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Rev. bras. alerg. imunopatol.


Copyright © 2009 by ASBAI

ARTIGO DE REVISÃO

Células T regulatórias: mecanismos de ação


e função nas doenças humanas

T regulatory cell: mechanism of action and function


in human diseases

Karina Mescouto Melo1, Beatriz Tavares Costa Carvalho2

Resumo Abstract
Objetivo: Revisar as principais características das células T Objective: To review the main characteristics of regulatory
regulatórias (Tregs) e os estudos de suas funções nas doenças T cells (Tregs) and the studies of their function in human dise-
humanas. As Tregs são componentes da tolerância imunológi- ases. Treg cells are members of immune tolerance, and are es-
ca, e são moduladores essenciais na resposta imune à patóge- sential modulators of immune response, including down-modu-
nos, alérgenos, células cancerígenas e antígenos próprios. lation of immune response to pathogens, allergens, cancer
Método: Levantamento bibliográfico nos bancos de dados cells and self-antigens.
PubMed, Medline, LILACS, SCIELO e capítulos de livros, nos Methods: Searches in MEDLINE, LILACS, SCIELO database
últimos 10 anos. and book chapters, in the last 10 years.
Resultados: Neste trabalho são descritas as principais ca- Results: This review describes the role of Tregs on immune
racterísticas fenotípicas e funcionais das Tregs, as três hipóte- regulation, the three current hypotheses of Tregs’ action me-
ses de mecanismos de ação das Tregs sobre as células T efeto- chanisms on effector T cells, and some studies of Tregs in hu-
ras e estudos de Tregs em diversas doenças humanas. man diseases.
Conclusão: A identificação dos genes relacionados ao Conclusion: The identification of genes related to FOXP3
FOXP3 e o esclarecimento dos mecanismos de ação das Tregs, and a better comprehension of Tregs’ action mechanism, could
poderão melhorar a terapêutica nas doenças com desregulação improve the therapy in diseases with immune dysregulation.
imune.
Rev. bras. alerg. imunopatol. 2009; 32(5):184-188 Imuno- Rev. bras. alerg. imunopatol. 2009; 32(5):184-188 Primary
deficiência primária, células T regulatórias, FOXP3, CD25, immunodeficiency, Regulatory T cell, FOXP3, CD25, CD127,
CD127, tolerância imunológica, IPEX. immune tolerance, IPEX.

1- Pós-graduanda do Departamento de Pediatria – UNIFESP/EPM las co-estimulatórias, tornando assim as células T incapa-
2- Professora Adjunta Disciplina Alergia, Imunologia e Reumatolo- zes de responder aos Ag; ou b) quando as células T ex-
gia- UNIFESP/EPM pressam receptores inibidores. Na deleção clonal ocorre a
estimulação repetida das células T por Ag, resultando na
Artigo submetido em 16.09.2009, aceito em 21.12.2009.
morte celular por apoptose1. O mecanismo de supressão é
exercido pelas Tregs.
Introdução
As células T regulatórias (Tregs) são componentes im- Células T regulatórias
portantes da tolerância imunológica. A tolerância imunoló- As Tregs representam uma subpopulação de linfócitos T
gica é definida como a não-resposta a um determinado caracterizados pela expressão da molécula CD25+ e do fa-
antígeno (Ag), induzida pela exposição prévia a este, e po- tor nuclear FOXP3. Induzem a supressão das células T efe-
de ser central ou periférica1. toras, bloqueando a ativação e a função destes linfócitos,
Tolerância central: É induzida nos órgãos linfóides pri- sendo assim importantes no controle da resposta imunoló-
mários, em conseqüência ao reconhecimento dos antígenos gica a Ag próprios e não-próprios3, 4.
próprios pelos linfócitos T imaturos. Atualmente são descritas pelo menos dois tipos de
Tolerância periférica: As células T maduras reconhe- Tregs: naturais e adaptativas5. As chamadas Tregs naturais
cem especificamente os Ag próprios presentes nos tecidos expressam constitutivamente o receptor de cadeia α da IL-
periféricos, tornando-se assim incapazes de responder a -2 (CD25), sendo assim denominadas CD4+CD25+ 6. São
estes1. A tolerância periférica tem importância fundamental produzidas naturalmente nos corpúsculos de Hassal no ti-
na resposta a Ag estranhos e no desenvolvimento de doen- mo como uma subpopulação de células T funcionalmente
ças auto-imunes2. distintas e maduras, e representam 5 a 10% das células T
- Mecanismos de tolerância periférica: CD4+ periféricas7.
Foram descritos nas células T CD4+ e ocorrem através A sinalização para o desenvolvimento das Tregs naturais
de anergia, deleção clonal e supressão das células T. A a- que ocorre durante a timopoiese normal ainda é desconhe-
nergia pode ser induzida durante o processo de reconheci- cida, porém, acredita-se que estas células possam ser ge-
mento do Ag pelas células T quando: a) as células apre- radas mediante reconhecimento de Ag próprios no timo,
sentadoras de antígenos (APCs) não expressam as molécu- através de receptores (TCR) de alta afinidade1,8.

