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Cardiologia
para Estudantes de Graduação
Vol. I
Prefácio
Em pouco mais de uma década de existência, a Liga Universitária de Cardiologia e Cirurgia
Cardiovascular do Amazonas – LUCAV-AM vem trabalhando incansavelmente para o aprimoramento
do conhecimento do médico em formação na bela e vasta área que é a medicina cardiovascular.
Além disso, em cada um de nós, membros efetivos e egressos, existe uma preocupação em
especial com o exercício da boa medicina, que apesar de ser estudada e debatida em forma separada,
não se divide em tópicos quando apresentada ao jovem médico.
Estes guias surgem da necessidade de um material acessível, objetivo e confiável para o
estudante de medicina. Não substitui, de forma alguma, o conhecimento contido nos grandes e
consagrados tratados da área, muitos deles utilizados como referência para a elaboração deste
trabalho, mas sem dúvida, ambiciona se tornar um material à mão que aborda assuntos importantes de
forma clara e prática. Neste primeiro volume, trouxemos temas elementares da prática cardiológica e
ansiosos pelo êxito, objetivamos a introdução gradual de novos assuntos.
Esperamos que este trabalho, assim como os subsequentes, cumpra sua função quanto ao
auxilio no estudo e aprimoramento do vasto campo da cardiologia.
Bons estudos!
Os editores,
Erika Christina e José Baena.
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Sumário
Prefácio 3
Hipertensão Arterial
Conceitualização 53
Epidemiologia 53
Pré-hipertensão 54
Fatores de Risco 54
Fisiopatologia 55
Diagnóstico 59
Classificação 62
Avaliação Clínica e Complementar 63
Abordagem Terapêutica 63
Medidas de Prevenção 67
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SEMIOLOGIA CARDIOVASCULAR
Erika Christina Silva, Marina Palhano de Almeida, Tiago Souza Amorim
O coração humano funciona como uma bomba, cuja função é bombear sangue
para as diversas partes do organismo, fazendo-o se estender até a microcirculação, local
no qual ocorrem trocas metabólicas, dando sentido à existência do sistema cardiovascular.
O átrio direito do recebe sangue venoso sistêmico por intermédio das veias cavas
superior e inferior, direcionando-o ao ventrículo direito e passando pela valva tricúspide. O
sangue que chega ao ventrículo direito é impulsionado ela contração do mesmo e
ultrapassa a valva pulmonar, chegando à artéria pulmonar que o distribui a trama vascular
pulmonar, oxigenando-o. A partir daí, o sangue oxigenado retorna ao coração através das
veias pulmonares e deságua no átrio esquerdo. Neste momento, o sangue flui ao
ventrículo esquerdo por diferença de pressão, ultrapassando a valva mitral. A partir da
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contração do ventrículo esquerdo o sangue oxigenado chega à aorta, ultrapassando a
valva aórtica, e sendo distribuído a todo o corpo. (Fig. 1)
Fig. 1 Anatomia do coração, mostrando a relação dos que desaguam nele e por ele são preenchidos. FONTE: Texas
Heart Institute.
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O coração é irrigado pelas artérias coronárias direita e esquerda, sendo sua
drenagem venosa feita por numerosas veias que desembocam nas câmaras cardíacas ou
se unem para formar o seio coronário, tributário do átrio direito. A artéria coronária direita
nutre o ventrículo direito, porção direita da parede posterior do ventrículo esquerdo e parte
do septo interventricular. A artéria coronária esquerda irriga a maior parte do ventrículo
esquerdo, parte do ventrículo direito e a maior parte do septo interventricular. (Fig.2)
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O estímulo tem origem no nó sinoatrial (sinusal), avança em direção ao nó
atrioventricular por meio de tratos intermodais e na direção do átrio esquerdo pelo feixe de
Bachmann; alcança o nó atrioventricular sofrendo atraso em sua transmissão para que a
contração atrial se complete antes da ventricular; rapidamente percorre o feixe de His,
seus ramos direito e esquerdo e suas subdivisões para finalmente chegar às fibras de
Purkinje.
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Iniciaremos o estudo do ciclo cardíaco pelo fim da diástole, momento no qual os
folhetos da valva mitral encontram-se semiabertos com pouca ou nenhuma quantidade
de sangue passando por eles devido a pequena diferença pressórica entre átrio e
ventrículo esquerdo – enchimento ventricular lento.
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A fase diastólica termina com o período de contração atrial. (Fig.3)
Fig. 3 Correlações das pressões do coração esquerdo com as bulhas cardíacas e com o fechamento e abertura das
valvas aórtica e mitral. FONTE: ECGRAFIK
2. Semiologia
2.1. Anamnese
a) Identificação (ID): a identificação é parte fundamental do registro da história do
paciente, pois possui diversas importâncias clínicas, semiológicas, institucionais e
epidemiológicas, devendo ser colhida da forma mais completa possível. É de suma
importância à datação do dia em que foi colhida a história e, sempre conveniente
quando há mudanças rápidas do quadro, o registro da hora.
São obrigatórios os seguintes elementos:
Nome Nunca se deve designar um paciente pelo leito ou
pelo seu diagnóstico.
Idade Cada grupo etário tem sua própria doença.
Sexo/gênero Há enfermidades que só ocorrem em determinado
sexo, ou que tem evolução/prognóstico distinto de
acordo com o gênero.
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Cor/etnia Cor branca, cor parda ou cor negra.
Estado civil Importância médico-trabalhista e pericial.
Profissão Relação entre a doença que lhe acometeu e o
trabalho do indivíduo.
Local de trabalho O ambiente pode envolver fatores que agravam
uma afecção preexistente.
Naturalidade Onde o paciente nasceu.
Procedência Residência anterior ou último local de viagem do
paciente.
Residência Residência atual. Endereço do paciente.
Nome da mãe Diferenciar pacientes homônimos.
Nome do Firmar uma relação de corresponsabilidade ética.
responsável/cuidador/acompanhante
Religião Relevância no processo saúde-doença
objetivamente ou subjetivamente.
Filiação a órgãos de previdência e Facilitar encaminhamento a outros especialistas,
planos de saúde para exames complementares ou outros serviços.
Tabela 1. Componentes estruturais essenciais na identificação do paciente. FONTE: Próprio autor
b) Queixa principal (QP): Deve ser registrada com as palavras do paciente de forma
breve e espontânea. Geralmente um sinal ou sintoma, tentando evitar, sempre que
possível, “rótulos diagnósticos”. Deve-se perguntar o que levou a pessoa a procurar
atendimento médico ou o que mais a incomoda no momento.
Exemplo: “Dor de cabeça”, “dor no peito” ou “Avaliação pré-operatória”.
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Sendo o principal sintoma, a dor deverá ser sempre bem caracterizada durante
anamnese para que seja comprovada ou não sua relação com alguma alteração
funcional do coração. Sempre caracterizar a qualidade da dor, localização, duração,
intensidade, irradiação, fatores desencadeantes ou agravantes, fatores atenuantes,
manifestações concomitantes.
A tabela 2 traz de forma esquemática a caracterização que deve ser feita de cada
sinal/ sintoma do paciente:
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primeira e segunda dentição, quando começou a andar e falar) e o aproveitamento
escolar. A pubarca (idade em que surgiram os primeiros pelos pubianos). Se a paciente
for do sexo feminino: registrar a menarca (idade da primeira menstruação) e telarca
(idade do surgimento do broto mamário); gestações (primigesta, secundigesta,
multigesta); partos (primípara, secundípara, multípara); climatério e menopausa (para
idosas). Orientação sexual: atualmente utilizam-se siglas como HSM, HSH, MSM,
HSMH, MSMH, onde H – homem, M – mulher e S – faz sexo com.
f) História Familiar (HFam): Registro sobre o estado de saúde dos pais e irmãos do
paciente, quando vivos. Se tiver algum doente na família, esclarecer qual a natureza da
enfermidade. Se falecidos, a causa e a idade do óbito. Filhos e cônjuges também
entram no registro.
g) História Psicossocial (HPs): Registrar padrão alimentar do paciente, sua ocupação
atual e anteriores, se faz atividades físicas regulares, se é tabagista (calcular carga
tabágica) e/ou etilista (quantificar) e outros vícios. Hábitos sexuais e usos de métodos
contraceptivos e de proteção sexual. Condições de habitação, culturais e
socioeconômicas. Vida conjugal e questionamento familiar. Se há temores, angustias e
ansiedades, principalmente sobre a percepção da doença atual.
