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Hermenêutica e Hermenêutica Bíblica

Introdução
A palavra hermenêutica deve sua origem ao nome de Hermes, o deus grego que servia de
mensageiro dos deuses, transmitindo e interpretando suas comunicações aos seus afortunados,
ou, com frequência, desafortunados destinatários. Em seu sentido técnico, muitas vezes se
define a hermenêutica como a ciência e arte da interpretação. Considera-se a hermenêutica
como ciência porque ela tem regras que podem ser classificadas em um sistema. É considerada
como arte porque a comunicação é flexível e, portanto, uma aplicação mecânica e rígida das
regras às vezes distorcerá o verdadeiro sentido de uma comunicação. Exige-se do intérprete
que ele aprenda as regras da hermenêutica bem como a arte de aplicá-las.
Conforme Gadamer, à Hermenêutica pertence a totalidade de nosso acesso ao mundo, pois é a
linguagem a base não somente do entendimento entre as pessoas, mas também do
entendimento sobre as coisas de que consta nosso mundo.

O leitor como intérprete


A primeira razão por que precisamos aprender como interpretar é que, quer deseje, quer não,
todo leitor é ao mesmo tempo um intérprete, ou seja, a maioria de nós toma por certo que,
enquanto lemos, também entendemos corretamente o que lemos.
Apesar disso, invariavelmente levamos para o texto tudo quanto somos, com toda nossa
experiência, cultura e entendimento prévio de palavras e ideias. Às vezes, aquilo que levamos
para o texto, sem o fazer deliberadamente, nos desencaminha ou nos leva a atribuir ao texto
ideias que lhe são estranhas.
Tomemos o exemplo do uso da palavra “carne” no Novo Testamento. Quando pessoas
herdeiras de culturas e de idiomas europeus escutam ou leem essa palavra, tendem a pensar que
“a carne” significa “o corpo”. Mas a palavra “carne” raras vezes se refere ao corpo.
Além disso, o leitor da Bíblia em idioma vernáculo já está envolvido na interpretação. A
tradução é, em si mesma, uma forma (necessária) de interpretação. Para o leitor em língua
vernácula, a tradução da Bíblia que para ele é o ponto de partida, é, na realidade, o resultado
final de uma interpretação. Os tradutores são regularmente tem que fazer escolhas quanto aos
significados, e as escolhas deles irão afetar o entendimento do leitor em língua vernácula.

Hermenêutica e Exegese
A hermenêutica bíblica está intimamente vincula à exegese moderna, mas aquela existe antes
desta. Antes que a ciência da exegese fosse desenvolvida na época da patrística já era realizada
a hermenêutica, mas convém lembrar que as línguas bíblicas eram o vernáculo dos escritores
sírios e gregos, e também estavam imbuídos das tradições orais antigas proporcionando-lhes
facilidade para entender as Escrituras.
A palavra exegese vem da língua grega, sendo composta pela preposição ek (de) e da forma
substantiva do verbo hegeomai (ir, guiar, conduzir) e significa “conduzir para fora” o sentido
original de um texto. Na exegese procuramos entrar no texto e ficar nele, para então fazermos a
tarefa da hermenêutica de sairmos dele tirando lições para nós.
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A tarefa do intérprete supõe a exegese por alicerce. A exegese é o estudo cuidadoso e


sistemático da Escritura para descobrir o significado original que foi pretendido. A exegese é
basicamente uma tarefa histórica. É a tentativa de escutar a Palavra conforme os destinatários
originais devem tê-la ouvido; descobrir qual era a intenção original das palavras da Bíblia. Esta
é a tarefa do “perito”, daquela pessoa que através das ciências modernas conhece bem o idioma
e as circunstâncias dos textos no seu âmbito original. Mas fazer a exegese não é a única tarefa
em relação ao estudo bíblico, é somente a primeira tarefa. Hermenêutica é a síntese dos
resultados da exegese, tornando-a relevante para o leitor, ou auditório atual.

Limites da Hermenêutica
A hermenêutica não emite juízo de valor não se pergunta se é verdadeiro ou falso, mas somente
que pretendeu dizer o autor. A hermenêutica não questiona a autenticidade de um livro ou de
um texto, nem se é de natureza secular ou sagrada.

