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História e Tragédia, entre as leituras de Nietzsche e Benjamin


Marta Mega de Andrade
PPGHIS IH UFRJ

(...) Nunca há um documento da cultura que não seja, ao mesmo tempo, um


documento da barbárie. E, assim como ele não está livre da barbárie, também não o
está o processo de sua transmissão, transmissão na qual ele passou de um vencedor
a outro. Por isso, o materialista histórico, na medida do possível, se afasta dessa
transmissão. Ele considera como sua tarefa escovar a história a contrapelo. W.
Benjamin, tese VII (trecho).

A minha intervenção discute as obras A Origem do Drama Barroco Alemão (1984;


publicada pela primeira vez em 1928) e as teses sobre a História (1940), de W. Benjamin
(LOWY, 2005), juntamente com O Nascimento da Tragédia (1996; revista e publicada em
1886) a II Consideração Intempestiva de F. Nietzsche (2003; primeira ed. 1874), tendo como
foco as críticas de Benjamin ao esteticismo na abordagem de Nietzsche e sua contraposição
da História e da saga (Geschichte). A meta é repensar a Tragédia grega e o "trágico"
extemporâneo à luz da problemática da história e do devir sugerida explicitamente por
Benjamin, por um lado, e implícita nas considerações sobre a história de Nietzsche, por outro
lado. Considero que um dos pontos centrais da discussão reside na tentativa de reunir poesia e
história numa única problemática do particular e do geral, da história e do tempo, do sujeito
como ação e potência.

I. História e Poesia

Está na Poética. É uma observação que poderia passar como um simples exemplo
vinculado a um debate sobre retórica presente na época de Aristóteles; e contudo, ela se
enraíza na problemática da poesia, da imitação e do mito. Aristóteles percebe na abordagem
trágica do mito, de fato, um "quê" de investigação histórica: o argumento, a narrativa, o foco
em praticantes, a construção de caracteres e a duração limitada que caracterizam o todo
formado pelas 6 partes da tragédia (mito, caractere, espetáculo, palavra, canto e pensamento)
levam o filósofo a articular uma diferenciação que seja mais essencial do que a diversidade
formal entre prosa e verso. Então, ele afirma que a poesia é universal (kat'holos, "em acordo
com o todo"), e portanto mais filosófica e séria que a história. Esta última lida com o
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particular (kat'hekastos, "em acordo com cada um"), ou seja, com o que "Alcibíades fez ou
sofreu". É claro que muito do que defendemos hoje ser a história já não condiziria de modo
algum com essa definição de particularidade. É claro, também, que já não cogitamos, até
estranhamos mesmo, que se compare história e poesia. Mas o centro do problema naquele
momento lá de Aristóteles era o mito e a imitação poética do mito. Naquele momento, isto é o
que nos interessa por enquanto, poesia e história podiam ser confundidas na prerrogativa de
imitar o mito estetizando a vida e o passado a sua maneira. A Poética resguarda a mimese
para a poesia, pois a mimese não é a mera imitação de um ou outro, mas a produção universal,
possível e necessária, de um modelo. Retornarei a isso.
Note-se que aqui ainda não está em questão a separação entre realidade (social) e
ficção. A poesia é tão verdadeira quanto a história, por isso ainda podem se confundir e tal
confusão justifica a intervenção do filósofo na Poética, justamente para tornar mais clara e
mais "séria" a diferença.

O que é da história e o que é da poesia não diferem por causa do


pronunciar com ou sem metro. De fato, o que está em Heródoto poderia ser
posto em metro e mesmo assim ainda seria um tipo de História, em metro
ou não. De outro modo, diferem ambas porque uma [a história] fala sobre o
que aconteceu e a outra [a poesia] sobre o que tinha que acontecer. Por
essa razão, a poesia é mais filosófica e mais zelosa que a história, pois a
poesia fala do universal, enquanto a história fala do particular. Por
“universal”, denomino aquilo que alguém irá fazer ou dizer segundo o
possível ou o necessário. “Particular” é aquilo que Alcibíades fez ou
sofreu. (...) Pelo que disse fica claro que o poeta não deve ser um fazedor
de versos mas de mitos, já que ele é poeta em virtude da mimese, e aquilo
que ele mimetiza é a ação. Mesmo supondo que ele mimetize aquilo que
aconteceu, ainda assim ele é um poeta, pois não há nada que impeça que
alguns acontecimentos sejam do tipo daqueles que aconteceriam
possivelmente ou inevitavelmente, e é por isso mesmo que ele é seu
“fabricador”. (...) Aristóteles, Poética (1451a-b; tradução minha)