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manifestações adrenais...
Coluna vertebral, ossos, Dor, rigidez, inflamação, limitação do movimento...
articulações e extremidades.
Músculos Fraqueza, atrofia, espasmos, marcha...
Artérias, veias, linfáticos e Dor, cor da pele, edema, temperatura, sensibilidade...
microcirculação
Sistema nervoso Consciência, cefaleia, tontura, convulsões, amnésia,
automatismo, ausência, sentidos, distúrbios do sono,
distúrbios esfincterianos...
Exame psíquico e avaliação Consciência, atenção, orientação, pensamento, memória,
das condições emocionais psicomotricidade, afetividade, comportamento...
Tabela 3. Esquematização da sequência realizada durante a revisão sistêmica. FONTE: Próprio autor
i) Parecer: Registro de qual foi à fonte das informações obtidas (do próprio paciente, do
acompanhante ou de terceiros), se foi colaborativo e se as informações são dignas de
crédito.
BIOTIPO LOCALIZAÇÃO
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A extensão do Ictus cordis é mensurada em polpas digitais, sendo aceitável até 1
ou 2 polpas digitais. Além disso, é sugestivo de dilatação ou hipertrofia ventricular
esquerda.
2.2.2 Ausculta
A ausculta cardíaca é parte indispensável do exame cardiovascular e
também do exame físico geral. Com o auxílio deste método é possível ter o
diagnóstico de doenças do coração e mensurar a gravidade da enfermidade do
paciente. A ausculta tem sua origem provavelmente no Antigo Egito, mas sua
aplicação foi aperfeiçoada com a criação, em 1816, do estetoscópio (sthetos = peito
e skopeo = examinar) por René Théophile Hyacinth Laennec (França, 1781-1826).
Este instrumento possui componentes, sendo eles: olivas auriculares que se
encaixam no canal auditivo do examinador; tubos de condução, que é uma haste
em forma de Y que permite a condução do som; campânula, peça que entra em
contato com o corpo do examinado e é mais apropriada para ausculta de sons
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graves (baixa frequência); e o diafragma, que é revestido por uma membrana, peça
que entra em contato com o corpo do examinado e é apropriado para ausculta de
sons agudos (alta frequência).
A demarcação de focos de ausculta cardíaca não significa que o
examinador apenas posicionará o estetoscópio nesses lugares. Os clássicos focos
servem como pontos de referencia visto que as informações mais pertinentes
quanto às valvas são encontradas nesses pontos.
Os focos auscultatórios são: foco mitral, pulmonar, aórtico + aórtico
acessório e foco tricúspide. Na Fig. 4 podemos observar a localização anatômica
desses focos.
Fig. 4 - Localização dos focos de referência para a ausculta cardíaca, notando-se que não coincidem com a
projeção superficial das valvas do coração. FONTE: Hubpages.com
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a) Semiotécnica
Ao iniciar o exame, o médico deve estar atento aos seguintes pontos: bulhas
cardíacas, ritmo e frequência, ritmo tríplice, alterações das bulhas, cliques ou estalidos,
sopros, ruído de pericardite, atrito pericárdico e rumor venoso.
Para uma boa ausculta é necessário que o examinador se preocupe em realizá-la
em um ambiente silencioso, e tanto o médico quanto o paciente devem estar acomodados
de maneira confortável. Geralmente, o examinado é colocado em decúbito dorsal com ou
sem apoio para a cabeça, porém essa posição pode ser alterada de acordo com a
necessidade do examinador. O médico deve se posicionar sempre à direita do paciente. O
receptor (diafragma ou campânula) deve estar suavemente apoiado sobre a pele e com
uma perfeita coaptação de suas bordas sobre o precórdio do paciente. Nunca deve se
auscultar sobre as roupas do paciente. O método auscultatório é uma capacidade de difícil
domínio, é necessário bastante treinamento e familiarização com os sons normais do ciclo
cardíaco para então prosseguir para os sons anormais.
As bulhas cardíacas se dividem em B1, B2, B3 e B4:
Bulhas Semiogênese Observações
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ventriculares. Ouve-se um “TUM TA
TU”, onde B3 é a bulha ouvida logo
após B2.
É resultante do turbilhonamento
sanguíneo causado pelo volume que Ouve-se um “TUM TUM TA”, sendo
chega após a sístole atrial de B4 a bulha ouvida imediatamente
B4 encontro com a massa sanguínea antes de B1. Causada por
existente no interior do ventrículo envelhecimento ou patologias
pouco complacente, ao final da hipertróficas.
diástole ventricular.
Tabela 5. Bulhas cardíacas e seus significados. FONTE: Próprio autor.
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Caso o ritmo cardíaco seja regular, ou seja, haja ritmicidade periódica na ausculta
das bulhas cardíacas, denomina-se de ritmo cardíaco regular. Do contrário, caso haja
diferença no tempo.
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observado no BRE, ocorrendo na
expiração, devido retardo no
componente aórtico.
Cliques e estalidos
Sopros
Fig. 5 – Tipos de sopro cardíaco quanto a sua localização no ciclo cardíaco. FONTE: Fisioterapia para todos.
Localização
Irradiação
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Fig. 7 – Representação dos sopros sistólicos e diastólicos. FONTE: Creative Commons Attribution
Intensidade
++++ Sopros muito intensos, audíveis inclusive com o estetoscópio afastado da parede
torácica ou com a mão interposta entre o receptor e a parede torácica
Timbre e tonalidade
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denominações: suave, rude, musical, aspirativo, em jato de vapor, granuloso,
piante e ruflar.
2.2.3 Pulsos
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Outra característica que deve ser analisada durante o exame dos pulsos é a
presença de ingurgitamento jugular que representa hipertensão venosa no sistema
da veia cava inferior e parece quando há insuficiência ventricular direita ou
pericardite constritiva. Para a realização da manobra basta deixar o paciente em
decúbito dorsal e depois pedir que ele adote a posição semissentada (45º entre o
dorso e o leito). Se a jugular permanece turgida, o sinal é positivo.
REFERÊNCIAS
1. PORTO, Celmo Celeno. Semiologia Médica. 7ª Ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.
2. Carvalho VO, Souza GEC. O estetoscópio e os sons pulmonares: uma revisão da literatura. Rev Med (São
Paulo). 2007 out.-dez.;86(4):224-31.
3. STEFANINI, Edson et al. Guia de medicina ambulatorial e hospitalar da UNIFESP – EPM: Cardiologia. Barueri,
SP: Manole, 2009.
4. Martins, Cássio. Semiologia Cardiovascular: Ausculta Normal e Bulhas - Fonese e Desdobramentos.
Disponível em:
<http://www.uff.br/cursodesemiologia/images/stories/Uploads/semio_cardiovascular/aulas/aula3_b1b2.pdf>.
Acesso em: 07 Set. 2017.
5. COUTO A. A., NANI E., MESQUITA E. T., PINHEIRO L.A.F.P., ROMÊO L. J. M., BRUNO W. Semiologia
Cardiovascular. 1ª Ed. São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, 2002
6. Ashley EA, Niebauer J. Cardiology Explained. London: Remedica; 2004. Chapter 2, Cardiovascular
examination. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK2213
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BASES ELETROCARDIOGRÁFICAS
Elizeu Rodrigues Matos, Fernanda Souza Henrique, José Emanuel Baena,
Lucas Edwardo Silva, Thomás Benevides Said, Tiago Souza Amorim
1. Bases eletrocardiográficas
O coração é dotado de um sistema excitatório e condutor especializados para gerar
impulsos elétricos rítmicos que causam contrações rítmicas do miocárdio e conduzir esses
impulsos rapidamente por todo o coração. As células do sistema elétrico capazes de gerar este
estímulo (automaticidade) são as células marcapasso encontradas no nó sinusal, nas fibras do
sistema de condução, no nó atrioventricular, no feixe de His, seus ramos e no sistema ventricular
de Purkinje. (Fig 1)
O impulso normal se origina no nó sinusal - localizado na junção do átrio direito com a veia
cava superior - e segue até o nó atrioventricular por meio das vias internodais anterior, posterior e
mediana a uma velocidade de condução de 1000mm/s. O nó atrioventricular situa-se abaixo da
valva tricúspide, inferiormente ao ao átrio direito; suas fibras caudais formam o feixe de His, que
origina os ramos ventriculares. Os ramos direito e esquerdo distribuem o estímulo pelas fibras de
Purkinje em cada um dos ventrículos a uma velocidade de condução de 4000 mm/s.
