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UNIVERSIDADE DE BRASILIA Instituto de Ciéncias Humanas Departamento de Antropologia Fones: 273-3264 (direto) 274-0022 - ramal 2368 SERIE ANTROPOLOGIA N° 77 1989 © LUGAR DA CULTURA TRADICIONAL NA SOCIEDADE MODERNA José Jorge de Carvalho O LUGAR DA CULTURA TRADICIONAL NA SOCIEDADE MODERNA(*) José Jorge de Carvatho IT. INTRODUGAO Teorizar a velha questao do folclore e€ da cultura po Pular € sem davida um grande desafio para nossa ‘imaginagao con ceitual, pois a maioria dos modelos conhecidos de analise do Problema dos niveis de cultura - a teoria das ideologias, a te orta marxista de classes, a abordagem gramsciana, a frankfurti ana encontram-se, no momento presente, bastante esgotados. A 1ém disso, uma parcela substancial das novas teorias das cién- cias humanas tem sido desenvolvida no confronto com questdes muito distintas, quase antagénicas a que nos ocupa, tais como 2 desconstrugao das nogdes substantivas de identidade, a entra dana cultura pés-moderna, a desestabilizacao do campo simbo1i_ C0, © niilismo face os valores tradicionais, a microfisica do poder. De qualquer. forma, & dustamente essa pluralidade de Posicées, que tao bem caracteriza o momento presente, que deve assegurar-nos o direito de retomar a discussio sobre um tema ave continua sendo importante, apesar de um pouco deslocado do que se considera como questées centrais. A Propria comemoracao dos trinta anos de criacgao da Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro aparece como ocasiao oportuna Para que exercitemos mais uma vez nossa capacidade de compreender as varias facetas da producao cultural contemporanea e, muito Particularmente, so bre o lugar da tradicgao nesse universo tao aberto e multiface- tado!!) rebalho apresentado no Seminario Folclore e Cultura Popular: Varias Fa- Ces de um Debate. Rio de Janeiro, agosto de 1988, INF/FUNARTE, 2 Antes de passar diretamente ao assunto, faco lembrar que ha sempre uma relacao muito estrita entre a conceituacio de cultura e a formulacao de politicas culturais. Aquele que fala, no momento em que fala, simula, pelo menos para si, se ndo para os outros, que possui um poder de atuacio, capaz de transformar as coisas naquilo que ele diz que elas sao pelo a- to mesmo de enuncia-las como tal. Assim, 0 que comeca como me- ro trabalho de conceito transforma-se numa filosofia, ou me- Thor, numa critica da cultura, na medida em que a propria tra- jetoria conceitual deixa entrever, implicita ou explicitamente, uma postura valorativa frente o dilema cultural analisado. Ape sar de Obvia, tal observacao nao é redundante, pois prepara o leitor de antemao para um tipo de texto que, embora de nature- za conceitual, nao pode deixar de ser heterdclito e,forcosamen te, alterna descricéo e analise com principios filosoficos e Propostas de atuacao. Alem disso, os autores que pretendo discutir dirigi- ram-se a publicos muito diversos e exercitaram sua sensibilida de de analistas frente a segmentos muito distintos da cultura. Houve um momento gureo na América Latina durante o qual os es- tudos de folclore eram dominados por intelectuais de uma forma Gao muito parecida entre si. Ja no momento presente,sio varias as frentes de discussao, quase independentes uma da outra, que Passam muito mais por fildsofos, antropologos, socidlogos, his toriadores, tedricos de comunicacao de massa, do que pelo tipi co especialista em folclore. Na tentativa de relacionar essas linhas tao diversas (0 que nao pode deixar de ser feito) nao tive como evitar um alto grau de fragmentacdo e descontinuida- de no texto, principalmente porque forgo um dialogo entre pen- Sadores que jamais se reconheceriam como pares ou como interlo cutores,

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