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Resenhas

1ª Resenha sobre o texto “Linguística e Ensino da Língua Portuguesa como


Língua Materna”, de Rofolfo Ilari.

O foco do texto, como sugere seu tíítulo, eí o de proporcionar um estudo sobre a


integraçaã o da linguíística ao ensino da lííngua portuguesa como primeira lííngua
(ensino este que eí , ateí hoje, majoritariamente prescritivo/gramatical) e, para isso,
nos apresenta o caminho que levou desde a “descoberta” da linguíística pelos
acadeê micos brasileiros, na deí cada de 1950, ateí sua influeê ncia e relevaê ncia no
ensino da lííngua portuguesa nos nííveis fundamental e meí dio das escolas
brasileiras.

Num primeiro momento, Ilari nos mostra as dificuldades que o ensino da lííngua
portuguesa estava sofrendo na deí cada de 50 com a crescente democratizaçaã o dos
espaços de ensino dos coleí gios puí blicos, ateí entaã o majoritariamente elitistas e
elitizados, muito provavelmente composta por uma maioria branca e de classe
meí dia/meí dia alta – tal como eí , hoje em dia, na grande maioria dos coleí gios de
ensino privado – que ignoravam e/ou menosprezavam os demais membros da
sociedade (incluindo aíí sua fala, o seu portugueê s), aleí m de hipervalorizar a forma
dita culta e correta da lííngua portuguesa (ignorando, de pronto, que as mudanças,
as atualizaçoã es da lííngua ocorrem atraveí s da fala e pela maioria dos falantes, ou
seja, as camadas populares da sociedade), o que sempre dificultou o ensino, pois
que a lííngua portuguesa real, a que se fala na vida real, pouco tem a ver com a
lííngua portuguesa das regras gramaticais que aprendemos em sala.

Apoí s uma breve aula de histoí ria do estudo de líínguas (sobre a relaçaã o entre a
filologia e a gramaí tica com a linguíística), introduziu o conceito da linguíística e a
tarefa de quem a pratica, ou seja, do linguista: descrever a lííngua. Poã e-se, portanto,
a comentar que os linguistas (inicialmente, os estruturalistas), jaí na deí cada de
1960, propunham uma mudança draí stica no ensino da lííngua portuguesa: que naã o
se baseasse mais em exemplos soltos, desconexos com a realidade da fala, para
exemplificar estruturas meramente gramaticais, mas que se focassem, os
professores de lííngua portuguesa, no texto (verbal e escrito), pois era nele que se
encontrava a lííngua na sua forma verdadeira, a usual, da coletividade. Naã o obstante
ser uma cieê ncia nova, a linguíística encontrou pedras no seu caminho aà revoluçaã o
do estudo da lííngua portuguesa, promovendo, assim, pesquisas de campo na aí rea
da linguagem que pudessem auxiliar os linguistas no seu objetivo maior – como
saã o o NURC (Projeto de Estudo da Norma Urbana Culta) e o Projeto de Gramaí tica
do Portugueê s Falado, ambos de Ataliba T. de Castilho. Ao mesmo tempo em que
essa pretensa revoluçaã o quedava “adormecida” no plano do ensino escolar, na
academia a linguíística se expandiu e seus estudantes e pesquisadores jaí naã o soí
descreviam a lííngua portuguesa, mas começaram a desenvolver projetos para
compreender desde as pequenas particularidades mais complexas da fala e do
falante, daíí surgindo estudos de foneí tica/fonologia, sociolinguíística,
psicolinguíística, etnolinguíística etc., e mais: ao absorver e trabalhar sob a
linguíística gerativa de Chomsky e todas as hipoí teses, propostas e conclusoã es que
ela carrega, a linguíística brasileira se depara com a questaã o: qual a verdadeira
funçaã o do professor de lííngua portuguesa numa sala de aula (partindo do
pressuposto que os professores de outras mateí rias ensinam algo “do zero” e os
alunos jaí cheguem aà aula de lííngua portuguesa falando portugueê s)?