A história é, assim, um discurso do particular. Traduzindo para o nosso tempo: não


somente o que "Alcibíades fez o sofreu", mas por que processos tal classe, grupo, país passou,
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quais lutas, quais conciliações e combinações para que esta ou aquela região "com história"
chegasse a configurações atuais ou passadas que "clamam" por lembrança. Isto não deixou de
ser particular porque não mais nos referimos a este ou aquele indivíduo. Ainda lidamos com
singularidades e em grande maioria somos mesmo avessos a quaisquer atributos universais a
que chamamos conceitos, paradigmas, etc. Não à toa tal inquietação é trazida por Ginzburg,
por exemplo, em seu Relações de Força: onde encontrar universais, como fazer ciência a
partir da exposição de detalhes, indícios particulares e infinitamente pequenos em documentos
eles mesmos particulares? Enfim, qual o estatuto de nossa "prova"?
No modo como pensamos a História e sua relação com o campo científico da
produção de saber sobre as sociedades humanas no tempo, persiste o desconforto entre o que
pretendemos como "ciência" e o que discutimos, nosso "objeto" em particular. A questão que
quero trazer para cá se endereça a esse entremeio, "particular" e "universal", "local" e
"global", "individuo", "sociedade"... porque como historiadores, nós nos deparamos
concretamente com "bibelôs de época", parafraseando Paul Veyne em seu "Foucault
revoluciona a história", e com eles lidamos, singularizando-os pelo próprio gesto de formar
com eles um corpus documental, por mais seriado que possa ser (cada um dos nossos
documentos de inventário cartoriais, o sabemos, é um caso particular de manuseio, leitura,
anotações). Essa intervenção não quer dar conta dessa experiência, não quer necessariamente
propor um novo método. Mas é que, talvez, para compreender atualmente o que na
historiografia remete a história ao universal seja preciso retornar à questão do tempo e do
devir, e não propriamente continuar utilizando imagens como a da separação (dialética,
mecânica, funcional, etc.) entre teoria e prática, conceito e realidade. Acredito que as
inquietações expressas por Nietzsche e Benjamin podem ser juntadas aqui num esforço de
reconsideração sobre o tempo, a história e a mutação (ou o imobilismo). O que quer que a
história tenha de universal, parafraseando Nietzsche, só pode advir de seu serviço à vida.1
Mas o que, na historiografia, serve à vida?

I- O "Trágico"

O Nascimento da Tragédia é um texto que se dirige à história da arte. Benjamin não


gostava dele, tinha críticas à abordagem de Nietzsche por ter abandonado a questão moral aos
retores e se restringido ao campo da estética ao descrever o movimento apolíneo e dionisíaco

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(...) precisamos dela [da História] para a vida e para a ação (...). Somente na medida em que a história serve à
vida queremos servi-la (...)" (Nietzsche, CEII, p. 5).
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no teatro trágico dos gregos (1984: 127-8) A crítica de Benjamin procede e nos apraz: de fato,
característica perigosa do romantismo alemão é esta que aposta todas as suas fichas no
temperamento de um além-homem. Somos historiadores, conhecemos o que se passou com
Nietzsche e outros autores alemães quando suas sentenças foram interpretadas e encapsuladas
no contexto do nacional-socialismo. Mas se seguirmos de perto o problema em si e não tanto
as imagens com que costumam se confundir — homens mais-que-humanos, iluminações
psicossubjetivas, ética e temperamento individuais — perceberemos que Nietzsche não falava
sobre tais indivíduos. Tanto quanto Benjamin também não falava para indivíduos-membros
de uma classe revolucionária embora esteja claramente imerso na tempestade da revolução.
Ambos, por diferentes meios e interesses, convergem na atenção e cuidado com a aposta da
subjetividade no movimento do devir: onde a ação se lança e se perde, destrói e constrói
refazendo combinações, imitações, vida (material).
Segundo Jean-Pierre Vernant, é próprio ao teatro trágico dos gregos o olhar sobre o
instante de decisão. Quando o herói se pergunta: "que fazer?", lançado no destino, não se
conecta a uma cadeia da qual possa se intitular autor ou origem das ações, e portanto causa de
certos efeitos. A pergunta lança o herói numa trama, numa saga que o ultrapassa e que implica
sua linhagem e a relação com os deuses. A saga é conhecida por todos, é contada e recontada
pelos mitos e não há inventividade singular na ação do herói. A pergunta é dramática,
contudo: "que fazer?" Trata-se ao mesmo tempo da única pergunta que pode ser feita pelo
agente ou praticante, a única que lhe pertence como sujeito e que o imerge imediatamente
nesse rio em que não podemos nos banhar duas vezes. E ao mesmo tempo, ela o extrapola, é
feita a uma comunidade atuando em cena como coro e presente no teatro, os observadores do
espetáculo. O instante em que se pergunta é também aquele em que o protagonista arrisca a
sua própria condução; dá-se a reviravolta. Destruição de uma cadeia, recondução trágica ao
destino, dionisíaco e apolíneo.
Claro, estou a fazer aqui uma redução medonha. Em O Nascimento da Tragédia,
Nietzsche guia nossa atenção à própria experiência do trágico como terror e piedade através
dos movimentos apolíneo e dionisíaco do espetáculo e da música, movimento estético,
portanto, que não nos interessa muito aqui segundo tal ponto de vista. Em termos
arquetípicos, apolínea é a doação da forma e dionisíaca é a destruição fática, a dança dos
dados. Apolíneo e dionisíaco caminham juntos, em synoikia. Não se trata de dialética, não se
trata sequer de uma dinâmica reconhecível a um relojoeiro qualquer, mas de um par de
potências que só podem presidir juntas o devir, daí o termo: synoikia, coabitação: Apolo e
Dioniso coabitam, fora do tempo.
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As imagens de Benjamin são diferentes. Porque ele não se conduz pela potência do
espetáculo propriamente, mas pela potência histórica do trágico. Com efeito, não me ocorre
que Nietzsche tenha em algum momento retomado o apolíneo e o dionisíaco numa reflexão
sobre devir e história. "Trágico" permaneceu uma qualidade do destino, sentida como amor
fati e avaliada no ponto de encontro entre vida e obra do homem: ecce homo, para todos e
para ninguém. Isto não é uma crítica, mas, antes, chamo a atenção para a diversidade dos
pontos de vista. Benjamin lamenta o fato de Nietzsche atrelar ao fenômeno da arte o apolíneo
e o dionisíaco, quando se trata do movimento da vida e daquilo que, nela, aflora como
subjetividade histórica num instante de perigo. O interesse aqui não aponta na direção do ser-
aí do homem diante do qual se abre o instante decisivo. Em Benjamin, há um ser-aí, mas eu
arriscaria dizer que a pré-sença está mais para um ser-com, um viver-com do que para um
próprio. Arrisco, mas não muito, já que Agamben trata desse assunto à exaustão em seus
textos (O Aberto, A Comunidade que Vem, Profanações, O Rosto, etc) que eu ainda não li à
exaustão.

