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DIREITOAOAMBIENTE
DIREITOAOAMBIENTE
Sumário
A. Diferenciação
B. Relevância prática
A. Previsão constitucional
Conclusão
A. Coordenadas histórico-políticas
IV - Conteúdo do direito
Sem negar tal facto, julgo conveniente, todavia, uma clarificação, tendo essencialmente
em vista termos civilísticos e, mais concretamente, a necessidade da afirmação de um
direito ao ambiente com conteúdo autónomo e positivo.
A. Não está no âmbito desta exposição a procura de uma definição para o direito do
ambiente nem a tentativa de delimitação do seu objecto (1).
Num plano muito lato, poderemos dizer que a sua essência reside no conjunto de
regras e princípios normativos, bem como de decisões, com relevância para o
ambiente.
Se, pelo contrário, se negar esse conteúdo positivo, a actividade daquele não passará da
constatação da existência ou não, in casu, de norma que proteja esse interesse.
É esta última a perspectiva, infelizmente dominante, que entende ser lícita uma
actividade, logo que devidamente licenciada, mesmo que se demonstre ofender
gravemente o ambiente (5)(6)(7)(8).
Se, pelo contrário, se entender que o direito ao ambiente tem um conteúdo próprio
positivo, será sempre legítimo ao juiz apreciar e valorar a se o interesse ambiental que
lhe corresponde, cotejando-o com outros direitos que com ele conflituem.
A. Dispõe o artigo 66.o, n.o 1, da Constituição da República Portuguesa que "todos têm
direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de
o defender".
O artigo 2.o da Lei de Bases do Ambiente - Lei n.o 11/87, de 7 de Abril -é uma cópia
quase integral daquele preceito.
O transcrito artigo 66.o integra-se no Título III da Parte I da Constituição, referente aos
direitos económicos, sociais e culturais.
Vem, no entanto, sendo entendido que o direito nele conferido, enquanto dirigido à
titularidade individual, é um direito fundamental de natureza análoga aos direitos
liberdades e garantias (10) (11).
Tal nota é deveras importante, já que, como previsto no artigo 17.o do mesmo diploma,
o regime destes últimos aplica-se aos direitos fundamentais de natureza análoga, sendo
uma das suas características o serem directamente aplicáveis e vincularem entidades
públicas e privadas cfr. artigo 18.o
Na verdade, o alcance dos direitos conferidos pelo artigo 66.o e pelo artigo 52.o é
diverso.
É este seu carácter instrumental que permite classificá-lo como garantia, por
contraposição aos direitos fundamentais stricto sensu, como o direito ao ambiente, com
o alcance já definido.
Com a alteração do artigo 52.o, n.º 3, a que se procedeu na revisão de 1989, a protecção
dos valores ambientais foi incluída, a título exemplificativo, no elenco daqueles que
usufruem da tutela do direito de acção popular.
Em Abril de 1987, tinham sido publicadas as Leis n.º 11/87 (Lei de Bases do Ambiente)
e n.º 10/87 (Lei das Associações de Defesa do Ambiente).
Se constatarmos que o teor daquele artigo 52.o, n.o 3, não pressupõe uma legislação
unitária sobre o modus como se há-de concretizar o direito de acção concedido, não me
parece forçado o entendimento de que, para já, e enquanto não for publicada lei que
defina os termos dessa genérica acção popular, se veja naqueles preceitos das Leis
n.º 10 e 11/87 o quid legislativo suficiente para despoletar a virtualidade contida
nesse direito.
Doutro modo, custoso será reconhecer que muitos dos preceitos das duas referidas leis
são pura letra morta (19).
Essa tutela assume, como visto, duas vertentes estruturais: uma positiva, porque
plasmada numa exigência de que o Estado proteja tais interesses direito subjectivo
público; outra negativa, consistente na possibilidade de impor a outrem, particular ou
Estado, que se abstenha de os ofender.
Assim, foram criadas as condições para que qualquer cidadão reaja instintivamente a
uma ofensa a um seu direito mediante o apelo à intervenção do poder político-
administrativo (21). Sem cuidar (ou sequer se lembrar) de que o poder
institucionalmente fadado para dirimir conflitos de direitos é o judicial.
Por um lado, o poder judicial, nas poucas vezes em que é instado para julgar questões
que passem pela consideração de bens ambientais, remete por sistema para os órgãos
políticos a sua definição e avaliação (22).
É, aliás, corrente a afirmação de que o direito do ambiente tem muito mais de comum
com o direito administrativo do que com qualquer outro ramo do direito, tendo vindo a
ser o seu estudo e cultivo feudo dos administrativistas (25).
Por fim, quando o interesse ambiental é afirmado numa vertente positiva, é-o por
referência a problemas conexos com o direito de propriedade ou com os direitos de
personalidade, como frontispício que vai reforçar o valor desses direitos (26). Ou
como factor delimitativo da extensão de outros direitos, cujas virtualidades de exercício
restringe v.g., direito de propriedade ou direito ao trabalho (27).
Na verdade, o direito ao ambiente, tal como o direito à vida, não é nada, enquanto
desligado dos juízos de valor de conteúdo sociológico que o hão--de conformar(28).
Sendo certo que o direito à vida não se resume ao morrer ou viver, o direito à liberdade,
ao tê-la ou não a ter, e o direito ao ambiente, à subsistência ou não do que nos rodeia.
Nenhum deles há-de ser definido em absoluto mas tão só enquanto o interesse que
lhe subjaz vier a preponderar ou não sobre outros que com ele conflituem.
Exemplificando: para viver, é necessário comer; não parece, porém, que o roubar para
comer seja o exercício do direito constitucional à vida.
Ele há-de ser condicionado e moldar-se àquele mínimo a partir do qual se venha a
entender não ser admissível a modificação do meio em que vivemos para
realização de outros interesses.
B. O que nos relança para a vexata quaestio de saber onde pára a competência do juiz
e começa a do político(30).
Não deve porém tal facto impelir o juiz a abster-se de julgar(31), pois a ele incumbe
assegurar o respeito pelos princípios éticos fundamentais da sociedade.
Mais correcto teria sido encarar o bem ambiental a preservar, verificar se ele
correspondia a um interesse com relevo suficiente (atendendo, essencialmente, à sua
natureza e ao grau de sacrifício que para ele resulta da ofensa concreta) para merecer a
tutela jurídica que se pretende com a consagração do direito ao ambiente, e, em caso
afirmativo, cotejá-lo com o direito em cujo exercício se iria praticar o acto lesivo.
Só se se entendesse não ser ele digno dessa tutela do direito, atitude que no caso
concreto se poderia compreender, seria legítimo remeter a decisão para instâncias
políticas (a decisão política de criação de uma reserva ecológica, actividade muito mais
discricionária do que a decisão jurisdicional de afirmação de um interesse carecente da
protecção daquele direito).
V) A Operacionalidade do Conceito
Pelo que já deixei exposto, a maior dificuldade provirá da segunda vertente, mais
concretamente da violação ilícita do direito ao ambiente.
A qual tem sido por sistema ignorada, fazendo-se coincidir o conteúdo do direito
com os limites definidos pelas normas que protegem o interesse ambiental(34).
É curioso anotar que, precisamente por não se vir dando ao direito ao ambiente um
conteúdo autónomo, casos houve em que o interesse ambiental funcionou como factor
limitativo do exercício de outro direito, que desse modo ajudou a conformar
restritivamente(35).
E mesmo as suas especialidades podem contribuir para uma concepção civilística dos
litígios mais enriquecida e dinâmica(36).