Objeto da Hermenêutica
Seu objeto material é o livro ou texto que deve ser explicado. Seu objeto formal se preocupa
com o sentido expresso pelo autor do livro em questão. Assim, a hermenêutica bíblica lida com
a Sagrada Escritura como seu objeto material, fornecendo um conjunto complexo de regras
para encontrar e expressar o verdadeiro significado dos escritores inspirados. A descoberta e
apresentação do sentido da Sagrada Escritura é o seu objeto formal.

Hermenêutica bíblica
As regras de hermenêutica podem ser de aplicação universal ou particular, ou seja, podem ser
válido para a explicação correta de qualquer livro ou escrito, ou podem ser adaptado para uma
classe particular de livros, por exemplo, a Escritura.
A hermenêutica bíblica exige normas suplementares de interpretação, não porque as regras
universais sejam inaplicáveis aos livros sagrados, mas devido ao caráter sagrado da Bíblia, há
regras que não são aplicáveis aos escritos seculares.
A hermenêutica bíblica está dividida em geral ou especial. É geral se as suas regras são
aplicáveis a toda a Bíblia; e especial se ele é destinada apenas a uma explicação de livros
particulares, tais como os Salmos ou Epístolas Paulinas.
Desde que as leis da hermenêutica especial não contradigam as leis da hermenêutica geral, mas
somente as determinem mais corretamente para adaptá-las aos escritos particulares, aos quais
são aplicados, deve ser possível determinar o primeiro e mais elevado princípio ou lei da
hermenêutica, do qual todas as regras especiais são derivadas.
Um autor utiliza geralmente o código de seu dia-a-dia e das circunstâncias particulares; ele usa
a linguagem de acordo com seus costumes e regras de uma gramática particular, suas palavras
refletem sua mentalidade assim suas condições sociais. Se o leitor deseja entender o escritor,
ele deve ser orientado pela linguagem, linha de pensamento, contexto e condição psicológica e
histórica do autor no momento em que surgiu o texto. Flui daí o primeiro e mais alto princípio
da hermenêutica: encontro o sentido de um livro por sua linguagem (gramatical e
filologicamente), pelas regras da lógica (a partir do contexto) e pela condição psicológica do
escritor.
Podemos dizer que qualquer significado de uma passagem que não concorde com a gramática,
contexto e condições internas e externas de seu autor, não pode ser o verdadeiro sentido do
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escritor. No caso da Escritura, há também o fato de sua inspiração divina, exige-se também
uma harmonia com a totalidade da revelação.

As fontes da hermenêutica bíblica


Como a hermenêutica pressupõe um conhecimento gramatical e filológico da língua em que a
obra foi escrita, o conhecimento das leis da lógica e da retórica, uma familiaridade com os
dados da psicologia e dos fatos da história do escrito; estas são as fontes das regras de
hermenêutica universal.
No caso das Escrituras Sagradas, o intérprete deve ser versado nas línguas bíblicas; deve
conhecer a história bíblica, a arqueologia e a geografia e, finalmente, ele deve ser bem versado
em patrística, história eclesiástica e literatura bíblica. Antes começar a explicação de qualquer
livro particular da Escritura, o comentarista também deve ser versado nas questões dogmáticas,
morais, filosóficas e científicas relacionadas com o seu assunto particular. À luz destes
diversos requisitos, pode-se facilmente compreender por que é tão difícil encontrar comentários
que sejam completamente satisfatórios, e também se percebe a necessidade de ler vários
comentários antes que se possa afirmar compreender as Escrituras ou qualquer parte da mesma.