Apoí s apresentar algumas outras teorias e escolas que os linguistas das


universidades brasileiras costumam seguir, Ilari volta ao tema do ensino
fundamental e meí dio, apresentando duas outras questoã es: reformulaçaã o das
produçoã es textuais escolares e a proí pria alfabetizaçaã o. Quanto ao primeiro ponto,
chegamos aà conclusaã o que as escolas ainda daã o importaê ncia demais aà “forma” (no
sentido prescritivo, ou seja, aà escrita), tirando pontos dos alunos por erros
gramaticais e de ortografia, deixando de lado, de certa forma, o objetivo principal
de um exercíício de produçaã o textual: a comunicaçaã o coesa e coerente do falante. Jaí
sobre o processo de alfabetizaçaã o eles nos apresenta treê s grandes pontos em que a
alfabetizaçaã o “falha” no Brasil: a “ignoraê ncia” da fonologia no ensino primaí rio e a
calcificaçaã o, por assim dizer, dos procedimentos alfabetizantes que insistem em
ensinar ao aluno que a lííngua portuguesa tem somente as cinco vogais, ignorando
que as letras da escrita e a foneí tica naã o funcionam nesta correspondeê ncia um-a-
um; a relaçaã o som e letra continua em pauta no segundo ponto importante
ressaltado por Ilari, que eí a de que a alfabetizaçaã o naã o se pode mais concentrar na
motricidade e na prontidaã o com que os alunos escrevem determinada palavra; por
fim, o uí ltimo ponto diz respeito ao letramento da sociedade brasileira e provoca ao
dizer que uma sociedade alfabetizada naã o eí uma sociedade letrada, afinal, naã o
queremos que os nossos saibam somente escrever os seus nomes, mas que
pensem, reflitam, absorvam, reproduzam etc. o que leem, o que escrevem, o que
produzem ou podem vir a produzir.

O autor finaliza o texto brilhantemente ao apontar que a lííngua portuguesa no


Brasil esteve sempre numa espeí cie de limbo, indecisa, entre a norma lusitana e a
norma tipicamente brasileira de interpretar e, ateí mais importante, realizar a
lííngua portuguesa, tendo como representante de um lado a míídia, com o papel
fundamental de (infelizmente) aumentar este hiato entre uma norma e outra,
preferindo sempre a norma prescritiva, dita correta e claramente lusitanizada, bem
vista e bem quista pelas elites que consomem tal míídia, e, do outro, o uso real da
lííngua, que a maioria usa em conversas, verbas ou escritas – por meio de redes
sociais, por exemplo. Assim, eí papel fundamental do linguista o de valorizar o uso
real da lííngua pelos educandos como ponto de partida do estuda da lííngua escrita
culta.
2ª Resenha sobre o texto “Natureza do Signo Linguístico”, de Ferdinand de
Saussure.

No Cours, o primeiro ponto eí a distinçaã o entre signo, significado e significante, os


quais Saussure classifica signo como a uniaã o naã o uma palavra a uma coisa, mas um
de conceito a uma imagem acuí stica – e afirma que esta naã o eí o som que a coisa
materialmente tem/produz (ateí porque de material ela nada tem, somente para
fins acadeê micos, obtidos por oposiçaã o, visto que a tal imagem acuí stica eí sensorial),
mas a impressaã o psííquica deste som, a representaçaã o que identificamos pelos
nossos sentidos. Acusa, no entanto, uma possíível confusaã o de nomenclaturas entre
signo, conceito e imagem acuí stica, portanto, propoã e substituir conceito por
“significado” e imagem acuí stica por “significante” e ainda afirma que naã o
substituiraí o termo signo, pois estaí bom assim.

Apoí s este momento de definiçaã o, Saussure passa a analisar os princíípios do signo,


que saã o a sua arbitrariedade e o caraí ter linear do significante. Quanto ao primeiro
princíípio, atesta que o signo deve ser absolutamente arbitraí rio, em oposiçaã o ao
síímbolo, que jamais eí completamente arbitraí rio, afinal, se o fosse, perderia sua
funçaã o de síímbolo e seria um mero signo; aleí m disso, prevendo que outros
estudiosos poderiam questionar sobre a completa arbitrariedade do signo usando
as onomatopeias como prova de que o signo pode, sim, ser naã o completamente
arbitraí rio, Saussure se adianta afirmando que, no caso das onomatopeias que naã o
saã o auteê nticas (jaí falo sobre elas), saã o resultado de uma evoluçaã o foneí tica e que a
atual qualidade de seus sons saã o resultado fortuito de tal evoluçaã o e que, em sua
origem, naã o possuííam o mesmo caraí ter que hoje possuem (por exemplo, “glas” que
eí a onomatopeia em franceê s para o dobrar dos sinos, evoluçaã o do latim
“classicum”), quanto aà s onomatopeias auteê nticas, Saussure atesta que saã o mera
imitaçaã o aproximativa, e jaí meio convencional, de certos ruíídos; por fim, quanto aà s
exclamaçoã es, Saussure afirma que, em sua origem, muitas começaram por serem
palavras com sentido determinado (como, por exemplo, “diabo!” ou “inferno!”).
Quanto ao segundo princíípio, o caraí ter linear do significante, Saussure daí apenas
uma breve explanaçaã o, pois trataraí do assunto posteriormente, assim, diz que a
importaê ncia deste princíípio foi negligenciada por muito tempo, pois os antigos
mestres a consideram muito simples, mas eí de extrema importaê ncia que se
compreenda que, dispondo somente da linha do tempo, os significantes devam
formar uma cadeia com seus elementos, apresentando-os um apoí s o outro, a fim de
evitar complicaçoã es de compreensaã o.

