAS, LS et al . V Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Tratamento do Infarto Agudo do
Miocárdio com Supradesnível do Segmento ST. Arq. Bras. Cardiol., São Paulo , v. 105, n. 2, supl. 1, p. 1-

51
121, Aug. 2015 Disponívl em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0066-
782X2015003000001&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 23 Set. 2017.
10. LAPA, Eduardo. Quais os critérios eletrocardiográficos de infarto com supradesnivelamento de ST?. Disponível em:
<https://cardiopapers.com.br/quais-os-criterios-eletrocardiograficos-de-infarto-com-supradesnivelamento-de-st/>.
Acesso em: 23 Set. 2017.
11. Klein I, Levey GS. The cardiovascular system in thyrotoxicosis. In: Braverman LE, Utiger RD, eds. Werner & Ingbar’s
the thyroid: a fundamental and clinical text. 8th ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 2000; 596-604.

52
HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA
Ana Beatriz dos Santos, Erika Christina Silva, Gabriel Pinto dos Santos,
Gustavo Rodrigues da Silva,Mylena Miki Ideta

1. Conceitualização

A hipertensão arterial sistêmica (HAS) pode ser definida como o aumento pressórico do
sangue nos vasos, de etiologia variada, que deve obrigatoriamente ser sustentada, ou seja, suas
medidas acima do padrão considerado normal devem ser mantidas (>140 e/ou 90 mmHg).

2. Epidemiologia

EUA:
45% das mortes cardíacas são de origem hipertensiva;
51% das mortes causadas por Acidente Vascular Encefálico (AVE)
Dados: 2015.

BRASIL:
Contribui de forma direta ou indireta para 50% das mortes por doença
cardiovascular (DCV), além do impacto na produtividade do trabalho.
A HA atinge cerca de 32,5% da população brasileira (36 milhões de pessoas).
Desde 2010 a taxa de mortalidade por doenças hipertensivas vem diminuído.
Ademais, DCV são responsáveis também pelos altos índices de internações, com custos
elevados.
53
Fig. 4- Taxa de mortalidade no Brasil por doença cardiovascular (DCV) e distribuição por causas
no ano de 2013. FONTE: 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial

3. Pré-hipertensão

Pacientes que apresentam Pressão Arterial Sistólica (PAS) entre 121 e 139 e/ou Pressão
Arterial Diastólica (PAD) entre 81 e 89 mmHg adentram uma categoria denominada Pré-
hipertensão (PH). É importante salientar que a PH está associada, principalmente, com o maior
risco de desenvolver Hipertensão Arterial ou outras anormalidades cardíacas. Meta-análises
mostraram que aqueles com níveis de pressão entre 130-139 ou 85 e 89 mmHg apresentavam
maior risco de desenvolver HA.

4. Fatores de Risco

1. Idade: existe uma associação direta entre envelhecimento e desenvolvimento de HAS.


Tais dados podem ser atribuídos, além de fatores fisiológicos, ao aumento da expectativa
de vida brasileira e consequentemente aumento da população de idosos >60 anos na
última década;
2. Sexo e etnia: a HAS se apresenta, estatisticamente, em maior quantidade nas mulheres
(24,2%) e pessoas negras/cor preta (24,2%);
3. Excesso de peso e obesidade: aqueles com IMC maior ou igual a 25kg/m² tem maior
propensão ao desenvolvimento de HAS;
4. Ingestão de sal: consumo excessivo de sódio é um dos principais fatores de risco para
desenvolver HAS, o qual se associa não somente a eventos cardiovasculares, mas
também renais;
5. Ingestão de álcool: o consumo crônico e elevado de bebidas contendo álcool em sua
composição aumenta a pressão arterial (PA) de forma consistente, acarretando,
posteriormente, em HAS;
6. Sedentarismo: observou-se associação significativa entre HAS e idade, sexo masculino,
sobrepeso, adiposidade central, sedentarismo nos momentos de folga e durante o
trabalho, escolaridade inferior a 8 anos e renda per capita < 3 salários mínimos, em um
54
estudo de base realizado em Cuiabá (MT) com 1298 adultos maiores ou com 18 anos de
idade;
7. Genética: estudos brasileiros que avaliaram o impacto de polimorfismos genéticos na
população de quilombolas não conseguiram identificar um padrão mais prevalente, no
entanto, evidenciaram forte impacto da miscigenação, o que dificultou mais o processo de
identificação de um padrão genético para tal.

5. Fisiopatologia da hipertensão arterial sistêmica

O coração funciona como uma bomba e os vasos sanguíneos como um sistema fechado
de tubos, sendo assim a pressão é proporcional ao produto da quantidade de fluido bombeada
para o interior dos tubos pela resistência ao fluxo:

Pressão = fluxo x resistência

Traduzindo-se cardiologicamente em:

Pressão arterial = débito cardíaco x resistência vascular periférica

Logo, a pressão arterial aumenta quando ocorre uma elevação do débito cardíaco (DC) ou
uma redução da resistência vascular periférica (RVP), principalmente nas arteríolas que tem sua
parede formada por uma grande quantidade de músculo liso.

A contração das células musculares lisas na parede das arteríolas está relacionada com o
aumento da concentração de cálcio intracelular, o que explica o efeito vasodilatador de drogas
bloqueadoras de canal de cálcio, como veremos adiante. A contração prolongada da musculatura
lisa das arteríolas induz mudanças estruturais na parede das mesmas, mediada por angiotensina,
leva a uma resistência vascular periférica irreversível.

Na fase inicial da HAS, a resistência periférica não é aumentada e a elevação da PA é


gerada pelo aumento do DC, que está relacionado com a hiperatividade simpática. O aumento
subsequente da RVP pode, portanto, se desenvolver de forma compensatória para evitar que a
pressão aumentada seja transmitida para o leito capilar, onde afetaria substancialmente a
homeostase celular, devido às forças de Starling (forças responsáveis pelo movimento de soluto e
solvente pela parede capilar, sendo elas: pressão hidrostática e pressão oncótica).

Na hipertensão franca há o aumento da resistência periférica, pela diminuição patológica


do calibre das arteríolas. São duas as possibilidades de ocorrer tal diminuição: alterações
funcionais, que promovem uma vasoconstrição ativa, e/ou alterações estruturais, que reduzem a
luz do vaso (hipertrofia e remodelamento vascular). Nas fases iniciais da doença predominam os

55
fatores funcionais, já na hipertensão crônica há uma interação dos fatores estruturais e funcionais
em graus variados.

Alguns mecanismos fisiológicos são compensatórios nas fases iniciais da HAS, sendo
superados quando a alteração estrutural nas arteríolas é tamanha a ponto dos mesmos não
vencerem a resistência vascular periférica.

5.1. Sistema Renina-Angiotensina-Aldoterona

O sistema renina- angiotensina-aldosterona (RAA) é o sistema endócrino mais


importante no que diz respeito ao controle da pressão sanguínea. A renina é secretada nas
células justaglomerulares renais e é responsável pela resposta a baixa perfusão glomerular ou
a baixa ingesta de sal. Também é liberada em resposta a estimulação do sistema nervoso
simpático.