História da Hermenêutica bíblica


O Rabi Hillel foi o primeiro a estabelecer as sete regras da hermenêutica (middoth), entre as
quais se encontram a inferência do maior ao menor contexto, do general ao particular para as
passagens paralelas.
1) Qal wa-chomer: do menor para o maior. Exemplo: Por que não devemos nos preocupar com
o que comer e com o que vestir? Porque se Deus não nega alimento aos pássaros e às ervas
(menos importantes) quanto mais não negará a nós (mais importantes, Mt 6,25-33).
2) Gezarah shavah (comparação de expressões similares). Só é possível no idioma do autor.
Exemplo: se a Páscoa (14 de Nisan) cair em um sábado deve-se celebrá-la ou realizar o
descanso sabático? Deve-se celebrá-la, pois a expressão tempo determinado que está na ordem
de celebrar a Páscoa (Ex 23,15) também se encontra na ordem sobre o sacrifício contínuo (Nm
28,2) o qual deve ser celebrado também no sábado (Nm 28, 9-10).
3) Chekesh (comparação). É a criação de um novo texto a partir de uma comparação entre
textos diferentes. Exemplo: Como saber se um homem lançar um olhar de cobiça para uma
mulher já cometeu adultério em seu coração? (Mt 5,27-28). Por uma comparação entre Ex
20,14 e Nm 15,37-40. O último texto afirma que a partir dos olhos é possível adulterar.
4) Kelal w-perat (princípio e detalhe, universal e particular). Primeiro se afirma o princípio, a
norma universal, depois se dá detalhes particulares para ilustrá-lo. Exemplo: Princípio: deve-se
ofertar gado vacum e ovelhas ao Senhor (Lv 1,2). Detalhes: como devem ser esses animais e
quais os procedimentos (Lv 1,3).
5) Perat we-kelal (detalhe e princípio). Exemplo: caso de apropriação de bens no qual primeiro
se afirmam detalhes particulares (Ex 22,7-9a). Depois vem o princípio que o rege: os juízes
decidirão e quem for condenado pagará o dobro (Ex 22,9b).
6) kelal w-perat we-kelal (princípio, detalhe e princípio). Exemplo: Princípio: não comer
sangue porque a vida está no sangue (Lv 17,10-11a). Detalhe: Lv 17,11b-13. Princípio: não
comer sangue porque a vida está no sangue (Lv 17,14).
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7) Dabar ha-lamed me-'inyano (o significado é estabelecido pelo contexto). Exemplo: No Novo


Testamento esse método é usado em Romanos 4,1-12. O contexto de dois textos do Gênesis é
usado para argumentar que a circuncisão não justifica, mas sim a fé. Abraão é justificado em
Gn 15 e a circuncisão é prescrita em Gn 17.

No início do século II d.C. Rabi Yishmael ben Elisha aumentou o número das regras de Hillel
para treze, tratando entre outras coisas da maneira de harmonizar as passagens contraditórias.
Podemos deduzir dos escritos dos primeiros Padres da igreja que a tradição e a analogia da fé
foram as leis soberanas dos primeiros intérpretes cristãos. No século II, Melito de Sardis
compôs um tratado de hermenêutica intitulado “A Chave”.
Os Padres dos séculos III e IV sugeriram regras de interpretação sem que estas tenham sido
recolhidas em alguma obra. Santo Agostinho (430 dC) escreveu um livro no qual tratou das
regras de interpretação de forma mais satisfatória que as anteriormente escritas (De doctrina
Christiana libri quatuor).
Santo Isidoro de Pelusium (440-450 dC) deixou cartas explicando os princípios da
hermenêutica da escola de Antioquia, e também um trabalho intitulado “De interpretatione
divinae scripturae”.
No século quinto e início do sexto, o monge Adriano explicou as expressões figuradas da
Sagrada Escritura, especialmente do Antigo Testamento, segundo os princípios da escola de
Antioquia em um trabalho intitulado “Introductio ad divinas scripturas”.
El Concilio de Viena (1311) ordenou que a cátedra de idiomas Orientais fosse inserida
universidades. A tomada de Constantinopla pelos Turcos (1453) ocasionou a emigração de
numerosos doutores gregos que levaram consigo vários tesouros literários assim como sua
habilidade artística.
João Gerson (d. 1429 dC) fez um tratado de hermenêutica intitulado “Propositiones de sensu
litterali Scripturae Sacrae”, no qual considera os diversos sentidos da Escritura, e defende que o
sentido literal seja determinado segundo o ensinamento da tradição e das declarações da Igreja.
No século dezesseis a Reforma defendeu a “sola Scriptura”. La literatura hermenêutica
Católica também se desenvolveu durante estes séculos, em parte devido à rivalidade entre
eruditos Católicos e Protestantes.
Como os trabalhos hermenêuticos tendiam a engrandecer-se, a clareza e a meticulosidade
exigiram a separação entre hermenêutica, crítica, história e perguntas dogmáticas, também
exigiu o desenvolvimento de princípios estritamente hermenêuticos.