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Células T regulatórias Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 32, Nº 5, 2009 185

A interleucina 2 (IL-2) parece ter papel importante no Fator de transcrição FOXP3


desenvolvimento das Tregs. Experimentos com murinos A importância de FOXP3 nas Tregs foi bem estabelecida
demonstraram que a deficiência tanto da citocina quanto a partir do trabalho de Brunkow et al., ao identificar a mu-
do receptor, resultou em defeitos graves de Tregs. O que tação do tipo frameship no gene FOXP317. Esta mutação é
também foi observado em pacientes com deficiência con- responsável pelo fenótipo de camundongos scurfy, uma li-
gênita da molécula CD251,8. nhagem mutante recessiva, ligada ao X que apresenta dis-
Além do marcador CD25 as Tregs naturais também ex- túrbios auto-imunes graves com depleção completa de
pressam outros marcadores de superfície que não são es- Tregs e óbito precoce17.
pecíficos, mas auxiliam na identificação destas células, en- Em humanos a deleção funcional do FOXP3 tem sido ob-
tre os quais estão: CTLA-4 (cytotoxic T-lymphocyte antigen servada nos pacientes com a síndrome IPEX (Immunodefi-
4), GITR (Glucocorticoid-induced tumor necrosis factor ciency, Poliendocrinopathy and enteropathy X-linked syn-
receptor), TNFR-2 (tumor necrosis factor receptor-2) e drome), caracterizada clinicamente por múltiplas doenças
HLA-DR (human leucocyte antigen). Dentre estes marca- autoimunes, incluindo diarreia, eczema, diabetes com des-
dores o CTLA-4, que é expresso constitutivamente nos truição das glândulas endócrinas, insulinite e tireoidite,
linfócitos T CD4+CD25+, é um dos mais estudados e acre- acometendo meninos e culminando com óbito precoce, ao
dita-se que o bloqueio desta molécula possa afetar a fun- redor de 2 anos de idade3, 17, 18.
ção das Tregs9, 10. O gene FOXP3 humano está localizado no braço curto do
Outros receptores de superfície descritos nas Tregs são cromossomo X, consiste de 11 exons e codifica uma proteí-
CD27, Fas, CD62L; e os receptores de quimiocina CCR6, na de 431 aminoácidos, também denominada FOXP3. É ex-
CCR7, CCR8 e CD103, o que permite a migração das Tregs presso predominantemente nas células do timo, baço e
até o local de inflamação5,10. Entretanto, como nenhum linfonodos e particularmente nas células T CD4+CD25+ 6,17.
destes marcadores é exclusivo desta subpopulação celular, A proteína FOXP3 é um fator de transcrição, cuja função
uma vez que refletem também o estado de ativação do lin- é exercida sobre regiões reguladoras específicas dentro do
fócito T10, a descoberta do fator de transcrição FOXP3, cru- DNA, aumentando ou suprimindo a transcrição de genes
cial no desenvolvimento e função das Tregs, permitiu ca- específicos1,17. Acredita-se que o fator FOXP3 exerça fun-
racterizar melhor estas células6. ções efetora e facilitadora sobre os genes de proteínas cha-
Sendo FOXP3 um marcador nuclear, o receptor de IL-7 ves na ativação celular, incluindo a IL-2 e o GM-CSF17.
(CD127), que é regulado negativamente pelo FOXP3, tem As proteínas FOX (forkhead box) são componentes de
sido descrito como um marcador de superfície fidedigno uma família de fatores de transcrição19. Estas proteínas
para selecionar as Tregs dentre a subpopulação de linfóci- têm um domínio ligante de DNA altamente preservado
tos T, além de caracterizar aquelas com maior função su- denominado forkhead/winged-helix, o qual recebeu este
pressora11,12. nome devido à forma de dupla-asa, semelhante a uma
As Tregs denominadas adaptativas, por sua vez são ge- borboleta17,19.
radas na periferia após uma variedade de estímulos antigê- O fator FOXP3 é membro da subfamília P das proteínas
nicos ou em condições ditas tolerogênicas5, 13. Estas células FOX e assim como os demais fatores de transcrição, é
exercem sua função através da liberação de citocinas inibi- composto por três domínios (repressor, central e ligante de
tórias como IL-10 e TGF-β14, 15. Vários tipos de Tregs adap- DNA ou forkhead3,19. (Figura 1). No domínio forkhead fo-
tativas têm sido descritos, incluindo TR1, que produzem IL- ram identificadas a maioria das mutações que afetam o ge-
-10 e cuja função supressiva está bem documentada nas ne FOXP3, denominadas missenses (as que levam a substi-
doenças alérgicas, autoimunes e transplante alogênico5. tuição de um aminoácido por outro); muito embora outros
Outras Tregs adaptativas citadas são: TR3 (produtoras de tipos de mutações (deleções ou substituições) possam
TGF-β), células T CD4-CD8-, natural killer, CD8+ supressora ocorrer e afetar os outros domínios17.
e gama-delta16.

