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Comissões Parlamentares e evangélicos: uma análise da atividade legislativa dos


deputados do Partido Social Cristão

Priscilla Leine Cassotta


Priscilla.cassotta@eui.eu
Área Temática: Estudos Legislativos

RESUMO: Nos últimos anos, por toda América Latina é possível observar a
reemergência de forças conservadoras. Nesta ocasião, no Brasil, os evangélicos vêm
endossar uma agenda conservadora, munidos de um discurso moralista em defesa dos
preceitos cristãos e em favor da família tradicional. O principal objetivo deste artigo é
analisar qual é o conteúdo das leis aprovadas e defendidas por deputados evangélicos do
Partido Social Cristão, nas Comissões Permanentes de Ciência e Tecnologia,
Comunicação e Informática; e Comissão de Direitos Humanos e Minorias, da Câmara
dos Deputados, entre 2011 – 2015. As Comissões legislativas são órgãos técnicos
previstos pelo Regimento Interno da Casa, com a finalidade de discutir e buscar
informações sobre proposições, em geral, antes de serem apreciadas pelo plenário.
Argumentamos que os incentivos gerados pelas regras formais favorecem os interesses
do partido, em detrimento do parlamentar. Mesmo assim, a atuação legislativa desses
políticos religiosos é muito desigual, e alguns desses parlamentares buscam defender
veementemente uma posição religiosa ligada aos preceitos evangélicos.

Introdução
O tema central deste artigo é o conteúdo das leis aprovadas e defendidas por
deputados evangélicos do Partido Social Cristão, nas Comissões Permanentes de Ciência
e Tecnologia, Comunicação e Informática; e Comissão de Direitos Humanos e Minorias,
da Câmara dos Deputados, entre 2011 – 2015. Este trabalho visa analisar se existe ênfase
em assuntos morais ligados ao cristianismo evangélico. Buscamos estabelecer um diálogo
com parte da produção brasileira sobre a participação dos evangélicos na política. Essa
produção tem apontado para uma ação militante e coordenada por parte desses políticos,
orientada pelos preceitos cristãos. Os argumentos aqui defendidos, em oposição a esses
trabalhos é que a atuação legislativa desses políticos religiosos é muito desigual. Assim,
enquanto alguns desses parlamentares buscam defender veementemente uma posição
religiosa ligada aos preceitos evangélicos, outros se distanciam de uma atuação guiada
por esses preceitos. No mais, assinalamos que os incentivos gerados pelas regras formais
favorecem os interesses do partido, em detrimento do parlamentar. Para tanto, utilizamos
2

como metodologia a análise documental realizada por meio da análise das atas destas
comissões.
Se no cenário político advindo com a Constituição de 1988 qualquer envolvimento
com setores mais conservadores, principalmente ligados a ditadura, era interpretado de
forma negativa, os fatos atuais nos mostram um retrocesso a antigas bandeiras, como
críticas a direitos sociais conquistados, aos direitos LGBTs, difamação de programas
sociais como o bolsa família e, em alguns casos, até pedidos de volta ao regime militar.
Crise econômica e política, desemprego, descontentamento com os partidos políticos, se
não é possível aqui levantar todos os motivos que levaram a esse fenômeno atual da direita
no Brasil, é fato que esses condicionantes mudam o ambiente externo dos partidos
políticos. Longe de se limitar a um fenômeno brasileiro, por toda América Latina é
possível observar o reagrupamento de forças conservadoras, com novas caras e táticas
(CRUZ, KAYSEL & CODAS, 2015 p.8). Nesta seara, os evangélicos vêm endossar uma
agenda conservadora, munidos de um discurso moralista em defesa dos preceitos cristãos
e em favor da família tradicional. Ocupando diferentes espaços de atuação, estão
fortemente presentes nos espaços políticos, com especial destaque para a Câmara dos
Deputados.
O artigo de desenvolvera da seguinte maneira: na primeira parte apresentamos as
principais características presentes na literatura sobre a participação dos evangélicos na
política. Na segunda parte damos especial atenção ao PSC e o seu crescimento na Câmara
a partir da aproximação com as igrejas evangélicas. Em seguida discutimos a importância
das comissões legislativas para os trabalhos da casa e apresentamos os dados encontrados.

1. Evangélicos na Política

A presença dos evangélicos na política brasileira é acompanhada pelo crescimento


demográficos desses cristões e da redemocratização do país (ALMEIDA, 2014). Na
tabela abaixo, podemos observar o crescimento numérico desse segmento religioso no
Brasil, que a partir de ano de 2010 já contava com pouco mais de 22% de uma população
de 190 milhões de habitantes. Por conseguinte, também é visível que esse crescimento é
acompanhado do declino da religião católica.
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Tabela 1. Distribuição percentual da população residente, segundo os grupos de religião -


2000/2010.
Grupo de religião 2000 2010
Católica Apostólica Romana 73,6 64,6
Evangélicos 15,4 22,2
Espirita 1,3 2
Umbanda e Candomblé 0,3 0,3
Sem religião 7,4 8
Outras religiosidades 1,8 2,7
Não sabe/ Não declarou 0,2 0,1
Fonte Censo IBGE: Elaboração própria

Foi na Constituinte, em 1986, que os evangélicos ganharam papel mais


significativa, em termos de cargos públicos conquistados, pela primeira vez1. Num país
de tradição católica saltaram de dois para dezoito deputados (FRESTON, 1993). Somado
aos protestantes históricos, a chamada “bancada evangélica” na Constituinte passou a
contar com trinta e três deputados. É a partir da Constituinte que os evangélicos passam
a compor uma nova opção para o voto conservador no país (PIERUCCI e PRANDI,
1996). Na ocasião, o discurso sobre a liberdade religiosa e a defesa dos bons costumes
foram as bandeiras levantadas por esses parlamentares religiosos que se auto intitulavam
como os representantes de Deus na Constituinte2.
Contudo, como bem destaca Santos (2013, p. 79), se o engajamento desses
religiosos favoreceu o surgimento de novas lideranças políticas, explorar a condição de
religioso desses políticos como principal recurso eleitoral não é garantia de voto. Sendo
assim, para a autora, vincular de forma direta ações assistenciais e fé ao comportamento
eleitoral pode se mostrar precipitado. Soma-se a isso que muito candidatos simplesmente
se declaram como evangélicos, sem ter fortes ligações com alguma instituição, da mesma
forma que muitos se declaram como “católicos não praticantes”. Logo, se montar um
perfil político-religioso dos políticos que ocupam cargos é uma tarefa árdua, entre os
milhares de candidatos é quase impossível fazer uma avaliação capaz de identificar e