A renina é responsável por converter o angiotensinogenio em angiotensina I, uma


substancia fisiologicamente inativa que é rapidamente convertida em angiotensina II no
pulmão pela enzima conversora de angiotensina (ECA). A angiotensina II é um potente
vasoconstritor, causando aumento na pressão arterial rapidamente. Além disso, estimula a
liberação de aldosterona na zona glomerulosa da glândula adrenal, o que resulta em um
aumento adicional da pressão arterial relacionada à retenção de sódio e água.

Uma importante função do Sistema RAA é permitir que o indivíduo possua grandes
variações em sua ingesta de sódio sem gerar importantes diferenças no volume extracelular
ou na pressão arterial. Essa função é explicada na Figura 2 que mostra o efeito inicial da
ingesta elevado de sódio, elevando o volume do líquido extracelular e a pressão arterial.
Então, a PA elevada aumenta o fluxo sanguíneo renal, reduzindo a secreção de renina e
provocando a redução da retenção renal de sal e água, normalizando a pressão arterial.
Dessa forma, o sistema RAA atua com feedback automático que contribui para manutenção
da PA em níveis próximos a normalidade mesmo quando a ingesta de sal é elevada.

56
Aumento da ingesta de sal

Aumento do volume extracelular

Aumento da pressão arterial

Redução da renina e angiotensina

Redução da retenção renal de sal e água

Retorno do volume extracelular praticamente ao normal

Retorno da pressão arterial praticamente ao normal

Fig. 5- Eventos sequenciais por meio dos quais a ingestão de sal aumenta a pressão arterial, mas a redução por
feedback da atividade do SRAA a normaliza. FONTE: GUYTON

5.2. Sistema nervoso simpático

A descarga dos nervos vasomotores noradrenérgicos causa constrição das arteríolas


atendidas pelos nervos e, se a descarga for geral em vez de local, ocorre um aumento na
pressão sanguínea. Além disso, a descarga dos nervos noradrenérgicos simpáticos que
atendem ao coração eleva a pressão sanguínea, através do aumento da força e da freqüência
de contração cardíacas (efeitos inotrópico e cronotrópico), do aumento do volume de
batimento e do débito cardíaco. O estímulo noradrenérgico também inibe o efeito do estímulo
vagal, que normalmente desacelera o coração e reduz o débito cardíaco.
O principal controle da descarga vasomotora é a regulação por realimentação via
barorreceptores. Os barorreceptores são terminações nervosas sensíveis à distensão,
localizados nos seios carotídeos e no arco aórtico do lado arterial, nas paredes das grandes
veias e no átrio cardíaco do lado venoso. O aumento da pressão arterial gera distensão dos
barorreceptores, fazendo com que transmitam sinais para o sistema nervoso central, mais
especificamente para o trato solitário do bulbo. Sinais secundários inibem o centro
vasoconstritor bulbar e excitam o parassimpático vagal. Os efeitos finais são: vasodilatação
das veias e arteríolas no sistema circulatório periférico e diminuição da frequência cardíaca e
da força de contração miocárdica, levando a diminuição reflexa da pressão arterial. Ao

57
contrario, a baixa pressão tem efeitos opostos, provocando elevação reflexa da pressão de
volta ao normal.

5.3. Substâncias secretadas pelo endotélio

Os vasos sanguíneos são revestidos por uma camada contínua de células endoteliais
e essas células desempenham um papel vital na regulação das funções vasculares. Elas
reagem a alterações de fluxo (força de cisalhamento), ao estiramento, a uma variedade de
substâncias circulantes e mediadores inflamatórios. Em resposta a esses estímulos, secretam
substâncias vasoativas e reguladoras de crescimento. Os fatores de crescimento regulam o
desenvolvimento vascular e são importantes em diversas doenças. As substâncias vasoativas
produzidas pelo endotélio geralmente agem de forma parácrina, para regular o tônus vascular
local. Essas incluem as prostaglandinas, como a prostaciclina e também os tromboxanos, o
óxido nítrico e as endotelinas.

A prostaciclina é produzida pelas células endoteliais e o tromboxano A2 pelas


plaquetas, a partir do seu precursor comum, o ácido araquidônico. O tromboxano A2 induz a
agregação de plaquetas e a vasoconstrição, enquanto a prostaciclina promove a
vasodilatação.

O óxido nítrico (ON) é produzido a partir da arginina em uma reação catalisada pela
óxido nítrico sintase (ONS). São encontradas três formas da ONS: a ONS1, encontrada no
sistema nervoso; a ONS2, encontrada em macrófagos e em células imunes relacionadas e a
ONS3, encontrada nas células endoteliais. A ONS1 e a ONS3 são ativadas por agentes que
aumentam o Ca2+ intracelular, incluindo os vasodilatadores acetilcolina e bradicinina,
enquanto a ONS2 é ativada por citocinas. O ON formado nas células endoteliais se difunde
para as células do músculo liso do tecido vascular adjacente, onde ativa a guanililciclase
solúvel, produzindo guanosina monofosfato cíclica (GMPc). A GMPc medeia o relaxamento do
músculo liso vascular.

As células endoteliais também produzem endotelina-1 (ET-1), um potente


vasoconstritor. Nas células endoteliais, uma parte da ET-1 produzida entra na circulação,
porém a maior parte se difunde para o músculo liso ao redor, atuando a ET-1 de forma
parácrina.

5.4. Substâncias circulantes que afetam o músculo liso

Os hormônios da circulação que causam efeitos gerais no sistema vascular são


vasoconstritores e vasodilatadores. Os principais vasoconstritores são a norepinefrina e a
epinefrina, a vasopressina e a angiotensina II. Os principais vasodilatadores são o peptídio
intestinal vasoativo, as cininas e os peptídios natriuréticos.
58
5.5. Resumindo

Cerca de 90 a 95% dos pacientes com HAS apresenta a dita Hipertensão primária, ou
seja, hipertensão de origem desconhecida, em contraste com as formas de hipertensão
secundária que possuem causas conhecidas, como estenose de artéria renal, etc.

Na maioria dos pacientes com hipertensão primária, os fatores ambientais como


sobrepeso e estilo de vida sedentária desempenham papel primordial, gerando alterações nos
mecanismos compensatórios de PA já descritos acima, levando a descompensação da PA e
consequente aumento permanente da mesma.

Esses mecanismos compensatórios alterados incluem: aumento da atividade do


sistema nervoso simpático; aumento da produção de hormônios retentores de sódio e de
vasoconstritores; aumento da secreção ou secreção inapropriada de renina, com consequente
aumento na produção de angiotensina II e aldosterona; deficiência na produção de
vasodilatadores como prostaciclinas, óxido nítrico (NO) e peptídeos natriuréticos; alterações
na expressão do sistema calicreína-cinina; anormalidades dos vasos de resistência, incluindo
lesões seletivas da microvasculatura renal; aumento na atividade de fatores de crescimento
vascular; alterações dos receptores adrenérgicos, influenciando a frequência cardíaca, a
resposta inotrópica do coração e o tônus vascular; e alterações no transporte iônico celular.