Domínio repressor Forkhead


ZnF Zip

N C

1 50 100 150 200 250 300 350 400 431

Figura 1 - Estrutura da proteína FOXP3, com o domínio repressor, central composto por dedos de zinco (ZnF) e zíper
de leucina (Zip), e o domínio forkhead . A régua representa o número de aminoácidos (AA) de 1 a 431. (Adaptado de
Torgerson, Ochs, 2007).

O domínio repressor suprime a transcrição gênica me- A sinalização nuclear através da FOXP3 nas Tregs não
diada pelo fator nuclear de células T ativadas (NFAT- Nu- está ainda bem definida. De acordo com estudos experi-
clear factor of activated T-cells). O domínio central, que mentais, após a ligação do Ag com o TCR, há uma atenua-
contém um dedo de zinco (ZnF) e um zíper de leucina está ção na sinalização celular em decorrência da interação fí-
envolvido na interação proteína-proteína e o domínio fork- sica dos fatores nucleares NF-κB e NFAT com o fator
head se liga ao DNA17. FOXP3, reprimindo os genes de transcrição das citocinas
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IL-2, IL-4 e IFN-γ. (Figura 2). Uma outra consequência da Mecanismos de ação das Tregs
ligação de NFAT e FOXP3 é o aumento da expressão de
CD25 e CTLA-4. E, finalmente uma terceira hipótese de Os mecanismos utilizados pelas Tregs para exercer a
atuação do FOXP3 seria a ativação de um co-fator com a função supressora ainda não foram esclarecidos. Postula-se
função de liberar sinais inibitórios após a ligação do TCR que existam pelo menos três mecanismos de atuação des-
com o Ag3. tas células Figura 34, 16.

A B C

citosol citosol citosol

núcleo núcleo núcleo

Proteína X

Figura 2 - Regulação da ativação das células T mediada por FOXP3. A) Sinalização nas células T CD4+ efetora. A ligação do receptor de células
T (TCR) e da molécula coestimulatória CD28 leva à ativação das vias de sinalização, resultando na translocação de NFAT (nuclear factor of
activated T cells) e AP1 (activator protein 1), com subseqüente transcrição do gene da IL- 2 (interleucina 2); B) Modelo de regulação direta de
TCR mediada pela sinalização do FOXP3. Neste modelo, o fator FOXP3 bloqueia a sinalização de TCR através da inibição da ativação mediada
pelo NFAT, NF-κB e AP1; C) Modelo de regulação indireta de sinalização do TCR: o fator FOXP3 modula a sinalização de TCR através da
expressão de um fator que pode inibir sinais induzidos pelo TCR. (Adaptado de Campbell e Ziegler, 20073).

a- Contato célula-célula b- Fatores de supressão c- Competição

Treg célula alvo célula alvo Treg célula alvo


Treg

APC
APC APC

Mediadores
CTLA-4/B7 -TGF-β -Receptor de cadeia
Lag3 -IL-10 γ para citocinas
AMPc -IL-35 -CTLA-4/B7
Granzima B -Adenosina

