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Introdução
A durabilidade dos sistemas que compõem o de fachadas requer a quantificação da carga de
edifício está voltada à agressividade do meio chuva dirigida.
ambiente onde está inserido, assim como às
Gaspar e Brito (2005), em estudos realizados nas
propriedades dos elementos e componentes. Entre cidades de Lisboa, Alcochete e Tavira, em
os sistemas que compõem o edifício, as fachadas Portugal, identificaram que 25% dos problemas de
estão sujeitas às condições de exposição, que
degradação em fachadas de edifícios revestidas
variam de acordo com as características
com argamassa de base cimentícia e com
climatológicas da região onde estão localizadas.
acabamento decorativo em pintura são decorrentes
Os elementos climáticos (precipitação da chuva dirigida e do escoamento superficial de
pluviométrica, precipitação de neve e de granizo, água na fachada.
vento, radiação solar, umidade relativa e
temperatura) contribuem com o processo de A complexidade do fenômeno e o surgimento de
degradação e afetam diretamente a durabilidade manifestações patológicas têm instigado a
das fachadas. A precipitação pluviométrica é uma comunidade científica e, por essa razão,
das principais fontes de umidade dos edifícios, pesquisadores de vários países têm buscado
sendo, portanto, uma vertente de preocupação, pois estabelecer mecanismos para mensurar a chuva
não é possível sua eliminação, uma vez que é dirigida, empregando equações semiempíricas,
regida pelas leis da natureza. Nesse sentido, Choi medições experimentais ou mesmo simulações
(1999) afirma que a degradação causada pela água numéricas do fenômeno. Apesar da importância,
da chuva vem sendo há muito tempo reconhecida no Brasil existem poucos estudos sobre a chuva
como o principal problema na manutenção de dirigida, e talvez uma das explicações para isso
edificações. Perez (1988) aponta as manifestações seja a dificuldade em se obterem dados climáticos
patológicas pela presença de umidade como uma da parte das estações meteorológicas.
das mais difíceis de ser combatidas devido à
complexidade e carência de estudos do fenômeno. Revisão da literatura
De acordo com Souza, Almeida e Verçosa (2005),
os efeitos pelo aparecimento desse problema A associação de vento e chuva (“precipitação
grave, de difícil solução e também dispendioso são pluviométrica” ou simplesmente “precipitação”,
a perda da funcionalidade da edificação, danos a termo mais usado) cria o vetor de intensidade de
equipamentos e bens no interior do edifício, chuva oblíqua. A partir da compreensão da relação
desconforto aos usuários com riscos à saúde e entre chuva e as fachadas de edificações, o termo
prejuízos financeiros, seja em decorrência dos “intensidade de chuva dirigida” restringe-se à
percalços citados, como pelos custos com componente de vetor de intensidade de chuva que
reparação das falhas apresentadas pelo edifício. causa fluxo de água sobre um plano vertical,
definição esta adotada pelo International Council
A presença de umidade em abundância contribui for Building Research and Innovation (CIB)
com uma série de problemas, tais como a corrosão (BLOCKEN; CARMELIET, 2004).
eletroquímica de metais, a proliferação de
microrganismos, a descoloração dos revestimentos Segundo Thomaz (1990), sem a incidência de
de fachadas, a formação de manchas e vento, as gotas de chuva cairiam verticalmente e as
eflorescências, além da variação dimensional de fachadas pouco seriam umedecidas. Porém, com a
componentes, materiais e elementos construtivos, presença do vento, as fachadas passam a se expor
como o concreto, o revestimento de argamassa, em diferentes níveis de umidade, diretamente
blocos de alvenaria, gesso, etc. influenciados pela direção e intensidade do vento
(Figura 1).