6. Diagnóstico de HAS

A avaliação inicial de um paciente com hipertensão arterial sistêmica inclui a confirmação


do diagnóstico, a suspeição e a identificação de causa secundária, além da avaliação do risco
cardiovascular. As lesões de órgão-alvo e doenças associadas também devem ser investigadas.
Fazem parte dessa avaliação a medição da PA no consultório e/ou fora dele, utilizando-se técnica
adequada e equipamentos validados, história médica (pessoal e familiar), exame físico e
investigação clínica e laboratorial.
A medição correta e a interpretação da pressão arterial são essenciais no diagnóstico e
manejo da hipertensão arterial. É essencial que as máquinas de pressão arterial sejam
devidamente calibradas, os tamanhos adequados do manguito são selecionados e, quando a PA
é medida em uma configuração baseada em consultório, o pessoal é treinado corretamente e o
paciente está posicionado corretamente2. Os equipamentos devem ser validados e sua calibração
deve ser verificada anualmente, de acordo com as orientações do INMETRO (tabela 1).

Por meio dessas portarias, os fabricantes ou importadores de esfigmomanômetros devem


submeter seus produtos ao controle metrológico, definido no Regulamento Técnico, abragendo as
seguintes etapas:

59
Apreciação técnica de modelo – cada fabricante ou importador de esfigmomanômetro deve
submeter à aprovação do INMETRO cada modelo fabricado ou importado, sendo que nenhuma
modificação pode ser feita sem autorização do INMETRO no esfigmomanômetro cujo modelo
tenha sido aprovado;
Verificação inicial – deve ser feita em todos os esfigmomanômetros fabricados, nas dependências
dos fabricantes ou outro local a critério do INMETRO, antes de sua colocação em uso;
Verificação periódica – deve ser realizada uma vez por ano, de preferência nas dependências dos
órgãos da RBMLQ (IPEMs) ou em local designado pelo INMETRO; e
Verificação eventual – deve ser realizada por solicitação do detentor do instrumento, após o
conserto e/ou manutenção do mesmo, ou quando o INMETRO julgar necessário.
Tabela 1 - Portaria INMETRO no. 24, de 22 de fevereiro de 1996, para os esfigmomanômetros mecânicos do tipo
aneróide, e no. 096, de 20 de março de 2008, para os esfigmomanômetros eletrônicos digitais de medição não-invasiva.
a
Fonte: 7 Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial

A pressão arterial pode ser medida usando uma das seguintes três estratégias aceitáveis:
 Monitoramento ambulatorial da pressão arterial (MAPA);
 Medição residencial da pressão arterial (MRPA);
 Medidas no consultório;
A MAPA deve fazer parte do fluxograma para diagnóstico da hipertensão arterial e a
MRPA fornece informações úteis sobre os níveis da PA e o seu comportamento fora do ambiente
de consultório, em diferentes momentos. No consultório, a PA deve ser medida por médicos de
qualquer especialidade ou qualquer profissional da saúde devidamente capacitados. Recomenda-
se, pelo menos, a medição da PA a cada dois anos para os adultos com PA ≤ 120/80 mmHg, e
anualmente para aqueles com PA > 120/80 mmHg e < 140/90 mmHg. A medição da PA pode ser
feita com esfigmomanômetros manuais, semi-automáticos ou automáticos. A medição também
deverá ser realizada nos membros inferiores, utilizando-se manguitos apropriados, na suspeita de
HAS secundária.
Hipotensão ortostática deve ser suspeitada em pacientes idosos, diabéticos,
disautonômicos e naqueles em uso de medicação anti-hipertensiva. Assim, particularmente
nessas condições, deve-se medir a PA com o paciente de pé, após 3 minutos, sendo a hipotensão
ortostática definida como a redução da PAS > 20 mmHg ou da PAD > 10 mmHg.
Os procedimentos recomendados para a medição da PA, segundo a 7a Diretriz Brasileira
de Hipertensão Arterial são:

 Preparo do paciente:
1. Explicar o procedimento ao paciente e deixá-lo em repouso de 3 a 5 minutos em ambiente
calmo. Deve ser instruído a não conversar durante a medição. Possíveis dúvidas devem ser
esclarecidas antes ou depois do procedimento.

60
2. Certificar-se de que o paciente NÃO:
- Está com a bexiga cheia;
- Praticou exercícios físicos há pelo menos 60 minutos;
- Ingeriu bebidas alcoólicas, café ou alimentos;
- Fumou nos 30 minutos anteriores.
3. Posicionamento:
- O paciente deve estar sentado, com pernas descruzadas, pés apoiados no chão, dorso
recostado na cadeira e relaxado;
- O braço deve estar na altura do coração, apoiado, com a palma da mão voltada para cima
e as roupas não devem garrotear o membro.
4. Medir a PA na posição de pé, após 3 minutos, nos diabéticos, idosos e em outras situações em
que a hipotensão ortostática possa ser frequente ou suspeitada.

 Etapas para a realização da medição:


1. Determinar a circunferência do braço no ponto médio entre acrômio e olécrano;
2. Selecionar o manguito de tamanho adequado ao braço;
3. Colocar o manguito, sem deixar folgas, 2 a 3 cm acima da fossa cubital;
4. Centralizar o meio da parte compressiva do manguito sobre a artéria braquial;
5. Estimar o nível da PAS pela palpação do pulso radial;
6. Palpar a artéria braquial na fossa cubital e colocar a campânula ou o diafragma do
estetoscópio sem compressão excessiva;
7. Inflar rapidamente até ultrapassar 20 a 30 mmHg o nível estimado da PAS obtido pela
palpação;
8. Proceder à deflação lentamente (velocidade de 2 mmHg por segundo);
9. Determinar a PAS pela ausculta do primeiro som (fase I de Korotkoff) e, após, aumentar
ligeiramente a velocidade de deflação;
10. Determinar a PAD no desaparecimento dos sons (fase V de Korotkoff);
11. Auscultar cerca de 20 a 30 mmHg abaixo do último som para confirmar seu
desaparecimento e depois proceder à deflação rápida e completa;
12. Se os batimentos persistirem até o nível zero, determinar a PAD no abafamento dos sons
(fase IV de Korotkoff) e anotar valores da PAS/PAD/zero;
13. Realizar pelo menos duas medições, com intervalo em torno de um minuto. Medições
adicionais deverão ser realizadas se as duas primeiras forem muito diferentes. Caso julgue
adequado, considere a média das medidas;
14. Medir a pressão em ambos os braços na primeira consulta e usar o valor do braço onde foi
obtida a maior pressão como referência;
15. Informar o valor de PA obtido para o paciente; e
16. Anotar os valores exatos sem “arredondamentos” e o braço em que a PA foi medida.
61
A MRPA é uma modalidade de medição realizada com protocolo específico, consistindo na
obtenção de três medições pela manhã, antes do desjejum e da tomada da medicação, e três à
noite, antes do jantar, durante cinco dias. Outra opção é realizar duas medições em cada uma
dessas duas sessões, durante sete dias. São considerados anormais valores de PA ≥ 135/85
mmHg.1
A MAPA é o método que permite o registro indireto e intermitente da PA durante 24 horas
ou mais, enquanto o paciente realiza suas atividades habituais durante os períodos de vigília e
sono. Uma de suas características mais específicas é a possibilidade de identificar as alterações
circadianas da PA, sobretudo em relação às medições durante o sono, que têm implicações
prognósticas consideráveis. São atualmente consideradas anormais as médias de PA de 24 horas
≥ 130/80 mmHg, vigília ≥ 135/85 mmHg e sono ≥ 120/70 mmHg.