Figura 3 – Modelos de mecanismos de ação das Tregs. (a) Contato célula-célula - Supressão da célula-alvo com liberação de fatores de
supressão incluindo o monofosfato de adenosina cíclica (AMPc), citocinas supressivas como o TGF –β, citólise direta ou sinalização negativa
através da molécula CTLA-4; (b) Fatores de supressão solúveis como citocinas IL-10, TGF-β e IL-35 ou secreção de fatores supressivos pelas
APC como adenosina; (c) Competição – Competição por citocinas que sinalizam através de receptores da cadeia γ comum (IL-2, IL-4 e IL-7).
APC: célula apresentadora de antígeno (Adaptado de Sojka et al., 20084).
Células T regulatórias Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 32, Nº 5, 2009 187

a - Contato célula – célula incluindo leite, níquel e gramíneas13. Por outro lado, em
Este tipo de mecanismo depende do contato da Tregs amostras de sangue de pacientes alérgicos a pólen, a de-
com a célula T CD4+ efetora, requer a participação de mo- pleção de Tregs não afetou a liberação de citocinas pelas
léculas de superfície, tais como TGF-β e CTLA-4; além de células T efetoras de pacientes alérgicos a pólen em com-
moléculas citolíticas (Fas e granzima B). A molécula CTLA- paração aos controles27.
-4 libera sinais inibitórios após a ligação com o receptor de Nos pacientes com asma grave há relato de alteração na
membrana B7-1 (CD80) expresso em células dendríticas e sinalização de quimiocinas relacionadas às Tregs, além de
células T ativadas4. secreção diminuída de IL-10 [5, 28]. Provoost et al., 2009
Um outro mediador importante é o monofosfato de ade- observaram que as Tregs de pacientes com asma intermi-
nosina cíclica (AMPc), que é liberado pelas Tregs após o tente a moderada tinham uma diminuição na expressão da
contato com as células efetoras através das junções comu- proteína FOXP3. Neste estudo os pacientes em uso de cor-
nicantes ou gap junctions. O AMPc em níveis elevados inibe ticóide inalado apresentavam uma tendência à maior ex-
a proliferação e a diferenciação celular, e em linfócitos leva pressão de FOXP3, em comparação aos outros29.
a uma inibição seletiva da expressão de citocinas, incluindo Um aumento no número de Tregs tem sido descrito nos
IL-2 e IFN-γ. Esta inibição pode ocorrer por bloqueio da pacientes com dermatite atópica recebendo baixas doses
proteína cinase A (PCA), do fator nuclear NF-κB, ou através de ciclosporina e nos pacientes alérgicos a leite de vaca e
da ativação de um repressor de transcrição chamado ICER que adquiriram tolerância “naturalmente”, com o a pro-
(inducible cAMP early repressor)4,16. gressão da idade13, 29, 30.
Apesar de não haver um consenso sobre os mecanismos
b - Liberação de citocinas inibitórias de ação das Tregs, acredita-se que estas células possam
Em modelos experimentais in vivo o papel das citocinas ser úteis na compreensão das principais doenças alérgicas,
inibitórias IL-10 e TGF-β1 na regulação da resposta imuno- e também ser utilizada para terapêutica nos pacientes ató-
lógica é complexo e depende do tempo e contexto desta picos.
resposta8 . O TGF-β além da função supressora sobre as
células alvo, exerce a função de modular a expressão de Doenças infecciosas
FOXP3 pelas Tregs, sendo capaz de transformar células T Para o controle das respostas imunológicas a infecção,
periféricas CD4+CD25- em CD4+CD25+, tornando-se alvo diversos mecanismos são acionados e as Tregs participam
importante de estudos relacionados a reação enxerto – ativamente no controle destas respostas. Em estudos sobre
hospedeiro20,21. Enquanto a IL-10, inibe a ativação das indivíduos infectados pelo Helicobacter pylori tem sido de-
APCs e é antagonista do IFN-γ, sendo relacionada às rea- monstrado o aumento na freqüência destas células em es-
ções de controle da inflamação nos tecidos alvo4. tômago e duodeno; e em pacientes com hepatite pelo vírus
B (HBV) e C (HCV) há um aumento de Tregs em sangue
c - Competição por fatores de crescimento periférico13.
Uma outra forma de atuação das Tregs seria a competi- Nos pacientes infectados pelo HIV a progressão da do-
ção por fatores de crescimento, em especial a IL-2, com as ença está diretamente relacionada a um estado de hipera-