Em A Origem do Drama Barroco Alemão, Benjamin afirma:

A poesia trágica se baseia na ideia do sacrifício. Mas o sacrifício trágico difere em seu
objeto — o herói — de qualquer outro, e é ao mesmo tempo um sacrifício inaugural e
terminal. Terminal, porque é uma expiação devida aos deuses, guardiães de um antigo
direito; inaugural, porque é uma ação que anuncia novos conteúdos da vida popular, e em
nome dela é praticada. Esses conteúdos, que ao contrário das velhas obrigações não
emanam de um decreto superior, mas da própria vida do herói, o destroem, porque são
desproporcionais à vontade do indivíduo, e só convêm a uma comunidade popular ainda
virtual. A morte trágica tem um sentido duplo: anular o velho direito dos deuses olímpicos,
e sacrificar o herói, precursor de uma humanidade futura, ao desconhecido p. 129.

A passagem é clara para mim e traz algumas nuances à forma como Vernant vê o
questionamento da tragédia enraizado na problemática da decisão livre. Está em questão não
propriamente a história contada do destino individual de uma personagem exemplar mas a
maneira como uma comunidade virtual representa, na figura do herói entre dois mundos, a sua
própria presença e o seu advento. Isto não como um programa consciente de indivíduos ou
grupos, mas na materialidade da vida: é uma realidade histórica que está em questão e não
propriamente uma reflexão ou representação sobre as experiências compartilhadas atenienses.
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O herói padece de história, tanto em seu desconhecimento dela quanto em sua imersão no
devir-comunidade bem real e singular; e contudo, não se fala aqui do hiato entre real e
representação, pois a comunidade que vem, essa comunidade popular ainda virtual, não é em
nenhum momento a totalização conceptual de um empírico vivido como tal. A comunidade
que vem inscreve-se num devir que ultrapassa as conjunturas, ela é aspiração social, no bom
sentido que Aristóteles dá ao telos do vivente político: uma comunidade em construção que
envolve em sua elaboração a partir da convergência e da igualdade dos cidadãos uma
aspiração, um porvir que não se corporifica em lugar nenhum. É um elã, uma linha, um fio
condutor extenso o bastante para desenrolar-se ainda. Nesse sentido, o herói padece em nome
da obediência poética (trágica) ao destino comunitário do homem. E, mais uma vez, isto não
está na consciência das pessoas, não é o tema das conversações e das obras. O materialismo
histórico, Benjamin afirma na primeira tese, é o autômato que ganha todas as partidas contra
os jogadores humanos na máquina de xadrez. Mas o condutor oculto do autômato é um anão
escondido sob a mesa, um anão chamado "teologia". A tragédia compõe-se inteira para ser o
recontar de uma saga e não dispõe um homem qualquer na encruzilhada de uma decisão. Ela é
o primeiro passo dado no interior de uma tradição cultural para a emergência do sujeito em
comunidade, também no interior de uma tradição cultural, entendido aqui não à maneira de
um senhor soberano do cogito (tal como se firmou depois disso, nos séculos XVII-XVIII,
premissa racional da responsabilidade civil) mas como agente responsável pelo destino
histórico da comunidade.