Como resultado de seu funcionamento normal, os átrios irão se contrair ⅙ de segundo
antes da contração ventricular, o que permite o enchimento dos ventrículos antes de bombearem
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o sangue para os pulmões e para a circulação periférica. Além disso, quando estimuladas, as
diferentes porções dos ventrículos irão se contrair quase simultaneamente, o que é essencial para
gerar pressão nas câmaras ventriculares com o máximo de eficiência.
Quando esse impulso elétrico passa através do coração, uma corrente elétrica também se
propaga do coração para os tecidos adjacentes que o circundam. Ao serem colocados eletrodos
sobre a pele é possível registrar os potenciais elétricos gerados pela corrente. A este registro dá-
se o nome eletrocardiograma.
O eletrocardiograma normal é composto pela onda P, pelo complexo QRS e pela onda T.
Constituem ondas de despolarização a onda P, produzida pelos potenciais gerados quando átrios
despolarizam antes do início da contração atrial, e o complexo QRS, gerado pela despolarização
dos ventrículos antes da contração dos mesmos. A onda T é produzida pelos potenciais gerados
enquanto os ventrículos se restabelecem do estado despolarização, sendo dessa maneira uma
onda de repolarização.
Antes que a contração possa acontecer é preciso que a despolarização se propague pelo
músculo para iniciar os processos químicos da contração dos ventrículos. Os átrios se repolariza,
cerca de 0,15-0,20 segundo após o término da onda P. Consequentemente a onda de
repolarização atrial (onda T atrial) é encoberta pelo complexo QRS. A onda de repolarização
ventricular é a onda T do ECG normal; este processo se inicia cerca de 0,20 s após o início do
QRS, mas em muitas fibras demora até 0,35 s de modo que a onda T é uma onda de longa
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duração, mas de voltagem bastante menor que o QRS, parcialmente em razão de sua duração
prolongada
Fig. 2 – Representação eletrocardiográfica do ciclo cardíaco. FONTE: EKG Komplex.svg
2. Eletrocardiograma normal
Como dito anteriormente, o eletrocardiograma consiste no registro gráfico da atividade
elétrica cardíaca. Classicamente ele consiste em 12 derivações: 6 do plano frontal e 6 do plano
horizontal ou precordial. Essa disposição permite a visualização tridimensional da atividade
elétrica cardíaca . Na tabela abaixo estão as principais paredes do coração seguidas das
derivações que melhor as visualizam:
Septal V1 e V2
Anterior V3 e V4
Lateral V5 e V6
Lateral alta DI e aVL
Inferior DII, DIII e aVF
Tabela 1 – Paredes cardíacas e suas respectivas derivações. FONTE: Próprio autor.
As derivações sao representadas por setas que vão do pólo negativo para o positivo. Se a
projeção do vetor tiver o mesmo sentido da derivação estará gerada uma onda positiva. As seis
derivações do plano frontal podem ser dispostas em uma única imagem denominada “rosa dos
ventos” ou sistema hexa-axial.
O registro eletrocardiográfico é interpretado como um gráfico de voltagem X tempo, de
maneira a representar as diferenças de potenciais ao longo de um ciclo cardíaco. Utiliza-se papel
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milimetrado com demarcações de quadrados de linhas claras com 1mm e de quadrados de linhas
escuras com 5mm para a interpretação do registro. O eixo vertical representa a voltagem no qual
cada milímetro equivale a 0,1 mV. O eixo horizontal representa o tempo e cada milímetro irá
equivaler a 0,04s.
O aparelho deve ser sempre calibrado antes de iniciar o registro para que a proporção 1
mV = 10 mm seja respeitada. A velocidade padrão de registro é de 25 mm/s. Estes sao os
parâmetros padrões de ECG convencional.
Para a avaliação do ritmo cardíaco o fator mais importante a ser verificado é a origem do
estímulo responsável pela despolarização ventricular. Normalmente o ritmo cardíaco é dito
sinusal, sob a análise dos seguintes critérios: a onda P positiva em DI e DII e negativa em aVR,
precedendo todos os complexos QRS e o intervalo PR constante e inferior a 200ms. Também
verifica-se a regularidade dos ciclos.
Em relação a frequência cardíaca, está normalmente fica entre 60 e 100 bpm quando em
repouso. Uma frequência abaixo deste intervalo é chamada bradicardia, enquanto que uma acima
é denominada taquicardia. Para o cálculo da frequência cardíaca existem diferentes métodos:
1. regra dos 1500 : divide-se 1500 pelo número de quadrados pequenos que
separam os picos de duas ondas R de complexos QRS consecutivos.
2. método dos 300 ou da sequência: como cada 5 quadrados pequenos equivalem a 1
quadrado grande, em um minuto são percorridos 300 quadrados grandes.
dividindo-se 300 pelo número de quadrados grandes entre duas ondas R obtém-se
os valores 300, 150, 100, 75, 60 e 50. Procura-se uma onda R com sua origem em
uma linha espessa e inicia-se a contagem desta sequência.
3. regra dos 3 segundos: é um método para cálculo da frequência cardíaca em
eletrocardiogramas com ritmo cardíaco irregular. Consiste em contar o número de
30
ondas R no decorrer de 15 quadrados grandes (3 segundos) e multiplicar o valor
encontrado por 20.
O eixo cardíaco normal pode variar de - 30° a + 90°. Para calculá-lo, deve-se
primeiramente isolar o vetor resultante em um dos quadrantes da rosa dos ventos através da
análise de D1 e seu eixo perpendicular (aVF). A interseção destas duas derivações define em qual
quadrante se encontra o eixo. Após isso, analisam-se as outra derivações perpendiculares (DIII e
aVL, DII e aVR) para obter o intervalo mínimo de 30° do eixo cardíaco.
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P e o segmento PR de maneira a referir-se a condução atrioventricular; tem duração entre 120 e
200 ms ( 3-5 quadrados pequenos). O complexo QRS se inicia na onda Q e termina no ponto J.
tem morfologia variável tornando-se progressivamente positivo de V1-V6; sua duração geralmente
varia entre 2,5 - 3 quadrados pequenos, devendo ser inferior a 120 ms; a onda Q deve ter duração
inferior a 40 ms e amplitude menor que ⅓ à da onda R. O segmento ST deve ser isoelétrico; não
apresenta uma duração normal estabelecida entre ele e o início da onda T sendo o mais
importante verificar ocorrência de supra ou infradesnivelamentos. A onda T tem morfologia
assimétrica, positiva, sem critérios bem estabelecidos para seus limites normais de duração e
amplitude.
3. Bradicardia
Uma arritmia cardíaca consiste em uma alteração da frequência, formação e/ou condução
do impulso elétrico através do miocárdio. Com base nisso, classifica-se bradicardia como uma
arritmia em que sua frequência se apresenta inferior a 50 bpm, fugindo do parâmetro de
normalidade estabelecido entre 50 e 100 bpm.
Suas causas variam entre não cárdicas e cardíacas.
Está presente em cerca de 80% dos atletas de alto rendimento, apresentando durante
seu repouso frequências ≥ 30bpm sendo consideradas normais neste tipo de atleta.
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Hipotireoidismo
Síncopes Neuromediadas
Esta é uma doença rara, em que certos movimentos bruscos do pescoço podem
provocar a queda da pressão arterial e uma diminuição da frequência dos batimentos do
coração.