células-alvo. O que levaria à apoptose células por privação tivação imune, e nestes casos há uma redução no número
de citocinas. Esta forma de ação seria combinada com ou- e na função das Tregs12, 31.
tros mecanismos de ação.
Câncer
Tregs nas doenças humanas Os trabalhos sobre Tregs nas neoplasias malignas suge-
rem que o aumento na atividade destas células associa-se
O estudo das Tregs nas doenças humanas tem aumen- a uma resposta prejudicada na imunidade anti-tumoral. Há
tado nas últimas 3 décadas5, 13,17. São inúmeros trabalhos co-estimulação deficiente das células T CD4+ sobre as cé-
sobre a possibilidade destas células se tornarem uma op- lulas T CD8+, bem como alteração na citotoxicidade me-
ção terapêutica nas doenças alérgicas, autoimunes, neo- diada por células NK contra os antígenos tumorais1,13. Uma
plásicas e infecciosas, nestas últimas se destacando a in- das formas de inibição das Tregs sobre as células efetoras
fecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) e da imunidade tumoral é a liberação das citocinas IL-10 e
também nos pacientes transplantados13,17, 22, 23. TGF-β. Assim, como estratégia terapêutica para o trata-
mento do câncer, a inibição da função das Tregs pode ter
resultados positivos13.
Doenças Autoimunes
Diversos estudos relatam alterações em número e fun-
ção das Tregs em distúrbios autoimunes5, 24- 26. Na escle- Imunodeficiências Primárias
rose múltipla as Tregs de sangue periférico exibem uma A síndrome IPEX é o protótipo de associação entre IDP e
redução na produção de INF-γ e na capacidade de inibir a desregulação imune. Descrita pela primeira vez em 198232,
proliferação de células T, disfunção esta, também observa- nesta síndrome há desregulação grave do sistema imunoló-
da em diabetes tipo I, na psoríase e na miastenia gravis5. gico, levando a tireoidite, anemia hemolítica autoimune, in-
Interessante, que nos pacientes com artrite reumatóide fecções de repetição e nefropatia32. O diagnóstico definitivo
o número e a função das Tregs podem ser normais, porém é baseado na análise de DNA, mostrando a presença da
com defeito na inibição de citocinas (IFN-γ e TNF- α) deri- mutação no gene FOXP3. Aproximadamente 20 mutações
vadas de células T e monócitos. Assim, o objetivo do tra- foram descritas, e o quadro clínico pode ser mais ou menos
tamento com Tregs nestas doenças visa utilizar mediado- grave dependendo do tipo de mutação. O transplante de
res que aumentem a função supressiva da população exis- medula óssea é o único tratamento curativo para IPEX33.
tente ao invés de simplesmente aumentar o número destas Atualmente acredita-se que alguns fenótipos de IPEX ou
células13. IPEX-like possam se manifestar mais tardiamente, até
mesmo na idade adulta.
Outras imunodeficiências que podem apresentar distúr-
Doenças Alérgicas
bios numéricos e funcionais das Tregs são: ICV, deficiência
Os estudos relacionados às Tregs e atopia têm mostrado
de CD25, APECED ( Autoimmune polyendocrinopathy- can-
resultados controversos. Os resultados de estudos in vitro
didiasis- ectodermal dystrophy ) e síndrome de Wiskottt-
descrevem que a depleção das Tregs de indivíduos normais
Aldrich17,34,35.
pode aumentar a resposta do tipo Th2 a vários alérgenos
188 Rev. bras. alerg. imunopatol. – Vol. 32, Nº 5, 2009 Células T regulatórias

Conclusão 19. Coffer PJ, Burgering BM. Forkhead-box transcription factors


As Tregs são componentes essenciais da tolerância imu- and their role in the immune system. Nat Rev Immunol 2004;
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nológica, influenciando assim a resposta imunológica a di- 20. Pyzik M, Piccirillo CA. TGF-beta1 modulates Foxp3 expression
versos estímulos. Acredita-se que com um melhor esclare- and regulatory activity in distinct CD4+ T cell subsets. J Leu-
cimento do mecanismo de ação destas células, as Tregs koc Biol 2007;82(2):335-46.
possam ser manipuladas a fim de serem utilizadas como 21. Chen W, Jin W, Hardegen N, Lei KJ, Li L, Marinos N, et al.
auxiliar na terapêutica das doenças com desregulação imu- Conversion of peripheral CD4+CD25- naive T cells to CD4+
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