A chuva dirigida é um fenômeno climático que
tem sua origem na associação da chuva e do vento, Devido à incidência de vento, as fachadas da
sendo considerada por Straube e Burnett (2000) edificação ilustrada anteriormente são atingidas de
como a maior fonte de umidade que as fachadas de maneira diferenciada, pois as faces A, B e C estão
um edifício podem receber do meio externo; por expostas à água da chuva, enquanto a face D não
essa razão, ela afeta diretamente o desempenho da está. As faces A e B ainda seriam mais agredidas
edificação. Ainda para os autores citados, a análise pelo acúmulo de água em decorrência do
do comportamento higrotérmico e da durabilidade escoamento da água pela face C.
VENTO
C D C D
Área
potencialmente
B B protegida
A A
(a) (b)
Figura 1 - Influência do vento na direção da chuva e na exposição das fachadas: (a) situação sem vento
e (b) situação com vento
Fonte: Thomaz (1990).
Índices de chuva dirigida direcional e análise do nível de umedecimento em fachadas de edifício multipavimentos 25
em Goiânia, GO
Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 11, n. 3, p. 23-37, jul./set. 2011.
Tabela 2 - Faixas de exposição à chuva dirigida propostas por Chand e Bhargava (2002)
Faixa Grau de exposição
ICD ≤ 3 m2/s Protegida
3 m /s < ICD ≤ 7 m2/s
2
Moderada
7 m2/s < ICD ≤ 11 m2/s Alta
ICD > 11 m2/s Severa
Figura 2 - Mapa brasileiro de chuva dirigida com base nos dados de 2004
Fonte: Lima e Morelli (2005).
Segundo Marsh (1977), cabe ainda salientar que, disponíveis na página do site do Centro de
para as distâncias menores que 8 km do mar, nas Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC)
áreas com ICD menores que 3 m2/s, a exposição de 2004.
deve ser considerada moderada, e entre
Apesar de o mapa brasileiro de chuva dirigida
5 m2/s e 7 m2/s, a exposição deve ser considerada
conter informações sobre o nível de exposição em
severa.
todo o território, possibilitando prever os riscos
O primeiro mapa de chuva dirigida no Brasil foi quanto à agressividade do meio ao qual a
desenvolvido por Lima e Morelli (2005), edificação se encontra, ele não permite conhecer
adotando-se as quatro faixas de exposição quais fachadas estão mais suscetíveis às
propostas por Chand e Bhargava (2002). Observa- manifestações patológicas por não conter o índice
se que esse mapa, ilustrado na Figura 2, não de chuva dirigida direcional (ICDd).2
apresenta os índices de chuva dirigida direcionais
(ICDd), trazendo apenas informações do grau de 2
LACY, R. E. Climate and Building in Britain: building research
exposição. O mapa foi elaborado com os dados establishment. London: Her Majesty’s Stationery Office, 1977.
185 p.
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337,5
N 22,5
NO 45° NE
45
45
°
292,5 67,5
O E
45°
45°
247,5 ° 112,5
45
45
°
45°
SO SE
202,5 157,5
S
Figura 3 - Transformação das direções de vento medidas em graus para as direções N, NE, E, SE, S, SO,
O e NO
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Figura 5 - Medição realizada na fachada norte do 9º andar, ao lado da janela, próximo à fachada oeste
Figura 6 - Regiões da fachada (embaixo e ao lado da abertura da janela) onde foram realizadas as
medições de umidade
NM
S
1 2 3 4
APT-03 APT-04
16 5
15 6
SOBE
8
7
6
5
4
3
2
1
16 DESCE
10
11
12
13
14
15
9
14 7
13 8
APT-01 APT-02
12 11 10 9
Para as medidas de umidade foi empregado um SE (0,23 m²/s), e o menor valor, ao quadrante S
medidor de umidade superficial digital, Moisture (0,09 m²/s).