1
Outros países da América Latina experimentaram fenômeno parecido “no Peru a virada de Fujimoro levou
ao parlamento 19 evangélicos, além do segundo vice-presidente. Na Guatemala, em 1991, Jorge Serrano
tornou-se o primeiro protestante praticante a chegar à presidência de nação latino-americana pelo voto
popular” (FRESTON, 1993 p. 6).
2
Durante a Constituinte Daso Coimbra, um dos líderes evangélicos pelo Partido do Movimento
Democrático Brasileiro (PMDB) chegou a dizer: “a maioria do nosso povo acredita em Deus e a
Constituição deve expressar a vontade dessa maioria” (PIERUCCI & PRANDI, 1996 p. 174).
4

classificar os evangélicos que se apresentam como representantes (SPECK e NETTO,


2014 p. 10).
A importância atual das igrejas evangélicas para a política partidária não pode
mais ser ignorada. O campo político institucional não se mostrou insensível à interpelação
evangélica, de forma que os canais de relacionamento entre lideranças políticas (em
ambas as esferas) foram alargados nos últimos anos (ORO, 2011 p. 391). Por
consequência, procurados por diversos partidos, as Igrejas Evangélicas passaram a
desempenhar papel importante não apenas nas eleições proporcionais, mas também nas
majoritárias.
Na eleição presidencial de 1989 os evangélicos3 apoiaram fortemente a
candidatura de Fernando Collor de Mello, pelo Partido da Reconstrução Nacional (PRN).
À época Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus, chegou a afirmar que:
"Após orar e pedir a Deus que indicasse uma pessoa, o Espírito Santo nos convenceu de
que Fernando Collor de Mello era o escolhido" (Jornal do Brasil, 3.12.89) (Apud
MARIANO & PIERUCCI, 1992 p. 94). No segundo turno, fizeram forte campanha contra
o candidato do PT, Luís Inácio Lula da Silva, associando-o ao comunismo que colocaria
em risco a família tradicional e os bons costumes cristão.
Em 1994 o cenário não foi diferente para o candidato do PT. Lula foi identificado
como um “demônio”, além de garantirem que sua vitória resultaria na perseguição aos
evangélicos (MARIANO, 2005). Nas eleições de 1998, por sua vez, para o cargo de
presidente da república a participação do evangélicos teve menor protagonismo e, assim,
menor influência (CAMPOS, 2006 p. 74). Porém, para cargos do executivo estadual e
legislativo (federal e estadual), os evangélicos conquistaram diversos cargos políticos.
Cabe destacar o Rio de Janeiro, que elegeu Anthony Garotinho para o cargo de
governador pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), tendo como vice-governadora
Benedita da Silva pelo PT, ambos evangélicos declarados (MACHADO, 2006).
Benedita da Silva é uma das poucas políticas evangélicas filiadas a um partido
identificado com a esquerda. No pleito de 2000, a candidata do PT concorreu à prefeitura
do Rio lançando o slogan “Bota fé no 13”, que lhe rendeu apenas a terceira posição no
primeiro turno. No seio evangélico, muitas igrejas reservam às mulheres um papel
secundário na distribuição de poder dentro dos templos. À exemplo disso, a Igreja

3
Inicialmente os evangélicos tentaram lançar como candidato à presidência o evangélico Íris Rezende à
Presidência da República pelo PMDB, fracassada essa possibilidade decidiram apoiar o candidato do PRN.
5

Universal do Reino de Deus não permite que mulheres assumam postos de lideranças da
cúpula da igreja, seja no âmbito local ou nacional (TADVALD, 2010 p. 97).
Apesar do seu histórico como os evangélicos, Lula, antes identificado como
grande inimigo desses cristãos foi quem ampliou as alianças políticas com esse segmento.
No pleito de 2002, inicialmente, os evangélicos apoiaram o candidato Anthony
Garotinho, agora filiado ao PSB. Já no segundo turno, esse apoio foi dado,
principalmente, pela Igreja Universal do Reino de Deus ao candidato Lula
(GONÇALVES, 2011 p. 17). Na campanha eleitoral de 2016, Lula e o PT tiveram como
prioridade de agenda a conquista do voto evangélico (ORO, 2011 p. 391). Para tanto,
lograram obter apoio de diferentes lideranças religiosas das principais igrejas evangélicas.
O candidato do PT participou de reuniões com lideranças evangélicas, prometeu ampliar
as parcerias na área social entre o governo federal e as igrejas desse segmento, pediu votos
e contou com um comitê destinado a esses religiosos (MARIANO, HOFF e DANTAS,
2006). Entre os evangélicos influentes, em 2006 Lula conseguiu apoio de Marcelo
Crivella4, que lhe garantiu o suporte oficial das igrejas Assembleia de Deus e IURD.
Como contrapartida, Lula e o PT apoiaram Crivela em sua candidatura ao governo do
Estado do Rio de Janeiro, oficializando a coligação em março de 2006 (IDEM, 2006).
Nas eleições de 2010, a influência de grupos de pressão religiosos, não apenas
os evangélicos, mas também os católicos, atingiu o seu ápice (ORO, 2011). Marina Silva,
candidata pelo Partido Verde - PV, era a única dos presidenciáveis identificada
diretamente com os evangélicos. Por conta disso, sofreu dentro do próprio partido, pois
logo após oficializar a sua candidatura um grupo de políticos do PV acusou o próprio
partido de abandonar sua luta pela legalização do aborto e união homoafetiva (ORO e
MARIANO, 2011 p. 256).
Já a candidata Dilma Roussef pelo PT, sofreu com forte campanha difamatória
após demonstrar simpatia por questões como a união homoafetiva (TADVALD, 2010).
A fim de reverter esse quadro, Dilma, junto a Lula, chegou a se reunir com mais de 60
lideranças religiosas reafirmando o seu compromisso com o povo evangélico de que não
enviaria proposta ao Congresso Nacional sobre a legalização do aborto (idem, 2010 p.
105).

4
Em um evento evangélico arranjado por Crivela, Lula se encontrou com diversos cantores gospel e
discursou: “Quis Deus que fosse esse, que era chamado de demônio, que fosse lá sancionar o Código Civil
que permite total liberdade de religião neste país”. (cf MARIANO, HOFF e DANTAS, 2006, p. 66).
6

Na arena legislativa, no ano de 2003 foi criada a Frente Parlamentar Evangélica.


Duarte (2012 p. 54) descreve que no ano de sua instauração, os deputados da FPE
realizavam cultos em um dos plenários da casa todas às quartas pela manhã,
transformando um espaço de fazer leis em um local de invocação do religioso. Na
legislatura atual, 55ª, a Frente tem como presidente o deputado federal João Campos –
PSDB/GO, e 199 deputados federais e 4 senadores como membros. No documento oficial
disponível no site da Câmara, a organização se denomina de natureza civil, integrada por
deputados federais e senadores.

Ainda sobre a participação na arena legislativa, em menos de 20 anos os


evangélicos duplicaram a sua base parlamentar, reforçando a chamada “bancada
evangélica”.
Gráfico 1. Número de Deputados Evangélicos na Câmara por legislatura

Fonte: ORO (2006) Câmara dos Deputados e Diap


Porcentagem com relação aos 513 deputados que compõe a Câmara.

Com exceção da 53ª Legislatura, onde houve queda significativa dos


parlamentares pentecostais, os demais anos mostram o crescimento desses religiosos na
política. A visível perda de cadeiras da bancada evangélica sofrida no ano de 2007 é o
resultado do envolvimento desses políticos no escândalo da Máfia dos Sanguessugas5,
que diz respeito ao esquema de corrupção de superfaturamento na venda de ambulâncias
para diversas prefeituras, em troca de emendas parlamentares que tiveram protagonismo
maciço de parlamentares evangélicos (SOUZA, 2009 p. 11). Para tentar diminuir os

