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A Oração ao Deus Desconhecido

Antes de prosseguir em meu caminho e lançar o meu olhar para


frente uma vez mais, elevo, só, minhas mãos a Ti na direção de
quem eu fujo.

A Ti, das profundezas de meu coração, tenho dedicado altares


festivos para que, em Cada momento, Tua voz me pudesse chamar.

Sobre esses altares estão gravadas em fogo estas palavras:

"Ao Deus desconhecido”.

Seu, sou eu, embora até o presente tenha me associado aos


sacrílegos.

Seu, sou eu, não obstante os laços que me puxam para o abismo.

Mesmo querendo fugir, sinto-me forçado a servi-lo.

Eu quero Te conhecer, desconhecido.

Tu, que me penetras a alma e, qual turbilhão, invades a minha vida.

Tu, o incompreensível, mas meu semelhante, quero Te conhecer,


quero servir só a Ti.

[Friedrich Nietzsche]

Uma tradução feita por Leonardo Boff de uma oração escrita por
Nietzsche.
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As paranóias, fobias, medos, e ambições, necessitam


desesperadamente de um "deus" para se sublimarem. De
preferência, esteticamente impecável e irresistível. Viver a verdade,
liberdade, justiça, em amor e paz incomodam o nosso ser.

Quando os véus caírem, quando os céus se abrirem, quando o


santuário do coração humano for deslacrado, quando o que é oculto
for revelado, quando o que é sussurrado for um brado audível,
quando o que é aparente der lugar ao que é patente, quando a Luz
iluminar todas as trevas e todas as ignorâncias, e quando todo joio
for joio e todo trigo for trigo — então, os homens, todos eles, todos
nós, entenderemos como temos blasfemado contra o santo-dos-
santos do coração humano; e, também, como a religião e sua moral
de juízos e certezas, foi satanás na história, e, além disso, foi a
principal responsável por afastar milhões, bilhões de homens e
mulheres, da genuína experiência de Deus.

O “deus” que para Nietzsche morreu foi o “deus” que já nasceu


morto: o “deus” da religião.

Os sacrilégios, as blasfêmias, as irreverências, os confrontos, as


acusações, por vezes o ódio ou o sarcasmo mais ferino que a lamina
de uma navalha afiada o dia todo — e que são encontrados em
Nietzsche, são todos próprios se deixarmos de lado Deus, e
pensarmos apenas em “deus”, “igreja” e “cristianismo convencional”.

A oração de Nietzsche transcrita acima, é uma confissão de amor ao


que Ama, e é a declaração de uma alma que, mesmo
enlouquecida de desejo de verdade, sabe quem É Aquele que É, e
sabe quem Ele É — apesar de todos os véus de linguagem que
‘aparentemente’ fizessem separação entre ele e Deus.

O “deus” que Nietzsche anunciou seu óbito, aprioristicamente, já está


morto mesmo. A hipocrisia de conveniência, ou a nossa estupidez é
que não vê. Quando os nossos olhos se descortinam, apenas
constatamos o seu óbito.

Esse “Deus” das virtudes legalistas, da religião da moral, da justiça


humana — é o grande promotor das guerras e das desarmonias
vistas e vomitadas neste planeta moribundo, porém muito ocupado
pelos “temas de mosquito” dos grupos formalistas e
fundamentalistas existentes na terra. "Quanto mais ritualismo e
cerimonialismo - menos verdade".
Neste mundo-sistema, e de fachada, ser é irrelevante e desprezível, o
importante é parecer.

Na atualidade, o importante é acontecer. Sendo assim, substitui-se o


Ser, pelo fazer, e o existir pelo acontecer. Assim, as pessoas só se
sentem existindo se estiverem acontecendo na sociedade, dentro dos
padrões estabelecidos, nas formas de ser mais fúteis e vãs possíveis.
E, se não estiverem engajadas em um ativismo frenético e tido como
importante, não se sentem sendo.

Esse “deus” é a morte do homem e da terra, e, não é Deus. Deus é


pura loucura para a vaidade sapiental, e totalmente escandaloso para
a liturgia religiosa da moral fétida de fachada. Esse, como anunciou o
Criador quando aqui esteve em um chassi humano, é o “deus desse
mundo”, e tem sido assim desde os primórdios frequentemente um
diabo. Esse “deus” tem que morrer.

Só as vidas lúcidas pela graça de Deus em Cristo Jesus, tem a


capacidade de enxergar e ver o óbito desse "deus".

Uma colaboração de ÁLVARO DE AMORIM GARCIA XIMENES.

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