3.2. Cardíacas:
Idade
Com o passar dos anos de uma pessoa doenças relacionadas ao nó sinusal aumenta
como, por exemplo, a fribose do nó sinusal, do tecido perinodal e do descontrole neurogênico
da frequência cardíaca. As alterações mais frequentes são: bradicardia sinusal persistente,
pausas sinusais e síndrome braditaquicárdica.
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Fig. 9 - ECG, Pausa sinusal. FONTE: Science Direct
Fibrilação atrial
A fibrilação atrial com FC muito lenta ,ou seja, menos de 40 bpm ou com pausas
prolongadas devem ser descartadas quando relacionadas doença do nó atrioventricular. FA
com frequência ventricular lenta e complexos QRS rítmicos, suspeita-se de Fibrilação Atrial
com Bloqueio AV completo e ritmo de escape.
Infarto do miocárdio ou ataque cardíaco que afeta a região inferior do coração costuma
cursar com BS em sua fase aguda.
Na miocardite os pacientes que se encontram na fase aguda de miocardite podem
desenvolver tanto taquiarritmias como bradiarritmias. Essas arritmias frequentemente
desaparecem após a fase aguda da miocardite.
A artéria coronária direita é responsável pela irrigação do nó sinoatrial, se comprometido
pode haver obstrução geralmente superior a 70% ou total que levará a Bradicardia Sinusal.
Outros fatores cardíacos também podem culminar em uma bradicardia, como: Distrofias
musculares, Síndrome do seio enfermo, Bloqueio cardíaco, Lesão do sistema elétrico do
coração por cirurgias e Cardiopatias congênitas.
4. Taquicardias
a) Taquicardia Sinusal
Frequência cardíaca superior a 100 bpm, com ondas P morfologicamente iguais
ao padrão sinusal normal.
b) Taquicardia Atrial
A onda P apresenta-se de forma alterada em relação ao ritmo sinusal, sendo
que a frequência atrial pode variar entre 100 e 250 bpm. As linhas isoelétricas entre as
ondas P tornam possíveis diferencias a taquicardia atrial do flutter atrial.
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c) Fibrilação Atrial
É caracterizada pela ausência da onda P, com atividade atrial rápida e
intervalos R-R irregulares. Complexo QRS estreito. A frequência cardíaca pode variar
entre 350 a 600 bpm.
Fig. 15: comparação do ECG normal (seta azul, apontando as ondas P presentes) e fibrilação atrial
(seta vermelha, ausência de ondas P). FONTE: Science Direct
d) Flutter Atrial
Aspecto em ‘dentes de serra’, apresentando as ondas ‘F’, comumente
visualizadas como deflexões negativas nas derivações D2, D3 e aVF e positivas em
V1, com frequência variando entre 250 e 350 bpm.
36
Fig. 17: taquicardia monomórfica sustentada. FONTE: Science Direct
c) Taquicardias não-Sustentadas
Taquicardias ventriculares com duração menor que 30 segundos, autolimitadas,
geralmente com término espontâneo.
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d) Torsades de Pointe
Complexo QRS em formas, amplitudes e durações variadas, aparentemente
formando um aspecto de ‘trançado’ em torno da linha de base.
e) Fibrilação Ventricular
Ritmo ventricular rápido, com intervalos R-R irregulares, complexos QRS
polimórficos e anômalos, deflexões bizarras e largas, com frequência cardíaca próxima
dos 500 bpm.
f)
5. Sobrecargas
a) Ventricular Direita
Existem duas formas com as quais o ventrículo direito pode ser sobrecarregado,
são elas: pressão, um exemplo é a estenose pulmonar, e por volume, como é o caso da
insuficiência da válvula tricúspide. No primeiro caso, essa condição recebe o nome de
sobrecarga sistólica e a segunda recebe o nome de sobrecarga diastólica.
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Haverá a presença de onda R de alta voltagem em V1 e V2. Na sobrecarga
sistólica terá um padrão qR, enquanto que na sobrecarga diastólica, qRS será o padrão do
eixo.
Nas derivações precordiais esquerdas – D1, aVL, V4, V5, V6 – se forma um
complexo RS ou rS, com uma redução de ondas r e ondas S mais profundas.
Outra aparição importante são os vetores finais para a direita, isso devido a um
segmento S em D1, D2, D3 e a um segmento terminal aVR.
Quando há uma relação R/S em V1 é maior que 1, existirá ondas T positivas
durante os 3 dias de vias e os 6 anos de idade.
Fig. 22 - ECG de paciente com sobrecarga ventricular direita secundária à comunicação biatrial. FONTE: Figuinha
b) Ventricular esquerda
Assim como a direita, a sobrecarga esquerda pode ser causada por pressão ou por
volume, sendo elas classificadas da mesma maneira. Diferente da direita o não é padrão-
ouro, porém possui relevância para os critérios que serão usados no diagnóstico.
Dentre os vários critérios utilizados, os mais recomendados são os índice Sokolow-
Lyon, onde é considerado positivo quando a soma da amplitude da onda S em V1 mais a
onda R em V5 for maior ou igual a 35 mm. E o índice de Cornell que soma as onda R de
aVL com a S de V3 e será positivo se, em homens for 28 mm e mulheres maior de 20 mm.
Além dos critérios, há alterações de repolarização ventricular, em que a onda T é
achatada em derivações esquerdas (D1,aVL, V5 e V6) ou há um padrão strain, ou seja, um
infradesnivelamento do segmento ST mais a onda T negativa e assimética.
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Fig. 23 - Exemplo de ECG de com sobrecarga ventricular esquerda secundária a uma insuficiência mitral. FONTE:
Figuinha
c) Biventricular
Vale lembrar que as duas sobre cargas ventriculares podem coexistir na mesma
pessoa, nessa caso, irá haver as seguintes alterações: o eixo elétrico estará desviado para
a direita, mas terá associados critérios de voltagem para Sobrecarga Ventricular Esquerda.
O eletrocardiograma será típico de Sobrecarga Ventricular Direita porém terá um ou dos
fatores a seguir: ondas Q profundas em V5 e V6 e em derivações inferiores. R de voltagem
aumentada em V5 e V6. Onda S em V1 e V2 mais a onda R em V5 e V6 com critério
positivo de Sokolow. E deflexão intrínsecoide em V6 maior ou igual a 40mm. Por fim, os
complexos QRS isodifásicos amplos, do tipo R/S, nas precordiais intermediárias de V2 a
V4.
40
Fig. 24 - Exemplo de ECG com sobrecarga atrial esquerda. FONTE: Figuinha
b) Atrial Direita
Uma característica muito importante da sobrecarga atrial é que ela
raramente está isolada, normalmente, encontra-se associada com sobrecarga
ventricular direita, além disso, é o fato da onda P se tornar apiculada, podendo
apresentar uma amplitude de 2,5 mm. Em relação a derivação V1, ela apresentará
porção inicial positiva maior 1,5mm..
Algo muito importante são os sinais acessórios e indiretos de sobrecarga
atrial direita que são: Peñaloza-Tranchesi, que indica é a presença de complexos
QRS de importante baixa voltagem em V1 e que, nas próximas derivações, estarão
em contrate pois serão com uma voltagem bem superior. E o Sodi-Pallares que
observa o aparecimento de complexos qr, qR, qR ou qRs nas derivações
precordias direitas (geralmente em V1, porém pode ocorrer até V3 ou V4).
41
Fig 25 – Exemplo de ECG de paciente SAD devido à atresia tricúspide. FONTE: Figuinha
c) Biatrial
6. Síndromes Isquêmicas
42
6.1. SÍNDROMES ISQUÊMICAS MIOCÁRDICAS INSTÁVEIS SEM SUPRADESNÍVEL DO
SEGMENTO ST (SIMISSST): ANGINA INSTÁVEL (AI) E IAM SEM SUPRADESVÍVEL DE
ST (IAMSSST)
A angina instável é definida como uma síndrome clínica situada entre a angina estável e o
infarto agudo do miocárdio. Nos Estados Unidos a AI é a causa cardiovascular mais comum de
internação hospitalar, sendo também a responsável pela maioria das internações em unidades
coronarianas. Durante a evolução, uma parte destes pacientes desenvolve elevações nos
marcadores bioquímicos de dano miocárdico, configurando o quadro de IAMSSST. O paciente
com AI tem prognóstico variável quanto a eventos desfavoráveis como IAM, óbito, recorrência de
angina e necessidade de revascularização miocárdica. Em virtude da ampla variação das
manifestações clínicas das SIMISSSTs, sua estratificação de risco ajuda a determinar estratégias
para tratamento ambulatorial ou hospitalar, propiciando uma adequação de custos em função de
maior eficácia terapêutica. Daí a importância de uma história clínica e diagnóstico precisos.