5
Segundo depoimentos colhidos pela Justiça Federal e CPMI, acredita-se que a bancada evangélica
participou ativamente do esquema, arrecadando uma média de R$ 53 milhões (cf MARIANO, HOFF e
DANTAS, 2006).
7

danos, as grandes denominações pentecostais, como a Universal e a Assembleia de Deus


retiraram o apoio político aos deputados envolvidos, fator que pode ser associado à
redução da bancada na legislatura seguinte (MARIANO, HOFF e DANTAS 2006, p. 69)
Apesar de na 54ª Legislatura os deputados evangélicos ainda estarem espalhados
em diferentes partidos políticos6, representando 22 estados diferentes, o PSC e PRB se
destacaram pelo número de políticos dessa vertente religiosa. O PSC foi o que concentrou
o maior número de evangélicos, 11 deputados. Além disso, o partido cristão ganhou
destaque pela atuação política de alguns dos seus deputados, com especial atenção ao
Pastor Feliciano. No ano de 2013, o cantor gospel Feliciano, líder da igreja Tempo de
Avivamento, denominação ligada à Assembleia de Deus foi nomeado para presidência da
Comissão de Direitos Humanos. Figura polêmica por suas posições sobre assuntos
essenciais tratados na comissão, tais como direitos da comunidade LGBT, direitos civis
de índios e negros e atentados contra os direitos humanos, sua nomeação causou comoção
na sociedade cível, com manifestações de insatisfação. No dia 12 de março de 2013, o
Colégio de Líderes decidiu manter o cargo do deputado. Tradicionalmente a Comissão
dos Direitos Humanos e Minorias - CDH sempre foi presidida por parlamentares ligados
a partidos de esquerda. Especula-se que a eleição do político do PSC teria sido manobra
política do PT para evitar que Sóstene Cavalcante – PSD/RJ, evangélico ligado a Silas
Malafaia, fosse eleito.
No ano seguinte de sua gestão enquanto presidente, a Comissão volta às mãos do
PT com a presidência do deputado Assis do Couto. Como consequência, foram
arquivados todos os requerimentos não votados durante a gestão de Feliciano. Além disso,
não houve grandes avanços dessas pautas fora da comissão. No ano de 2015 o PT manteve
a presidência da CDH, com a eleição de Paulo Pimenta – PT/RS à sua frente. Contudo, a
vaga de vice volta para um evangélico, ninguém menos que Marco Feliciano.
Com a 55ª Legislatura, a bancada evangélica chega a sua maior expressão
numérica. Além da presença desses cristãos em diferentes comissões, os evangélicos
ainda demonstraram força política em outros momentos de atuação na Câmara, como no
episódio da votação do impeachment da presidenta Dilma Roussef. Se grande parte dos

6
Partido Progressista, Partido do Movimento Democrático Brasileiro, Partido da Social Democracia
Brasileira, Partido Social Cristão, Democratas, Partido dos Trabalhadores, Partido Republicano
Brasileiro, Partido da República, Partido Trabalhista Cristão, Partido Verde, Partido Socialista Brasileiro,
Partido Trabalhista Brasileiro, Partido Democrático Trabalhista e Partido da Mobilização Nacional
8

513 deputados justificaram a destituição da presidenta como um ato “por Deus”, poucos
dias antes da votação, a Frente Parlamentar Evangélica, no dia 06 de abril de 2016, por
meio do seu presidente João Campos, declarou apoio ao impeachment da presidenta.
Segundo deputado declarou em nota, a decisão foi tomada pela “grave crise econômica,
moral, ética e política que atravessa o país" e dos "recentes escândalos de corrupção
praticados pelo governo e crimes de responsabilidade praticados por Dilma que
constituem uma afronta ao povo e ao estado democrático de direito" (Jornal o Globo
06/04/2016).
Se o governo de Lula e Dilma mantiveram estreitas relações com os evangélicos,
Michel Temer – PMDB, após tomar posse como Presidente da República, em sua reforma
ministerial deu papel de destaque a esses religiosos. Para o Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior nomeou o Bispo Marcos Pereira, grande
aliado de Edir Macedo. Para o Ministério do Trabalho nomeou o Pastor Ronaldo
Nogueira. Para Secretaria de Políticas para mulheres, que objetiva implementar políticas
para as mulheres, nomeou a deputada evangélica Fátima Pelaes, que já se declarou contra
o aborto mesmo em caso de estupro7. Nos últimos anos, dois partidos têm concentrado
um maior número de deputados evangélicos: PRB e PSC.

3. O Partido Social Cristão

No Brasil, após a reforma do sistema partidário brasileiro em 1979, o primeiro


partido confessional que surge é o Partido Social Cristão – PSC, em 1985. Porém, a sua
fundação enquanto agremiação política não se deu por conta de fortes ligações com
segmentos religiosos da sociedade. Os partidos cristãos no Brasil não representam
clivagens tradicionais, como a religiosa foi tão significativa em países europeus, gerando
grandes partidos, como os PDCs na Alemanha, Itália, entre outros. O que reforça a
importância de estudos que abordem esse aspecto da política brasileira
Há apenas um trabalho no Brasil que discorre, muito brevemente, sobre a origem
do PSC8. Praticamente não há informações na literatura sobre essa agremiação que aborde
sua estrutura organizacional ou mesmo principais características da sigla. Encontra-se,

7
Dados coletados no site do Palácio do Planalto e jornal El País publicado em 08/06/2016
8
No caso, nos referimos ao livro “Multipartidarismo e Democracia”, de Jairo Nicolau.
9

apenas, poucos estudos que fazem referência ao PSC enquanto um partido que concentra
muitos evangélicos.
A plataforma do PSC não é monoconfessional, agregando cristão católicos,
protestantes e os pentecostais. Segundo o site do partido, o “PSC surgiu como uma
consequência natural da ousadia de brasileiros alicerçados nos ideais difundidos pelo
político mineiro Pedro Aleixo9”. A origem do PSC remonta a década de 70, com a
tentativa do político Pedro Aleixo em criar o Partido Democrático Republicano (PDR).
Pedro Aleixo foi um conhecido político mineiro que em 1930, partidário da Aliança
Liberal, ajudou na Revolução de 1930 a colocar Getúlio Vargas na posição de presidente.
O que chama nossa atenção neste ponto, é que não há registro ou qualquer menção que
este seria um partido diretamente ligado aos preceitos cristãos.
Em 1937, quando Vargas dissolveu o Congresso Nacional, com o golpe de estado,
Aleixo era presidente da Câmara, e, por isso fez forte oposição a Vargas. Em 1943 foi um
dos fundadores da União Democrática Nacional (UDN). Em 1964, por sua vez, como um
dos grandes nomes da oposição, foi um importante articulador da deposição de Goulart.
Filiado a Aliança Renovadora Nacional - ARENA, foi eleito em 1966 para o cargo de
vice-presidente do General Arthur da Costa e Silva. Em 1968 foi contrário à aprovação
do AI – 5, afirmando que o ato representaria a institucionalização da ditadura. Como
consequência, em 1969, mesmo com a doença do General Costa e Silva, Pedro Aleixo foi
impedido de assumir a presidência pelo Ato institucional nª 12, que decidiu que o país
seria governado por uma junta militar.
No ano seguinte ao seu impedimento, Pedro Aleixo se desligou da ARENA e
passou a articular, sem sucesso, o Partido Democrático Republicano – PDR. Após sua
morte, em 1975, o seu filho, Mauricio Aleixo deu prosseguimento a organização da sigla,
que em 1981 conseguiu o seu registro provisório. Com a abertura política em 1985, Vítor
Jorge Abdalla Nousseis, então filiado ao PDR desde os seus primórdios e presidente do
partido sugere a mudança do nome da sigla. Na ocasião, o político também mineiro
entendia “que o termo “social” tornaria mais dinâmica a mensagem partidária”
(CPDOC/FGV)10, alterando o nome da agremiação para Partidos Social Cristão.