7. Classificação

Os limites da PA considerado normais em adultos são classificados da seguinte forma:

a) Hipertensão: os valores que definem HAS são divididos em 3 estágios, conforme


Tabela 2. É necessário lembrar que o diagnóstico realizado em consultório deverá
ser validado por medições repetidas em duas ou mais ocasiões e confirmado por
medições fora do consultório (MAPA ou MRPA). A HAS não controlada é definida
quando, mesmo sob uso de anti-hipertensivos, o paciente permanece com PA
elevada intra e extra ambulatorial confirmado por MAPA ou MRPA.

b) Normotensão: medidas de consultório ≤ 120/80 mmHg com MAPA ou MRPA que


confirmem tais valores. Define-se hipertensão arterial controlada quando o paciente
permanece com pressão controlada intra e extra ambulatorial, em uso de anti-
hipertensivos.

c) Pré-hipertensão: presença de PAS entre 121 e 139 e/ou PAD entre 81 e 89 mmHg.

Classificação PAS PAD


(mmHg) (mmHg)

Normal ≤120 ≤80

Pré-hipertensão 121-139 81-89

Hipertensão estágio 1 140-159 90-99

Hipertensão estágio 2 160-179 100-109

Hipertensão estágio 3 ≥180 ≥110

*Quando PAS e PAD situam-se em categorias diferentes, a maior deve


ser utilizada para classificação da PA.

**Considera-se hipertensão sistólica isolada se PAS≥140 mmHg e


PAD<90 mmHg, devendo a mesma ser classificada em estágios 1, 2 e 3

62
Tabela 2 – Classificação da PA de acordo com a medição casual ou no consultório a partir de 18 anos de idade.
FONTE: 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial

Outra classificação que podemos encontrar no ambulatório é a hipertensão do avental


branco, que consiste em valores anormais da PA no consultório, porém com valores normais na
MAPA ou MRPA. A prevalência global de hipertensão do avental branco é de 13% e atinge cerca
de 32% dos hipertensos. A diferença de pressão entre as medidas obtidas no consultório e fora
dele deve ser igual ou superior a 20 mmHg na PAS e/ou 10 mmHg na PAD.

A hipertensão mascarada é o oposto da hipertensão do avental branco, consistindo em


medidas de PA normais no consultório e elevadas no MAPA ou MRPA. Alguns fatores podem
levar a esse fenômeno: paciente jovem, sexo masculino, tabagismo, consumo de álcool, atividade
física, hipertensão induzida pelo exercício, ansiedade, estresse, obesidade, DM, DRC e historia
familiar de HAS.

A hipertensão sistólica isolada consiste no aumento da PAS com PAD normal. A


hipertensão sistólica isolada e a pressão de pulso são importantes fatores de risco cardiovascular
em pacientes de meia idade e idosos.

8. Avaliação clínica e complementar

Os objetivos da avaliação clinica e laboratorial são: confirmação diagnóstica, identificação


dos fatores de risco cardiovasculares, identificação de lesão de órgão alvo, presença de doenças
associadas, estratificação do risco cardiovascular, avaliação de HAS secundária. É de extrema
importância a realização de anamnese e exame físico completos para a averiguação de todos os
fatores prognósticos desse paciente

A avaliação complementar tem como objetivo detectar lesões subclínicas ou clinicas em


órgãos alvo, melhorando a estratificação do risco cardiovascular.

 Estratificação do risco cardiovascular global.

O risco CV global deve ser avaliado em cada individuo hipertenso, pois auxilia na
decisão terapêutica e permite analise prognostica mais acurada. A tabela a seguir
objetiva auxiliar o profissional de saúde na estratificação.

Tabela 3 – Estratificação de risco no paciente hipertenso de acordo com fatores de risco adicionais, presença de lesão
em órgão-alvo e de doença cardiovascular ou renal. FONTE: 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial.

9. Abordagem terapêutica

63
Os objetivos da abordagem terapêutica incluem redução da pressão arterial, e
consequente proteção de órgãos-alvo e prevenção de desfechos cardiovasculares e renais. Para
isso, são utilizadas medidas não medicamentosas e medicamentosas.
Ao tomar a decisão terapêutica, deve-se atentar para o grau da pressão arterial, presença
de fatores de risco, lesão de órgão-alvo e/ou doença cardiovascular estabelecida, observada no
fluxograma 1.
Nos casos de níveis de PA entre 130-139/85-89, a decisão de instituir terapia
farmacológica deve ser individualizada, baseada em história prévia de doença cardiovascular e
naqueles com risco cardiovascular alto.
Na abordagem de hipertensos idosos, inicia-se terapia farmacológica a partir de PAS ≥ 140
mmHg para aqueles abaixo de 80 anos, já para aqueles com idade acima de 80 anos, o limite
para início da terapia aumenta para PAS ≥ 160 mmHg.
O tratamento medicamentoso em pacientes jovens com hipertensão sistólica isolada (HSI)
deve ser iniciada caso o risco cardiovascular seja alto, caso não seja, deve-se iniciar a terapia não
farmacológica com monitorização da lesão de órgão-alvo.

Hipertensão Hipertensão Hipertensão


estágio 1 estágio 2 estágio 3

Iniciar tratamento
Risco baixo Risco moderado Risco alto medicamentoso
associado à terapia não
medicamentosa

Terapia não Terapia não


famacológica por famacológica por
6 meses 3 meses

Reavaliação

Controle da PA: Não controle da PA:


manter o associar terapia
tratamento farmacológica
64
Fluxograma 1 – Tratamentos instituídos de acordo com cada estágio de hipertensão arterial. FONTE: próprio autor.
9.1. Metas pressóricas

• Hipertensão estágio 1 e 2, com risco


< 140/90 mmHg
baixo ou moderado
• Hipertensão estágio 3

• Hipertensão estágio 1 e 2, com risco alto < 130/80 mmHg

Tabela 4 – Metas a serem atingidas em conformidade com as características individuais. FONTE: 7ª Diretriz Brasileira
de Hipertensão Arterial.

Os hipertensos sem controle adequado da PA devem ser acompanhados mensalmente


com o objetivo de alcançar a meta pressórica recomendada o mais breve possível através de
ajustes terapêuticos sequenciais.

Em idosos e aqueles com PA muito elevada, deve-se reduzir com cautela e


progressivamente, considerando condições gerais do paciente, presença de comorbidades e de
outras medicações em uso.

9.2. Tratamento não medicamentoso

O tratamento não medicamentoso inclui: controle ponderal, medidas nutricionais,


prática de atividade física, cessação do tabagismo, controle do estresse.
a) Peso

• Manter IMC <25kg/m2 até 65 anos


• Manter IMC <27kg/m2 após 65 anos
• Circunferência abdominal < 80 cm nas mulheres e < 94 cm nos homens

b) Padrão alimentar
A dieta DASH (Dietary Approaches to Stop Hypertension) foca no consumo de frutas, hortaliças,
laticínios com baixo teor de gordura, cereais integrais, frango, peixe e frutas oleaginosas e
redução de carne vermelha, doces e bebidas com açúcar.
Entre as outras dietas associadas a diminuição da PA, encontra-se a dieta do mediterrâneo e
dietas vegetarianas.