p. 132. O decisivo confronto dos gregos com a ordem demoníaca do mundo imprime
também na poesia trágica a sua assinatura histórico-filosófica. O trágico se relaciona com o
demoníaco como o paradoxo com a ambiguidade

Ethos anthropô(i) daimon, é o fragmento 119 de Heráclito. O caráter é daimon para o


homem, a maioria dos tradutores aceita "o caráter é o destino do homem". Eu prefiro manter
aqui a palavra daimon, ou mais comumente demônio, uma potência de origem divina que
imprime conduta ao destino. O trágico, segundo Benjamin, focaliza essa condução
demoníaca resguardando-a como tal o que significa dizer que o caráter, na Tragédia, não
constitui psicologicamente um homem mas perfaz a sua trajetória longe ainda de qualquer
psicologia. O que dá unidade e identidade a ação, aquele que seria seu autor, não está
preparado para assumir em essência a culpa pelos seus atos elevados ou baixos, bons ou ruins;
ele não sabe o que é isso, nem poderia saber porque o ethos não o estrutura. Como morada do
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daimon para o homem — "morada" é outra acepção arcaica do termo ethos — ele flui
ambíguo entre a evidente ligação do ato ao agente e a também evidente conexão entre todos
os atos humanos e o destino e necessidade inumanos, aquilo que toca os deuses. Ora, a justiça
movida pela comunidade exige saber quem é o autor (do crime, da falta com relação à vida
comum)2; a ordem divina do mundo reconhece como autores apenas os próprios deuses, e os
homens não dominam nem o tempo, nem a saga, nem os desdobramentos de seus atos. Eis o
paradoxo em que se coloca a tragédia; e eis a ambiguidade em que o demoníaco envolve a
ação.

pp. 132-133 - (...) na tragédia o homem pagão percebe que é melhor que os deuses e, ao
percebê-lo, perde o uso da palavra, condenando ao silêncio esse conhecimento. Esse saber
procura, em segredo, reunir suas forças... Não se trata de restaurar a ordem moral do
mundo, e sim de uma tentativa por parte do homem moral, ainda mudo, ainda imaturo —
por isso ele se chama herói — de se reerguer entre as convulsões de um mundo torturado.

Faltava ao Nascimento da Tragédia essa incidência sobre a implicação do ethos no


destino. Que o apolíneo e o dionisíaco sejam inerentes à força vital ou à vontade de potência,
ok, mas ao mesmo tempo não se trata de uma dinâmica "natural" como a alternância entre
aurora e ocaso, o movimento das marés ou o tempo das colheitas da uva. Apolo e Dioniso são
o reflexo do daimon que habita a superfície lisa do tempo e do mundo humanos, a força
plástica daquele que agarra o acaso com quinhentas mãos. Ora, quem é aquele que quer?
Quem é aquele que age? Nem natureza objetiva, nem mente subjetiva, um herói cai. Ninguém
quer; ninguém age enquanto não se apoderar do próprio destino. Ninguém quer, ninguém age
enquanto não souber como enredar o aqui e o agora em que se movimenta, em particular, ao
instante mundano da reviravolta em que se revela a conjunção de acaso e necessidade. Note-
se: não falo aqui de uma sabedoria a adquirir ou adquirida. Falo de um cuidado e de uma
atenção (ou tensão) que a tragédia grega expressa pelo gosto (divino) de estragar-lhe as
expectativas. A saga do herói na tragédia é uma história, sim, contada a partir do meio e
seguindo em direção à catástrofe anunciada, pois no princípio estava a desmedida de se
perceber melhor que os deuses. Mas a lição não é a do comedimento, por mais que algumas
tragédias anunciem exortações morais em seus últimos versos. A lição da saga para a
posteridade é a da queda do ethos na autoria coletiva do mundo. O teatro trágico toma outros
rumos, e a história — eis a revelação de Benjamin no Drama Barroco — a história universal

2
- Ver a análise de Foucault para Édipo Rei em A Verdade e as Formas Jurídicas.
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ou a história do homem reinventa a saga na relojoaria do estado moderno.3 Falemos, então, da


história do homem, ou seja, da história da produção d'um mundo espaço-temporal de objetos
e relações pelos sujeitos com seus objetos e em suas relações.