9
http://www.psc.org.br/partido-social-cristao/historico
10
CPDOC/FGV – Verbete PSC. Consultado em 22/12/2016.
10

Em 1989, primeira eleição pós ditadura militar em que os cidadãos brasileiros


escolheram o presidente da república, o PSC junto ao Partido Social Trabalhista11 - PST,
Partido Trabalhista Renovador - PTR e Partido da Reconstrução Nacional - PRN formou
a chamada coligação “Brasil Novo”, que bem-sucedida elegeu Fernando Collor de Melo.
O registro definitivo no TSE só foi obtido em 1990. No ano de 1994, o PSC, após
alteração da lei eleitoral que, antes de sua mudança, não permitia aos partidos pequenos
que lançassem candidatos próprios, apresentou para o cargo de Presidente da República
a chapa Hernani Fortuna e Vítor Jorge Abdala Nósseis, para presidente e vice-presidente,
respectivamente, ambos membros do PSC. À época, Nósseis era o presidente da
agremiação. Por sua vez, Hernani Fortura, era um militar recém filiado a sigla. O
desempenho eleitoral nesse pleito foi pífio, o PSC ficou em último lugar com apenas
238.12612 votos.
No pleito de 1998 o partido ainda persistiu com candidato próprio, lançando para
o cargo de presidente mais uma vez somente candidatos do PSC, Sergio Bueno e Ronald
Abrahão Azaro. Os aspirantes ao cargo ficaram em penúltima posição com 124.659 votos.
Nas eleições de 2002, pela primeira vez desde a fundação da sigla, o PSC não lançou um
candidato próprio. No primeiro turno a sigla apoiou o candidato do Partido Socialista
Brasileiro - PSB, Anthony Garotinho, evangélico declarado. Frustrada a vitória de um
evangélico, no segundo turno, junto com outros partidos formaram coligação com o PT,
e apoiaram o candidato Lula. Em 2006 a sigla não lançou candidato e não declarou apoio
formal à nenhuma agremiação.
No pleito de 2010 o PSC declarou apoio político a então candidata à presidência
da República Dilma Rousseff pelo Partido dos Trabalhadores – PT. Porém, nas eleições
de 2014, o partido volta a sua antiga posição com uma agenda mais conservadora ao
lançar como candidato à Presidência o evangélico Pastor Everaldo, alcançando a posição
de 4ª mais votado.
Com relação a sua atuação na arena legislativa - federal e estadual - o PSC
demonstra que desde das eleições de 1990 conseguiu eleger parlamentares.

Tabela 2 – Número de eleições em que o PSC obteve votos para a Câmara dos Deputados

Partido 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014

11
Em 1993 o PST fundiu-se ao PTR e deu origem ao Partido Progressista – PP.
12
Dados do TSE.
11

PSC 0 1 1 1 1 1 1 1
Fonte: TSE - elaboração própria
0 = não obteve votos para deputado federal
1= obteve votos para deputado federal

Quando detalhamos este resultado, com relação ao número de cadeiras, não há um


processo homogêneo de crescimento na Câmara dos Deputados. Além disso, o número
máximo de cadeiras conquistadas foi de 18, sendo assim pouco representativo.

Gráfico 2. Número de cadeiras do PSC na Câmara


dos Deputados

20

10

0
1982 1986 1990 1994 1998 2002 2006 2010 2014

Dados: TSE – elaboração própria

Com o levantamento dos dados fica evidente a relação entre o PSC e a Igreja
Assembleia de Deus. Mais da metade dos deputados federais eleitos nos dois últimos
pleitos são evangélicos e se declaram pertencentes a essa denominação cristã.

Tabela 3. Deputados Federais evangélicos do PSC – 54ª Legislatura

Nome Partido Estado Mandato Denominação Religiosa


Antônia Lúcia PSC AC Novo Assembléia de Deus
Edmar Arruda PSC PR Novo Assembléia de Deus
Erivelton Santana PSC BA Novo Assembléia de Deus
Filipe Pereira PSC RJ Reeleito Assembléia de Deus
Lauriete Rodrigues PSC ES Novo Assembléia de Deus
Marco Feliciano PSC SP Novo Assembléia de Deus
Mário de Oliveira PSC MG Reeleito Evangelho Quadrangular
Takayama PSC PR Reeleito Assembléia de Deus
Zequinha Marinho PSC PA Reeleito Assembléia de Deus

Fonte: Câmara dos deputados e Diap, elaboração própria


12

Tabela 4. Deputados Federais evangélicos do PSC – 55ª Legislatura

Nome Partido Estado Mandato Denominação Religiosa


Prof. Victório Galli PSC MT Novo Assembleia de Deus
Julia Marinho PSC PA Nova Assembleia de Deus
Edmar Arruda PSC PR Reeleito Presbiteriana Independente
Takayama PSC PR Reeleito Assembleia de Deus
Eduardo Bolsonaro PSC SP Novo Batista
Pastor Gilberto PSC SP Novo Assembleia de Deus
Marco Feliciano* PSC SP Reeleito Catedral do Avivamento/Assembleia de Deus

Fonte: Câmara dos deputados e Diap, elaboração própria

O PSC elegeu também na 55º Legislatura o deputado federal Erivelton Santana,


pelo estado da Bahia. O mesmo é pastor da Assembleia de Deus e recentemente migrou
para o Partido Ecológico Nacional - PEN.
Segundo o estatuto do PSC, no item “Da regência e finalidade do estatuto”, o
mesmo dispõe que o documento é fundamentado pela doutrina social cristã, onde o
cristianismo, mais que uma religião, representa um estado de espirito. Em outubro de
2016, o PSC se reuniu para começar a elaboração do Manifesto Social Cristã, que irá
conter os princípios que nortearão um eventual governo do partido para as eleições de
2018. Entre os participantes estavam o presidente da sigla Pastor Everaldo, Marcondes
Gadella (vice-presidente do PSC), Antônio Cabrera (ex-ministro da agricultura no
governo Collor) e Paulo Rabello (atual presidente do IBGE).

3. Discussão teórica sobre as comissões no Brasil


No Brasil, as comissões legislativas são órgãos técnicos que contribuem para a
divisão interna dos trabalhos legislativos sob jurisdições específicas, favorecendo o
andamento do processo legislativo ao coletar informações e debater questões importantes
sobre temáticas específicas. Os estudos sobre o funcionamento das comissões legislativas
no Brasil foram fortemente influenciados pela literatura da escolha racional sobre o
Congresso dos EUA (PEREIRA e MUELLER, 2000), e se divide em três correntes
teóricas: distributivista, informacionais e partidária.
A primeira delas, a versão distributivista é a mais dominante nos estudos
legislativos. O ponto de partida deste modelo é a premissa que todo parlamentar tem por
13

motivação primária a reeleição. De modo resumido, Weingast, Shepsle e Johnsen (1981


p. 346) definem uma política distributivista como uma ação política que concentra os
beneficios para um círculo eleitoral. As preferências relativas as políticas públicas
escolhidas por esses atores só podem ser compreendidas à luz da sua motivação, ou seja,
a reeleição (LIMONGI, 1994).
Por conseguinte, as chances de um deputado se reeleger tem efeito positivo para
as políticas aplicadas em benefício do seu eleitorado. Neste caso, as regras eleitorais
ganham destaque. Por meio do voto distrital estabelece-se um vínculo entre candidato-
eleitor, pois os interesses a serem atendidos são localizados e correspondem a
características sociais e econômicas circunscritas. Assim, se de um lado as políticas
públicas dos congressistas serão direcionadas a oferecer benefícios a uma clientela
identificada, por outro lado, os custos de tais políticas serão dispersos por toda a
população (LIMONGI, 1994 p. 8).
Nota-se que para os autores acima, a questão geográfica é um imperativo
essencial. Contudo, para Collie (1988 apud LIMONGI, 1994) os benefícios podem ser
distribuídos para uma população ou área de forma mais geral, sem sublinhar um espaço
geográfico. No Brasil, essa corrente de interpretação fez sucesso ao aliar-se com os
diagnósticos negativos acerca do nosso sistema partidário. A ausência de partidos
ideologicamente consistente e com poucas ferramentas de controle sobre a atividade
parlamentar incentivariam políticas paroquialistas por parte dos nossos congressistas, que
“estariam voltados única e exclusivamente para a maximização dos interesses
individuais” (LEMOS, 2001 p. 566-567).
Segue-se que a relação entre os congressistas será sempre de conflito, pois todos
devem lutar pela maior quantidade de benefícios para o seu distrito. Porém, a cooperação
entre os parlamentares é essencial para alcançarem os seus objetivos. Existe um mercado
de voto, políticas são aprovadas por meio da troca de voto (LEMOS, 2001; LIMONGI,
1994; PEREIRA e MUELLER, 2000). O papel das instituições é regular os trâmites entre
as trocas de voto. Um dos eixos fundamentais para o funcionamento do Congresso nos
termos distributivistas é o papel das comissões. São elas que estruturam todas as trocas
de votos de modo estável e garante a aprovação dessas matérias. Por sua vez, há grande
dificuldade em importar esta análise ao modelo brasileiro por conta da diferença do papel
das nossas comissões.
14