43
g) Parede lateral alta D1 e aVL
h) Parede inferior D2, D3 e aVF
i) Parede dorsal V7 e V8
Fig 26 – Paredes cardíacas e suas correlações eletrocardiográficas. FONTE: Próprio autor
44
(3) Aparecimento de ondas Q patológicas: representam a fase final da evolução do
IAM, indicando necrose das células cardíacas e liberação de substâncias intracelulares
(elevando os níveis dos marcadores de necrose miocárdica). Demonstram uma área
eletricamente inativa no ECG. Devem contemplar:
a. Duração > 0,04s
b. Associadas ou não a amplitude > 3 mm, ou,
c. Redução da onda R onde a mesma deveria estar presente.
Obs.: Importante lembrar que existem outras causas para aparecimento de ondas Q patológicas
no ECG além do IAM.
(4) Bloqueio de Ramo Esquerdo (BRE) Novo: O BRE agudo associado a um quadro
clínico sugestivo de IAM também permite seu diagnóstico. Porém, se o BRE é antigo, o
diagnóstico eletrocardiográfico é dificultado, mas possível se houver supra de ST maior
do que 1mm concordante com o QRS, ou maior que 5mm discordante do QRS.
45
7.1. Pericardite
A inflamação dos folhetos pericárdicos pode originar-se na própria camada externa do
coração ou em estruturas adjacentes mediastinais. Sua etiologia é variada, podendo ser
infecciosa, imune-inflamatória, induzida por medicamentos, entre outras causas. Dor torácica é a
apresentação comum das pericardites podendo estar acompanhada de sinais e sintomas
relacionados a etiologia. O diagnóstico diferencial com o infarto agudo do miocárdio é muito
importante e baseia-se também em alterações de traçado.
O processo inflamatório é responsável por uma elevação de segmento ST, que
diferentemente da isquemia, não respeita parede, apresentando-se de modo difuso e com
concavidade superior. Podem também ocorrer depressões no segmento PR.
Fig. 30 - ECG de 12 derivações demonstrando supra desnível de segmento ST e infra desnível de intervalo PR em DI,
DII, aVL, aVF e precordiais. Apresentação clássica de pericardite. Notar concavidade para cima. FONTE: Science direct
46
No traçado, a baixa voltagem é sugestiva de um afastamento entre a fonte elétrica e os
eletrodos. Desse modo, não é patognomonico de derrame pericárdico, no entanto, na presença de
indicativos fisiopatológicos, este diagnóstico não deve ser afastado. Outro achado interessante no
estudo eletrocardiográfico do derrame pericárdico é a alternância elétrica. Consiste em complexos
QRS amplos intercalados com complexos de baixa amplitude, representando um coração
“nadante” no derrame. Como usualmente apresenta-se em decorrência de uma pericardite, não é
incomum que os achados estejam combinados no traçado.
Fig. 31- ECG de 12 derivações apresentando alternância elétrica, evidente nos complexos QRS. FONTE: Science
Direct
Fig. 12 - ECG de 12 derivações apresentando supra desnível de segmento ST difuso, com concavidade voltada para
cima associada a baixa voltagem, sugestivo de pericardite e derrame pericárdico. FONTE: Science Direct
47
7.3. Embolia Pulmonar
Consiste na impactação de substâncias sólidas, líquidas ou gasosas no leito vascular
pulmonar, o que impede a perfusão de áreas do parênquima pulmonar, determinando assim a
dificuldade de trocas gasosas. É intimamente relacionada com a Trombose Venosa Profunda,
podendo também ser consequente a um trauma de ossos longos, líquido amniótico e iatrogênicas.
Apresenta-se clinicamente por dispneia e dor torácica, podendo esta última sugerir a altura do
comprometimento pulmonar. Um quadro suspeito de Embolia Pulmonar, somado a dor pleurítica,
pode sugerir acometimento do leito vascular distal, próximo a pleura.
Ao traçado, algumas alterações podem auxiliar no diagnóstico. O aumento da resistência
vascular pulmonar determina um esforço maior por parte do ventrículo direito, o que pode ser
apreciado, após certo tempo de instalação, como indicativos de dilatação ventricular deste lado.
Bloqueio de ramo direito, identificado pela primeira vez, também pode sugerir a Embolia.
Além dos citados, existe um padrão eletrocardiográfico que sugere o comprometimento do
lado direito do coração de forma muito específica: o S1Q3T3. Consiste na presença de onda S na
derivação DI, onda Q e inversão de onda T em DIII.
48
7.4. Distúrbios Séricos Do Potássio
a) Hipercalemia
O Potássio deve estar mais concentrado no meio intracelular do que no meio
extracelular justamente para a manutenção do gradiente de concentração para a
depolarização após a abertura dos canais de potássio. Altos níveis de potássio sérico, ou
seja, fora da célula, dificultam a despolarização e aceleram a repolarização. Deste modo,
podemos facilmente compreender as alterações eletrocardiográficas presentes neste tipo
de distúrbio. São elas: apiculação de onda T e QT curto, que ocorrem em virtude da alta
velocidade com que ocorre a repolarização e o adiantamento da mesma, respectivamente;
achatamento de onda P, alargamento do intervalo PR e complexos QRS alargados,
decorrentes da dificuldade de repolarização.
Fig. 35 - Traçado típico de hiperpotassemia. Achatamento de onda P e QRS alargado, demonstrando a dificuldade de
despolarização e onda T apiculada demonstrando um repolarização veloz. FONTE: Science Direct
49
Fig. 36 - Outra apresentação de hiperpotassemia. Ondas T apiculadas e complexos QRS alargados sugerem as
alterações iônicas na membrana. FONTE: Science Direct
b) Hipocalemia
Já versamos sobre a importância da concentração de Potássio para a manutenção
do potencial de ação celular e a espelho do que fora discutido no tópico anterior, é muito
simples perceber que baixos níveis de potássio fora da célula, tornam mais “fácil” a
despolarização ao reduzir o potencial de ação em conjunto com a diferença de
concentração que aumenta a velocidade de difusão. Em contrapartida, a repolarização
será mais demorada. O novo potencial de repouso é mais negativo e portanto mais
potássio precisará retornar para que ele seja atingido.
Estas alterações traduzem-se no traçado por uma onda T alongada e achatada e
um intervalo QT também mais demorado, em virtude do maior tempo gasto para a
repolarização ventricular. A onda P tende a apicular-se em virtude da rápida
despolarização. Um achado bem típico da hipopotassemia é o aparecimento da onda U,
que representa a repolarização tardia das fibras de Purkinje.
50
Fig. 37 - Traçado apresentando ondas P apiculadas, ondas T achatadas e presença de onda U. Padrão sugestivo de
Hipocalemia. FONTE: Science Direct
REFERÊNCIAS
51
121, Aug. 2015 Disponívl em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0066-
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<https://cardiopapers.com.br/quais-os-criterios-eletrocardiograficos-de-infarto-com-supradesnivelamento-de-st/>.
Acesso em: 23 Set. 2017.
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52
HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA
Ana Beatriz dos Santos, Erika Christina Silva, Gabriel Pinto dos Santos,
Gustavo Rodrigues da Silva,Mylena Miki Ideta
1. Conceitualização
A hipertensão arterial sistêmica (HAS) pode ser definida como o aumento pressórico do
sangue nos vasos, de etiologia variada, que deve obrigatoriamente ser sustentada, ou seja, suas
medidas acima do padrão considerado normal devem ser mantidas (>140 e/ou 90 mmHg).
2. Epidemiologia
EUA:
45% das mortes cardíacas são de origem hipertensiva;
51% das mortes causadas por Acidente Vascular Encefálico (AVE)
Dados: 2015.