65
Fig. 3 – dieta DASH.
FONTE: próprio autor
9.3. Tratamento Medicamentoso

Havendo indicação de tratamento medicamentoso, o pacietne deverá ser orientado


quanto a importancia de manutenção de tratamento regular e de eventual ajustes de doses,
troca ou associações de medicações e efeitos adversos eventuais.
Possuímos hoje no mercado uma infinidade de medicamentos anti-hipertensivos,
sendo de obrigatoriedade médica a escolha da melhor droga para seu paciente. A tabela
abaixo traz informações cruciais a respeito das várias classes de anti-hipertensivos.

Medicamento Uso Efeitos Adversos Exemplos


Diuréticos Efeitos natriuréticos + diminuição - parestesia, hipovolemia, Tiazídicos:
do volume extracelular, que leva fraqueza, disfunção erétil. clortalidona,
a diminuição da resistência - hipopotassemia, pode estar hidroclorotiazida e
vascular periférica. acompanhada de indapamida
Redução da PA e da hipomagnesemia (risco de
morbimortalidade CV. arritmias ventriculares). de alça:
- Tiazídicos: preferenciais, mais - redução da liberação de
furosemida e
suave e maior tempo de ação bumetanida
insulina, causando
- de alça: casos de Insuficiência intolerância à glicose (risco
Renal e situações de edema Poupadores de
de DM 2).
- Poupadores de Potássio: potássio:
- espironolactona, em espironolactona e
habitualmente utilizados em pacientes com déficit de amilorida
associação com os outros função renal, pode causar
diuréticos, que aumentam a hiperpotassemia.
excreção de potássio
Obs: o uso de doses baixas
diminui o risco dos efeitos
adversos
Beta- - Diminuição do débito cardíaco - Broncoespasmo, 1ª geração:
bloqueadores e secreção de renina bradicardia, distúrbios da Propanolol,
- Readaptação dos condução atrioventricular, Nadolol, Timolol,
barorreceptores vasoconstrição periférica, Sotalol
- Diminuição das catecolaminas insônia, pesadelos,
depressão psíquica, 2ª geração:
nas sinapses nervosas
astenia, disfunção sexual Atenolol,
Obs: fármacos de terceira
- 1ª e 2ª gerações: Metoprolol e
geração apresentam efeito
Bisoprolol
adicional vasodilatador pelo • contra-indicadas em
bloqueio de receptores alfa-1 asma brônquica, DPOC e 3ª geração:
adrenérgico simultâneo bloqueio atrioventricular Carvedilol,
de 2º e 3º graus Nebivolol
• intolerância à glicose
(potencializado quando
combinado com
diuréticos),
hipertrigliceridemia com
elevação do LDL-
colesterol e redução do
HDL-colesterol
- 3ª geração:
• impacto neutro ou
melhora do metabolismo
de glicose e lipídico
• menor disfunção sexual

66
Inibidores da Inibição da enzima conversora de - principal: tosse seca Captopril,
enzima angiotensina I em angiotensina II, - edema angioneurótico e enalapril, ramipril,
conversora de cuja ação é vasoconstritora. erupção cutânea lisinopril, quinapril
Angiotensina Redução da morbimortalidade - hiperpotassemia em
cardiovascular.
pacientes com insuficiência
Usadas em afecções CV, como
renal
em IC com fração de ejeção
- redução da taxa de filtração
reduzida, anti-remodelamento
cardíaco pós-infarto, além de glomerular em casos de
possíveis propriendades estenose bilateral das
antiateroscleróticas. artérias renais.
Diminui a perda de função renal Contraindicados na gravidez.
em pacientes com nefropatia
diabética ou outras causas.

Bloqueadores Bloqueiam os receptores AT1 , Incomuns e raros, entre eles: Losartana,


dos que agem na vasoconstrição, exantema. candesartana,
Receptores de proliferação e estimulação da Contraindicados na gravidez. irbersartana,
AT1 da liberação de aldosterona, através olmesartana,
angiotensina II do estímulo de angiotensina II. valsartano
Redução da morbimortalidade
cardiovascular e renal,
principalmente no grupo de alto
risco cardiovascular ou com
comorbidades.

Inibidores Inibição direta da renina, que Boa tolerabilidade. Alisquireno


diretos da culmina na diminuição da Efeitos adversos raros: Rash
Renina formação de angiotensina II. cutâneo, diarreia (em casos de
Sem evidências atuais dos efeitos doses elevadas), aumento da
sobre a morbimortalidade. creatinofosfoquinase (CPK) e
tosse
Contraindicados na gravidez.
Tabela 5 – Principais classes de anti-hipertensivos. FONTE: Próprio autor.

10. Estratégias para implementação de medidas de prevenção primária

A fim de prevenir o desenvolvimento da HA, deve-se ter em vista políticas de saúde


pública associadas a ações médicas e de meios de comunicação, para que a sociedade tenha
conhecimento do risco que corre ao estar exposto aos fatores de risco supracitados, além de
alertar quanto ao diagnóstico precoce e estimular o tratamento contínuo do controle da PA e FC
associados, através, principalmente da modificação do estilo de vida e/ou uso regular de
medicamentos.

REFERÊNCIAS

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107 (Supl 3).
2. McPhee, Stephen J. Fisiopatologia da doença [recurso eletrônico] : uma introdução à Medicina Clínica. – 5.
Ed.. – Porto Alegre : AMGH, 2011
3. GUYTON, A.C.; HALL, J.E. Tratado de Fisiologia Médica. 12ª ed. Rio de Janeiro, Elsevier Ed., 2011.
4. Malachias MVB, Souza WKSB, Plavnik FL, Rodrigues CIS, Brandão AA, Neves MFT, et al. 7ª Diretriz Brasileira
de Hipertensão Arterial. Arq Bras Cardiol 2016; 107(3Supl.3):1-83.

67
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hypertension in adults. 2016. www.uptodate.com.
6. Beevers G, Lip GYH, O’Brien E. The pathophysiology of hypertension. BMJ : British Medical Journal.
2001;322(7291):912-916.
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de Monitorização Residencial da Pressão Arterial (MRPA III). Sociedades Brasileiras de Cardiologia,
Hipertensão e Nefrologia. Arq Bras Cardiol 2011; 97(3 Supl 3):1-24
8. Damen JA, Hooft L, Schuit E, Debray TP, Collins GS, Tzoulaki I, et al. Prediction models for cardiovascular
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9. Turnbull F, Neal B, Algert C, Chalmers J, Chapman N, Cutler J, et al; Blood Pressure Lowering Tratment
Trialists´collaboration. Effects of different blood pressure lowering regimens on major cardiovascular events in
individuals with and without diabetes mellitus: results of prospectively-designed overviews of randomized trials.
Arch Intern Med. 2005;165(12):1410-9.
10. Calhoun DA, Jones D, Textor S, Goff DC, Murphy TP, Toto RD, et al. Resistant hypertension: diagnosis
evaluation, treatment. A scientific statement from the American Heart Association Professional Education
Committee of the Council for High Blood Pressure Research. Hypertension. 2008;51:1403–1419.[PubMed]

68
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA
Erika Christina Silva, Giovanna Lacerda Guedes,
Gustavo Militão do Nascimento, Kristian Holanda Nogueira

1. Conceitualização
A insuficiência cardíaca (IC) é uma condição na qual o coração fragilizado, por diversas
etiologias possíveis, torna-se incapaz de manter um débito cardíaco adequado para a perfusão e
demanda metabólica dos tecidos; ou ainda quando o faz à custa de aumento das pressões de
enchimento das câmaras.