O segundo modelo, o informacional, têm uma tradição pouco extensa quando


comparado ao modelo distributivista (PEREIRA e MUELLER, 2000). O modelo
informacional destaca como as comissões desempenham papel importante na coleta de
informações fundamentais para o andamento do processo legislativo e na distribuição
dessas informações entre os parlamentares (LEMOS, 2001). Apesar de estar diretamente
dialogando com o modelo distributivista, a versão informacional possui dois postulados
essenciais: a do primado majoritário, que as políticas no congresso são escolhidas pela
maioria e; o postulado da incerteza das consequências políticas de decisões tomadas com
base em informações incompletas (KREHBIEL, 1991).
Com relação ao primeiro axioma, o majoritário, as escolhas da legislatura devem
englobar as duas áreas de atuação dos parlamentares: tanto para votar, quanto para
escolher as regras e procedimentos a estabelecer os seus trabalhos (LIMONGI, 1996).
Este postulado tem dois aspectos: negativo e positivo. O postulado negativo é utilizado
como crítica ao modelo distributivista. Se o coletivo dos legisladores decide por algo
contrário aos interesses da maioria, por que esse resultado não seria alterado? Em outros
termos, por que a maioria aprovaria matérias sob resoluções restritas, sendo esse resultado
consequências de decisões ligadas às preferências dos congressistas? (Idem, 1996). O
postulado positivo corresponde a legislatura como um corpo único. A vontade da
legislatura corresponde a do seu eleitor mediano. Portanto, a Legislatura funciona por
decisão da maioria que está intrinsecamente ligada as preferências dos eleitores.
O postulado da incerteza diz respeito a como as informações são distribuídas na
casa legislativa. A incerteza quanto aos resultados de escolhas políticas está relacionada
a assimetria de como a informação é distribuída, isto é, alguns parlamentares têm maior
conhecimento acerca de determinadas políticas. Portanto, há mais benefícios se todos os
deputados utilizarem o maior número possível de informações para tomada de decisão,
pois só assim é possível diminuir a incerteza quanto aos resultados (LIMONGI, 1996;
KREHBIEL, 1991). Neste sentido, as instituições serão mais eficientes quanto mais
inibirem o uso de informação para estratégias particulares e incentivarem a distribuição
destas.
Fica claro que ambas as correntes – distributivista e informacional - atribuem
importante status às comissões, porém com papeis diferentes: para a teoria distributivista
as comissões servem aos propósitos dos congressistas, ela é um meio para se obter ganhos
de troca; na teoria informacional o plenário concede certos poderes ás comissões para que
15

estas se especializem em certas áreas e passem informações para o plenário, entre esses
poderes concedidos às comissões estão o poder de veto e de alterar propostas (PEREIRA
& MUELLER, 2000).
De modo geral, é possível identificar uma diferença normativa fundamental entre
as duas versões (Idem, 2000). Para a corrente informacional uma organização será
eficiente se conseguir estimular e retribuir informação de forma a diminuir as incertezas.
Com relação a versão distributivista, podemos chamar de organização eficiente quanto
mais inibir que os parlamentares ofereçam políticas clientelistas. Mesmo assim, podemos
dizer que as duas versões coincidem quanto a importância atribuída às comissões como
centrais para estruturar os trabalhos no legislativo
A terceira versão é a partidária. Diferente das outras duas versões para a corrente
partidária as comissões devem ser entendidas, por meio dos partidos, como governos
partidários. Os maiores expoentes desta corrente, Cox e McCubbins (2007), criticam a
literatura dos anos 70 e 80 que avaliaram os partidos americanos como insignificantes e
ineficientes para organização dos trabalhos legislativos. De modo a reavaliar o papel dos
partidos, eles partem da premissa que os partidos majoritários são uma espécie de “cartel
legislativo” que tomam o poder. As forças desses cartéis estariam assentadas no controle
das lideranças partidárias da agenda legislativa (NASCIMENTO, 2010). Essa posição dos
partidos tem como consequências que o processo legislativo e o sistema de comissões são
estruturados a partir dos partidos políticos.
Neste sentido, para a versão partidária, há uma grande tensão entre a ideia de um
partido como uma coalizão processual que estabelece as regras dos trabalhos no
legislativo e a ideia de comissões como agentes autônomos imprescindível ao legislativo
(COX & McCUBBINS, 2007). Com relação as comissões, é preciso destacar a norma da
antiguidade, do qual a presidência das comissões é ocupada pelo membro do partido
majoritário mais antigo presente na comissão (LIMONGI, 1996). Claramente, esta norma
da antiguidade limita a ação dos partidos. No entanto, para este ponto é preciso destacar
que há uma atuação anterior do partido, que seleciona e reconduz à comissão os
parlamentares mais afinados com o partido.
Apesar desses postulados teóricos serem importantes para se pensar o Brasil, eles
se foram pensados para o caso americano, que apresenta diferenças significativas de suas
instituições quando comparados ao caso brasileiro. Entre as disparidades Pereira e
Mueller (2000), destacam a preponderância do executivo sobre os procedimentos
16

legislativos. O executivo exerce forte poder por meio do Colégio de Líderes e da Mesa
Diretora sobre as comissões (LIMONGI, 1996; PEREIRA & MUELLER, 2000). A
influência é exercida por meio de manipulação, em alguns casos, da nomeação de algumas
comissões para nelas colocar membros fieis ao seu governo (PEREIRA & MUELLER,
2000 p. 49).
Apesar de parte da literatura apontar para fragilidade das nossas comissões, em
especial, ao compará-las com as comissões dos EUA, estas ainda possuem papel de
importância no processo legislativo. É fato que o Executivo brasileiro tem poderes de
retirar propostas das comissões por meio de pedidos de urgência, ou mesmo de influenciar
nas escolhas das composições destas. Também é verdade que isso demonstra a fragilidade
das nossas comissões. Em trabalho seminal Pereira e Mueller (2000, 2003), destacam
que mesmo assim esses pressupostos teóricos podem ser utilizados para se pensar o caso
do Brasil. Para os autores o fato do Executivo investir e buscar influenciar a composição
das comissões demonstra a importância delas. Neste sentido, apesar de não explicar por
completo, como sugere a teoria distributivista o veto ex-post não deixa de ser uma fonte
de poder dessas comissões. Assim, um conjunto de comissões agiria como um facilitador
das propostas defendidas pelo executivo.
Como somente este ponto não é suficiente para se pensar no caso brasileiro, os
autores se voltaram para teoria informacial. Partindo da premissa que as comissões são
capazes de adquirir informações e se especializar em assuntos específicos,13 há um ganho
informacial para o Plenário e o Executivo (idem, p.61). Porém há o custo com a espera,
o que podem gerar pedidos de urgência. Os autores constataram que quanto maior for a
distância entre as preferências da comissão e do plenário, maiores são as chances de
pedido de urgência.
Sobre a composição das Comissões, esta é assegurada de acordo com a
representação da proporcionalidade dos partidos e dos blocos parlamentares da Câmara,
incluindo sempre um membro da minoria, mesmo que a esta não lhe caiba vaga (Art. 23).
Contudo, sabe-se que tais indicações passam pelo crivo dos líderes partidário.
Os deputados só podem compor 1 comissão permanente por vez como membro
titular (Art. 26 §2º). Apesar disso, a rotatividade dos parlamentares nas comissões é
extremamente alto. Em alguns casos, o parlamentar chega a permanecer menos de três