2. História e subjetividade

O relojoeiro do estado desconhece o devir trágico; ele presta atenção a processos ou a


uma progressão de processos que se acoplam para modificar a paisagem humana da
civilização, na cadência da passagem linear do tempo. Sua imagem do tempo reflete seu
interesse pela vida biológica, homem e natureza: processos de germinação, maturação e
declínio. Toda a nossa vida, da infância a idade final, é assim edificada. Vemos como dado
natural o tempo que passa transformando as pessoas e as coisas no espaço. As reviravoltas do
trágico pertencem às pulsões do inconsciente e na superfície da face do homem comum se
refletem os fatos memoráveis da construção e transformação das instituições — o estado, a
aldeia, o gênero, a burguesia, etc; uma ampulheta plácida substituiu a correnteza do rio para
domesticar o destino, regular o processo, encadear as causas e efeitos em trilhos que departem
da estação da revolução (industrial, francesa, popular chinesa, cubana, etc). Totalmente
avessos à experiência estética ou ao ponto de vista singular, como construtores de ferrovias
por vezes surrealistas, estabelecemos a aliança com o "global": na vida de cada um ressoa
(bem ou mal) a vida social.
Parece inexorável, mas quando se tem em vista uma historiografia ainda a ser escrita
de grupos subalternos, histórias mudas de gente vencida e outros abandonos, mesmo que se
continue dentro desse modelo cronológico dos processos sociais abre-se uma brecha, pois a
única maneira de contra-ecoar a marcha universal da história é apoderar-se da lembrança,
reivindicá-la desfazendo a trama e desconstituindo os edifícios.4 Conversando com o

3
- "A imagem do movimento dos ponteiros, como demonstrou Bergson, é indispensável para a representação do
tempo recorrente e não qualitativo da ciência matemática. É nesse tempo que estão inscritos não só a vida
orgânica dos homens, como as manobras do cortesão e as ações do Príncipe, que segundo o modelo de um
Deus que governa, intervindo em ocasiões específicas, interfere de forma imediata nos negócios do Estado, a
fim de ordenar os dados do processo histórico numa sequência regular, harmônica, e por assim dizer
espacialmente mensurável." (Benjamin, DB, p. 119).
4
- Articular historicamente o passado não significa conhecê-lo "como ele de fato foi". Significa apropriar-se de
uma reminiscência, tal como ela relampeja num instante de perigo. Cabe ao materialismo histórico fixar uma
imagem do passado, como ela se apresenta, no momento do perigo, ao sujeito histórico, sem que ele tenha
consciência disso. O perigo ameaça tanto a existência da tradição como os que a recebem. Para ambos, o
perigo é o mesmo: entregar-se às classes dominantes, como seu instrumento. Em cada época, é preciso arrancar
a tradição ao conformismo, que quer apoderar-se dela. Pois o Messias não vem apenas como salvador; ele vem
9

historicismo, imerso na perspectiva revolucionária do socialismo, é no tabuleiro dessa história


que Benjamin vislumbra o titeteiro do autômato turco. E porque reencontrou o daimon na
teologia, busca desvelar aos outros a presença contínua, es aeí (e "para sempre", poderíamos
dizer a-histórica) da determinação da redenção no juízo final, que é, sim, um porvir mas um
porvir presente, sempre presente no lampejo do passado num instante de perigo: kairós. O
sujeito racional e responsável deve conhecer a história. O sujeito revolucionário deve rompê-
la em nome de uma lembrança que lhe pertença.

Existe um quadro de Klee intitulado: Angelus Novus". Nele está representado um anjo, que
parece estar a ponto de afastar-se de algo em que crava o seu olhar. Seus olhos estão
arregalados, sua boca está aberta e suas asas estão estiradas. O anjo da história tem de
parecer assim. Ele tem seu rosto voltado para o passado. Onde uma cadeia de eventos
aparece diante de nós, ele enxerga uma única catástrofe, que sem cessar amontoa
escombros sobre escombros e os arremessa a seus pés. Ele bem que gostaria de demorar-
se, de despertar os mortos e juntar os destroços. Mas do paraíso sopra uma tempestade
que se emaranhou em suas asas e é tão forte que o anjo não pode mais fechá-las. Essa
tempestade o impele irresistivelmente para o futuro, para o qual dá as costas, enquanto o
amontoado de escombros diante dele cresce até o céu. O que nos chamamos de progresso é
essa tempestade. (Tese IX)

também como o vencedor do Anticristo. O dom de despertar no passado as centelhas da esperança é privilégio
exclusivo do historiador convencido de que também os mortos não estarão em segurança se o inimigo vencer. E
esse inimigo não tem cessado de vencer. (Benjamin, TH VI)
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Na tese IX de Benjamin, o progresso é a tempestade contínua que deixa todo o