BRASIL:
Contribui de forma direta ou indireta para 50% das mortes por doença
cardiovascular (DCV), além do impacto na produtividade do trabalho.
A HA atinge cerca de 32,5% da população brasileira (36 milhões de pessoas).
Desde 2010 a taxa de mortalidade por doenças hipertensivas vem diminuído.
Ademais, DCV são responsáveis também pelos altos índices de internações, com custos
elevados.
53
Fig. 4- Taxa de mortalidade no Brasil por doença cardiovascular (DCV) e distribuição por causas
no ano de 2013. FONTE: 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial
3. Pré-hipertensão
Pacientes que apresentam Pressão Arterial Sistólica (PAS) entre 121 e 139 e/ou Pressão
Arterial Diastólica (PAD) entre 81 e 89 mmHg adentram uma categoria denominada Pré-
hipertensão (PH). É importante salientar que a PH está associada, principalmente, com o maior
risco de desenvolver Hipertensão Arterial ou outras anormalidades cardíacas. Meta-análises
mostraram que aqueles com níveis de pressão entre 130-139 ou 85 e 89 mmHg apresentavam
maior risco de desenvolver HA.
4. Fatores de Risco
O coração funciona como uma bomba e os vasos sanguíneos como um sistema fechado
de tubos, sendo assim a pressão é proporcional ao produto da quantidade de fluido bombeada
para o interior dos tubos pela resistência ao fluxo:
Logo, a pressão arterial aumenta quando ocorre uma elevação do débito cardíaco (DC) ou
uma redução da resistência vascular periférica (RVP), principalmente nas arteríolas que tem sua
parede formada por uma grande quantidade de músculo liso.
A contração das células musculares lisas na parede das arteríolas está relacionada com o
aumento da concentração de cálcio intracelular, o que explica o efeito vasodilatador de drogas
bloqueadoras de canal de cálcio, como veremos adiante. A contração prolongada da musculatura
lisa das arteríolas induz mudanças estruturais na parede das mesmas, mediada por angiotensina,
leva a uma resistência vascular periférica irreversível.
55
fatores funcionais, já na hipertensão crônica há uma interação dos fatores estruturais e funcionais
em graus variados.
Alguns mecanismos fisiológicos são compensatórios nas fases iniciais da HAS, sendo
superados quando a alteração estrutural nas arteríolas é tamanha a ponto dos mesmos não
vencerem a resistência vascular periférica.
Uma importante função do Sistema RAA é permitir que o indivíduo possua grandes
variações em sua ingesta de sódio sem gerar importantes diferenças no volume extracelular
ou na pressão arterial. Essa função é explicada na Figura 2 que mostra o efeito inicial da
ingesta elevado de sódio, elevando o volume do líquido extracelular e a pressão arterial.
Então, a PA elevada aumenta o fluxo sanguíneo renal, reduzindo a secreção de renina e
provocando a redução da retenção renal de sal e água, normalizando a pressão arterial.
Dessa forma, o sistema RAA atua com feedback automático que contribui para manutenção
da PA em níveis próximos a normalidade mesmo quando a ingesta de sal é elevada.
56
Aumento da ingesta de sal
Fig. 5- Eventos sequenciais por meio dos quais a ingestão de sal aumenta a pressão arterial, mas a redução por
feedback da atividade do SRAA a normaliza. FONTE: GUYTON
57
contrario, a baixa pressão tem efeitos opostos, provocando elevação reflexa da pressão de
volta ao normal.
Os vasos sanguíneos são revestidos por uma camada contínua de células endoteliais
e essas células desempenham um papel vital na regulação das funções vasculares. Elas
reagem a alterações de fluxo (força de cisalhamento), ao estiramento, a uma variedade de
substâncias circulantes e mediadores inflamatórios. Em resposta a esses estímulos, secretam
substâncias vasoativas e reguladoras de crescimento. Os fatores de crescimento regulam o
desenvolvimento vascular e são importantes em diversas doenças. As substâncias vasoativas
produzidas pelo endotélio geralmente agem de forma parácrina, para regular o tônus vascular
local. Essas incluem as prostaglandinas, como a prostaciclina e também os tromboxanos, o
óxido nítrico e as endotelinas.
O óxido nítrico (ON) é produzido a partir da arginina em uma reação catalisada pela
óxido nítrico sintase (ONS). São encontradas três formas da ONS: a ONS1, encontrada no
sistema nervoso; a ONS2, encontrada em macrófagos e em células imunes relacionadas e a
ONS3, encontrada nas células endoteliais. A ONS1 e a ONS3 são ativadas por agentes que
aumentam o Ca2+ intracelular, incluindo os vasodilatadores acetilcolina e bradicinina,
enquanto a ONS2 é ativada por citocinas. O ON formado nas células endoteliais se difunde
para as células do músculo liso do tecido vascular adjacente, onde ativa a guanililciclase
solúvel, produzindo guanosina monofosfato cíclica (GMPc). A GMPc medeia o relaxamento do
músculo liso vascular.
Cerca de 90 a 95% dos pacientes com HAS apresenta a dita Hipertensão primária, ou
seja, hipertensão de origem desconhecida, em contraste com as formas de hipertensão
secundária que possuem causas conhecidas, como estenose de artéria renal, etc.
6. Diagnóstico de HAS
59
Apreciação técnica de modelo – cada fabricante ou importador de esfigmomanômetro deve
submeter à aprovação do INMETRO cada modelo fabricado ou importado, sendo que nenhuma
modificação pode ser feita sem autorização do INMETRO no esfigmomanômetro cujo modelo
tenha sido aprovado;
Verificação inicial – deve ser feita em todos os esfigmomanômetros fabricados, nas dependências
dos fabricantes ou outro local a critério do INMETRO, antes de sua colocação em uso;
Verificação periódica – deve ser realizada uma vez por ano, de preferência nas dependências dos
órgãos da RBMLQ (IPEMs) ou em local designado pelo INMETRO; e
Verificação eventual – deve ser realizada por solicitação do detentor do instrumento, após o
conserto e/ou manutenção do mesmo, ou quando o INMETRO julgar necessário.
Tabela 1 - Portaria INMETRO no. 24, de 22 de fevereiro de 1996, para os esfigmomanômetros mecânicos do tipo
aneróide, e no. 096, de 20 de março de 2008, para os esfigmomanômetros eletrônicos digitais de medição não-invasiva.
a
Fonte: 7 Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial
A pressão arterial pode ser medida usando uma das seguintes três estratégias aceitáveis:
Monitoramento ambulatorial da pressão arterial (MAPA);
Medição residencial da pressão arterial (MRPA);
Medidas no consultório;
A MAPA deve fazer parte do fluxograma para diagnóstico da hipertensão arterial e a
MRPA fornece informações úteis sobre os níveis da PA e o seu comportamento fora do ambiente
de consultório, em diferentes momentos. No consultório, a PA deve ser medida por médicos de
qualquer especialidade ou qualquer profissional da saúde devidamente capacitados. Recomenda-
se, pelo menos, a medição da PA a cada dois anos para os adultos com PA ≤ 120/80 mmHg, e
anualmente para aqueles com PA > 120/80 mmHg e < 140/90 mmHg. A medição da PA pode ser
feita com esfigmomanômetros manuais, semi-automáticos ou automáticos. A medição também
deverá ser realizada nos membros inferiores, utilizando-se manguitos apropriados, na suspeita de
HAS secundária.
Hipotensão ortostática deve ser suspeitada em pacientes idosos, diabéticos,
disautonômicos e naqueles em uso de medicação anti-hipertensiva. Assim, particularmente
nessas condições, deve-se medir a PA com o paciente de pé, após 3 minutos, sendo a hipotensão
ortostática definida como a redução da PAS > 20 mmHg ou da PAD > 10 mmHg.
Os procedimentos recomendados para a medição da PA, segundo a 7a Diretriz Brasileira
de Hipertensão Arterial são:
Preparo do paciente:
1. Explicar o procedimento ao paciente e deixá-lo em repouso de 3 a 5 minutos em ambiente
calmo. Deve ser instruído a não conversar durante a medição. Possíveis dúvidas devem ser
esclarecidas antes ou depois do procedimento.