13
De acordo com Pereira e Mueller (2000, p. 61) O equilíbrio acontece quando as comissões revelam
informações que ajudam a reduzir as incertezas que podem prejudicar a todos.
17

meses como membro titular de uma comissão. No caso do PSC, 16 deputados fizeram
parte de uma ou mais comissões permanentes durante a 54º Legislatura, como membros
titulares. Percebe-se que é comum o retorno de um mesmo deputado para uma comissão
na qual permaneceu apenas por poucos meses. Essa alta rotatividade, não apenas
prerrogativa do PSC, pode ser observada como prática de todos os partidos e em todas as
comissões permanentes, o que com certeza dificulta a especialização do parlamente nas
temáticas exigidas por essas comissões.
Tabela 5. Deputados do PSC e Comissões Permanentes
Membro - Membro -
Comissão - Sigla Deputado - Nome
Início Fim
CAPADR NELSON PADOVANI 01/03/2011 31/01/2012
CAPADR NELSON PADOVANI 07/03/2012 02/02/2013
CAPADR NELSON PADOVANI 05/03/2013 03/02/2014
CAPADR NELSON PADOVANI 25/02/2014 31/01/2015
CCJC ANDRE MOURA 05/03/2013 06/03/2013
CCJC ANDRE MOURA 13/03/2013 03/02/2014
CCJC ANDRE MOURA 25/02/2014 31/01/2015
CCJC ANTÔNIA LÚCIA 26/02/2014 27/02/2014
CCJC LEONARDO GADELHA 05/03/2013 03/02/2014
CCJC MARCO FELICIANO 01/03/2011 31/01/2012
CCJC MARCO FELICIANO 07/03/2012 02/02/2013
CCJC MARCO FELICIANO 25/02/2014 26/02/2014
CCJC MARCO FELICIANO 27/02/2014 31/01/2015
CCTCI SÉRGIO DE OLIVEIRA 21/08/2012 06/12/2012
CCTCI SÉRGIO DE OLIVEIRA 25/02/2014 04/04/2014
CCTCI RATINHO JUNIOR 01/03/2011 31/01/2012
CCTCI RATINHO JUNIOR 07/03/2012 21/08/2012
CCTCI RATINHO JUNIOR 12/12/2012 02/02/2013
CCTCI RATINHO JUNIOR 07/04/2014 31/01/2015
CCTCI TAKAYAMA 05/03/2013 03/02/2014
CCULT SÉRGIO DE OLIVEIRA 05/03/2013 03/02/2014
CDC FILIPE PEREIRA 01/03/2011 23/03/2011
CDC FILIPE PEREIRA 07/03/2012 02/02/2013
CDEICS ANDRE MOURA 01/03/2011 31/01/2012
CDHM COSTA FERREIRA 25/02/2014 17/03/2014
CDHM FELICIANO 07/03/2013 26/02/2014
CE COSTA FERREIRA 20/10/2011 31/01/2012
CE COSTA FERREIRA 07/03/2012 02/02/2013
CE COSTA FERREIRA 05/03/2013 06/03/2013
CE COSTA FERREIRA 19/03/2013 03/02/2014
CFFC EDMAR ARRUDA 07/03/2012 02/02/2013
CFFC ZEQUINHA MARINHO 07/03/2012 07/03/2012
CFT EDMAR ARRUDA 01/03/2011 31/01/2012
CFT EDMAR ARRUDA 07/03/2012 07/03/2012
18

CFT EDMAR ARRUDA 05/03/2013 13/03/2013


CFT EDMAR ARRUDA 12/07/2013 03/02/2014
CFT EDMAR ARRUDA 25/02/2014 31/01/2015
CFT RICARDO ARRUDA 13/03/2013 07/07/2013
CFT ZEQUINHA MARINHO 21/03/2012 02/02/2013
CINDRA ANTÔNIA LÚCIA 07/03/2012 02/02/2013
CINDRA ZEQUINHA MARINHO 01/03/2011 31/01/2012
CINDRA ZEQUINHA MARINHO 05/03/2013 03/02/2014
CLP COSTA FERREIRA 04/06/2013 03/02/2014
CMADS MÁRIO DE OLIVEIRA 08/07/2011 31/01/2012
CMADS MÁRIO DE OLIVEIRA 07/03/2012 15/05/2012
CMADS MÁRIO DE OLIVEIRA 31/10/2012 02/02/2013
CREDN LEONARDO GADELHA 07/03/2012 02/02/2013
CREDN TAKAYAMA 01/03/2011 31/01/2012
CREDN ZEQUINHA MARINHO 05/03/2013 03/02/2014
CSSF FILIPE PEREIRA 07/04/2014 31/01/2015
CSSF LAURIETE 05/03/2013 03/02/2014
CSSF LEONARDO GADELHA 25/02/2014 24/03/2014
CTASP ERIVELTON SANTANA 01/03/2011 31/01/2012
CTASP ERIVELTON SANTANA 07/03/2012 02/02/2013
CTASP ERIVELTON SANTANA 05/03/2013 03/02/2014
CTASP ERIVELTON SANTANA 25/02/2014 31/01/2015
Fonte: Câmara dos Deputados, elaboração própria

Os deputados evangélicos estão presentes nas seguintes comissões permanentes:


Constituição e Justiça e de Cidadania; Integração Nacional, Desenv. Regional e
Amazônia; Fiscalização Financeira e Controle; Finanças e Tributação; Trabalho,
Administração e Serviço Público; Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável;
Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática; Relações Exteriores e de Defesa
Nacional e Integração Nacional, Desenv. Regional e Amazônia; e Direitos Humanos e
Minorias. Para os objetivos por nos propostos analisaremos apenas as comissões de
Ciência e Tecnologia e Direitos Humanos e Minorias. Essas duas comissões foram
escolhidas por tratarem de questões que muitas vezes podem vir de encontro com os
preceitos cristãos. Neste sentido, concentramos nossa análise na atuação de dois
deputados: Takayama e Marco Feliciano.
1) Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática: é formada por 84 deputados,
sendo metade destes titulares e os demais suplentes. Segunda as normas regimentais da
casa (art. 32), entre as suas atribuições destacamos: política nacional de ciência e
tecnologia, meios de comunicação; produção e programação das emissoras de rádio e
televisão; informática e assuntos relativos a comunicação; regime jurídico das
telecomunicações e informática, discussão sobre ciência e tecnologia. Nesta comissão
19

analisamos a atuação do deputado federal pelo estado do Paraná, Hidekazu Takayama,


membro da Igreja Assembleia de Deus.
Foram analisadas 451 propostas que foram apreciadas na comissão. Para nossa
surpresa, destas, 434 são Projeto de Decreto Legislativo de Concessão, Renovação e
Permissão de Rádio/TV de iniciativa do Executivo. E apenas 17 são Projetos de Lei de
iniciativa de deputados e ou senadores. Excluímos de nossa análise as matérias que foram
retiradas de pauta e, portanto, não foram votadas.
O deputado cristão compareceu em todas as reuniões deliberativas. Contudo, as
votações foram unanimes, o que demonstra a força do colégio de líderes e do Executivo
sobre a comissão. Dos PL que foram votados 1 foi sobre pesquisa genética e os demais
sobre regulação e ou mudanças relacionadas à tecnologia e telecomunicação. Além dessas
matérias, foram apreciadas 8 Sugestões de Emenda ao Orçamento (SOR) para fomento à
pesquisa e apoio a projetos de inclusão digital. Outro dado interessante é o andamento
dessas matérias: todas as matérias sobre concessão de rádio que foram de iniciativa do
Executivo foram transformadas em Decreto Legislativo, por sua vez, os PL, 9 foram
arquivados e os demais estão aguardando parecer de outras comissões ou apreciação pelo
Senado Federal.