passado em escombros. E o anjo da história é impelido, os escombros se revelam a ele
enquanto violentamente segue em frente. Eis uma imagem do devir extremamente aguçada, já
que se o movimento remete ao tempo que passa progressivamente, o anjo, como figura divina
ligada ao apocalipse, remete à eternidade a-histórica do Juízo Final. Mas este olhar... o terror
e a piedade do olhar decidido a ver em escombros, este é um olhar para o kairós, para a
abertura, a compreensão e a determinação de um outro. Pois o anjo não é um agente. Se
formos retornar à problemática da tragédia, o anjo não é o herói; ele é impelido pela música e
pela dança a evoluir como um coro; é espectador atemporal das ruínas dos tempos dos
homens. Mas tanto o herói como o coro-espectador estão presentes no teatro; e se ambos
deparam com os escombros, somente o herói de uma comunidade vindoura pode retomar a
construção de uma vida. Édipo em Colono, esse homem sacro.
E o que fizemos do herói? Fizemos dele um homem que anda já inteiramente formado
em uma estrada que constrói à medida que anda. Fizemos dele o lugar comum da liberdade,
da racionalidade e do saber. Fizemos dele nosso objeto, vale dizer, o objeto da história
universal tanto naquilo que constrói como naquilo que pensa, seja como sujeito, seja como
exemplar representativo do contexto de uma coletividade determinada. A história é uma
ciência do homem, e por isso mesmo não escapa dele nem quando busca tendências,
estatísticas e padrões não subjetivos ou anônimos. Por ser uma ciência do homem em
primeiro lugar é que postula como seu o objetivo de estudar a sociedade. Ora, todas essas
sentenças são complicadas, já sabemos disso, por exemplo, quando afirmamos que o homem
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universal é, com efeito, nada mais que o exemplo hegemônico de um homem em particular:
masculino, europeu, branco, cristão e de classe média... Mas é a isto mesmo que devemos
estar atentos, quer dizer, devemos substituir em nossos textos o homem com H maiúsculo
pelo homem europeu ou pela mulher negra ou pelos camponeses russos? Bem, é certamente
muito urgente reconfigurar a linha férrea da história universal pluralizando os objetos. Ou,
como parece pensar Benjamin quando tem em vista a pragmática de seu questionamento, é
urgente construir outros trilhos que conduzam o comboio não da burguesia mas da classe
operária. E depois? Quando os trilhos forem refeitos e múltiplas ferrovias disputarem a gare
central, não teremos multiplicado o problema do universal e do particular, do ideal e do real,
do indivíduo e da sociedade ao invés de reposicionar politicamente a História? Há algo mais
nas teses de Benjamin do que pragmatismo político, ou melhor, há algo mais político do que o
pragmatismo, há algo mais político na teologia do que no materialismo histórico.
A espera escatológica é sempre vã, o que não quer dizer que ela não esteja no fundo
do olhar daquele que se abriga da passagem do tempo na narrativa de sua saga: na lembrança,
na memória de seus feitos. Se o anjo da história revolve a tempestade com suas asas para a
passagem de um outro, este outro é o sujeito que devem, a subjetividade que irrompe na
história. Mas como passar do objeto homem tal e qual particular ao sujeito que devem?
Tanto quanto Nietzsche e Benjamin, não vamos compreender aqui nem sujeito nem
subjetividade como atributos de um indivíduo: consciência, linguagem, auto-representação,
nada disso corresponde ao problema do ethos que se impôs desde o começo desse texto que
vem indagando sobre tragédia e história.
O ethos é daimon para o homem. Para o homem, a força vital que o conduz chama-se
ethos: caráter, morada, hábito. A partir desse ponto, ao invocar a palavra subjetividade, não
me referirei a nenhum indivíduo em particular, mas a um modelo de conduta, isto é, um fio
condutor que não é a essência subjacente ao indivíduo mas, ao contrário, reivindica
adjacências a cada um, em acordo com o todo. A preocupação com esta ética aparece como
um ponto central nas teses de Benjamin como nas considerações intempestivas de Nietzsche,
por motivos diferentes. Mas o fato do tema ser o mesmo, a preocupação com uma conduta
que destitui o indivíduo e restitui uma espécie de sintonia no que tange ao tempo histórico —
o "tempo do agora"5 — eis o que precisamos compreender ainda.
O texto da segunda consideração intempestiva é extenso. Em geral, guardamos dele o
estabelecimento de três paradigmas positivos e negativos da historiografia antiquaria,