60
2. Certificar-se de que o paciente NÃO:
- Está com a bexiga cheia;
- Praticou exercícios físicos há pelo menos 60 minutos;
- Ingeriu bebidas alcoólicas, café ou alimentos;
- Fumou nos 30 minutos anteriores.
3. Posicionamento:
- O paciente deve estar sentado, com pernas descruzadas, pés apoiados no chão, dorso
recostado na cadeira e relaxado;
- O braço deve estar na altura do coração, apoiado, com a palma da mão voltada para cima
e as roupas não devem garrotear o membro.
4. Medir a PA na posição de pé, após 3 minutos, nos diabéticos, idosos e em outras situações em
que a hipotensão ortostática possa ser frequente ou suspeitada.
7. Classificação
c) Pré-hipertensão: presença de PAS entre 121 e 139 e/ou PAD entre 81 e 89 mmHg.
62
Tabela 2 – Classificação da PA de acordo com a medição casual ou no consultório a partir de 18 anos de idade.
FONTE: 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial
O risco CV global deve ser avaliado em cada individuo hipertenso, pois auxilia na
decisão terapêutica e permite analise prognostica mais acurada. A tabela a seguir
objetiva auxiliar o profissional de saúde na estratificação.
Tabela 3 – Estratificação de risco no paciente hipertenso de acordo com fatores de risco adicionais, presença de lesão
em órgão-alvo e de doença cardiovascular ou renal. FONTE: 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial.
9. Abordagem terapêutica
63
Os objetivos da abordagem terapêutica incluem redução da pressão arterial, e
consequente proteção de órgãos-alvo e prevenção de desfechos cardiovasculares e renais. Para
isso, são utilizadas medidas não medicamentosas e medicamentosas.
Ao tomar a decisão terapêutica, deve-se atentar para o grau da pressão arterial, presença
de fatores de risco, lesão de órgão-alvo e/ou doença cardiovascular estabelecida, observada no
fluxograma 1.
Nos casos de níveis de PA entre 130-139/85-89, a decisão de instituir terapia
farmacológica deve ser individualizada, baseada em história prévia de doença cardiovascular e
naqueles com risco cardiovascular alto.
Na abordagem de hipertensos idosos, inicia-se terapia farmacológica a partir de PAS ≥ 140
mmHg para aqueles abaixo de 80 anos, já para aqueles com idade acima de 80 anos, o limite
para início da terapia aumenta para PAS ≥ 160 mmHg.
O tratamento medicamentoso em pacientes jovens com hipertensão sistólica isolada (HSI)
deve ser iniciada caso o risco cardiovascular seja alto, caso não seja, deve-se iniciar a terapia não
farmacológica com monitorização da lesão de órgão-alvo.
Iniciar tratamento
Risco baixo Risco moderado Risco alto medicamentoso
associado à terapia não
medicamentosa
Reavaliação
Tabela 4 – Metas a serem atingidas em conformidade com as características individuais. FONTE: 7ª Diretriz Brasileira
de Hipertensão Arterial.
b) Padrão alimentar
A dieta DASH (Dietary Approaches to Stop Hypertension) foca no consumo de frutas, hortaliças,
laticínios com baixo teor de gordura, cereais integrais, frango, peixe e frutas oleaginosas e
redução de carne vermelha, doces e bebidas com açúcar.
Entre as outras dietas associadas a diminuição da PA, encontra-se a dieta do mediterrâneo e
dietas vegetarianas.
65
Fig. 3 – dieta DASH.
FONTE: próprio autor
9.3. Tratamento Medicamentoso
66
Inibidores da Inibição da enzima conversora de - principal: tosse seca Captopril,
enzima angiotensina I em angiotensina II, - edema angioneurótico e enalapril, ramipril,
conversora de cuja ação é vasoconstritora. erupção cutânea lisinopril, quinapril
Angiotensina Redução da morbimortalidade - hiperpotassemia em
cardiovascular.
pacientes com insuficiência
Usadas em afecções CV, como
renal
em IC com fração de ejeção
- redução da taxa de filtração
reduzida, anti-remodelamento
cardíaco pós-infarto, além de glomerular em casos de
possíveis propriendades estenose bilateral das
antiateroscleróticas. artérias renais.
Diminui a perda de função renal Contraindicados na gravidez.
em pacientes com nefropatia
diabética ou outras causas.
REFERÊNCIAS
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107 (Supl 3).
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Ed.. – Porto Alegre : AMGH, 2011
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hypertension in adults. 2016. www.uptodate.com.
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2001;322(7291):912-916.
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de Monitorização Residencial da Pressão Arterial (MRPA III). Sociedades Brasileiras de Cardiologia,
Hipertensão e Nefrologia. Arq Bras Cardiol 2011; 97(3 Supl 3):1-24
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Committee of the Council for High Blood Pressure Research. Hypertension. 2008;51:1403–1419.[PubMed]
68
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA
Erika Christina Silva, Giovanna Lacerda Guedes,
Gustavo Militão do Nascimento, Kristian Holanda Nogueira
1. Conceitualização
A insuficiência cardíaca (IC) é uma condição na qual o coração fragilizado, por diversas
etiologias possíveis, torna-se incapaz de manter um débito cardíaco adequado para a perfusão e
demanda metabólica dos tecidos; ou ainda quando o faz à custa de aumento das pressões de
enchimento das câmaras.
É uma síndrome que se apresenta com sintomas respiratórios como dispneia progressiva,
ortopneia, dispneia paroxística noturna, fadiga e retenção de fluídos. Os pacientes com
insuficiência cardíaca são geralmente intolerantes ao esforço físico e ao decúbito dorsal horizontal
quando estão muito congestos.
2. Epidemiologia
Os pacientes com insuficiência cardíaca tem uma queda na qualidade de vida e aumento
da mortalidade e da morbidade. A III Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica diz que
no ano de 2007 as doenças cardiovasculares representaram a terceira causa de internações no
SUS, com 1.156.136 hospitalizações. A IC é a causa mais frequente de internação por doença
69
cardiovascular. Apesar de todos os avanços terapêuticos, o prognóstico dessa síndrome é ruim,
com média de sobrevida após a instalação dos sintomas de somente 1,7 ano em homens, e 3,2
anos em mulheres.
Quanto à etiologia da IC, nos últimos anos houve mudanças no perfil. Na década de 1950
as causas mais comuns eram as não isquêmicas, como hipertensão arterial sistêmica, doença
valvar e doença de Chagas. No entanto, com as mudanças nos hábitos alimentares, aumento do
sedentarismo e estresse, maior consumo de bebidas alcoólicas e fumo, aumentou-se a incidência
de doença aterosclerótica. Hoje, a aterosclerose, se manifestando nas cardiopatias isquêmicas, é
responsável pela etiologia da maioria dos casos de IC; configurando-se como a doença arterial
coronária responsável por aproximadamente dois terços dos pacientes com que possuem
disfunção sistólica do ventrículo esquerdo.
3. Fisiopatologia
A insuficiência cardíaca é um complexo fisiopatológico associado à disfunção do coração,
e é um ponto terminal comum a muitas doenças do sistema cardiovascular. Há diversas etiologias
possíveis, podendo ser causada por sobrecargas inapropriadas colocadas sobre o coração, como
sobrecarga de volume ou de pressão; restrição ao enchimento do coração; perda de miócitos; ou
diminuição da contratilidade dos miócitos.
70
dos vasos sanguíneos. Em suma, o coração lesionado passa a receber mais sangue que o usual
e, consequentemente, eleva a pressão intra-atrial direita para conseguir bombear tal volume
sanguíneo.
Tal efeito compensatório não é infinito, visto que, quanto maior força de contração o
coração dispuser, maior a lesão na musculatura. Quando a capacidade de bombeamento do
coração for ainda mais reduzida, o fluxo sanguíneo para os rins torna-se muito baixo, o que os
mesmos traduzem por hipovolemia, desencadeando um mecanismo compensatório de retenção
de sódio e agua. Essa tentativa de compensar gera um ciclo vicioso no mecanismo cardiorrenal:
quanto mais liquido os rins retêm, maior a volemia e maior a dificuldade do coração bombear essa
maior quantidade de liquido, o que gera uma elevação no volume diastólico final, ocasionando
sobrecarga de pressão nas câmaras retrogradamente e maior congestão pulmonar. Esse ciclo
continua indefinidamente, a não ser que medidas terapêuticas eficazes sejam postas em prática.