Ou seja, a insuficiência cardíaca é o estado fisiopatológico de falha progressiva do


mecanismo de bomba do coração, é a via final da maioria das cardiopatias. As causas são tanto
anatômicas e estruturais quanto funcionais e moleculares.

É uma síndrome que se apresenta com sintomas respiratórios como dispneia progressiva,
ortopneia, dispneia paroxística noturna, fadiga e retenção de fluídos. Os pacientes com
insuficiência cardíaca são geralmente intolerantes ao esforço físico e ao decúbito dorsal horizontal
quando estão muito congestos.

2. Epidemiologia
Os pacientes com insuficiência cardíaca tem uma queda na qualidade de vida e aumento
da mortalidade e da morbidade. A III Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica diz que
no ano de 2007 as doenças cardiovasculares representaram a terceira causa de internações no
SUS, com 1.156.136 hospitalizações. A IC é a causa mais frequente de internação por doença

69
cardiovascular. Apesar de todos os avanços terapêuticos, o prognóstico dessa síndrome é ruim,
com média de sobrevida após a instalação dos sintomas de somente 1,7 ano em homens, e 3,2
anos em mulheres.
Quanto à etiologia da IC, nos últimos anos houve mudanças no perfil. Na década de 1950
as causas mais comuns eram as não isquêmicas, como hipertensão arterial sistêmica, doença
valvar e doença de Chagas. No entanto, com as mudanças nos hábitos alimentares, aumento do
sedentarismo e estresse, maior consumo de bebidas alcoólicas e fumo, aumentou-se a incidência
de doença aterosclerótica. Hoje, a aterosclerose, se manifestando nas cardiopatias isquêmicas, é
responsável pela etiologia da maioria dos casos de IC; configurando-se como a doença arterial
coronária responsável por aproximadamente dois terços dos pacientes com que possuem
disfunção sistólica do ventrículo esquerdo.

3. Fisiopatologia
A insuficiência cardíaca é um complexo fisiopatológico associado à disfunção do coração,
e é um ponto terminal comum a muitas doenças do sistema cardiovascular. Há diversas etiologias
possíveis, podendo ser causada por sobrecargas inapropriadas colocadas sobre o coração, como
sobrecarga de volume ou de pressão; restrição ao enchimento do coração; perda de miócitos; ou
diminuição da contratilidade dos miócitos.

O mecanismo fisiopatológico da insuficiência cardíaca tem diversas vias de ativação que


no final gerarão a baixa perfusão e a retenção de líquidos. Além disso, ocorrerão consequências
no próprio coração que trabalhará sobrecarregado de líquido retido, sobre uma pressão
aumentada nas câmaras e sobre o efeito de diversos sistemas que são ativados como o SRAA,
sofrendo um remodelamento miocárdico, com hipertrofia na IC sistólica e dilatação na IC diastólica.

Para melhor entendermos a fisiopatologia da IC, trabalharemos com um caso clínico de um


paciente hipotético que sofre um infarto agudo do miocárdio, gerando lesão e sobrecarga ao
miocárdio. Como em toda lesão, existirá uma resposta inflamatória com ativação de vários
medidores e substâncias, estresse oxidativo e disfunção endotelial.

Após o evento inicial etiológico da insuficiência cardíaca, continuando com o exemplo do


IAM que deixa uma parede do coração acinética, o coração perde força de contração e
consequentemente ejeta menos volume sanguíneo, gerando redução do débito cardíaco (DC) e
acúmulo de sangue na circulação periférica, levando a aumento da pressão arterial.

Com o DC em níveis muito baixos, ocorre ativação de mecanismos reflexos


compensatórios, como o reflexo barorreceptor, exercendo forte estimulação simpática sobre a
circulação: primeiramente, torna a musculatura cardíaca mais forte, ainda que danificada,
aumentando cerca de duas vezes sua força contrátil e, por conseguinte, o débito cardíaco. O
segundo efeito é sobre a circulação, aumentando o retorno venoso devido à elevação do tônus

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dos vasos sanguíneos. Em suma, o coração lesionado passa a receber mais sangue que o usual
e, consequentemente, eleva a pressão intra-atrial direita para conseguir bombear tal volume
sanguíneo.

Tal efeito compensatório não é infinito, visto que, quanto maior força de contração o
coração dispuser, maior a lesão na musculatura. Quando a capacidade de bombeamento do
coração for ainda mais reduzida, o fluxo sanguíneo para os rins torna-se muito baixo, o que os
mesmos traduzem por hipovolemia, desencadeando um mecanismo compensatório de retenção
de sódio e agua. Essa tentativa de compensar gera um ciclo vicioso no mecanismo cardiorrenal:
quanto mais liquido os rins retêm, maior a volemia e maior a dificuldade do coração bombear essa
maior quantidade de liquido, o que gera uma elevação no volume diastólico final, ocasionando
sobrecarga de pressão nas câmaras retrogradamente e maior congestão pulmonar. Esse ciclo
continua indefinidamente, a não ser que medidas terapêuticas eficazes sejam postas em prática.

O acúmulo excessivo de liquido acaba por aumentar a carga no coração já danificado,


gerando distensão excessiva da musculatura, enfraquecendo-o ainda mais; filtração do excesso
de líquidos pelo pulmão, levando a edema pulmonar e posterior desoxigenação sanguínea; edema
extenso em grandes áreas corporais.

Quando a câmara atrial direita aumenta tanto de volume a ponto de compensar o debito
cardíaco elevado, tornando-o dentro dos padrões normais, caracterizamos a insuficiência cardíaca
compensada. Esse padrão ocorre principalmente em pessoas idosas, que possuem níveis de
pressão atrial elevado, mostrando as varias compensações cardíacas sofridas. Esses pacientes
não podem realizar exercícios físicos, visto que os sintomas acabam retornando por
descompensação transitória do padrão circulatório.

Do contrário, caso ocorra lesão gravíssima no coração, não haverá compensação


simpática ou por retenção de líquidos que possibilitará que o coração bombeie sangue
adequadamente. Assim, o DC não consegue elevar o suficiente para que os rins excretem
quantidade adequada de líquidos, o que permite que o paciente evolua com mais sintomas
edemigênicos, podendo leva-lo a óbito. Caracterizamos essa situação como insuficiência cardíaca
descompensada.

4. Diagnóstico
O Diagnóstico na Insuficiência Cardíaca pode se dar através de Critérios Clínicos,
Radiológicos e Laboratoriais.

a) Sinais Clínicos
Sinais e sintomas incluem dispneia, que pode ser manifestada por dispneia aos
esforços, ortopneia ou também dispneia paroxística noturna; além de fadiga; edema de

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membros inferiores, turgência de jugular e estertores pulmonares. Também podem ser
encontrados cardiomegalia, hepatomegalia e ascite.
O exame de ausculta cardíaca pode mostrar B3 indicando diminuição da complacência
ventricular resultante de hipertrofia concêntrica ou B4 indicando aumento de volume no
ventrículo causando dilatação. Tosse, taquicardia e perda de peso (pelo uso de diuréticos)
podem também estar presentes.

b) Radiografia de Tórax
A radiografia de tórax pode mostrar cardiomegalia que se calcula pelo Índice
Cardiotorácico que é a razão entre o diâmetro cardíaco máximo transversal e o diâmetro da
caixa torácica em inspiração profunda e nesses casos está maior que 0,5. Também se
encontra edema pulmonar ou derrames pleurais. Podem aparecer também as linhas Kerley B
lines (linhas horizontais na periferia das bases pulmonares).