5
Vide tese XIV: (...) a história é objeto de uma construção, cujo lugar não é formado pelo tempo homogêneo e
vazio, mas por aquele saturado pelo tempo-de-agora (...) (Jetzteit). Tb XV, XVI.
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monumental e crítica, do que não me ocuparei aqui. Considerando que o traço positivo em
seus exemplos é a história colocada à serviço da vida (e não do conhecimento neutro e frio do
passado), parece que a meta das considerações intempestivas é restituir à a vida e à cultura
viva o devir-sujeito, quer dizer, a subjetividade como potência, ética e temperamento. Assim
interpreto muitas das passagens de "Da Utilidade e da Inutilidade da História para a Vida",
como por exemplo:

subjetividade / potência:

p. 13. Este é o estado mais injusto do mundo, estreito, ingrato frente ao que passou, cego
para os perigos, surdo em relação às advertências, um pequeno e vivo redemoinho em um
mar morto de noite e esquecimento: e contudo esse estado — a-histórico, contra-histórico
de ponta a ponta — é o ventre não apenas de um feito injusto, mas muito mais de todo e
qualquer feito reto; e nenhum artista alcançará a sua pintura, nenhum general a suas vitória,
nenhum povo a sua liberdade, sem ter antes desejado e almejado vivenciar cada uma delas
em meio a um tal estado.

subjetividade / ética:

p. 56 - "somente a partir da suprema força do presente tendes o direito de interpretar o


passado: somente na mais intensa tensão de vossas qualidades mais nobres desvendareis o
que há no passado digno de ser conhecido e conservado

subjetividade / temperamento:

"(...) nós somos sem cultura, mais ainda, estamos estragados para a vida, para o ver e o
ouvir corretos e simples, para a apreensão feliz do que há de mais próximo e natural, e não
temos até agora nem mesmo o fundamento de uma cultura, porque não estamos
convencidos de termos uma vida verdadeira em nós. Esfacelado e despedaçado,
decomposto no todo em um dentro e um fora, de maneira semimecânica, coberto com
conceitos como com dentes de dragão, produzindo dragões conceituais, sofrendo, além
disso, de uma doença das palavras sem confiança em qualquer sensação própria que ainda
não esteja selada com palavras, como uma tal fábrica de conceitos e palavras sem vida e,
entretanto, estranhamente ativa, talvez ainda tenha o direito de dizer de mim cogito, ergo
sum, mas não vivo, ergo cogito. O "ser" vazio, não a "vida" plena e verdejante me é
garantida; minha sensação originária assegura-me apenas que sou um ser pensante, não de
que sou um vivente, de que eu não sou nenhum animal, mas no máximo um ser cogitante."
(p. 94)
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Intensa e belíssima a tentativa de devolver a subjetividade ao devir, não ao fluxo do


tempo simplesmente mas à unidade do a-histórico, do supra-histórico e do histórico. A-
histórico é o sem história, o fora da história, o que significa aqui fora do fluxo do tempo, o
esquecido.6 O supra-histórico constitui uma sobredeterminação, a irrupção da obra que rasga
o fluxo do tempo, o agarra e o transmuta com alegria fática vindo "do fundo dos tempos".
Eterno retorno, acaso e fluxo conduzem o pensamento para a vida, reconectando a vida
particular ao vivente e dando a prerrogativa ao vivente em detrimento do cogitante. Ao fim e
ao cabo, o cogitante aparece como um serzinho irritantemente particular, como dizia Nelson
Rodrigues, um "idiota da objetividade" — e lembremos aqui a origem da palavra idiota. Antes
de ser chula e provocar ofensas, o idiota era, de fato, a palavra grega para dizer
aproximadamente "indivíduo", isto é, "aquele que desdobra sua propriedade sobre o que é seu
somente". O "cada um", que Aristóteles contrasta ao "todo" quando discute a particularidade
da história e a universalidade da poesia.
A chave é, então, restituir poesia à história?

"Se o valor de um drama residisse apenas no pensamento conclusivo e central, então o


próprio drama seguiria um caminho mais extenso possível, indireto e fatigante até a meta; e
assim espero que a significação da história não seja reconhecida nos pensamentos
universais, como em uma espécie de flor e fruto: mas que seu valor seja circunscrever
espirituosamente e elevar um tema conhecido, talvez habitual, uma melodia do cotidiano,
alçá-lo a símbolo abrangente e assim deixar pressentir no tema original todo um mundo de
profundidade, poder e beleza.
Para tanto, porém, é requerida antes de tudo uma grande potência artística, um pairar
criativamente acima de tudo, uma imersão amorosa nos dados empíricos [grifo meu],
imaginar além do tipo dado — aliás, tudo isto diz respeito à objetividade, mas somente
como qualidade positiva." (p. 55)

Sim, mas é só uma parte do problema que proponho aqui. A parte que diz respeito a
uma sintonia entre a melodia do cotidiano e o símbolo abrangente, ou o eidos: a ideia, o
modelo. Mais uma vez, voltarei a isso. Ainda há a segunda parte, e a parte central. Com