Meter M-T-170 (James T-M), para materiais
Na Figura 9 apresenta-se a resultante do ICDd
sólidos (tijolos, concreto, argamassa, gesso e
específico para o mês de janeiro, no período
madeira), com faixa de medida 0-80% de conteúdo
estudado (2002 a 2008), onde se observam os
de água e resolução de 0,1%, ilustrado na Figura 5.
maiores valores nos quadrantes N e NO
Ao todo, foram realizadas 48 medições, em três (0,50 m²/s), e o menor valor, no quadrante S
pavimentos-tipo: 2º, 9º e 17º andares. Em cada (0,06 m²/s).
pavimento, foram realizadas 16 medições, quatro
O ICDd da média mensal no período de 2002 a
para cada orientação (N, S, E e O). Para cada
2008 apresentou resultados menores em relação ao
fachada dos pavimentos analisados foram feitas ICDd do mês chuvoso de janeiro, que pode ser
medições abaixo e ao lado da janela, como
explicado pela diminuição da chuva dos períodos
indicado na Figura 6, sendo duas para cada
secos. Apesar disso, nesses períodos, alguns
extremo da fachada, isto é, mais à esquerda e mais
eventos de chuva foram registrados e,
à direita da fachada, como indicado na Figura 7.
considerando a intensidade de vento associada às
direções SE e S, esses quadrantes apresentam
Resultados e discussão valores significativos de índices de chuva dirigida
direcionais.
Os resultados de índice de chuva dirigida
direcional calculados foram representados na Porém, no mês de janeiro, muito chuvoso, os
forma de gráficos do tipo radar, com a finalidade índices de chuva dirigida direcionais apresentaram
de visualizar facilmente as direções predominantes valores muito altos em relação à média mensal de
de chuva dirigida. Na Figura 8 ilustra-se a ICDd, principalmente para os quadrantes N e NO
resultante da média de ICDd mensal no período de (0,50 m²/s). Giongo (2007) apresenta os índices de
2002 a 2008. chuva dirigida direcionais sazonais para
Florianópolis no período de 1961-1970, onde o
Observa-se na Figura 8 que os maiores valores de
quadrante com maior índice foi o S, com valores
ICDd médio correspondem aos quadrantes NO e
aproximados de 0,43 m²/s.
NO NE
0,23 0,19
0,20
O 0,20
0,19 E
0,11
0,09
0,23
SO SE
Figura 8 - Média dos índices de chuva dirigida direcionais de todos os meses (m²/s), para o período de
2002 a 2008, para Goiânia
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Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 11, n. 3, p. 23-37, jul./set. 2011.
0,50
NO NE
0,50
0,21
O 0,24 0,23 E
0,06
0,16
0,37
SO SE
Figura 9 - Índice de chuva dirigida direcional (m²/s) para o mês de janeiro nos anos de 2002 a 2008
para Goiânia
Figura 10 - Umidade superficial em função da orientação da fachada, medida nos diversos pavimentos
5
COUPER, R. R. Drainage From Vertical Surfaces. In: DIVISION OF BUILDING RESEARCH. Wind Driven-Rain and the Multi-Storey Building.
Australia: Division of Building Research, CSIRO, 1972.
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11,1
NO NE
8,6
7,3
5,5
O E
4,2
4,7 4,0
3,8
SO SE
Os valores médios globais de umidade superficial Visando confrontar os resultados dos índices de
nas fachadas também foram transformados em chuva dirigida direcionais (calculados para
gráfico do tipo radar, o mesmo tipo empregado Goiânia no mês de janeiro) com os valores de
para a representação gráfica dos índices de chuva umidade superficial medidos experimentalmente
dirigida direcionais, por meio das médias das nas fachadas do edifício, foi traçado o gráfico da
medições próximas aos vértices da edificação Figura 14, onde é apresentada a interseção dos dois
(Figura 13). radares obtidos anteriormente, do ICDd (Figura 9)
e da umidade superficial (Figura 13).
NO NE
O E
SO SE
S
Figura 14 - Interseção dos resultados obtidos pelo ICDd de janeiro e pela medição de umidade
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Agradecimentos
O presente trabalho foi realizado com o apoio da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (Capes) e Pró-Engenharias.
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