Figura 1 - Radiografia de Tórax em PA revela cardiomegalia e infiltrado pulmonar


característicos de ICC. FONTE: Arquivo pessoal.

c) Critérios de Framingham
Os Critérios de Framingham são um conjunto de sinais clínicos, radiológicos e de
monitorização que quando presentes (2 maiores ou 1 maior + 2 menores) indicam
Insuficiência Cardíaca. A sua sensibilidade é de 96% e especificidade de 38,7%.
Critérios Maiores Critérios Menores
Edema agudo de pulmão Edema maleolar bilateral
Dispneia paroxística noturna Hepatomegalia
Estertores pulmonares Derrame pleura;
Turgência jugular patológica Dispneia aos esforços

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Refluxo hepatojugular Tosse noturna
PVC > 16 cmH2O Capacidade vital < 1/3 do previsto
Cardiomegalia no Rx (índice cardiotorácico > Taquicardia > 120 bpm
50%)
B3
Perda de peso > 4,5 kg em resposta ao
tratamento

Tabela 1 - Critérios de Framingham. FONTE: Próprio autor

d) Ecocardiografia
Após o diagnóstico clínico de Insuficiência Cardíaca, é necessário analisar
ecocardiograficamente a Fração de Ejeção do Ventrículo Esquerdo do paciente para distinguir
entre uma IC Sistólica (FEVE>50) ou IC Diastólica (FEVE<50). Outras informações
importantes que podem ser esclarecidas pelo ecocardiograma incluem volume aumentado dos
ventrículos, hipertrofia de paredes, áreas isquêmicas e até causas de ICC como valvopatias
ou doenças de pericárdicas.

e) Peptídeo Natriurético (BNP)


Apesar de sensibilidade e especificidade variáveis, valores de Peptídeo Natriurético
>100pg/mL são sugestivos de Insuficiência Cardíaca. Esses resultados devem ser
correlacionados com a clínica e é preciso lembrar de fatores que aumentam o BNP
independente de ICC como na falência renal ou hipertensão pulmonar que aumentam o seu
valor.

f) Fatores de Descompensação
Pacientes com ICC têm problemas para tolerar alterações hemodinâmicas e acabam
entrando em quadros de descompensação com piora da situação clínica. Fibrilação Atrial,
Hipertensão Arterial e Isquemia estão entre os fatores mais comuns. Infecções, falência renal,
administração excessiva de fluidos também são fatores que alteram a hemodinâmica e podem
conduzir a uma descompensação.

Fatores ligados a não Fatores cardíacos Fatores não cardíacos


aderência e ao atendimento
médico
Não observação dietética Síndromes coronarianas Pico hipertensivo
Não aderência às medicações Doença valvar Falência renal
Infusão excessiva de volume Arritmias Êmbolo pulmonar
Medicamentos Agentes tóxicos Infecções

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Tabela 2 – Fatores de descompensação. FONTE: Próprio autor

5. CLASSIFICAÇÃO
Podemos classificar aspectos do paciente para ter uma melhor avaliação geral do quadro
além de definir de forma mais efetiva a conduta terapêutica.
Uma classificação importante é a definição do Perfil Clínico-Hemodinâmico do paciente.
Para isso é necessário avaliar o paciente quanto a sinais de perfusão e congestão. Se a perfusão
for adequada (pele normocorada, ausência de alteração de consciência, pulso normal) o paciente
é dito quente. Se for inadequada (pele hipocorada, alteração de consciência, pulso fino) ele é
classificado como frio. Se os sinais de congestão forem evidentes (estertores pulmonares,
derrame pleural, edema de membros inferiores) o paciente é dito úmido. Caso estes sinais sejam
pouco evidentes, ele é classificado como seco.
Portanto, estes são os possíveis Perfis Clínico-Hemodinâmicos e as suas proporções
pacientes com IC Descompensada:

Quente e Seco Quente e Úmido


27% 49%
Frio e Seco Frio e Úmido
4% 20%
Tabela 3 - Perfis Clínico-Hemodinâmicos na IC Descompensada. FONTE: Próprio autor

Duas classificações importantes são a Evolutiva e a Funcional.


Há também a Classificação quanto ao Mecanismo, definindo se a IC é sistólica ou
diastólica. O principal critério definidor é a Fração de Ejeção do Ventrículo Esquerdo, que está
≤50% na sistólica e >50% na diastólica.
A sistólica é a maioria dos casos e cursa com incapacidade durante a sístole e está
associada à dilatação ventricular e presença de B3. Tem como causas IAM, isquemia miocárdica,
fase dilatada da cardiopatia hipertensiva, miocardiopatia dilatada idiopática, cardiomiopatia
alcoólica e doença de Chagas.
A diastólica cursa com incapacidade durante a diástole e está associada a hipertrofia
ventricular com redução da capacidade da câmara. Está associada a B4 e tem como principais
causas: cardiopatia hipertensiva, fibrose isquêmica, cardiomiopatia hipertrófica, cardiomiopatias
restritivas e envelhecimento.
A Classificação Evolutiva é progressiva e irreversível, ou seja, uma vez que o paciente
subiu de nível, ele nunca mais retorna ao nível anterior mesmo que haja melhora clínica com
tratamento. As classes vão de A a D, sendo:
A. Assintomático e sem lesão estrutural, mas com fatores de risco (HAS, DM, Coronariopatia)
B. Assintomático mas já com lesão estrutural

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C. Sintomático
D. Refratário ao Tratamento Otimizado

A Classificação Funcional (New York Heart Association - NYHA) é dinâmica e reversível,


ou seja, uma vez que um paciente sobe de nível ele pode voltar ao nível anterior desde que haja
melhora clínica. As classes vão de I a IV, sendo:
I. Sem comprometimento às atividades cotidianas
II. Comprometimento leve das atividades cotidianas
III. Comprometimento a qualquer atividade cotidiana
IV. Sintomatologia em repouso ou com mínimos esforços

6. Tratamento
O tratamento da Insuficiência Cardíaca com Fração de Ejeção Reduzida (ICFER) tem
como objetivos: diminuir a morbidade e mortalidade, diminuir o número de hospitalizações,
melhorar a qualidade de vida e o status funcional, além de reduzir os sintomas.
O manejo da ICFER inclui o controle de fatores contribuintes e condições associadas,
mudanças de estilo de vida, cuidados preventivos, terapia medicamentosa, o uso de terapia por
dispositivos se indicado e não menos importante, a reabilitação cardíaca.
Pacientes com Insuficiência Cardíaca refratária ao tratamento requerem cuidados
avançados, incluindo a revisão de potenciais opções como transplante cardíaco, circulação
mecânica de suporte, e cuidados paliativos.

a) Condições Contribuintes e Fatores Associados


O tratamento também deve incluir o controle de condições contribuintes e fatores
associados. (Tabela 4)

a) Hipertensão – é uma das causas primárias de IC em muitos pacientes. Os objetivos da


terapia são o controle da pressão arterial além da redução da pós-carga do ventrículo
esquerdo, assim, melhorando a função cardíaca e diminuindo a progressão do
remodelamento patológico.