Quando a câmara atrial direita aumenta tanto de volume a ponto de compensar o debito
cardíaco elevado, tornando-o dentro dos padrões normais, caracterizamos a insuficiência cardíaca
compensada. Esse padrão ocorre principalmente em pessoas idosas, que possuem níveis de
pressão atrial elevado, mostrando as varias compensações cardíacas sofridas. Esses pacientes
não podem realizar exercícios físicos, visto que os sintomas acabam retornando por
descompensação transitória do padrão circulatório.
4. Diagnóstico
O Diagnóstico na Insuficiência Cardíaca pode se dar através de Critérios Clínicos,
Radiológicos e Laboratoriais.
a) Sinais Clínicos
Sinais e sintomas incluem dispneia, que pode ser manifestada por dispneia aos
esforços, ortopneia ou também dispneia paroxística noturna; além de fadiga; edema de
71
membros inferiores, turgência de jugular e estertores pulmonares. Também podem ser
encontrados cardiomegalia, hepatomegalia e ascite.
O exame de ausculta cardíaca pode mostrar B3 indicando diminuição da complacência
ventricular resultante de hipertrofia concêntrica ou B4 indicando aumento de volume no
ventrículo causando dilatação. Tosse, taquicardia e perda de peso (pelo uso de diuréticos)
podem também estar presentes.
b) Radiografia de Tórax
A radiografia de tórax pode mostrar cardiomegalia que se calcula pelo Índice
Cardiotorácico que é a razão entre o diâmetro cardíaco máximo transversal e o diâmetro da
caixa torácica em inspiração profunda e nesses casos está maior que 0,5. Também se
encontra edema pulmonar ou derrames pleurais. Podem aparecer também as linhas Kerley B
lines (linhas horizontais na periferia das bases pulmonares).
c) Critérios de Framingham
Os Critérios de Framingham são um conjunto de sinais clínicos, radiológicos e de
monitorização que quando presentes (2 maiores ou 1 maior + 2 menores) indicam
Insuficiência Cardíaca. A sua sensibilidade é de 96% e especificidade de 38,7%.
Critérios Maiores Critérios Menores
Edema agudo de pulmão Edema maleolar bilateral
Dispneia paroxística noturna Hepatomegalia
Estertores pulmonares Derrame pleura;
Turgência jugular patológica Dispneia aos esforços
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Refluxo hepatojugular Tosse noturna
PVC > 16 cmH2O Capacidade vital < 1/3 do previsto
Cardiomegalia no Rx (índice cardiotorácico > Taquicardia > 120 bpm
50%)
B3
Perda de peso > 4,5 kg em resposta ao
tratamento
d) Ecocardiografia
Após o diagnóstico clínico de Insuficiência Cardíaca, é necessário analisar
ecocardiograficamente a Fração de Ejeção do Ventrículo Esquerdo do paciente para distinguir
entre uma IC Sistólica (FEVE>50) ou IC Diastólica (FEVE<50). Outras informações
importantes que podem ser esclarecidas pelo ecocardiograma incluem volume aumentado dos
ventrículos, hipertrofia de paredes, áreas isquêmicas e até causas de ICC como valvopatias
ou doenças de pericárdicas.
f) Fatores de Descompensação
Pacientes com ICC têm problemas para tolerar alterações hemodinâmicas e acabam
entrando em quadros de descompensação com piora da situação clínica. Fibrilação Atrial,
Hipertensão Arterial e Isquemia estão entre os fatores mais comuns. Infecções, falência renal,
administração excessiva de fluidos também são fatores que alteram a hemodinâmica e podem
conduzir a uma descompensação.
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Tabela 2 – Fatores de descompensação. FONTE: Próprio autor
5. CLASSIFICAÇÃO
Podemos classificar aspectos do paciente para ter uma melhor avaliação geral do quadro
além de definir de forma mais efetiva a conduta terapêutica.
Uma classificação importante é a definição do Perfil Clínico-Hemodinâmico do paciente.
Para isso é necessário avaliar o paciente quanto a sinais de perfusão e congestão. Se a perfusão
for adequada (pele normocorada, ausência de alteração de consciência, pulso normal) o paciente
é dito quente. Se for inadequada (pele hipocorada, alteração de consciência, pulso fino) ele é
classificado como frio. Se os sinais de congestão forem evidentes (estertores pulmonares,
derrame pleural, edema de membros inferiores) o paciente é dito úmido. Caso estes sinais sejam
pouco evidentes, ele é classificado como seco.
Portanto, estes são os possíveis Perfis Clínico-Hemodinâmicos e as suas proporções
pacientes com IC Descompensada:
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C. Sintomático
D. Refratário ao Tratamento Otimizado
6. Tratamento
O tratamento da Insuficiência Cardíaca com Fração de Ejeção Reduzida (ICFER) tem
como objetivos: diminuir a morbidade e mortalidade, diminuir o número de hospitalizações,
melhorar a qualidade de vida e o status funcional, além de reduzir os sintomas.
O manejo da ICFER inclui o controle de fatores contribuintes e condições associadas,
mudanças de estilo de vida, cuidados preventivos, terapia medicamentosa, o uso de terapia por
dispositivos se indicado e não menos importante, a reabilitação cardíaca.
Pacientes com Insuficiência Cardíaca refratária ao tratamento requerem cuidados
avançados, incluindo a revisão de potenciais opções como transplante cardíaco, circulação
mecânica de suporte, e cuidados paliativos.
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Outras drogas utilizáveis incluem diuréticos de alça (furosemida, bumetanida),
nitratos, alguns bloqueadores dos canais de cálcio vasoseletivos (anlodipino) e
hidralazina.
Tabela 4 – Fatores que contribuem para a insuficiência cardíaca. FONTE: HEART FAILURE SOCIETY OF
AMERICA.
d) Doença valvar – doença valvar é uma causa de IC. Além disso, insuficiência valvar é um
fenômeno secundário ou sobreposto em muitos casos de IC. Como exemplo, algum grau
de regurgitação mitral e tricúspide quase sempre está presente em pacientes com
cardiomiopatia dilatada severa, independente da etiologia.
Cessamento do fumo;
Restrição de fluidos (1,5 a 2 L / dia) pode ser útil em pacientes com IC refratária,
particularmente aqueles com hiponatremia;
Evitar a obesidade;
c) Terapia Farmacológica
Os objetivos da terapia farmacológica da ICFER são melhorar os sintomas (incluindo
risco de hospitalização), deterioração lenta ou reversa da função miocárdica e redução da
mortalidade.
A melhora dos sintomas pode ser alcançada por diuréticos, beta bloqueadores, IECA,
BRA, IRNA, hidralazina mais nitrato, digoxina e antagonistas da aldosterona
(espirinolactona);
Todas as drogas e suplementos que o paciente está tomando devem ser revistas e
aquelas que porventura contribuirem para a IC (por exemplo, antiinflamatórios não esteróides,
antiarrítmicos, bloqueadores de canais de cálcio) devem ser evitados.
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Tabela 4 – Beneficios demonstrados pela terapia recomendada pela guideline. FONTE: HEART FAILURE
SOCIETY OF AMERICA.
e) Reabilitação Cardíaca
Para os pacientes com classes estáveis II a III de IC da New York Heart Association,
que não possuem arritmias avançadas e que não possuem outras limitações para o exercício,
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recomendamos oferecer um programa de reabilitação cardíaca. Os efeitos benéficos do
exercício são vistos com altos ou baixos níveis de treinamento e são evidentes apenas três
semanas após o treinamento. Não há dados suficientes no momento para recomendar
reabilitação cardíaca para pacientes com IC avançada.
REFERÊNCIAS
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de Cardiologia. Atualização da Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica - 2012. Arq Bras Cardiol
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