Conteúdo da Hermenêutica
Um tratado completo de hermenêutica deveria tratar primeiro do sentido da Escritura em geral;
deve estabelecer as regras definidas para se encontrar este sentido; deve ensinar-nos como
apresentar este sentido a outras pessoas.

I - os princípios
Primeiramente, trata-se de encontrar o sentido genuíno da Escritura, considerando:
- o carácter humano da Bíblia, que exige uma interpretação histórico-gramatical de modo que o
comentarista deva ter presente o significado da expressão literária do idioma e da Escritura;
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- El carácter divino ou inspirado da Bíblia requer uma interpretação que implique aceitar um
direcionamento adicional de carácter negativo que previna (1) toda irreverência e (2) a
admissão de qualquer erro; e/ou de natureza positiva, que foi ordenada por (a) definições da
Igreja, (b) interpretação patrística, (c) analogia da fé.

Depois de se encontrar o sentido genuíno da Escritura Sagrada deve-se apresenta-lo a outros


por meio de:
-Versão, paráfrases, glosas, escólio, dissertação e, finalmente, comentário.
- A homilia: classificada como o meio mais popular de exposição bíblica.

II - as análises
1. Análise Histórico-Cultural e Contextual: Saber considerar o ambiente histórico-cultural
do autor, a fim de entender suas alusões, referências e propósitos. Saber, também, relacionar
uma passagem com o escrito completo do autor, conhecendo melhor seu pensamento geral e
melhorando a compreensão da passagem. Textos arrancados do seu contexto tem o significado
original totalmente distorcido. Há vários tipos de contexto:

a) Contexto literário: o contexto literário de qualquer versículo é o parágrafo do qual faz


parte, a seção da qual o parágrafo é parte, e o livro do qual a seção é parte. E devido à unidade
das Escrituras, o contexto definitivo de qualquer livro é a Bíblia toda.

b) Contexto histórico: quando o fato está acontecendo? Onde na história a passagem se


encaixa? O que está acontecendo no mundo na mesma época? Quais são as influências sociais,
políticas e tecnológicas sobre o autor e sobre aqueles para quem escreve?

c) Contexto cultural: a cultura tem poderosa influência sobre todas as formas de


comunicação, e as culturas nos tempos bíblicos tiveram efeito na formação da Bíblia. Assim,
quanto mais se tem conhecimento sobre culturas antigas, mais compreensão se terá do texto.

d) Contexto geográfico: A investigação do contexto geográfico (geografia das terras bíblicas)


responde perguntas como: Que características topográficas distinguiam a região? Como era o
clima? Qual a distância entre os lugares mencionados no texto? Quais eram as rotas de
transporte? Qual o tamanho da cidade? Por quais características o local era conhecido?

e) Contexto teológico: a questão aqui é: O que este autor sabia sobre Deus? Qual o
relacionamento de seus leitores com Deus? Como o povo adorava a Deus na época? A que
partes das Escrituras o escritor e sua audiência têm acesso? Que outras religiões e visões de
mundo o influenciam? O problema central aqui é: Onde a passagem se encaixa na expansão
das Escrituras? A Bíblia não caiu do céu como obra terminada, ao contrário, foram necessários
cerca de 1.200 anos para formá-la. Durante esse tempo, a Revelação de Deus foi acontecendo
progressivamente. Por isso, é importante localizar a passagem no fluxo das Escrituras.

Não é suficiente apenas ter consciência dos fatos históricos e dos costumes de determinada
cultura; o intérprete da Bíblia deve ter também consciência do impacto que a mensagem teria
sobre o público original. Uma plateia atual não se surpreende, por exemplo, diante da ideia de
um “bom samaritano”. Nos dias de Jesus, porém, havia uma animosidade tão grande por parte
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dos judeus para com os samaritanos, que tal alusão seria tão inconcebível quanto uma
referência hoje a um terrorista bom.

Alguns passos podem ajudar na análise histórico-cultural e contextual:


1. Determinar o ambiente geral histórico e cultural do escritor e de sua audiência.
a) Determinar as circunstâncias históricas gerais.
b) Estar atento às circunstâncias e normas culturais que adicionam significado a determinadas
ações.
c) Discernir o nível de compromisso espiritual da audiência.