2) Comissão de Direitos Humanos: É formada por 18 membros titulares e igual número


de suplentes. Entre os objetivos da comissão, segundo site da Câmara, é contribuir “para
a afirmação dos direitos humanos. Parte do princípio de que toda a pessoa humana possui
direitos básicos e inalienáveis que devem ser protegidos pelos Estados e por toda a
comunidade internacional”
Diferente da CCTCI, é visível a atuação de evangélicos na comissão de direitos
humanos. Analisamos a atuação do deputado Pastor Marco Feliciano no período entre
07/03/2013 à 26/02/2014. Percebe-se que além de Feliciano, a comissão contava com
outros deputados evangélicos: Henrique Afonso – PV, João Campos – PSDB, Pastor
Eurico – PSB e Lilian Sá - PROS. Entre os requerimentos, parte habitual dos trabalhos
das comissões, encontramos alguns que podem ser relacionados com a moral cristã,
como: “a realização de Audiência Pública para debater a violação dos direitos humanos
do nascituro" (REQ 45/2013 CDHM, feito pelo dep. Henrique Afonso). O pedido de João
Campos, que, por sua vez, é conhecido por ser favorável a redução da maioridade penal.
Tal deputado, no dia 28/05 aprovou REQ 41/2013 CDHM - que "requer que seja
20

promovido pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias, Seminário para debater a


Redução da Maioridade Penal, em conjunto com a CSPCCO e CCJC". Também, o pedido
do evangélico Marcos Rogério – PDT, que defende uma maior flexibilização na redução
da maioridade penal, também obteve sucesso em solicitar “à Comissão de Direitos
Humanos e Minorias - CDHM - reunião de Audiência Pública para debater a alteração da
Maioridade Penal" (REQ 42/2013 CDHM). Além desses, foram solicitados
requerimentos sobre audiência pública para debater assédio moral no trabalho (REQ
52/2013 CDHM - do Pastor Marco Feliciano), Avaliação das Políticas Indigenistas sobre
Demarcação e Mineração em Terras (REQ 60/2013 CDHM - do Sr. Henrique Afonso),
Audiência Pública para discutir o Aborto (REQ 89/2013 CDHM – do Marco Feliciano),
entre outros temas.
Das audiências públicas, geralmente utilizadas como meio de discussão e
informação sobre assuntos específicos, destacamos a reunião realizada no dia 06/06/2013,
sobre a instituição do Dia do Perdão. Na ocasião, o vice-presidente da federação espirita
Brasileira, Geraldo Campetti Sobrinho, proferiu discurso, entre outras questões, sobre a
importância de orar. Outra audiência interessante, foi sobre a iniciativa privada e as
políticas de valorização e proteção a família. Ocorreram também audiências sobre a
condição do Programa Brasil Quilombola, Saúde Indígena, Cultura Cigana, Sistema
educativo para menores infratores. Ainda foi realizado debate a respeito do “problema da
erotização das nossas crianças através de imagens, de músicas nos meios de
comunicações, cartilhas educativas e demais exposições (Requerimento nº 50/2013, do
Dep. Pastor Eurico) ”, Audiência pública sobre o Dia Nacional do Capelão Evangélico
Civil e Militar (11/12/2013 – Req. Dep. Lilian de Sá), entre outros.
Em julho de 2013, foi realizada audiência pública para se discutir sobre a violação
dos direitos humanos dos nascituros, no qual foram convidados um mestre em direito e o
dep. João Campos, autor do pedido de instalação da CPI do aborto na Câmara. Na ocasião,
o presidente da Comissão, Pastor Feliciano, relatou sua preocupação com a chegada de
médicos estrangeiros ao Brasil. O deputado Jairo Bolsonaro também participou da
audiência e ressaltou que é autor de projeto que trata sobre a paternidade responsável.
Também foi realizado seminário de discussão sobre a redução da maioridade
penal. Entre os depoentes convidados estavam os pais de um rapaz assassinado por um
menor de idade, um pastor da Igreja O Brasil Para Cristo, a secretária Nacional de
Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente, da Secretaria de Direitos Humanos
21

da Presidência da República e a promotora de Justiça e Coordenadora do Centro de Apoio


Operacional da Infância e Juventude, do Ministério Público do Pará. Nesta ocasião, o
Dep. Roberto Lucena, evangélico, começa sua fala defendendo que todas as pesquisas
mostram que um grande número da população é favorável a redução da maioridade penal.
Feliciano, ao tomar a palavra diz:
“Vivemos num mundo louco, num mundo que está de pernas para
o ar: o certo passou a ser o errado e o errado passou a ser o certo.
Quando criança, na escola, na minha época, nós tínhamos um
período em que parávamos para fazer uma oração, o Pai-Nosso.
Aquilo mexia com a gente, porque falava do sagrado, e todas as
crianças da minha época acreditavam que havia algo sagrado.
Quando o ser humano sabe ou acredita que existe algo além
daquilo que a visão humana pode alcançar, isso dá a ele um pouco
mais de esperança e respeito pelo próximo e por si mesmo
(Discurso do Dep. Marco Feliciano – 27/08) ”.

Também esteve presente o Deputado Jair Bolsonaro, afinco defensor da redução


da redução da maioridade penal. Em sua fala:
[...] hoje, tem esta bagunça: direitos humanos para vagabundo é
o que não falta neste País. [...] com 15 anos de idade, eu estava na
Praça Nossa Senhora da Guia, em Eldorado paulista, quando
passou um caminhão, vindo do interior. Dentro, estava o ex-
Capitão Lamarca, com um bando de marginais, meteu fogo para
tudo quanto é lado, seis soldados foram feridos e uma senhora
levou um tiro na perna. Ontem, por coincidência, pela primeira
vez na história, a Câmara Municipal teve coragem de fazer sessão
solene cumprimentando, saudando o heroísmo desses soldados
que enfrentaram o grupo de Lamarca. Detalhe: sabe quem era o
comandante da VPR - Vanguarda Popular Revolucionária? Dilma
Rousseff. [...] O nosso objetivo - há praticamente consenso entre
todos aqui - é tirar uma posição desta Comissão de Direitos
Humanos e Minorias, que é diferente daquela de anos
anteriores, que defendia gay, kit gay, tudo quanto é sacanagem
para a sociedade. Essa bagunça acabou com o general Feliciano e
o capitão Bolsonaro o assessorando (risos) e mais alguns
soldados, como o Deputado Roberto de Lucena (Discurso do Dep.
Jair Bolsonaro – 27/08).