Apoí s esta introduçaã o, Saussure se poã e a descrever a imutabilidade e a


mutabilidade do signo, respectivamente: a imutabilidade como o caraí ter que torna
a lííngua o meio de comunicaçaã o possíível que ela eí , afinal, se cada um pudesse
modifica-la a seu bel prazer, muito provavelmente naã o nos entenderííamos, entaã o e
necessaí rio que ela se mantenha “imutaí vel” neste sentido, aleí m do mais, o mestre
aponta que os homens soí conheceram a lííngua de uma forma: por tradiçaã o, por
herança. EÉ claro que naã o faria sentido dizer que naã o haí uma liberdade míínima na
ordem de imutabilidade da lííngua, caso assim fosse, ainda estarííamos todos
falando a mesma lííngua no mundo todo (partindo do pressuposto que os seres
humanos surgiram num soí lugar, ao mesmo tempo, e depois colonizaram outras
partes do mundo), mas eí fato que o povo estaí satisfeito com a lííngua que recebeu
de herança. Saussure aponta quatro pontos que ajudam a responder uma seí rie de
questionamentos a respeito da imutabilidade do signo: a arbitrariedade do signo,
apontando que naã o haí norma razoaí vel para que um sistema prefira um signo a
outro; a multidaã o de signos necessaí rios para constituir qualquer lííngua, dizendo
que poderííamos ateí mudar o nosso alfabeto de 24 letras, os caracteres da escrita,
mas os signos saã o inumeraí veis; o caraí ter bastante complexo do sistema, e as
tentativas frustradas de modifica-lo, em vista da incompeteê ncia da massa falante
para transformaí -la (e, aponto eu, seu desinteresse em transformaí -la); e, por uí ltimo,
e um tanto discutíível, a resisteê ncia da ineí rcia coletiva aà toda renovaçaã o linguíística,
apontando que, para a massa, de todas as instituiçoã es sociais, eí a lííngua a que
menos oferece oportunidades aà s iniciativas, formando um todo com a vida social,
num processo quase fossilizador, tornando-a inerte e aparecendo, antes de tudo,
como um processo conservador. Finaliza esta parte afirmando que o signo eí
arbitraí rio porque naã o conhece outra lei que naã o a tradiçaã o, e eí por causa da
tradiçaã o que eí arbitraí rio.

Quanto aà mutabilidade do signo, Saussure admite que a continuidade de


atualizaçaã o da lííngua tem o efeito de manter, ironicamente, a imutabilidade do
signo ao mesmo tempo que promove a mutabilidade do signo. Essa mutabilidade,
reflete o mestre, tem muito mais a ver com um deslocamento de relaçaã o entre um
significado e um significante que as mudanças meramente foneí ticas ou
ortograí ficas. Neste ponto, Saussure utiliza vaí rios exemplos de mudança de uma
lííngua externa para uma interna e as mudanças na proí pria lííngua interna que naã o
cabe mencionar nesta resenha, mas termina este ponto afirmando que nenhuma
lííngua estaí isenta do processo fatal que eí a influencia de seus agentes sobre ela,
querendo dizer que as líínguas vaã o se modificar, sim, pois as pessoas saã o diferentes,
possuem backgrounds familiares, religiosos, regionais diferentes e que tudo isso eí
essencial para a evoluçaã o e atualizaçaã o da lííngua – e, aà s vezes, sua morte – e que
nem mesmo líínguas artificiais, como o esperanto, estariam isentas deste destino.

Conclui o capíítulo sobre imutabilidade e mutabilidade apresentando o tempo como


fatores principais o tempo e a massa falante, supondo que se houvesse a passagem
do tempo, mas somente um indivííduo que vivesse vaí rios seí culos, a lííngua pouco se
modificaria, ao passo que se se considerasse a massa social minus o tempo,
tambeí m naã o haveria mutabilidade a ser constatada, pois naã o haveraí as forças
sociais sobre a lííngua. Por fim, o deslocamento da massa falante no tempo eí que
garante aà lííngua sua mutabilidade, sua evoluçaã o, sua atualizaçaã o, a sua
continuidade.

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