2. Determinar o propósito (ou propósitos) do autor ao escrever o livro / texto.


a) Observar as declarações explícitas ou frases repetidas.
b) Observar as seções parenéticas.
c) Observar os problemas omitidos ou os enfocados.

3. Entender de que forma a passagem se enquadra no contexto imediato.


a) Localizar os principais blocos de material no livro e mostrar como se encaixam num todo
coerente.
b) Mostrar como a passagem se ajusta à corrente de argumento do autor.
c) Determinar a perspectiva que o autor tenciona comunicar – numenológica (a realidade das
coisas) ou fenomenológica (a aparência das coisas).
d) Distinguir entre verdade descritiva e verdade prescritiva. Distinguir entre detalhes
incidentais e ponto central do ensino de uma passagem.
e) Localizar a pessoa ou categoria de pessoas às quais a passagem é dirigida

2. Análise Léxico-Sintática: é o estudo do significado de palavras tomadas isoladamente


(lexicologia) e o modo como essas palavras se combinam (sintaxe), a fim de determinar com
maior precisão o significado que o autor pretendia lhes dar.
A análise léxico-sintática fundamenta-se na premissa de que embora as palavras possam
assumir uma variedade de significados em contextos diferentes, elas têm apenas um significado
intencional em qualquer contexto dado. Assim, se eu dissesse “Ele é ou está verde”, essas
palavras poderiam significar que (1) ele é inexperiente, ou (2) ele está doente, ou (3) ele está
assustado. Conquanto minhas palavras pudessem significar qualquer uma dessas três coisas, o
contexto geralmente indicará qual dessas ideias eu desejo comunicar. A análise léxico-sintática
ajuda o intérprete a determinar a variedade de significados de uma palavra ou de um grupo de
palavras, e então declarar que o significado X é mais provável do que o significado Y ou Z de
ser a intenção do autor nessa passagem.
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Procedimento em sete passos:


1. Apontar gênero literário geral: se o autor usa o padrão prosa, poesia etc, pois isso influencia
o modo com o qual ele pretende que suas palavras sejam entendidas.
2. Investigar o desenvolvimento do tema do autor e mostrar como a passagem em
consideração se encaixa no contexto. Este passo, já iniciado como parte da análise contextual,
dá uma perspectiva necessária para determinar o significado das palavras e da sintaxe.
3. Apontar as divisões naturais do texto. As principais unidades conceptuais e as declarações
transicionais revelam o processo de pensamento do autor e, portanto, tornam mais claro o
significado que ele quis dar. As divisões em versículos e capítulos foram acrescentadas muitos
séculos depois que a Bíblia foi escrita, como auxílio na localização de passagens, não
correspondem ao que estava na mente do autor do texto sagrado.
4. Identificar os conectivos dentro dos parágrafos e sentenças. Os conectivos (conjunções,
preposições, pronomes relativos) mostram a relação que existe entre dois ou mais pensamentos.
Os conectivos, incluindo conjunções, preposições, pronomes relativos etc., muitas vezes nos
ajudam a acompanhar a progressão do pensamento. Tomemos como exemplo Gl 5,1:
“Permanecei, pois, firmes e não vos submetais de novo a jugo de escravidão”. Tomado
isoladamente, o versículo poderia ter qualquer de diversos significados: poderia referir-se à
escravidão humana, à escravidão política, à escravidão ao pecado, e assim por diante. O termo
“pois” indica que essa afirmação se refere a um ponto que Paulo apresentou antes. Paulo está
incentivando os Gálatas a não se escravizar de novo ao jugo do legalismo (Gl 3,1 – 4,30).
5. Determinar o significado isolado das palavras. Qualquer palavra que sobrevive por muito
tempo numa língua começa a assumir uma variedade de significados. Por isso é necessário
procurar os diversos possíveis significados de palavras antigas, e então determinar qual desses
possíveis significados é o que o autor tencionava transmitir num contexto específico. Há três
métodos geralmente adotados para se descobrir a variedade de significados que uma palavra
possa ter:
O primeiro é estudar os modos como ela foi empregada em outra literatura antiga. O segundo
método é estudar os sinônimos, procurando pontos de comparação bem como de contraste. O
terceiro método para a determinação dos significados de uma palavra é a etimologia – o estudo
do significado das raízes históricas da palavra. Há vários tipos de instrumentos que capacitam o
estudioso das Escrituras averiguar os possíveis significados de palavras antigas. Os mais
importantes são: (1) a concordância, ou chave bíblica, que contém uma lista de todas as vezes
que determinada palavra é usada na Escritura; (2) o léxico é um dicionário de vocábulos
hebraicos ou gregos, ele registra as várias denotações de cada palavra.
6. Analisar a sintaxe. A sintaxe trata do modo como os pensamentos são expressos por meio de
formas gramaticais. Cada língua tem sua própria estrutura, e um dos problemas que tanto
dificultam a aprendizagem de outra língua é que o estudante deve dominar não só as definições
e pronúncias das palavras da nova língua, mas também novos modos de dispor e demonstrar a
relação de uma palavra com outra. As gramáticas hebraicas e gregas explicam as várias formas
que as palavras podem tomar em suas respectivas línguas, e o significado das palavras quando
aparecem em determinadas formas.
7. Colocar os resultados de sua análise léxico-sintática em palavras que não tenham conteúdo
técnico, mas que sejam fáceis de ser entendidas, que transmitam claramente o significado que o
autor tinha em mente. Ponha os resultados em palavras não técnicas, de fácil compreensão,
evite a tentação de impressionar os ouvintes com erudição e demonstração de grandes
conhecimentos. As pessoas precisam ser alimentadas, não impressionadas.
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3. Análise Teológica: a Bíblia é um produto do desenvolvimento evolutivo da religião de