Apesar dos discursos técnicos serem contrários a redução da maioridade penal, o


tom favorável dos deputados que organizaram o seminário é claramente a favor da
redução. Este seminário durou por mais dois encontros da comissão.
O número de Projetos de Lei apreciados na CDHM é visivelmente menor quando
comparado com os apreciados pela CTCI. Grande parte das reuniões não são
22

deliberativas, mas sim audiências públicas ou seminários sobre matérias específicas.


Excluídas as proposições retiradas de pauta foram apreciados apenas 12 projetos pela
comissão, destes apenas 1 de iniciativa do executivo. Entre estes, os mais problemáticos,
tendo em vista o papel da comissão são: PDC 234/2011, conhecido como a cura gay, que
suspende a resolução do Conselho Federal de Psicologia que proíbe tratamento para
homossexualidade. A proposta partiu do deputado evangélico João Campos – PSDB e foi
aprovada na comissão; a PL 1411/2011, de autoria do deputado Washington Reis “que
Descaracteriza crime a recusa, em templos religiosos, de aceitar ou efetuar cerimônias ou
pessoas em desacordo com suas crenças e liturgias”; o PDC 232/2011 que “dispõe sobre
a convocação de plebiscito para decidir sobre a união civil de pessoas do mesmo sexo;
respondendo a seguinte questão: "Você é a favor ou contra a união civil de pessoas do
mesmo sexo?". Todos esses projetos tiveram parecer aprovado na comissão, os dois
primeiros, mas seguintes tramitações foram arquivados e este último está aguardando
Designação de Relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC).
Também ocorreu a rejeição da proposta do deputado Maurício Rands - PT que
"acresce um parágrafo ao art. 16 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, e acresce uma
alínea ao inciso I do art. 217 da Lei nº 8.112, de 11 de novembro de 1990, para incluir na
situação jurídica de dependente, para fins previdenciários, o companheiro homossexual
do segurado e a companheira homossexual da segurada do INSS e o companheiro
homossexual do servidor e a companheira homossexual da servidora pública civil da
União
Contudo, duas matérias importantes foram votadas e aprovadas pela comissão:
“PL 6738/2013 - do Poder Executivo - que reserva aos negros vinte por cento das vagas
oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos
públicos no âmbito da administração pública federal, das autarquias, das fundações
públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela
União" e a “ PL 6418/2005 - do Senado Federal - Paulo Paim - (PLS 309/2004) - que
"define os crimes resultantes de discriminação e preconceito de raça, cor, etnia, religião
ou origem, incluindo o crime de discriminação no mercado de trabalho, injúria resultante
de preconceito, apologia ao racismo, atentado contra a identidade étnica, religiosa ou
regional e associação criminosa, tornando-os crimes inafiançáveis e imprescritíveis”.
23

Conclusão
Ao longo deste artigo buscamos demonstrar que os evangélicos, desde a
Constituinte, têm ocupado diferentes espaços de atuação na política partidária. Apesar de
espalhados por diversas siglas, dois partidos têm concentrado um maior número desses
religiosos: PRB e PSC. A escolha pelo PSC se justifica por ser um partido que tem
sinalizado, nas últimas eleições, para um público cristão específico. Além disso, como
partido cristão, concentra em seu estatuto preceitos morais religiosos que tem atraído cada
vez mais candidatos evangélicos. Escolhemos analisar a participação de dois deputados
em comissões permanentes por este ser um espaço de atuação ocupado por esses políticos
religiosos que é pouco estudado pela literatura.
Apesar das limitações das comissões plenárias, em parte decorrente das
prerrogativas do poder Executivo, estas ainda são importantes para o processo legislativo.
Prova disso é o controle e influencia que o Colégio de Líderes e o Executivo sempre
buscam ter sobre as comissões. Do ponto de vista estratégico, as duas comissões possuem
características muito distintas. A Comissão de Ciência e Tecnologia – CCTCI é um
espaço de atuação estratégico para o controle de muitos recursos, como por exemplo o de
concessão de emissoras de rádio e TV, regulamentação da Internet, investimento em
tecnologias, entre outros. Por sua vez, do ponto de vista de recursos, a Comissão de
Direitos Humanos e Minorias não faz sentido. Tanto é que historicamente, com exceção
das duas últimas legislaturas foi sempre delegada, sem maiores problemas, à partidos
ideologicamente de esquerda.
Ainda sobre essas diferenças, percebe-se que mais de 96% das matérias apreciadas
na CCTCI foram de iniciativas do Poder Executivo, e todas elas foram transformadas em
decreto legislativo. Os dados ainda sugerem que, por se tratar de uma comissão
estratégica, não há muito espaço para atuação religiosa, mesmo contando com a
participação de mais que um evangélico. O que se percebe é que praticamente todas as
votações são unanimes. Outra surpresa dessa comissão é que são raras às discussões de
matérias ligadas à ciência e tecnologia. Essas temáticas ficaram restritas à alguns
requerimentos e audiências públicas durante o período analisado, o que também dificulta
a possibilidade de analisar qualquer atuação ligada a preceitos religiosos. Ainda assim,
parte da literatura da sociologia da religião associou a atuação desses parlamentares com
uma possível defesa das suas concessões de Rádio e TV mas, que, no entanto, sugere-se
que por serem de iniciativa do Executivo já chegam negociadas à Comissão.
24

Por sua vez, na Comissão de Direitos Humanos e Minorias, de fato, Feliciano se


empenhou numa pauta “anti gay”. Ainda no ano de 2013, na Comissão, Feliciano
conseguiu aprovar o fim da resolução que obriga os cartórios a realizarem casamento
entre pessoas do mesmo sexo. Criou a subcomissão “Direito das Forças Armadas”, que
foi presidida por Jair Bolsonaro, aquela época, ainda deputado pelo PP/RJ. Também foi
contra o projeto que prevê ao parceiro homossexual a condição de dependente do INSS.
Foi a favor do projeto apelidado de “cura gay”, apresentado pelo deputado federal João
Campos do PSDB-GO, sobre tratamento psicológico para pessoas que se declarem
homossexuais. Além disso, criou polêmica em suas redes sociais como Twitter e blogs ao
atacar a comunidade LGBT, ser favorável a censura e a redução da maioridade penal.
Muitos evangélicos foram contra as declarações do Marco Feliciano, colocando em
dúvida a existência de um grupo religioso coeso. Apesar de praticamente todas as
matérias por ele aprovadas terem sido arquivadas, houve um retrocesso na discussão de
temas de grande importância à nossa sociedade. No mais, ao contrário da CCTCI, poucas
proposições foram apreciadas na comissão. Grande parte das reuniões foram de
audiências públicas e seminários e das poucas proposições apreciadas apenas 1 foi de
iniciativa do Executivo.
Assim, fica evidente que as normas e resoluções que regulam a dinâmica interna
da Câmara dos Deputados possuem uma complexa dinâmica que fortalece as lideranças
partidárias e o Poder Executivo quando nos referimos ao sucesso para criar uma lei e
conseguir a sua provação. Ainda que as escolhas individuais dos parlamentares sejam
importantes, como sugere a literatura sobre o tema (LOMINGI, 1996; RICCI, 2003) sua
dependência dos recursos distribuídos está diretamente relacionada ao Colégio de Líderes
e ao Poder Executivo. O caso específico da Comissão de Direitos Humanos pode indicar
que espaços pouco ocupados pelo Executivo, podem dar espaço para ação de outros
grupos, ou mesmo, parlamentares individuais. Para uma análise mais detalhada sobre esse
tema, é necessário investigar a atuação dos deputados evangélicos, no geral, em todas as
comissões permanentes nas últimas legislaturas, considerando a diferença estratégica de
cada comissão para a distribuição de poder interno para os trabalhos da Casa.

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