 Pacientes com ICFER e hipertensão se beneficiam do uso de beta bloqueadores,


inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), bloqueadores de
receptores de angiotensina II (BRA), inibidores do receptor neprisilina de
angiotensina (IRNA) além de antagonistas dos receptores de mineralocorticoides
(ARM), pois as referidas drogas possuem comprovado aumento da taxa de
sobrevida de pacientes com ICFER. Beta bloqueadores também podem promover o
alívio da angina em pacientes com cardiopatia isquêmica além do controle da taxa
de daqueles com fibrilação atrial.

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 Outras drogas utilizáveis incluem diuréticos de alça (furosemida, bumetanida),
nitratos, alguns bloqueadores dos canais de cálcio vasoseletivos (anlodipino) e
hidralazina.

Tabela 4 – Fatores que contribuem para a insuficiência cardíaca. FONTE: HEART FAILURE SOCIETY OF
AMERICA.

b) Doença renovascular – a presença de doença renovascular deve ser considerada em


pacientes com IC e hipertensão, particularmente aqueles com IC devido cardiopatia
isquêmica. Descompensação recorrente e inexplicável da IC ou edema agudo de pulmão
ocorre em pacientes com hipertensão renovascular, normalmente com função sistólica do
ventrículo esquerdo preservada (normal ou próxima do normal). Opções de tratamento
incluem drogas antihipertensivas e revascularização.

c) Cardiopatia isquêmica – ateroesclerose coronariana é a causa dominante de IC em


países desenvolvidos. Pacientes com cardiopatia isquêmica podem possuir IC decorrente
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de um ou de ambos mecanismos: infarto do miocárdio prévio seguido de disfunção e
remodelamento do ventrículo esquerdo; ou miocárdio hibernante devido disfunção
isquêmica crônica, porém, reversível. Somado a isso, doença coronariana pode estar
presente em pacientes com IC consequente de outras causas, e pode às vezes ser
negligenciada como fator contribuidor.

 Todos os pacientes com cardiopatia isquêmica documentada devem ser tratados


medicamentosamente para alívio da angina e redução dos fatores de risco, como
diminuição da taxa sérica de lípides.

 Revascularização do miocárdio com angioplastia ou através de cirurgia com


enxerto vascular podem melhorar os sintomas, capacidade de exercícios e
prognóstico em determinados pacientes com miocárdio disfuncional porém viável.
Revascularização também deve ser considerada em pacientes com histórico de
repetidos episódios de insuficiência ventricular esquerda aguda e edema agudo de
pulmão.

d) Doença valvar – doença valvar é uma causa de IC. Além disso, insuficiência valvar é um
fenômeno secundário ou sobreposto em muitos casos de IC. Como exemplo, algum grau
de regurgitação mitral e tricúspide quase sempre está presente em pacientes com
cardiomiopatia dilatada severa, independente da etiologia.

 Doença valvar impõe uma sobrecarga hemodinâmica sobre os ventrículos, levando


adiante a prejuízo na função cardíaca, independente se a doença valvar é primária
ou secundária. Correção cirúrgica de valvopatia pode levar à melhora da função
cardíaca e resolução dos sintomas

e) Outras condições associadas – Taquicardias supraventriculares (particularmente


fibrilação atrial), arritmias ventriculares e risco de morte cardíaca súbita, indicações padrão
de bradicardia para um marca-passo, tromboembolismo, anemia e apnéia do sono.

b) Mudanças de Estilo de Vida


As recomendações para a modificação do estilo de vida baseiam-se, em grande parte,
em estudos observacionais e racionalidade fisiológica, já que houve poucos ensaios
randomizados sobre os efeitos da modificação do estilo de vida:

 Cessamento do fumo;

 Restrição ou abstinência do consumo de álcool, incluindo o uso de grupos de apoio


como Alcoólicos Anônimos; evitando o uso de drogas ilícitas;
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 Restrição de sal é comumente recomendada, embora haja dados insuficientes para
suportar qualquer nível específico de ingestão de sódio em pacientes com IC
sintomática;

o Dada a evidência limitada disponível, a ingestão ótima de sódio para


pacientes com insuficiência cardíaca não é conhecida. Com base na opinião
de especialistas, aconselha-se os pacientes com IC a restringir a ingestão
de sódio a 2 a 3 g por dia.

 Restrição de fluidos (1,5 a 2 L / dia) pode ser útil em pacientes com IC refratária,
particularmente aqueles com hiponatremia;

 Evitar a obesidade;

 O monitoramento diário do peso é recomendado para detectar a acumulação de


líquido antes de se tornar sintomático.

c) Terapia Farmacológica
Os objetivos da terapia farmacológica da ICFER são melhorar os sintomas (incluindo
risco de hospitalização), deterioração lenta ou reversa da função miocárdica e redução da
mortalidade.

 A melhora dos sintomas pode ser alcançada por diuréticos, beta bloqueadores, IECA,
BRA, IRNA, hidralazina mais nitrato, digoxina e antagonistas da aldosterona
(espirinolactona);

 O prolongamento da sobrevida do paciente foi documentado com beta bloqueadores,


IECA, IRNA, hidralazina mais nitrato e antagonistas da aldosterona. Evidências mais
limitadas apontaram o benefício da terapia diurética na taxa de sobrevida.

Todas as drogas e suplementos que o paciente está tomando devem ser revistas e
aquelas que porventura contribuirem para a IC (por exemplo, antiinflamatórios não esteróides,
antiarrítmicos, bloqueadores de canais de cálcio) devem ser evitados.

O tratamento da ICFER na gravidez requer atenção às preocupações específicas sobre os


efeitos dos medicamentos sobre o feto e a mãe.

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Tabela 4 – Beneficios demonstrados pela terapia recomendada pela guideline. FONTE: HEART FAILURE
SOCIETY OF AMERICA.

d) Terapia com Dispositivos

Os dispositivos recomendados em pacientes selecionados com IC incluem:

 Um desfibrilador-cardioversor implantado (DCI) para prevenção primária ou secundária de


morte cardíaca súbita.

 A terapia de ressincronização cardíaca (TRC) com estimulação biventricular pode melhorar


os sintomas e a sobrevivência em pacientes selecionados que estão em ritmo sinusal e
têm uma fração reduzida de ejeção do ventrículo esquerdo e uma duração prolongada do
QRS. A maioria dos pacientes que satisfazem os critérios de implantação de TR também
são candidatos a um DCI e recebem um dispositivo combinado.

e) Reabilitação Cardíaca
Para os pacientes com classes estáveis II a III de IC da New York Heart Association,
que não possuem arritmias avançadas e que não possuem outras limitações para o exercício,
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recomendamos oferecer um programa de reabilitação cardíaca. Os efeitos benéficos do
exercício são vistos com altos ou baixos níveis de treinamento e são evidentes apenas três
semanas após o treinamento. Não há dados suficientes no momento para recomendar
reabilitação cardíaca para pacientes com IC avançada.

REFERÊNCIAS

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de Cardiologia. Atualização da Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica - 2012. Arq Bras Cardiol
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Task Force on Clinical Practice Guidelines and the Heart Failure Society of America. Circulation, v. 134, n. 13,
p. e282-e293, 2016.
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