Israel. Quando a consciência religiosa de Israel se tornou mais sofisticada, aconteceu o mesmo
com a sua teologia. Como consequência, há na Bíblia uma variedade de teologias – escritos
que refletem diferentes níveis de sofisticação teológica, às vezes conflitantes entre si. Contudo,
em Jesus Cristo se dá a plenitude da Revelação. A análise teológica pergunta: “De que modo
esta passagem se encaixa no padrão total da revelação de Deus?”
Os passos dessa análise são:
a. Determinar o ponto de vista sobre a natureza do relacionamento de Deus com o homem. A
compreensão de determinados textos é tendenciosa por causa da manipulação de textos com
concepções arcaicas sobre Deus.
b. Descobrir as implicações deste ponto de vista para a passagem que está sendo estudada.
c. Avaliar a extensão do conhecimento disponível às pessoas daquele tempo. Que
conhecimento prévio elas haviam recebido?
d. Determinar o significado que a passagem possuía para seus primitivos destinatários à luz do
conhecimento que tinham.
e. Descobrir o conhecimento complementar acerca deste ponto que hoje temos disponível em
virtude de revelação posterior.

REFERÊNCIAS
BERGER, Klaus. Hermenêutica do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1999.
BERKHOF, Louis. Princípios de Interpretação Bíblica, 3 ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2008.
BRUGGEN, Jakob Van. Para Ler a Bíblia, São Paulo: Cultura Cristã, 2001.
EGGER, Wilhelm. Metodologia do Novo Testamento: Introdução aos métodos linguístico e
histórico-crítico. São Paulo: Loyola, 1994.
FEE, Gordon D., STUART, Douglas. Entendes o que lês? Um guia para entender a Bíblia com
o auxílio da exegese e da hermenêutica. São Paulo: Vida Nova, 1982.
HERMENÉUTICA in: Enciclopedia Católica Online:
http://ec.aciprensa.com/wiki/Hermen%C3%A9utica acessado em 23 de junho de 2015.

KAISER JR, Walter C. e SILVA, Moises. Introdução a Hermenêutica Bíblica: como ouvir a
Palavra de Deus apesar dos ruídos de nossa época, São Paulo: Cultura Cristã, 2009.
LUND, E. e NELSON, P. C. Hermenêutica: Regras de Interpretação das Sagradas Escrituras,
São Paulo: Editora Vida, 1968.
OSBORNE, Grant R. A Espiral Hermenêutica: uma nova abordagem à interpretação bíblica,
São Paulo: Vida Nova, 2009.
REIMER, Haroldo e SILVA, Valmor da (org). Hermenêuticas Bíblicas: Contribuições ao I
Congresso Brasileiro de Pesquisa Bíblica, São Leopoldo: Oikos, Goiânia: UCG, 2006.

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