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- Com a palavra "a-histórico" denomino a arte e a força de poder esquecer e de se inserir em um horizonte
limitado; com a palavra "supra-histórico" denomino os poderes que desviam o olhar do vir a ser e o dirigem ao
que dá à existência o caráter do eterno e do estável em sua significação, para a arte e a religião. A ciência (...)
vê nessa força, nesses poderes, forças e poderes contrários; pois ela só toma por verdadeira e correta, ou seja,
por científica, a consideração das coisas que vê por toda parte algo que veio a ser, algo histórico, e nunca vê
um ente, algo eterno (...) (Nietzsche, CEII, p. 95).
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Nietzsche, podemos remeter história à poesia. Mas ainda não podemos implicar a
subjetividade, a não ser passivamente, a se engajar no movimento da vida como vivente. A
questão aqui ainda é o "trágico", ou história e tragédia, vale dizer, a atividade do herói. O
herói trágico, segundo Aristóteles, é um praticante e o ethos o define apenas secundariamente
na trama de uma (boa) tragédia. Ora, ethos não é o vivente, o homem como estirpe nem este
ou aquele homem em particular e assim a mimese na tragédia não deve tentar imitar
caracteres. Ethos é um exemplo, uma ideia, uma morada e um destino fora do homem, mas
com o qual ele entra em sintonia como se tomasse um caminho. Então, fazer com que a
história sirva à vida não é uma tarefa que se esgote na potência artística de um criador, pois
esta potência artística fala sobre a forma mas não sobre a própria tomada decisiva de um
caminho. A imersão amorosa nos dados empíricos diz muito sobre o temperamento daquele
que se dispõe em sintonia com o seu tempo extemporaneamente, mas precisamos ainda
conduzir o amor, a criatividade e a arte para mais longe ainda e o mais longe possível de um
autor que possa, não por Nietzsche mas por certas apropriações infelizes apesar de possíveis
como todos nós sabemos, compreender-se ainda como um indivíduo que tem nas mãos o
destino de um povo eleito. Por isso a forma como Benjamin retoma a teologia me parece
imprescindível. A teologia foge efetivamente desse mundo cronológico, e por esse motivo a
redenção não pode, nem que se queira assim, nem que se busque muito no âmago do
inconsciente de cada indivíduo civilizado, encontrar um só autor. Numa teologia sem deus, o
ethos é, com propriedade, o destino, quer dizer, o demônio para o homem. Ele destrói a
autoria e refaz a potência, pois nenhum homem em particular pode dominar nem seu destino
nem seu demônio.

Na tese IV, Benjamin afirma:

"a luta de classes que um historiador escolado em Marx tem sempre diante dos olhos é uma
luta pelas coisas brutas e materiais sem as quais não há coisas finas e espirituais. Apesar
disso, estas últimas estão presentes na luta de classes de outra maneira que a da
representação de uma presa que toca ao vencedor. Elas estão vivas nessa luta como
confiança, como coragem, como humor, como astúcia, como tenacidade, e elas retroagem
ao fundo longínquo do tempo [grifo meu]. Elas porão incessantemente em questão cada
vitória que couber aos dominantes. Como flores que voltam suas corolas para o sol, assim o
que foi aspira, por um secreto heliotropismo, a voltar-se para o sol que está a se levantar no
céu da história. Essa mudança, a mais imperceptível de todas, o materialista histórico tem
que saber discernir".
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O materialista histórico não é o reflexo idealizado deste ou daquele indivíduo em


primeiro lugar. Trata-se de um modelo e, como modelo não a imitar mas ao qual sincronizar-
se, ele sobrevoa o tempo histórico e é seguido nesse sobrevôo por aquele que almeja uma
lembrança, uma decisiva lembrança para constituir com ela o instante do movimento
revolucionário. Confiança, coragem, humor, astúcia, tenacidade são virtudes, essas coisas
finas e espirituais sem as quais não existe luta pelas coisas brutas e materiais. Nenhuma
dessas virtudes pertence a um só indivíduo como lhe pertenceria seu nome. Elas são
disposições para a comunidade, à serviço da comunidade vindoura, justa, boa, absolutamente
escatológica; essas virtudes cintilam e se apoderam do homem histórico vindas do fundo dos
tempos. Certamente, a luta de classes irrompe como luta pela apropriação da produção social,
incluindo aí a luta pela reapropriação de si, de sua vida, seu corpo, seu trabalho, mas o mais
importante é que se luta em linha com o ethos; não com as forças biológicas de reprodução
natural da vida. Pensar a subjetividade na história é, portanto, dar lugar a irrupção de
agenciamentos outros, de formas outras de constituir sociedade, luta, memória, não porque
este ou aquele sujeito (individuo, grupo) assumem um determinado papel no processo, mas
antes de tudo porque todos estão virtualmente implicados na urdidura ou no drama da vida
comum. Acompanhar um grupo de operários em greve, uma confraria de mulheres religiosas,
ouvir / fazer falar os presos em uma penitenciária e fazer explodir com isso o tempo de agora,
reconciliando-o com o destino, refazer esse tempo com lembranças tão urgentes quanto
intempestivas, tão incendiárias quanto plácidas, eis aqui um secreto heliotropismo, uma visão
do bem.

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